Autor: Alceu Sperança

  • Guerra começa e governadores do Paraná fracassam

    Guerra começa e governadores do Paraná fracassam

    Depois de criar a Província explorando o antagonismo entre conservadores e revolucionários liberais, é em clima de guerra que o primeiro paranaense recebe o chamado do imperador Pedro II para ocupar um cargo de ministro.

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    Jesuíno Marcondes (1827–1903) foi nomeado para administrar o Ministério dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, integrando o Gabinete de 31 agosto, chefiado pelo piauiense Francisco José Furtado (1818–1870).

    A partir dessa época, Marcondes se tornará o grande chefe das Araucárias e começará com ele uma “dinastia” de políticos que terão seus descendentes, por parentesco ou afinidade política, em todos os governos paranaenses no futuro.

    O clima de guerra foi instalado em setembro de 1864, quando finalmente as tropas brasileiras cumpriram a ameaça de invadir o Uruguai.

    Solano López em cena

     

    Joaquim Marques Lisboa (1807–1897), o Almirante Tamandaré, chefe da esquadra brasileira, assinara um acordo de cooperação militar com Venâncio Flores (1808–1868), o líder colorado uruguaio, para a deposição do governo blanco de Aguirre.

    Mas a liquidação de Aguirre, determinada a pretexto de defender os interesses dos brasileiros que viviam no Uruguai, não iria ficar por isso mesmo: será o estopim de um conflito bem maior.

    Ao líder paraguaio Solano López só restava cumprir a ameaça feita de que iria retaliar se o Brasil invadisse o Uruguai. A resposta veio com o aprisionamento do navio brasileiro Marquês de Olinda, que navegava pelo Rio Paraguai, próximo a Assunção, com destino à província de Mato Grosso.

    Ainda nesse início de hostilidades, a Província do Paraná mantinha o quadro favorecido pela expansão dos negócios na região.

    As exportações de erva-mate dobraram até esse final de 1864, passando de pouco mais de sete mil toneladas para quatorze mil. Entretanto, uma crise viria, fatalmente, em consequência da guerra.

     

    O grande Paraná

    O decreto Imperial 3.378 estabelecia como limites da Província do Paraná os rios Canoas e Uruguai. O Paraná, portanto, mantinha limites legais com o Rio Grande do Sul. Depois da Guerra do Paraguai, no curso de um longo processo em que o Paraná foi derrotado por Santa Catarina e sua poderosa força no Rio de Janeiro, esse território foi perdido.

    Naquele momento, ainda com capacidade de iniciativa, o Paraná estava decidido a tomar posse de todo o território que legalmente lhe pertencia.

    Foi aparelhada uma nova exploração exploradora, também aos cuidados dos engenheiros Keller, constituída por seis embarcações, cinco das quais com cinco toneladas de capacidade.

    O objetivo era explorar a fundo as possibilidades dos mais importantes afluentes do Rio Paraná, “no interesse da navegação e da ciência”.

     

    Oeste, região estratégica

    O presidente (governador) da Província do Paraná, André Augusto de Pádua Fleury, informava aos deputados provinciais no início de 1866 que o Paraná “recebeu como herança de São Paulo e este de Portugal o estabelecimento de uma via de comunicação entre o litoral e a margem esquerda do Rio Paraná, abaixo das Sete Quedas”.

    Esta via, argumentava Pádua Fleury, era necessária não só para defender a fronteira, como também para a fundação de um porto na confluência do Iguaçu com o Paraná.

    Atendendo à sua recomendação, ordem imperial determinou à canhoneira Mearim promover uma jornada exploratória na região para organizar a estrutura de defesa da fronteira e projetar a edificação de um porto na foz.

    Dava a largada ao projeto para viabilizar a soberania do Paraná sobre a região Oeste, então dominada pela Argentina e interesses ingleses.

     

    Fleury projeta Foz do Iguaçu

    A proposta de Fleury está na origem da atual BR-277 e do “empório comercial de vulto entre o Brasil e os Estados do Prata”, em seu dizer, que viria a ser a atual Foz do Iguaçu.

    Esse porto, pretendia Fleury, deveria ser um futuro centro comercial (“empório”, segundo ele), aproximando o Império do Brasil das nações do Prata. Fleury estava “profetizando” a atual Foz do Iguaçu e intuindo o Mercosul.

    Fleury deixa o governo paranaense em março de 1866, devolvendo-o a Agostinho Ermelino Leão, sem ter condições de avançar mais nesse projeto por conta da Guerra do Paraguai.

    Ao término de um governo provisório de Ermelino de Leão, assume em novembro de 1866 o jornalista, juiz e professor piauiense Polidoro César Burlamaqui (1836–1894).

    A gestão de Polidoro Burlamaqui acaba em agosto de 1867, quando assume por breve período o advogado e juiz fluminense Carlos Augusto Ferraz de Abreu (1834–1872).

    Ferraz de Abreu, que também governaria Santa Catarina durante a guerra, entregou o comando paranaense no final de outubro de 1867 ao mineiro José Feliciano Horta de Araújo (1835–1908).

     

    Colonização não prosperava

    Com o fim do governo de Horta de Araújo, em maio de 1868, reassume por alguns meses o vice-presidente provincial Carlos Augusto Ferraz de Abreu, para dar posse ao português Antônio Augusto da Fonseca (1830–1890).

    Abreu saiu lamentando as dificuldades enfrentadas no setor de colonização. “Este ramo de serviço”, observou ele, “merece ser estudado acuradamente. As grandes despesas feitas com ele tem sido até hoje improdutivas”.  

    De fato, embora algumas boas sementes já estivessem plantadas, só iriam frutificar depois da Guerra do Paraguai, considerando também que a região já sentia os efeitos danosos do prolongado conflito entre as nações vizinhas.

    A guerra pareceu encerrada quando, sob o comando do Duque de Caxias, as forças brasileiras entram em Assunção, a 5 de janeiro de 1869.

