Os três Bartnik, uma história de famílias eslavas

Ônibus da Viação São José, de José Bartnik. Francisco, esposa Stanislava e filhos. Janine, filha de Vítor Bartnik

Com o fim da ditadura, em julho de 1947 o coronel José Rodrigues da Silva foi dispensado das funções de chefe da Comissão de Estradas de Rodagem (CER-1) apesar da competência e dedicação que seu trabalho sempre fez notar.

PRINCIPAIS NOTÍCIAS PELO WHATS: ENTRE NO GRUPO. TAMBÉM ESTAMOS NO TELEGRAM: ENTRE AQUI

No entanto, relações muito próximas com o ditador deposto, Getúlio Vargas, dificultavam sua permanência no comando. Mesmo tendo avisado para os riscos do fracassado empreendimento rodoviário no Paraguai, uma insensata aventura geopolítica do núcleo duro da ditadura, Rodrigues foi encarregado de executá-lo.

Militar, devendo obediência aos superiores, cumpriu a missão até segunda ordem, mas o que importava aos governos de Paraná e Santa Catarina era que o governo ditatorial lhes havia tomado suas partes a Oeste para formar o frustrado Território Federal do Iguaçu e como se não bastasse drenou os recursos que deveriam ser aplicados na construção da rodovia Ponta Grossa-Foz do Iguaçu e outras obras rodoviárias nos dois estados, desviando-os ao Paraguai.

Agora que novamente havia verbas para levar adiante o projeto de complementação da futura BR-277, Rodrigues era afastado da posição por estar “contaminado” pelas relações com o governo derrotado.

Horta, o novo chefe

A despedida do coronel foi emocionante, cercada pelo carinho da população e da imprensa, mas logo ele seria esquecido, como geralmente ocorre com os militares profissionais, cujas principais características são a “mudez” (proibição de envolvimento político-partidário) e a movibilidade.

O governador Moysés Lupion puxou os elogios à atuação do ex-chefe da CER-1, substituído em 1º de julho de 1947 pelo tenente-coronel Paulo Horta Rodrigues, este “com um excelente crédito financeiro aberto à sua frente” (Oscar Ramos Pereira, Estradas Paranaenses Construídas pelo Exército).

Vindo de elogiadas atuações anteriores em Lagoa Vermelha (RS) e Lages (SC), Horta Rodrigues assumia a CER-1, portanto, com os recursos que faltaram ao antecessor durante o fracasso da obra rodoviária no Paraguai.

De início, o trabalho do novo chefe foi imenso, “pois os serviços estavam paralisados desde outubro de 1946 e foram reorganizadas as secções de construção localizadas em Imbituva, Bracatinga, Cavernoso, Laranjeiras e Cascavel” (Oscar Ramos Pereira).

A segunda onda eslava

Assim que as obras recomeçaram com vigor, o projeto de colonização do interior do governo paranaense teve um sólido argumento para intensificar a propaganda.

As empresas colonizadoras antes apreensivas com a paralisia das obras no último ano, já vendiam terras com grande facilidade aos colonos que chegavam, filhos e netos de imigrantes capitalizados por décadas de trabalho de suas famílias no Rio Grande do Sul e Santa Catarina.    

Foi assim que a vinda de a vinda de colonos italianos se intensificou e também ocorreu uma segunda leva de colonos de origem eslava, que em primeira instância começaram a chegar nos anos 1920.

Um dos mais representativos desta nova onda foi Francisco Bartnik, não porque a região lhe fosse desconhecida, mas pela opção de passar a viver no setor urbano.

Ele e outros patriarcas da família Bartnik – José (https://bit.ly/3HwUWzn) e Vítor – constituíram a partir dessa época um dos principais eixos familiares da formação da cidade de Cascavel.  

A história de José é a mais conhecida, por conta de seu hotel pioneiro, a presença na formação do Tuiuti Esporte Clube e atuação como vereador.

Por sua vez, Francisco, que nasceu em Itaiópolis (SC) em 5 de outubro de 1912, tornou-se esmerado carpinteiro, já conhecia bem o meio rural e veio para se fixar na vila de Cascavel em 1947, já traquejado e disposto a fazer tudo que estivesse a seu alcance – e uma dessas tarefas foi construir a primeira sede do Tuiuti.

A transição do rural ao urbano

De origem eslava, como tantos poloneses, ucranianos e russos que iniciaram a colonização efetiva do Paraná, na década de 1920, Francisco Bartnik veio para o Oeste do Paraná antes da formação da vila de Cascavel e foi um dos grandes colaboradores de Tio Jeca Silvério para iniciar a cidade ainda antes de vir se radicar no setor urbano.

