Oeste despovoado terá um futuro inglês

Família complicada no governo: o rei Afonso VI e a mãe, Luísa de Gusmão

No plano mundial, o fim da primeira metade do século XVII, em 1649, registrou fatos decisivos para a história. Na Inglaterra, a decapitação do rei inglês Carlos I, acusado de pensar em interesses pessoais e não no povo. Na Holanda, a revolução agrícola dos nabos, que reorientou o processo produtivo mundial. 

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Em seguida, a Inglaterra republicana atacou os navios da Holanda, que governava o Nordeste do Brasil, iniciando uma guerra pelo controle do comércio marítimo. Havendo uma prolongada instabilidade em Portugal, a situação determinou abalos em suas colônias e apresentou reflexos também no futuro Paraná. 

Com milhares de índios já escravizados e outros tantos fugindo para as missões no Sul, minguou o “estoque” de nativos na região. A atenção dos portugueses se dirigia agora prioritariamente para se libertar da invasão holandesa. 

Desajustes familiares

O Brasil lusitano, espelhando a matriz, também estava mergulhado em problemas. A ocorrência crucial foi a colônia sofrer uma crescente influência inglesa, favorecida pela criação da Companhia Geral do Comércio.

O conflito com a Inglaterra enfraqueceu a Holanda, o que ajudou Portugal a retomar o Nordeste, mas seu governo estava nas mãos de uma família muito complicada. Espanhola, a rainha de Portugal, Luísa de Gusmão, exercia grande influência sobre o marido, o rei João IV.

Caindo enfermo em 1648, o rei nomeou Luísa como regente de Portugal durante a menoridade do herdeiro do trono, Afonso VI. João IV morreu em novembro de 1656 e contra a vontade da mãe, que pretendia continuar governando, o filho Afonso VI foi coroado muito jovem, aos 14 anos. 

A Corte lusa considerava que Afonso VI tinha “cabeça perturbada”, subindo ao trono em má hora para os interesses lusos ultramarinos. A fragilidade do governo português, ainda tentando se libertar totalmente do domínio espanhol, foi determinante para a ascensão da influência inglesa. 

Índios com muito ouro

Enquanto esses fatos mudavam o mundo, no futuro Oeste do Paraná o despovoamento causado pelas bandeiras portuguesas nesta região e a expulsão dos jesuítas espanhóis fortaleceu os bandeirantes, cuja nova ocupação principal na área passava a ser a busca de ouro, prata e diamantes. 

Retornando o Brasil Colônia inteiro ao domínio luso, a necessidade de Portugal se fortalecer para enfrentar a Espanha e salvar sua economia impunha fazer com que os territórios desbravados lhe proporcionassem um rendimento máximo.

Agora, em lugar dos cruéis caçadores de homens, as expedições luso-paulistas em território do futuro Paraná se faziam acompanhar por técnicos em minas e geologia. 

Um deles, Luís de Góis Sanches, “andando pelos lados do morro de Capivaruçu, próximo às nascentes do Ivaí, em 1641, encontrou índios com muitas folhetas de ouro” (Afonso Botelho, Notícia da conquista e descobrimento dos sertões do Tibagi). 

O Paraná, assim, foi alvo de uma corrida do ouro e a parte da produção aurífera entregue ao reino português como tributo tinha o apelido de “quinto dos infernos”. 

Expulsão custou caro

Todo o ouro dos quintos existente nos cofres do Paraná, aos cuidados de Eleodoro Ébano Pereira, segundo determinação baixada em 1652 pelo governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá, deveria ser repassado “à Rainha Nossa Senhora” de Portugal – d. Luísa de Gusmão (1638–1705). Depois disso, Ébano Pereira ficou sem funções.

O ouro paranaense que Salvador de Sá mandou Eleodoro Ébano rapar em 1652 para entregar à rainha foi destinado ao esforço da Coroa lusitana para derrotar os holandeses, que capitularam em 1654. 

Expulsar os holandeses foi um bom uso para o ouro paranaense? Nem tanto, já que ida dos holandeses causou uma forte crise na economia colonial. Sem o Brasil, passaram a produzir açúcar em suas colônias nas Antilhas, mais próximas da Europa e com terras virgens. 

O Brasil, sem planejamento e com terras cansadas, perdia a posição de vanguarda na produção açucareira. A concorrência holandesa derrubou os preços e o volume exportado caiu pela metade. 

Governantes retardados

A regência da Rainha Viúva, Luísa de Gusmão, termina em junho de 1662 com a ascensão ao trono do menino-rei Afonso VI, convencido por áulicos da Corte a contrariar a mãe, por fim afastada a contragosto.

Afonso e o rei espanhol Carlos II (1661–1700) eram tidos pelas próprias famílias como fracos, retardados e imbecis. Afonso em breve seria deposto pelo irmão, Pedro II. Carlos, que morreu aos 39 anos sem deixar herdeiros, era conhecido como “o amaldiçoado”.

No futuro Paraná, Fernão Dias Paes Leme ocupava a Serra da Apucarana, onde o bandeirante estabeleceu um “arraial com o troço* das suas armas, para vencer a redução daquele reino, que se dividia em três diferentes reis” (Affonso Taunay, A grande vida de Fernão Dias Paes). 

Não sem trabalho, a tropa de Paes Leme capturou os caciques da nação Guainá, ancestrais dos Caingangues, levando-os prisioneiros para São Paulo com todo o seu povo. A tarefa demorou três anos, entre 1661 e 1663.

Sobre a conquista de Paes Leme, padre Antônio Vieira escreveria a sua versão sobre o massacre sofrido pelos índios: “Toda aquela gente se acabou ou nós a acabamos; em pouco mais de trinta anos (…) eram mortos dos ditos índios mais de dois milhões” (Darcy Ribeiro, O Povo Brasileiro).

*Troço – Base para assentar um canhão.

Portugal perde o interesse

O rei Afonso VI teve um curto reinado de muitas batalhas externas, culminando com um desmoralizante complô chefiado pelo irmão Pedro II (1648–1706), então com 19 anos, em 1667.

Assumindo na condição de regente sob a alegação de instabilidade mental do irmão rei, aprisionado em Sintra, Pedro II lhe tomou até a esposa, a francesa Maria Francisca de Saboia, de 22 anos, em 1668. O governo de Pedro II iria se caracterizar por mais submissão à Inglaterra e uma febril exploração das minas brasileiras.

Os primeiros sinais de descontentamento do interior do futuro Paraná com a administração geral do Brasil Colônia se verificam logo depois de se constatar que o ouro paranaense já não atendia mais às ávidas pretensões de Portugal. 

Em breve a ilusão da fartura de veios de prata também acabaria por se desvanecer e o litoral paranaense deixaria de ser interessante aos governantes do Rio de Janeiro, tanto quanto seu interior, a Oeste, já não atraía mais os bandeirantes luso-paulistas.

Entre famílias complicadas e governos inseguros, ao Oeste do Paraná só restava esperar por dias melhores. Eles tardaram mas vieram, e o comando, a partir daí, será inglês.

CLIQUE AQUI e veja os episódios anteriores da Grande História do Oeste, narrados pelo jornalista e historiador Alceu Sperança.

O jovem rei Pedro II acreditava que havia uma fabulosa “serra de prata” no Paraná

 

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