    Mais de um ano ainda transcorreria, entretanto, até que o Paraguai estivesse destroçado e seu comandante já caído fosse executado por um golpe final.

     

    Desenho da vocação agrícola

    Com o fim do governo de Antônio Augusto da Fonseca, em agosto de 1869, Ermelino de Leão prepara a posse do baiano Antônio Luís Afonso de Carvalho (1828–1892), que ocorre em novembro.

    Carvalho, que também governou a Bahia, em relatório aos parlamentares provinciais desenhou o retrato de um Paraná agrícola, projeto de difícil execução após o esgotamento da mão-de-obra escrava e antes das colônias de imigrantes:

    – O terreno é de uma fertilidade espantosa e presta-se perfeitamente a todos os gêneros da agricultura europeia, bem como de alguns peculiares aos climas temperados. Na colônia Thereza, o terreno às margens do Rio Ivaí produz trigo, café, centeio, cana de açúcar, algodão e arroz de que se abastece em grande quantidade Guarapuava e a Comarca de Castro.

    Uma descrição que trazia, com o relato, uma proposta de propaganda da qualidade das terras paranaenses, tendência crescente a partir dessa época. Mas no Oeste, e assim ainda seria por longo tempo, os idiomas mais falados eram o Guarani e o Espanhol. O controle real da região, porém, era inglês.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Governador detestado e Zacarias leva o Brasil à guerra

    Governador detestado e Zacarias leva o Brasil à guerra

    Embora favorecida por lei provincial específica em de 21 de março de 1854, a atração de imigrantes ao Paraná demorou a produzir resultados consistentes, enquanto interesses estrangeiros tomavam conta do Oeste, na trilha do expansionismo britânico.

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    O porto de Santa Helena, no Rio Paraná, é tido como instalado em 1858, embora erroneamente atribuída à Companhia Domingo Barthe, que só viria a se constituir vários anos depois.

    A essa altura, o Paraná sempre esvaziado de índios, mão de obra escrava e soldados, levados para as lavouras de São Paulo e combates no Sul, só contava com cerca de 70 mil habitantes.

    A inexpressividade da agricultura, com o êxodo da mão-de-obra escrava, tornava a pecuária absoluta para a economia provincial.

    Em 1859, o rebanho paranaense era de 228 mil cabeças – 113 mil em Guarapuava e Palmas, o que representava a metade de todo o gado do Paraná.

    O Paraná, reportou o governador Francisco Liberato de Matos, “tem-se desvelado em promover a imigração de colonos úteis e industriosos, que superem a falta de braços que tanto sente a lavoura”, mas a iniciativa ainda estava longe de obter os resultados propostos nas leis e regulamentos.

    Cardosinho, o “econômico”

    À frente da Província do Paraná até maio de 1859, Liberato de Matos passa o governo ao fluminense Luiz Francisco da Câmara Leal (1822–1878), que passou de imediato o cargo ao conterrâneo José Francisco Cardoso (1830–1885).

    Cardoso teve uma gestão muito criticada por tomar medidas para trazer economia ao governo cortando gastos de programas e obras essenciais.

    Chegou a fechar escolas de grau médio por achá-las inúteis. E, como não havia mais escravos disponíveis, quis prender e obrigar os índios a se tornar agricultores a serviço dos brancos.

    Seu estilo personalista de governar chocou a população, que o hostilizava agressivamente, que respondeu qualificando o Paraná como “terra de selvagens”, o que lhe rendeu o incômodo apelido de Cardosinho Maluco.

    O café aparece na economia regional

    Cardoso tinha horror a criar novas vilas no interior, porque isso representava gastar com a instalação de prédios públicos, para gestão e cadeias.

    Felizmente, na gestão imperial, prevaleceu o espírito do decreto de 16 de novembro de 1859, que ao instituir as colônias militares do Chapecó e do Chopim, então parte do território paranaense, tinha como objetivos a defesa das fronteiras e o fomento à ocupação colonial da região.

    O café, já aparecendo timidamente no Norte paranaense, em algumas grandes fazendas, constituía uma primeira e sólida frente pioneira.

    Partindo das montanhas do Rio de Janeiro, o café penetrara em São Paulo em 1850, no vale do Paraíba do Sul. Em menos de vinte anos se alastrava pela região de Campinas.

    “A partir desta data o entusiasmo pioneiro se acelerou: os plantadores de café transpuseram o escarpamento de arenitos e basaltos que limita os planaltos ocidentais de São Paulo, e, desde 1880 mais ou menos, foi no quadro geográfico destes planaltos, que a frente pioneira progrediu para Oeste, em direção do Rio Paraná” (Pierre Monbeig, A Zona Pioneira do Norte-Paraná, 1945).

    Prosperidade no Brasil e crise nos EUA

    Dez anos depois de o Brasil adotar sua lei agrária, que só legitimava uma propriedade se ela fosse comprada, os EUA criam, em 1860, uma lei de ocupação que trará progresso e pequenas propriedades para sua região Oeste: a terra pertenceria a quem tomasse posse.

    Apesar do imbróglio das terras, negadas aos escravos e aos índios, sem dinheiro para comprá-las, o decênio 1850/1860 marcou uma grande fase de prosperidade econômica para o Brasil.

    Vigorava a conciliação política orquestrada pelo governo de Honório Hermeto Carneiro Leão, o Marquês do Paraná.

    Seu pacto entre adversários muito parecidos – conservadores cultos e liberais moderados – pacificara o País em um período áureo que coincide com o fim da primeira fase da Revolução Industrial.

    O Brasil estava em relativa paz, mas dramáticas notícias vinham do Norte: o Norte industrial e o Sul escravista se envolviam em fratricida Guerra Civil.

    Primeiro paranaense governador

    Em março de 1861, José Francisco Cardoso passa o governo ao mineiro Antônio Barbosa Gomes Nogueira (1823–1885). Sem deixar saudades, governou até março de 1863, quando assumiu seu vice, o curitibano Manoel Antônio Ferreira (1805–1885).

