Passando a ter autonomia em dezembro de 1952, os municípios de Cascavel e Toledo tiveram suas próprias leis em março de 1953. As primeiras foram exigências impostas aos novos municípios: adotar uma legislação tributária, adaptando as normas já vigentes para o Município do qual faziam parte – Foz do Iguaçu –, a composição dos órgãos da administração local e criação do quadro próprio do pessoal fixo da Prefeitura.
AS PRINCIPAIS NOTÍCIAS PELO WHATS: ENTRE NO GRUPO. TAMBÉM ESTAMOS NO TELEGRAM: ENTRE AQUI. SIGA-NOS NO GOOGLE NEWS
Coincidentemente, o primeiro problema que entrou em debate nos dois municípios foi a precariedade dos cemitérios. Em junho de 1953 o prefeito em exercício de Toledo, vereador Guerino Viccari, recebeu da colonizadora Maripá uma área para a formação do cemitério municipal.
O terreno recebia sepultamentos desde 1949, com a morte do pioneiro José Drago. Antes os corpos eram enterrados nos arredores da vila.
Com a urbanização e as obras que a caracterizam, exigindo escavações, houve casos de ossos humanos aparecendo, inclusive as peças mais assustadoras da caveira: os crânios.
A população toledana, entretanto, jamais associou o Cemitério Cristo Rei a maldições capazes de arruinar a vida das autoridades locais. Em Cascavel foi diferente. Em 3 de agosto de 1953, quando o prefeito José Neves Formighieri determinou o fechamento do cemitério distrital, que bloqueava o caminho para o Patrimônio Novo, fatos estranhos passaram a acontecer, transcorrendo pelas décadas futuras.
“Não sou supersticioso, mas depois desse trabalho aconteceram alguns fatos desagradáveis comigo, com o [prefeito] Neves e outros envolvidos”, contou Mário Thomasi (1928–1996). Um dos primeiros servidores municipais, ele foi o encarregado de fechar o antigo cemitério distrital e abrir um novo campo santo, na futura Avenida Carlos Gomes.
Temor ao sobrenatural
Thomasi não conseguiu completar a tarefa, mas depois nem tudo foi dificuldade. Teve sucesso como dirigente do Tuiuti Esporte Clube, que sob seu comando se recuperou de complicados problemas financeiros e estruturais.
Um dos primeiros astros do automobilismo cascavelense, chegou a ser delegado de polícia e vereador na década de 1950. No entanto, também sofreu uma série de infortúnios, que atribuiu a mexer com as ossadas do cemitério.
Quando o Município surgiu, em 1952, a cidade começou a crescer para o lado do Patrimônio Novo e o velho cemitério, encravado entre os patrimônios Velho e Novo, na altura da esquina das atuais ruas Rio Grande do Sul e Voluntários da Pátria, tornou-se um entrave ao desenvolvimento urbano.
Em agosto de 1953 o prefeito José Neves Formighieri (1916–2002) se viu obrigado a determinar o fechamento. Thomasi acreditava que foi essa a razão de Neves nunca mais ter conseguido voltar a ser candidato a prefeito ou a deputado, pois uma urucubaca se abateu sobre sua carreira política. Depois de preso e torturado pela ditadura, Neves abandonou de vez a política.
Por medo, os servidores da Prefeitura não queriam, em hipótese alguma, trabalhar na remoção do velho cemitério. O tratorista, mesmo habituado a trabalhar à noite, apavorou-se com a perspectiva de aparecerem fantasmas.
Foi assim que Mário Thomasi, primo do prefeito e diretor do Serviço Rodoviário do Município, viu-se deslocado para a tarefa. Não pôde recusar, mas se arrependeu, atribuindo as dificuldades pessoais e políticas de quem lidou com cemitérios a uma espécie de “maldição” por perturbar os mortos.
Desastres políticos
No velho cemitério estavam enterrados os verdadeiros pioneiros de Cascavel, posseiros assassinados pelos jagunços e também jagunços mortos em emboscadas de represália armadas pelos posseiros, gente que, segundo a crença popular, não conseguiu morrer em paz. Neves Formighieri condenou a área e decidiu fazer a remoção dos corpos, mas como ninguém mais morreu, a área do novo cemitério ficou sem inauguração, como na comédia O Bem Amado, de Dias Gomes.
Cidade com população muito jovem, ambiente saudável e doentes graves transportados a centros com melhor estrutura médica, o novo cemitério só foi inaugurado, na rua Carlos Gomes, em plena mata, pelo prefeito seguinte – Helberto Schwarz.
Vereador na gestão anterior, Helberto havia aprovado a lei do novo cemitério e precisava cumpri-la, mas os novos vereadores não gostavam da ideia de abrir o novo cemitério na Rua Carlos Gomes, então era um enorme matagal, longe do centro urbano, a caminho para o Cascavel Velho.
