Para o historiador Ruy Christovam Wachowicz, o projeto de colonização de Rio Negro, proposto há dois séculos por João da Silva Machados, o futuro Barão de Antonina, tinha outros objetivos além de criar um estabelecimento para o provisionamento das tropas que percorriam a Estrada da Mata:
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“Na realidade os 238 alemães foram ali localizados para que, com sua atividade agrícola e consequente expansão, afugentassem o indígena Xokleng mais para as matas, diminuindo os ataques que as tropas do futuro barão sofriam na região”.
Defendidas até então pelos índios, essas terras seriam progressivamente ocupadas para assegurar o sucesso do empreendimento. No entanto, a essa altura, os índios já não eram mais tão numerosos e já se sabia que só atacavam para revidar agressões.
Quando as turmas de Machado iniciaram sua participação nas obras da estrada, as estimativas para a população indígena na região eram de apenas 152 indivíduos Camés, ou seja, os índios que aceitaram ser catequizados.
Índios dizimados
Segundo Wilmar da Rocha D’Angelis, os Votorões, índios que não aceitaram ser catequizados, perfaziam 120 a 400 indivíduos pertencentes ao grupo de Dorins, que tinha “seu aldeamento à margem do Rio Dorins onde fica o Campo das Laranjeiras”.
Os Xokrens eram 60 indivíduos, localizados “[…] entre os rios Iguaçu e Uruguai…” (Francisco das Chagas Lima, Memória sobre o descobrimento e colônia de Guarapuava). Ainda para o padre Lima, também havia 240 índios Guaranis “nos bosques e faxinais inerentes ao Rio Uruguai” – reduzidos, portanto à metade desde 1821, quando o religioso os estimou em torno de 500 indivíduos.
A ameaça indígena representada pelo cacique Guairacá nos tempos dos jesuítas estava definitivamente eliminada.
O impulso da madeira
Com o gado, a erva-mate e as colônias de abastecimento, a economia regional se diversificava, formando a base do futuro Paraná, completada, já no primeiro quarto do século XIX, pela exportação de madeiras, que aparece com força crescente nos registros do comércio exterior pelo porto de Paranaguá.
“Em 1826 a madeira já significava 8,21% da exportação do Paraná, em raios e eixos, portadas, lenha, vigas e tirantes, tábuas e pranchões, ripas e varas, paus tortos e curvas. O pinho era utilizado apenas nos limites da Serra acima, devido a dificuldades de transporte para o litoral” (Nilson Monteiro, Uma lasca da história da madeira).
Em outubro de 1826 chegou ao conhecimento do governo paulista a tese da loucura do padre Chagas Lima como explicação para os atritos entre o catequista e os coronéis fazendeiros de Castro.
Estes se queixaram ao ouvidor José Vernecke Ribeiro de Aguilar que o religioso proibia o contato dos índios com os colonos, “mantendo-os presos no aldeamento”.
A mão do gato
Tentando usar a mão de obra indígena, alegavam que a melhor forma de civilizar os índios era que trabalhassem nas fazendas “para estarem seguros dos ataques dos outros selvagens”, segundo proposta formulada na Câmara de Castro. Para eles, escravidão era o que o padre fazia.
“Na verdade, a crítica sobre o vigário tinha o propósito de extinguir o aldeamento a fim de ocupar o território dos índios, como foi percebido por Chagas Lima, num ofício no qual o pároco se defende das acusações dos povoadores da Freguesia, denunciando o interesse destes sobre as terras indígenas” (Tatiana Takatuzi, Águas Batismais e Santos Óleos).
O governador Monteiro de Barros, ao apurar os fatos, recebeu do padre uma resposta firme: mudar o sistema de aldeamento seria “tirar a sardinha das brasas com a mão do gato”. Assegurar a posse das terras de Guarapuava com uma política de extermínio dos nativos, sugeriu, custaria sérios prejuízos ao povoamento do interior.
O fracasso de Pedro I
Não por acaso, os ataques dos fazendeiros ao padre Chagas Lima coincidiram com o fim de sua catequese na frente pioneira de Guarapuava. A tese da loucura do padre – possuído por severa depressão ao presenciar a destruição de Atalaia/Guarapuava – predominou.
Lima foi afastado dos serviços religiosos sob a alegação de que sua perturbação mental se agravou, mas por falta de outro pároco na região os registros de batismos, casamentos e óbitos continuariam a ser oficialmente lavrados em seu nome até agosto de 1828.
O ano de 1827 começou com o Brasil vivendo mais uma de suas costumeiras crises políticas. Logo em 15 de janeiro, depois de sucessivas intrigas da Marquesa de Santos, amante do imperador Pedro I, todos os ministros se demitem.
O monarca vinha de uma frustrante visita ao teatro de lutas na Província Cisplatina, onde as derrotas eram disfarçadas em supostas vitórias pelo comando militar.
A procissão dos derrotados
Na frente de povoamento do interior paranaense, entre Castro e Guarapuava, em situação extrema, de vida ou morte, os índios perderam a possibilidade de aceitar a catequese no aldeamento controlado pelo padre Lima. Só lhes restava se render, aceitar que suas mulheres e crianças fossem capturadas para ser escravizadas nas fazendas ou ser massacrados nas matas.
Prevaleceu a opção de se render no aldeamento de Atalaia/Guarapuava, onde seu destino era traçado: os índios mais capazes e dóceis eram destacados do grupo étnico original para servir nas fazendas dos coronéis paulistas.
Já sem a proteção do padre Francisco das Chagas Lima, em maio de 1828 foram levados do aldeamento grupos com dezenas nativos como se fosse “uma procissão”, segundo descrição do soldado Francisco Manoel de Assis França, escrivão que assessorava o comandante Antônio da Rocha Loures.
O sinal que faltava
Desde meados de 1828, a mando do governo paulista, parte significativa dos índios aldeados em Guarapuava é mandada para trabalhar nas lavouras em São Paulo. Havia interesse em tirar os índios da mata para facilitar a vida dos imigrantes alemães que chegavam.
A notícia de que os nativos outrora rebeldes procuravam se aldear espontaneamente para servir aos brancos deu ao ministro do Império José Feliciano Fernandes Pinheiro (1774–1847), Visconde de São Leopoldo, base para determinar em 8 de novembro de 1827 que a Província de São Paulo tomasse providências para o recebimento de 955 colonos alemães.
Parte desses colonos seriam entregues a João da Silva Machado para formar o núcleo pioneiro da imigração no Paraná: Rio Negro. Eles partiriam do Porto de Bremen em meados de 1828, embarcados no veleiro Charlotte Louise a caminho do Brasil. A saga da imigração estava para começar.
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