    Um dos primeiros deputados provinciais, eleito em 1854, Ferreiro se tornava o primeiro paranaense nato a assumir o posto de governante da Província, embora por poucos meses: em 5 de junho transmitiu o governo ao pernambucano Sebastião Gonçalves da Silva (1827–1879).

    Com uma gestão discreta, igualmente de poucos meses, o governo Gonçalves teve como destaque uma expedição para explorar as possibilidades do Rio Ivaí.

    Sob as ordens dos engenheiros alemães Joseph e Franz Keller, a expedição partiu de Curitiba no início de janeiro de 1864.

    Zacarias assume o governo do Brasil

    O governo de Sebastião Gonçalves coincide também com a volta de Zacarias de Góis e Vasconcelos à chefia do governo brasileiro, em 15 de janeiro de 1864.

    Novamente no comando da Nação, os liberais tentarão mostrar serviço e é assim que promovem uma ruidosa intervenção no Uruguai, onde Atanasio Cruz Aguirre (1801–1875) ameaçava os interesses brasileiros.

    O governo provincial de Sebastião Gonçalves da Silva termina em 7 de março de 1864, quando já começam a aparecer os frutos da expedição dos irmãos Keller, em sua tarefa de explorar o potencial do Rio Ivaí.

    Eles relataram ter encontrado ruínas de uma cidade: Vila Rica do Espírito Santo, “povoação espanhola destruída e abandonada há mais de trezentos anos”, que chegou a ter mais de três mil habitantes.

    Ditador paraguaio entra em cena

    O fluminense José Joaquim do Carmo Júnior (1832–1915) assumiu o governo provincial por três meses, em junho de 1864, até dar posse a André Augusto de Pádua Fleury (1830–1895), que mais tarde, de volta ao governo, passaria à história como o governador que propôs a criação de Foz do Iguaçu.

    O governo imperial, então, apresenta seu ultimato ao governo blanco do Uruguai: fixa o prazo de seis dias para Aguirre atender às exigências brasileiras, sob pena de intervenção militar para garantir os direitos dos súditos do Império do Brasil no Uruguai.

    O Paraguai reage, imediatamente. O Brasil é notificado pelo ditador Solano López, no final de agosto de 1864, que “não pode se conservar indiferente” frente a uma eventual invasão do Uruguai, “pois ela destrói o equilíbrio político no Prata”.

    López provoca, assim, uma situação de confronto. O Império não responde, mas o ditador paraguaio de fato não iria se manter indiferente à dura ação militar brasileira que estava para acontecer.

     

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Mais sucesso governando o Brasil que o Paraná

    Mais sucesso governando o Brasil que o Paraná

     

    Além de Curitiba, o litoral, Guarapuava e os setores navegáveis do Médio-Iguaçu (o Sul), a autoridade provincial paranaense era completamente ausente nas demais regiões – Norte, Oeste e Sudoeste.

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    Com essa preocupação, o presidente (governador) Zacarias Vasconcelos elaborou um plano de ocupação do interior. Para isso teria que criar condições para tornar mais consistente a atração de estrangeiros à Província.

    Essa meta levou a uma lei provincial, datada de 21 de março de 1854, autorizando o governo do Paraná a promover a atração de estrangeiros ao interior e fornecer apoio à formação de colônias agrícolas.

    Para as autoridades imperiais e provinciais, a tarefa que se apresentava era patrocinar a ocupação dos espaços vazios, promovendo a propaganda das terras paranaenses na Europa, de modo a atrair braços para a agricultura, que, até então, era tarefa ancestralmente praticada pelos índios e na região colonizada se reservava unicamente aos escravos.

    Mas os escravos haviam sido arrematados pelos cafeicultores paulistas, a bom preço, quando o tráfico escravocrata foi proibido por pressão britânica.

    O Paraná, com uma população crescentemente branca e avessa ao trabalho no campo, precisava atrair gente para ocupar as terras mais generosas do mundo e fazê-las, finalmente, produzir.

    Primeiras escaramuças do Contestado

    Logo no início da governança provincial paranaense, em 1854, começaram a se destacar as divergências com Santa Catarina quanto à extensão territorial do Paraná. E havia ainda o problema da reivindicação argentina sobre a porção Oeste de Santa Catarina e Sudoeste do atual Paraná – região que seria conhecida como Contestado.

    Por conta disso, o Exército iria fundar colônias militares, das quais um protótipo foi a Colônia Militar de Jataí, nos arredores de São Pedro de Alcântara e São Jerônimo da Serra, junto ao Rio Tibagi.

    Ocupar o amplo território do Paraná e garantir a autoridade provincial sobre ele era essencial para construir uma estrutura agrícola.

    Havia um surto de criminalidade na região, cuja causa era justamente a falta de interesse pela agricultura. Um juiz da Vila de Castro atribuiu as ocorrências violentas à desocupação proveniente da inexistência de empregos industriais, devido à predominância da criação de animais e aos negócios com o mate.

    Era mais fácil roubar gado que tratar de lavouras, como faziam os índios. Para o senso comum, não havia o propósito de alternar a criação de gado ou a indústria ervateira com o trabalho agrícola. Caberia ao governo preencher essa lacuna com incentivos.

    Rohan precursor de Rondon

    Primeiro governante paranaense, o baiano Zacarias Vasconcellos deixa o Paraná no início de maio de 1855, substituído em julho desse ano pelo paulista Teófilo Vitório Ribeiro de Rezende (1815–1884).

    Mais tarde, Zacarias governaria o Brasil duas vezes. Na primeira vez, por apenas uma semana (1864) e depois por dois anos (1866–1868), em tentativa de unir conservadores e liberais na mesma gestão para romper os prejuízos da polarização.

    Com Zacarias fora, o Império evitou entregar o governo local a um líder nascido na região porque líder local também significa oposição local.