Na década de 1960, já esgotado o prazo para a transferência dos corpos ao novo cemitério, o Departamento Autônomo de Águas e Esgotos da Prefeitura (hoje, Sanepar) começou a abrir valetas para a canalização de água e na altura do futuro Moinho Corbélia, construído na quadra do velho cemitério, foram encontrados ossos humanos. Alguns moleques foram advertidos por jogar futebol com um crânio.
O Moinho Corbélia também historiou um destino inglório: sofreu incêndio, a estrutura ficou comprometida e esteve no centro de uma longa batalha judicial.
Azares confirmam medos
Mário Thomasi tinha um brilhante futuro pela frente, sendo um dos principais líderes da comunidade, mas se viu obrigado a ir embora de Cascavel a contragosto, levando-o a crer na imaginária maldição. “Acho que esse negócio de mexer com cemitério não é bom”, disse.Como para confirmar o temor de Thomasi, depois de fazer a transferência do cemitério do centro da cidade para a Rua Carlos Gomes o prefeito Helberto Schwarz teve a Prefeitura criminosamente incendiada em seu último dia de administração.
Por um triz Schwarz não foi linchado e mesmo tendo escapado espetacularmente, via aérea, jamais conseguiu retomar sua até então bem-sucedida carreira política.
Três vereadores signatários de projetos que redundariam na criação da Administração dos Cemitérios e Serviços Funerários (Acesc), em 1989, enfrentaram problemas das mais diversas origens, em suas vidas pessoais e na carreira política.
“Escolhas determinam o futuro”
Hostílio Lustosa, que foi vereador, secretário municipal e vice-prefeito, depois de apresentar projeto referente aos cemitérios jamais voltou a se destacar na cena principal do mundo político local. Segundo ele, apenas fez escolhas de acordo com a conjuntura política. Sempre foi vitorioso e não se deixava perturbar por tais histórias.
O vereador Reinaldo Rodrigues, que também demonstrou preocupação com os serviços funerários – foi o primeiro a propor o sistema de gavetas para o cemitério –, elegeu-se apenas uma vez, em 1992.
Quando concorreu à reeleição, em 1996, obteve menos da metade dos votos recebidos quando se elegeu, fato que se deveu a problemas internos do PMDB, mas a “maldição” levou a culpa.
A maldição do cemitério teria alcançado com maior força o ex-vereador Celso Demoliner. Autor do projeto que criou a Acesc, ele foi o justamente o primeiro administrador da autarquia, mas sua carreira política se arruinou e chegou a enfrentar sérios problemas com a Justiça.
Se a maldição fosse real, seria maior
O ex-prefeito Fidelcino Tolentino pareceu ter superado a “maldição”, pois em sua primeira administração (1987) criou o cemitério do Jardim Guarujá e isso não o impediu de se eleger para a Prefeitura em 1992, embora depois disso sua carreira política também tenha sofrido reveses. Os ex-prefeitos Salazar Barreiros e Edgar Bueno fizeram várias melhorias em cemitérios da cidade e dos distritos e só gente muito impressionável pode acreditar que as derrotas sofridas por eles respectivamente nas eleições legislativa de 2002 e municipal de 2004 tenha algo a ver com espíritos perturbados.
Para o cabeleireiro Sebastião Bastroco Miranda, se houvesse maldição ela afetaria mais gente. Várias partes da cidade serviram eventualmente de túmulos clandestinos para jagunços que executavam “serviços” de matança de posseiros.
“Os caras encomendavam e os jagunços matavam mesmo”, contou Bastroco. “Aqui em Cascavel tem gente com mansão de uma quadra que não sabe que está morando em cima de um cemitério. E fica bem aqui no centro da cidade. Se cavar um pouquinho, vai tirar caveira debaixo da terra”.
100 anos da revolução: A milícia dos ervais
Por que soldados chegando de longe, com fardas esfarrapadas, barbudos e armados, recebiam apoio popular ao ocupar o Oeste do Paraná? A explicação está nas condições de miséria do povo. Os rebeldes prometiam que a revolução traria um tratamento melhor a todos e educação para as crianças.
As comissiones eram grupos paramilitares mantidos pelos latifundiários estrangeiros no Oeste paranaense. Seu papel era punir quem se recusasse ao regime de quase escravidão vigente.
Com o Estado ausente, formavam a polícia do sertão. Sádicos, eram “criaturas desumanas, cruéis, sedentas de sangue […] feras fiéis no cumprimento da incumbência desapiedada” (Hélio Serejo, Vida de erval).
A milicia ervateira semeava o terror. “Surras terríveis, castigos dolorosos e, não raro, a morte. […] A população apresenta um ar de submissão e tristeza confrangentes. A situação servil a que estão condenados lança-os numa espécie de apatia moral” (João de Talma, Das Fornalhas de Nabucodonosor).
Os revolucionários de 1924, portanto, abriram os olhos da nação para o sofrimento que era trabalhar no interior do Paraná.

Fonte: Alceu Sperança
Deixe um comentário