A proposta feita ao donatário Martim Afonso de Sousa por Francisco de Chaves, sobrevivente da trágica jornada de Aleixo Garcia, era tentadora: homens e armas em troca do retorno “com quatrocentos escravos carregados de prata”. Tinha ainda a vantagem de ser rápida, sem a necessidade de acompanhar o litoral até a foz do Prata e subir por este para a longa jornada aos Andes, onde os tesouros estavam.
Em trinta dias, Martim Afonso organizou a nova expedição, não se sabe se exatamente com 400 escravos respaldados por 80 homens armados: quarenta besteiros e quarenta espingardeiros. Besteiros eram os soldados que usavam uma arma – a besta (é) conhecida também como balestra – formada por um arco, cabo e corda, com que disparavam bolotas, pedras ou setas.
Sob o duplo comando de Francisco de Chaves e Pero Lobo, este o capitão do galeão São Vicente, da esquadra de Martim Afonso, a comitiva partiu em 1º de setembro de 1531 com a missão de encontrar as fabulosas riquezas que já se sabia existirem na “serra de prata” dos Incas.
Mais uma derrota no Oeste
Confiantes em que fariam a conquista militar do ainda desconhecido Império Inca, localizado a dois mil quilômetros de distância, a nova expedição “era uma reprise da aventura de Aleixo Garcia, realizada sete anos antes” (Eduardo Bueno, Náufragos, Traficantes e Degredados).
A expedição (ou entrada, como os portugueses qualificavam as iniciativas oficiais de exploração) guiou-se pelo Caminho do Peabiru. Cruzou o Rio Iguaçu pouco acima da foz e entrou no território dos índios Paiaguás. Quatro meses depois da partida, no fim de 1531, os europeus foram bloqueados pelos índios.
Ao impedir o avanço da tropa, os índios atraíram os invasores para campo raso, onde se deu o confronto e a completa derrota dos portugueses, narra Sérgio Buarque em Visão do Paraíso.
O Paraná conhecido dessa época, sem mais notícias de exploradores nas perigosas terras do Oeste, limitava-se a trechos litorâneos das Capitanias de São Vicente e Santana. Ao Norte, a Capitania de São Vicente, doada pelo reino português a Martim Afonso de Sousa. Ao Sul, a de Santana, concedida a seu irmão, Pero Lopes.
A primeira se estendia por uma costa de 45 léguas, desde Bertioga até a ilha do Mel. A outra, abrangendo 40 léguas, desde essa ilha até Laguna, a considerar o limite inferior do Tratado de Tordesilhas (Eduardo Bueno, Brasil: uma História).
Irmãos Sousa desistem do Paraná
O limite não era entendido da mesma forma por portugueses e espanhóis. Para os portugueses, o limite ambicionado, era, na realidade, o Rio da Prata, que, aliás, Pero Lopes de Sousa subiu, em sua exploração da região, e chegou a assinalar “com seus padrões a posse da Coroa portuguesa”, ignorando assim aquele tratado (História Geral da Civilização Brasileira, A Época Colonial, Tomo I, organização de Sergio Buarque de Holanda).
A carta de doação concedendo a Martim Afonso a posse sobre cem léguas de costa brasileira, aí constando o litoral do Paraná, foi assinada em 7 de outubro de 1534, mas o donatário já não se interessava mais pela propriedade.
Nesse mesmo ano, a região do atual Oeste do Paraná foi doada pelo rei Carlos V (1500–1558, também referido como Carlos I de Espanha) a Pedro de Mendoza y Luján (Marcelino Machuca Martinez, Atlas histórico e descritivo do Paraguai Gigante).
Pedro de Mendoza, fundador de Buenos Aires, enfrentou sérios dissabores para manter a posse. Conseguiu controlar por algum tempo a região do Prata doando alimentos aos índios, mas Buenos Aires foi destruída em um ataque em dezembro de 1536. Mendoza abandonou a América do Sul e ao voltar à Espanha adoeceu em alto-mar e morreu em junho de 1537.
Papa repudia escravizar índios
Já sem o interesse dos irmãos Sousa em ocupar o Oeste, o substituto de Mendoza, Juan de Ayolas (c.1493–1538) encontrou um índio sobrevivente da expedição de Aleixo Garcia, que se dispôs a guiá-lo em busca de ouro e prata.
“Em 1537, partiu em direção aos Andes, travando combates com tribos hostis, e chegando a alcançar algumas que possuíam ouro e prata. Com a expedição enfraquecida pelas perdas em combate e por doenças, e sabedor de que forças poderosas se preparavam para atacá-lo, bateu em retirada. Ao chegar ao Rio Paraguai com grande carga de metais, teve a mesma sorte de Garcia. Foi morto pelos mesmos Paiaguás, e o tesouro que levava desapareceu” (Nivaldo Kruger, Paraná Central: A Primeira República das Américas).
As tentativas dos ibéricos para escravizar índios na América foram desautorizadas pelo papa Paulo III, que em 28 de maio de 1537 condenou à excomunhão os apresadores, mercadores e exploradores de índios. A bula Veritas Ipsa defendia os indígenas como plenamente humanos e condenava a escravização. A bula Sublimis Deus, de 2 de junho, reconhece aos índios direito de posse sobre seus bens.

Uma parte da Capitania de São Vicente e a Capitania Santana eram as duas únicas partes do atual Paraná que pertenciam a Portugal, segundo a primeira interpretação do Tratado de Tordesilhas
Na próxima semana: Cabeza de Vaca enfrentou índios honestos e brancos traiçoeiros
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