    O próximo dirigente provincial, Henrique Beaurepaire Rohan (1812–1894), que assumiu em 27 de julho de 1855, era fluminense, filho do nobre português Jacques Antonio Marcos de Beaurepaire, o Conde de Beaurepaire.

    Ainda antes de Cândido Rondon (1865–1958), Rohan foi um defensor dos povos indígenas. Pode também ser considerado um dos precursores da expansão das etnias europeias na formação demográfica do Paraná, na medida em que foi um entusiasta da atração aos imigrantes.

    “É meu sentimento, senhores, que a Província do Paraná, nos seus ensaios de colonização (…), crie um estabelecimento agrícola, onde se admitam os estrangeiros e nacionais, que se quiserem sujeitar ao trabalho de parceria, mediante um contrato, pelo qual se obriguem a servir até haverem satisfeito seus empenhos” (Rohan, relatório ao parlamento provincial, março de 1856).

    Vários governantes, poucos resultados 

    José Antônio Vaz de Carvalhaes (1823–1888) assume o governo do Paraná em setembro de 1856. Paulista de Santos, teve como grande destaque da gestão a entrega da Biblioteca Pública do Paraná, em março de 1857.

    Quando se proclamou a Republica Juliana (ou Catarinense), em julho de 1857, ficou mais uma vez evidenciada a importância estratégica do Paraná.

    Afirmando-se um “Estado livre independente”, aliado à “República Rio-grandense de Piratini”, a República Juliana foi um sinal de alerta para a necessidade de fortalecer o Paraná no contexto geopolítico imperial para resistir aos ataques que viriam do Sul.

    Um ano de grave crise inflacionária e febre especulativa, 1857 findou, para os paranaenses, também com o término do governo Carvalhaes, em novembro, com a posse do soteropolitano Francisco Liberato de Matos (1813–1892). Mais um baiano ia dirigir o Paraná.

    Índios ou argentinos?

    A tentativa de ocupar produtivamente o território paranaense se abriria então em duas frentes na segunda metade do século XIX: a iniciativa privada, que dependia do interesse de empresas nacionais e estrangeiras, e a pública, ainda muito limitada.

    No final de 1859 haveria uma orientação mais segura para esse processo. O decreto imperial 2.502 determinava a criação de duas colônias militares para futura instalação no território do Paraná:

    “Estas colônias são destinadas à defesa da fronteira, à proteção dos habitantes dos Campos de Palma(s), Erê, Xagu e Guarapuava, contra a incursão dos índios, com o auxílio da catequese à civilização”.

    Nas entrelinhas, porém, parecia claro que a iniciativa pretendia resolver pela ocupação territorial a questão de limites com a Argentina.

    Não era exatamente fruto da alegada ameaça indígena, embora ainda houvesse alguns índios hostis, porque para isso havia aldeamentos como os de Palmas e Xagu.  ]

    Não por outro motivo Leônidas Boutin, no livro Colônias Militares na Província do Paraná, conta que o governo argentino reagiu à medida reclamando o adiamento da instalação das duas colônias até que o litígio fosse resolvido no foro internacional.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Genocídio reconhecido por São Paulo

    Genocídio reconhecido por São Paulo

    O governo provincial paulista fez um relatório deprimente da situação dos índios em 1852, um ano antes da criação oficial do Paraná. 

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    Reconhecia as dificuldades dos nativos no Oeste dos atuais Paraná e Santa Catarina como resultantes da “malfadada história das povoações de Palmas e Guarapuava, que foram sucessivamente arruinadas e abolidas depois que os índios que as habitam foram assassinados e despojados das terras que lhes haviam sido concedidas” (John Hemming, Fronteira Amazônica).

    Segundo Hemming, o governo imperial “planejou recriar estabelecimentos indígenas ao longo do Rio Iguaçu – rota estratégica para uma nova estrada do Paraná às províncias missionárias da Argentina e Paraguai –, mas não houve como persuadir os Caingangues”, desconfiados de mais violências e traições.

    São Paulo admitiu “a história ominosa dos aldeamentos” no interior do atual Paraná, “que se dissolveram e extinguiram sucessivamente em razão de terem sido os índios a eles pertencentes barbaramente trucidados e espoliados das terras que por sesmaria lhes foram doadas em Guarapuava”. 

    Diante de tanta opressão, ficava difícil afastar “a desconfiança de que os índios daquelas paragens estão dominados em razão dos fatos que ali ocorreram”.

    O que deu errado?

    O governo paulista manifestou a necessidade de promover “um grande empenho” no aldeamento em Palmas para reconquistar a confiança dos indígenas. 

    Os motivos da desconfiança, depois de massacres, expulsões, promessas não cumpridas e maus tratos, ficam bem claros pelos resultados negativos da política original de catequese desvirtuada pelo aldeamento forçado via coerção militar.

    Objetivamente, a situação era cômoda para as autoridades: alegavam que tinham soluções, mas os índios as recusavam por medo de mais massacres e nada era feito.

    Além disso, a tramitação do projeto de criação da Província do Paraná isentava os chefes paulistas de providências quanto à situação social dos povos originais: que as autoridades da nova unidade do Império tomassem as providências necessárias.

    A grandeza de Cruz Machado

    Antônio Cândido da Cruz Machado (1820–1905), professor e deputado-geral por Minas Gerais, fez uma defesa apaixonada do projeto de criar a futura província, prevista para receber o nome de “Coritiba”, por fim designada pelo nome do Marquês do Paraná, o grande líder brasileiro da época.

    Machado justificou a criação da Província pela necessidade de administrar melhor o território devido à permanência de relações ainda tensas com os demais países do Cone Sul.  

    “Trata-se de criar um centro administrativo que possa trazer em resultado fortificações e povoações nas nossas fronteiras”, sustentava Machado, “antes que, algum tempo adiante, sejamos apanhados desprevenidos, ou antes que apareçam conflitos a respeito do nosso território”.

    Cruz Machado ganhou do Paraná que ajudou a criar a homenagem no nome de uma cidade e ficaria célebre por presidir a sessão do Senado que aprovou a abolição da escravatura. Ao governar a Bahia, em 1873, construiu o Elevador Lacerda.

    Quadro geral da geopolítica

    “A Argentina ainda impedia o acesso brasileiro ao Rio Paraná e seus afluentes pelo Rio da Prata. Para complicar, havia ainda as pressões das potências da época pela navegação interior nos rios da Prata e Paraná, o que não interessava ao Império em vista da existência de campos despovoados nas regiões entre Curitiba e Rio Paraná” (Antenor Luiz Bósio, Contribuições para a história legislativa da criação da Província do Paraná).

    Tudo indicava mais atrasos. O ano de 1852 foi agitado no mundo, começando pela França, onde em dezembro do ano anterior Luís Bonaparte desfechou um golpe com o apoio da burguesia, dissolvendo o parlamento e se coroando imperador Napoleão III.

    Em 4 de março, o Paraguai celebrava com os EUA um tratado de “amizade, comércio e navegação”, aumentando a intensa pressão americana sobre o Brasil para ceder nossos rios à livre navegação. 

    Como o Brasil não povoou as terras próximas às margens do Rio Paraná, temia que a abertura à navegação dos rios favorecesse sua ocupação por estrangeiros, com risco de contestação, mais tarde, do domínio brasileiro sobre esses territórios.

    Paraná, nova estrela na bandeira

    Finda a longa batalha travada com os paulistas, a Província do Paraná foi finalmente instalada em 19 de dezembro de 1853 para ser governada pelo baiano Zacarias de Góes e Vasconcellos (1815–1877), ex-ministro da Marinha.

    A essa altura, argentinos e paraguaios já dominavam o Oeste paranaense, então inacessível às autoridades provinciais. 

    Quem quisesse sair de Curitiba em direção ao Rio Paraná teria que dar uma volta enorme: de Paranaguá seguia a Montevidéu, com escalas em Buenos Aires, Rosário, Corrientes e Posadas, daí até o chamado “Alto Paraná”.

    O primeiro ano de governo foi desafiador. A agricultura era precaríssima. Mesmo havendo um prazo para a regularização da posse das terras incultas, ou seja, ainda sem produção, o presidente (governador) Zacarias mostrava decepção por haver “encontrado confuso e desordenado o estado de propriedade territorial, frequentes os conflitos pelas questões de posses” (Ana Yara Dania Paulino Lopes, Pioneiros do Capital: A Colonização do Norte Novo do Paraná). 

    Síndrome da herança maldita

    A confusão e a desordem começaram em 1850, com a lei 60l, quando o Império impôs normas severas para a utilização das terras devolutas e estabelecia uma zona de exceção no limite de dez léguas nas áreas (faixas) de fronteira.

    Ficou estabelecido que a aquisição de terras não se faria mais por ocupação, apenas com a compra. Enquanto os EUA facilitavam a ocupação de suas terras a Oeste, o Brasil impedia legalmente os escravos, imigrantes e índios de adquirir terras, pois eles não tinham dinheiro. 

    Em sua regulamentação, a lei dispôs que “dentro da zona de dez léguas contíguas aos limites do Império com países estrangeiros e em terras devolutas, que o governo pretende povoar, estabelecer-se-ão Colônias Militares” (Decreto 1.318, de 30 de janeiro de 1854).

    Mapas palacianos

    Foi previsto um forte junto à foz do Rio Paraná para bloquear nações estrangeiras que tentassem invadir o território brasileiro, com uma flotilha da Marinha encarregada de “melhor fiscalizar” a região. Por enquanto, só intenções, porque não havia nenhuma fiscalização.

    O governo paranaense quis impor sua autoridade sobre o território ao defender em 1855 que sua jurisdição se estendia por todo o planalto meridional, o que significa dizer que abrangia grande parte do atual Estado de Santa Catarina.

    Lidar com mapas sobre uma mesa de palácio era fácil. Difícil seria seguir até as barrancas do Rio Paraná, onde interesses britânicos e argentinos prevaleciam.

    CLIQUE AQUI e veja episódios anteriores sobre A Grande História do Oeste, narrados pelo jornalista e escritor Alceu Sperança.

    Governar o Paraná foi um presente de casamento ao baiano Zacarias Vasconcellos, nomeado em plena lua de mel com Ana Carolina

     

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Intervenção militar foi um sucesso

    Intervenção militar foi um sucesso

    Adiando mais uma vez as ações para a ocupação do Oeste paranaense, toda a energia do Império se concentrou no Sul. Com seus interesses na região contrariados com a eleição do blanco Manuel Oribe no Uruguai, aliado ao argentino Rosas, o Brasil articulou rapidamente uma intervenção militar na região. 

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    Aliou-se a Frutuoso Rivera (Partido Colorado) no Uruguai para derrotar Oribe e ao general argentino Justo José de Urquiza, governador de Entre-Rios, para derrotar Rosas.

    Foi celebrado em maio de 1851 um acordo entre o Império brasileiro e Justo Urquiza, que se revoltou à frente de “um exército de cerca de 20 mil homens e recebeu a ajuda de um corpo de exército brasileiro, 4.000 soldados de elite, sob o comando do general Manoel Marques de Souza [depois Conde de Porto Alegre]” (Pedro Calmon, História da Civilização Brasileira). 

    O entendimento resultou em cinco tratados de limites, comércio, extradição, subsídios e aliança. 

    Apoiando os Colorados no Uruguai, o Império do Brasil contribui assim para a derrota dos Blancos de Manuel Oribe, em outubro de 1851. Garantido o controle do Uruguai pelos Colorados, o combate às tropas rosistas ficava facilitado.

    A organização do Exército brasileiro para a campanha foi confiada a Luís Alves de Lima e Silva (Conde de Caxias), mas a força militar ainda era escassa. A deficiência de soldados no conflito no Prata apresentaria reflexos posteriores para o futuro Paraná, por conta da formação heterogênea dos batalhões que seguiriam para o combate. 