Uma das primeiras serrarias de Cascavel foi montada em 1932 pelos dois, às margens do Rio Melissa. Eles aproveitaram os recursos hídricos que mais tarde dariam à região de Cascavel sua primeira usina hidrelétrica: a usina do Melissa, hoje incorporada à estrutura da Copel.

Casado com a estimada professora Stanislava Boiarski, tiveram cinco filhos: Dirceu Lúcio, Elza (Fosqueira), Beatriz (Soares), Francisco Filho e Dinéia (Formighieri).

Além de carpinteiro, Francisco foi comerciante e fundou a Associação Rural de Cascavel ao lado de Tarquínio Joslin dos Santos, Antônio Rodrigues de Almeida, Antônio Alves Massaneiro, Celso Sperança e dezenas de outros pioneiros.

Ao morrer, em 12 de maio de 1962, Francisco servia à fiscalização da Receita Estadual.

Trabalho incansável e sofrimento intenso

Vitor Bartnik, por outro lado, teve uma biografia igualmente de muito trabalho, mas também muito sofrimento. Irmão de José, Vitor nasceu em 15 de novembro de 1915, no interior de Canoinhas (SC).

Seus pais, Valentin e Maria Galeski Bartnik, vieram da Polônia de navio e tiveram os filhos em Santa Catarina, que depois se instalaram inicialmente em Formiga, Catanduvas, próxima à futura Ibema.

Já carroceiro em Cantagalo (PR), Vítor puxava sal de Ponta Grossa para Foz do Iguaçu e veio para Cascavel com a família Tfardoski, também uma das mais antigas da região.

Sua esposa, a costureira Inês, filha de Plila e Thomas Babinsk, um sapateiro de origem alemã, teve oito filhos com Vitor Bartnik: Jaime, Janine, Ezídio, Navilha, Marlineide, Elim, Cleusa e Maria.

Inês costurava para as famílias pioneiras e também fazia fardas para a Polícia Militar. Claro que era também muito requisitada para costurar bombachas, segundo a filha Janine.

Tudo nos tempos em que tiveram paz, pois perderam as terras para grileiros encastelados na Inspetoria Regional de Terras no primeiro o governo Lupion, revelou Janine, que morreu em abril de 2021, vítima  de complicações da Covid.

O difícil recomeço

As terras tomadas dos Bartnik foram vendidas a pioneiros vindos do Sul. Era um cenário comum na época: os grileiros roubavam as terras dos pioneiros – a família Bartnik foi uma as primeiras a fazer o Oeste – e as vendiam aos colonos que chegavam para se estabelecer na região.

Em consequência, os pioneiros esbulhados mas sem apoio na Justiça e na autoridade policial, tentavam recuperar as terras pelas armas e enfrentavam a reação também armada dos novos ocupantes, que haviam investido suas economias e recorriam também à força para se manter na propriedade.

Os posseiros espoliados só começaram a ser defendidos por advogados depois da criação da Comarca de Cascavel, em 1954. Até lá, quem podia mais perdia menos.

Até perder a propriedade, escorraçado por jagunços a serviço dos grileiros, Vitor Bartnik vivia da agricultura e ao perder as terras também perdeu a colheita da estação e os animais que possuía.

“Os pistoleiros entraram atirando e prometendo matar não só os animais como a família”, contou Janine. Todos foram expulsos do lugar e Vitor foi se esconder dos inimigos nas cercanias do Lago Azul, onde tomou posse de algumas terras e recomeçou a vida, plantando e criando animais.

O Natal mais triste dos Bartnik

Bartnik trabalhava com afinco no dia a dia, mas não escondia sua revolta com os jagunços. Chegou a ficar doente, com dificuldades para trabalhar na criação e abate de bovinos, que geralmente vendia aos açougueiros Zardo e Gabana.

Enquanto o pai ficava escondido no mato, disse Janine, os familiares ficaram instalados num lote no centro da cidade, onde funcionou o Bar Amarelinho, que depois foi vendido.

Por essa época, Vitor Bartnik resolveu tentar recuperar alguns animais. Foi, juntamente com a corajosa esposa Inês, que o acompanhava, recebido a tiros.

Não era uma situação anormal na Cascavel daqueles tempos.  Janine recordou que certa vez, diante do Posto Bomm, na Avenida Brasil, viu um pistoleiro matar três homens e jogá-los sobre uma camioneta como se fossem animais.

Ainda adolescente, sequer se assustou, pois já estava acostumada com a violência: todos na cidade andavam armados. A vida naquela época não era mesmo fácil. Tanto que a vida de lutas de Vitor Bartnik acabou tragicamente, assassinado na véspera do Natal de 1969.

Fonte: Fonte não encontrada

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *