Um impasse envolvendo a Prefeitura de Cascavel e profissionais de dois setores da saúde, que se arrasta há anos, promete se estender por muito mais tempo e ao que tudo indica, sem solução a curto prazo.
Cerca de 450 agentes comunitários de endemias e comunitários da saúde aguardam, com ansiedade, pelo pagamento do chamado Incentivo Financeiro Adicional (IFA).
Os recursos, segundo o delegado regional do Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde e Endemias do Paraná (SINDACS/PR) Vanderlei de Souza Bandeira é repassado religiosamente todos os anos pelo governo federal à prefeitura, mas o dinheiro nunca caiu na conta dos trabalhadores.
O assunto, polêmico em outras regiões no país, foi pacificado em 2022 quando o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a verba deve ser utilizada como uma compensação anual aos profissionais destas áreas. Em Cascavel o assunto segue sem solução.
O dinheiro opera como uma espécie de incentivo extra aos agentes e equivale a pouco mais de R$ 2 mil por profissional por ano, resultando em aproximadamente R$ um milhão anual, considerando o volume global de beneficiados.
Segundo o delegado regional, apesar de as verbas serem destinadas ao Município, os agentes nunca puseram a mão nela. No entendimento do sindicato há uma vedação legal para uso do repasse para pagamento de 13º salário, ou para destinação a outras finalidades, mesmo que inseridos na saúde.
Reunião com a Comissão de Saúde e poder público ainda espera por respostas
Em uma das tentativas de resolver o impasse, o setor se reuniu com representantes do poder público municipal e a Comissão da Saúde da Câmara de Vereadores de Cascavel no mês passado. O prefeito Leonaldo Paranhos e o secretário da Saúde Miroslau Bailak não participaram do encontro.
Segundo o delegado sindical, o Município foi representado por Jorge Trannin. “Durante a reunião, o doutor Jorge Trannin se posicionou claramente a favor que se resolva a questão do incentivo e destacou que o Município não resolveu ainda por que não tinha o entendimento dos profissionais e do sindicato”, informou o delegado.
Porém, no entendimento oficial do Município à reportagem não há o que se resolver, pois os problemas elencados pelos agentes já estão sendo sanados. Em resposta aos questionamentos feitos pelo Preto no Branco, a Secretaria da Saúde informou “que já está sendo tudo pago de acordo com o previsto e repassado inclusive recursos do Município [que] estão sendo aplicados como complementares”. Segundo o Município não há dívida retroativa para quitar com os agentes.
A informação é contestada pelo Sindicato e, de acordo com Vanderlei, desde o encontro na Câmara de Vereadores não houve avanços nas tratativas. Além disso, o líder sindical disse ter conversado pessoalmente com Leonaldo Paranhos em maio passado sobre o assunto e que o prefeito o designou a levar o tema para uma profissional específica, indicada pelo gestor no Município. “Procuramos a profissional e ela nos disse que seria com outra pessoa, procuramos a outra pessoa que nos informou que se buscava recursos para o pagamento”, completou.
Comissão espera por reunião no paço
Na reunião realizada no mês passado na Câmara, também ficou acordado que seria formada uma comissão para dar encaminhamento às tratativas e que isso seria debatido em um encontro no paço municipal. “Até o presente momento, os responsáveis pela gestão da saúde não agendaram nenhuma reunião com os representantes das categorias para discutir o tema”, reforçou.
A reportagem questionou o Município quais valores foram destinados ao pagamento das verbas de incentivo, qual a fonte dos recursos e de que forma os pagamentos são feitos, mas a pasta não respondeu aos questionamentos.
Segundo o Sindicato que representa a categoria, a falta de ação da administração municipal tem gerado insatisfação entre os profissionais de saúde e levantado questionamentos sobre o compromisso da gestão com a categoria. “A expectativa agora é que a comissão seja formada e que as discussões avancem para garantir que o direito ao incentivo financeiro adicional seja efetivamente reconhecido e implementado”.
A categoria não ajuizou o tema e espera que tudo se resolva com diálogo, apesar de reconhecer que há ordenamento jurídico pela obrigatoriedade do pagamento. Considerando apenas os anos de 2022, 2023 – a verba é sempre paga no fim do ano, a soma dos valores se aproximaria dos R$ 2 milhões que deveriam ter ido para os agentes comunitários da saúde e endemias, mas não foram.
LDO e Projeto de Lei
O Sindicato também está amparado pela previsão do pagamento dos recursos que chegam do governo federal ao Município pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de Cascavel e na tentativa de o pagamento ser regulamentado a partir de lei municipal, a entidade chegou a elaborar um texto, com fundamentação pautada pelos regramentos jurídicos, para orientar um projeto de lei passando pela Câmara de Vereadores e então sancionamento do prefeito, mas até o momento o documento segue engavetado.
Decisão do TCE gera novas polêmicas sobre o pagamento
No Paraná o assunto se tornou ainda mais polêmico depois que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) reconheceu, em abril passado, que a parcela extra referente aos incentivos financeiros repassados pelo governo federal para o fortalecimento de políticas relacionadas à atuação de agentes comunitários de saúde (ACSs) e agentes de combate a endemias (ACEs) pode ser utilizada em prol do aprimoramento das condições de trabalho desses agentes.
“Ela também pode ser utilizada para pagamento de salários e demais encargos trabalhistas; e para as finalidades de promoção das atividades dos agentes. Além disso, o ente federativo pode estabelecer vantagens, incentivos, auxílios, gratificações e indenizações, para valorizar o trabalho dos ACSs e ACEs, conforme as disposições do parágrafo 7º do artigo 198 da Constituição Federal, independentemente da existência de sobras referentes aos repasses da União”, descreveu o TCE.
O líder sindical contesta e reitera que a verba vem carimbada, como forma de indenização direta aos agentes.
O voto do relator do processo, conselheiro Maurício Requião, foi acompanhado por unanimidade.
Fonte: Juliet Manfrin
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