    A Tropa Mercenária

    Com fronteiras imensas e em diversos pontos questionadas e sob ataque, o Império recorreu à tática de contratar mercenários para resistir aos avanços guerrilheiros dos vizinhos.

    A Tropa Mercenária, contratada no Norte da Alemanha pelo governo imperial, compunha-se de 1.800 homens, com 80 oficiais, um batalhão de infantaria com seis companhias, um grupo de artilharia com quatro baterias e duas companhias de sapadores. 

    Os militares recrutados na Alemanha eram chamados de brummers (ranzinzas, encrenqueiros) e foram pagos em moedas de cobre de 40 réis (as patacas).

    Quando foram desmobilizados, muitos ficaram sem receber em moedas, completando o soldo com terras, inclusive as ainda ocupadas por índios. Na impossibilidade de vendê-las, as terras foram cultivadas e os índios afastados pela força das armas.

    Nem todos os brummers chegaram realmente a combater, por se mostrar desorganizados e rebeldes (daí o apelido pejorativo), mas vários deles, após terminado o contrato com o Império, ao receber terras como pagamento alternativo frente à escassez das patacas, fixaram-se no Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, contribuindo para a organização e desenvolvimento da economia sulina, sua cultura e tradições.

    Paraná, o cérebro da operação 

    A guerra contra Oribe e Rosas, iniciada efetivamente no Combate de Tonelero, em dezembro de 1851, será também importante para os paranaenses porque na condução política e estratégica de todo o episódio vai subir a estrela de Honório Hermeto Carneiro Leão, que logo iria criar a Província do Paraná com seu título nobiliárquico.

    “Carneiro Leão, que já havia sido signatário, pelo Brasil, das negociações concluídas com o ministro uruguaio Andrés Lamas, tratando de aliança, limites, comércio, navegação e extradição, foi enviado ao Rio da Prata, em missão especial, junto aos governos do Uruguai e Paraguai, e das províncias argentinas de Corrientes e Entre-Rios, então rebeladas contra Rosas” (Hélio Vianna, na obra Honório Hermeto Carneiro Leão, Visconde e Marquês do Paraná, da Maioridade à Conciliação [1840-1853]).

    O deslocamento até Buenos Aires começou em 5 de janeiro de 1852. As forças rosistas instalaram-se defensivamente na chamada cañada de Morón, antigo cemitério. 

    Em 27 de janeiro, Rosas seguiu para o acampamento em Monte Caseros e em 2 de fevereiro o Grande Exército Aliado (Uruguai, Brasil, Entre-Rios e Corrientes)  chegou ao arroio Morón.

    A batalha de Monte Caseros (ou dos Santos) foi decisiva, assinalando a vitória das forças aliadas.

    Paulistas esvaziam o Paraná 

    A economia regional se limitava “preferencialmente à extração da erva-mate e ao criatório nos Campos Gerais, Guarapuava e Palmas” (Ruy Christovam Wachowicz, História do Paraná). 

    Um dos fatores que dificultaram a formação do Paraná foi o aumento da aquisição de escravos por parte dos cafeicultores paulistas. Arrematando a mão de obra cativa do futuro Paraná, deixaram a região com pouquíssimos trabalhadores no campo.

    Para o cafeicultor paulista, ter muitos escravos significava mais lucros. Como já dissera Pero de Magalhães Gandavo, “a primeira cousa que pretendem alcançar, são escravos para lhes fazerem e granjearem suas roças e fazendas, porque sem eles não se podem [se] sustentar na terra” (História da província de Santa Cruz).

    A Inglaterra, potência hegemônica na época, já não permitia mais “importar” escravos e o Brasil se viu forçado a adotar a severa Lei Eusébio de Queiroz, restritiva ao tráfico, embora mantivesse intocada a escravidão, cerne do modelo econômico imperial. Com isso, os cafeicultores teriam que adquirir escravos no mercado interno.

    Custo de vida disparou

    Já com a população mais branca do País, a região se dedicava ao mate e ao gado. Para seus fazendeiros, criar animais bastava como fonte de renda. As tarefas antes reservadas aos escravos eram evitadas, tidas como “indignas”. 

    “O preço do escravo, depois da extinção do tráfico – com fidelidade, proibição de importar e não de negociar –, dobrou, suprido o fechamento da fonte africana pela migração do norte ao sul” (Raymundo Faoro, Os Donos do Poder).

    A partir de 1852, os preços dos alimentos chegaram a subir 200%. A Câmara de Curitiba não tardou a manifestar preocupação com o alto custo de vida e a fome nos bolsões de pobreza.

    Eram os primeiros efeitos palpáveis da concentração fundiária facilitada pela famigerada Lei de Terras de 1850. Os vereadores curitibanos preferiram pôr a culpa no povo, criticando “o desprezo manifestado pelo brasileiro, e paranaense em particular, ao trabalho agrícola”.

    “Trabalhar no cabo da enxada era considerado uma atividade de baixo status social, digna apenas de escravos e libertos. O homem comum estava cheio de preconceitos com relação ao trabalho agrícola. Preferia ser peão de tropa, cavalgar à procura de reses nos Campos Gerais ou colher erva-mate a dedicar-se ao serviço da agricultura” (Ruy Christovam Wachowicz).

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    General Osório e o exército imperial brasileiro marcham em Buenos Aires, após a vitória

    Fonte: Fonte não encontrada

  • A lei que configurou a exclusão e o atraso

    A lei que configurou a exclusão e o atraso

    Desde o início do tropeirismo e já como herança dos tempos de mineração, a produção agrícola era considerada uma tarefa inferior, reservada aos escravos e índios. A riqueza, o poder e a respeitabilidade estavam nas fazendas de gado.

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    Em seguida, com o avanço das exportações de erva-mate, o poder e a riqueza se dividiram entre as fazendas e os engenhos. 

    No final da década de 1840, favorecendo a concentração da terra, a força do mate na economia regional asfixiou a precária agricultura de subsistência existente, levando as autoridades a temer um colapso no sistema de abastecimento.

    As facilidades para colher e preparar a erva com pouca mão de obra e sobretudo obter ótima renda com a exportação eram muito compensadoras frente às dificuldades para a produção e venda de cereais. 

    Com isso a cultura do trigo, crescente nos campos do Paraná desde o século XVIII, deixou de ser tradição aqui. 

    “O trigo foi obstruído e estrangulado duplamente, primeiro pelos fenômenos climáticos e depois pelo bloqueio da erva-mate paraguaia e o boom na procura da erva-mate brasileira no mercado externo” (Projeto Livrai-Nos!, Paraná, Tempo de Formação).

    Terras, só comprando

    Pedro II, “por Graça de Deus e Unânime Aclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil”, fazia saber aos súditos, em 18 de setembro de 1850, que o Império passava a ter normas severas para o uso das terras devolutas: 

    “Art. 1º – Ficam proibidas as aquisições de terras devolutas por outro título que não seja o de compra. Excetuam-se as terras situadas nos limites do império com países estrangeiros em uma zona de 10 léguas, as quais poderão ser concedidas gratuitamente”.

    O preço da gratuidade era enfrentar os ataques de guerrilheiros platinos e a presença de índios resistentes ao aldeamento, situação que não interessava às famílias de colonos.  

    Só na segunda década do século XX, após a conclusão da precaríssima Estrada Estratégica, os colonos começaram a se interessar por tomar posse de terras no Oeste paranaense, pressionados pelo minifúndio no Sul e estimulados pelo governo estadual.

    O direito à posse

    Em seu aspecto positivo, a Lei de Terras, ao fixar as regras restritivas aos ex-escravos e aos imigrantes pobres, abriu a perspectiva de colonização das terras devolutas mediante a posse.

    O problema estava em sair com a família pela mata desconhecido, sem meios para provisões, armas e pessoal, inexistência de estradas e nenhum apoio militar para enfrentar os índios e castelhanos que aparecessem no caminho.

    “Esse conjunto de leis (…) abriam o espaço necessário para o advento do que se entende como a grande migração, onde colônias de estrangeiros, como alemãs e italianas, principalmente, vão proliferar na ocupação das terras ditas devolutas, previstas na Lei de Terras” (Almir Antonio de Souza, Armas, Pólvora e Chumbo).

    A lei 601 fundava um novo Brasil. Nele, as oportunidades favoreciam quem tinha poder político e o controle dos cartórios. 

    As terras desocupadas não seriam cedidas aos escravos, mas griladas pelos interesses mais poderosos existentes no interior e vendidas aos imigrantes que escapassem das tramoias criadas para enchê-los de dívidas. 

    A necessidade de apoio militar

    O debate sobre a necessidade de fortalecer as imensas fronteiras evoluiu na metade do século XIX para a compreensão da importância estratégica do território paranaense, então a porção Sul da Província de São Paulo. 

    Para animar os aventureiros, a regulamentação da lei 601, em 30 de janeiro de 1854, dispôs que “dentro da zona de dez léguas contíguas aos limites do império com países estrangeiros e em terras devolutas, que o governo pretende povoar, estabelecer-se-ão Colônias Militares”.

    É a origem de Foz do Iguaçu, dando sequência a uma proposta apresentada pelo Visconde de Itaboraí em 1843, em sua justificativa para apoiar a criação do Paraná, sempre impedida pelas autoridades paulistas.

    Reforçar a região era uma necessidade por conta dos riscos de desequilíbrio na região do Prata.

    Foi também um período de intensificação das pressões para expulsar os índios das terras em que viviam, tendo como pano de fundo a substituição da mão de obra escrava e o estímulo à imigração europeia ao Brasil.

    Urgência não evitou demora 

    Preparando-se para a imigração, o Barão de Antonina – João da Silva Machado – defendeu um projeto de pacificação dos índios via aldeamento e catequese, a formação de estruturas militares no interior para assegurar as conquistas territoriais e a apropriação de terras também cobiçadas por interesses estrangeiros.

    No quadro de conflitos fronteiriços com países vizinhos e interesses imperialistas da Inglaterra mirando o Oeste do atual Paraná, impôs-se a política de povoamento segundo o padrão idealizado por Machado: em 2 de janeiro de 1851 o imperador Pedro II assinava o decreto 751, criando a Colônia Militar de Jataí, porto do arroio do mesmo nome em sua confluência com o Rio Tibagi.

    A crescente instabilidade na região do Prata  foi a principal motivação para concretizar o projeto do Visconde de Itaboraí (1843), que defendia a emancipação do Paraná com instalações militares para proteção territorial e apoio à colonização. No entanto. mesmo com tanta urgência, Foz do Iguaçu só viria quase 40 anos depois.

    Oribe e Rosas

    A longa demora se explica pelos acontecimentos no Sul. Na Argentina, Juan Manuel Rosas buscava a hegemonia para consolidar a federação das Províncias Unidas, cuja administração ficaria em Buenos Aires. 

    Manuel Oribe, em Montevidéu, do Partido Blanco uruguaio, passa a ser seu aliado e esse arranjo preocupou o Império do Brasil.

    Juan Manuel Rosas “não escondia seu desejo de submeter o Uruguai e o Paraguai, numa tentativa desesperada de reconstituir o antigo Vice-Reinado do Prata” (Hélio Vianna, na obra Honório Hermeto Carneiro Leão, Visconde e Marquês do Paraná, da Maioridade à Conciliação [1840-1853]).

    Se consolidasse seu poder, Rosas passaria a controlar as duas margens do Rio da Prata. O Império decidiu intervir militarmente em Montevidéu porque importantes famílias da elite rio-grandense tiveram estabelecimentos atacados no Uruguai.

    Mais uma vez o desequilíbrio geopolítico no Sul tirava o Paraná das prioridades imperiais.

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    A Colônia Militar do Jataí foi criada junto ao aldeamento de São Pedro de Alcântara, idealizado pelo Barão de Antonina

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Terras do Paraná não prestam, insinua líder mineiro

    Terras do Paraná não prestam, insinua líder mineiro

    Comandando um projeto de desbravamento e posse de terras entre o Paraná e Mato Grosso, João da Silva Machado, o Barão de Antonina, tinha duas preocupações: domar os índios rebeldes, criando instalações adequadas para convivência e catequese; depois, resistir aos interesses militares expansionistas da Argentina.

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     Em ofício ao governo provincial paulista em 23 de outubro de 1849, Machado chama a atenção para a facilidade que seu caminho aberto ao Mato Grosso traria para a estrutura defensiva, “aplanando dificuldades (…) ao governo quando tiver de fornecer trem bélico para fazer respeitar a extensa fronteira limítrofe com diversos estados da América Espanhola” (Luiz Adriano Gonçalves Borges, O Barão Bandeirante).

    No ano seguinte, sob a ameaça expansionista de Oribe e Rosas, o assunto seria considerado seriamente pelo Império. A preocupação com Paraguai e Argentina crescia porque o Paraná em vias de criação teria fronteiras despovoadas.

    Razões estratégicas

    Crescia o apoio à tese de que a autonomia estimulava os povos das regiões de fronteira a se estruturar para rechaçar qualquer invasão estrangeira. 

    “Essa nova política possibilitou a criação da Província do Amazonas, trazendo, novamente, à tona, a questão da emancipação da 5ª Comarca de São Paulo” (Angelo Priori, Luciana Regina Pomari, Silvia Maria Amâncio e Veronica Karina Ipólito, A emancipação política do Paraná).

    “Como decorrência da exploração dessa vasta área ocidental do Paraná e do conhecimento das dificuldades regionais para transformá-la em caminho trivial de passagem rumo ao Rio Paraná (que consistia de ponto de conexão fluvial com o Mato Grosso, Oeste de São Paulo, Paraguai e Argentina) é que iniciou-se o estabelecimento da colonização do Oeste do Estado (Fernando Costa Straube e Pedro Scherer-Neto, História da Ornitologia no Paraná, citando Francisco Ribeiro de Azevedo Macedo [Conquista pacífica de Guarapuava]).

    Avança a luta pelo Paraná 

    Cartas na mesa, o ano de 1850 começa com uma nova e renhida batalha entre adeptos e inimigos da criação do Paraná autônomo. Antes favorável aos líderes paulistas, que não aceitavam perder uma parte importante de seu território, a conjuntura agora vai fragilizar seus argumentos e colocá-los na defensiva. Para aceitar a perda, SP queria o Sul de Minas Gerais para compensar a perda de território. 

    Atuaram no Senado pela aprovação do Paraná independente o senador Cândido Baptista de Oliveira, o mineiro Honório Hermeto Carneiro Leão e o Visconde de Abrantes (Miguel Calmon Du Pin e Almeida [1794–1865]). Baiano, diplomata, Miguel Calmon também foi ministro da Fazenda. No Senado, como Cândido Baptista, representava o Ceará.

    Contra a emenda, empenhou-se o senador Nicolau de Campos Vergueiro, português, fazendeiro e representante de Minas, apoiado por Francisco de Paula Souza e Mello (1791–1854), de São Paulo, e Antonio Francisco Hollanda Cavalcanti (1797–1863), de Pernambuco.

    Agricultura era precária

    Carneiro Leão, futuro Marquês do Paraná, sugeria razões estratégicas para a emancipação: “Não seria político discutir todas as razões de defesa externa a que é favorável a criação da Província de Curitiba […] todos nós sabemos que na Comarca de Curitiba limita o Império com a República do Paraguai, e porventura com a Confederação Argentina”. 

    Não era possível a comunicação com o Paraguai, embora limítrofe, pelo Mato Grosso nem pela Província de São Paulo, “porque nesses pontos o deserto nos separa; pelo Rio da Prata, o governo da Confederação Argentina nos proíbe a comunicação”. A solução estava no Oeste do futuro Paraná.

    Nicolau Vergueiro, o primeiro a explorar sem piedade os imigrantes, pôs dúvida até a qualidade das terras paranaenses: “O lavrador por onde conhece a fertilidade do terreno inculto é pelas madeiras; ora, sendo a Curitiba coberta de pinhais e de erva-mate, é claro que não são boas as terras”.

    Para ele, a inexistência de uma agricultura desenvolvida na região era a prova de terras ruins. “Como é pois que uma população em tanto atraso se pode julgar em estado de formar uma Província?”

    Na verdade, a agricultura não se desenvolvia porque os criadores de gado julgavam a atividade inferior, cabível só a índios e escravos, que os paulistas levavam para suas fazendas. 

    Caiar (embranquecer) a população 

    Com a proibição de comprar mais escravos africanos, a mão de obra disponível sofreu valorização porque os fazendeiros de café de São Paulo começaram a comprar escravos nas províncias vizinhas: Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Paraná, já quase sem mão de obra.

    “Esses escravos, encaminhados para São Paulo, eram retirados principalmente de atividades agrícolas de subsistência. Como resultado, na década de 1850 começou a decair a produção de alimentos: feijão, milho, farinha de mandioca etc. Ocorreu então um período de grande aumento de custo de vida: era a primeira grande inflação da história brasileira. Na época, o fenômeno era chamado de carestia” (Ruy Christovam Wachowicz, História do Paraná).

    “Tornou-se então o escravo muito caro para ser adquirido pelos proprietários de terras”, prossegue Wachowicz, fazendo necessário substituir essa mão-de-obra com vantagens. 

    “Por outro lado, as elites diretivas do Brasil pensavam numa forma de impedir que o país se tomasse a maior nação negra do planeta, tamanho era o número de africanos trazidos ao Brasil desde o século XVI. Era o problema do caiamento da população”. 

    Reorientação do capital

    O interesse das elites brasileiras era um país de população branca, mimetizando a origem europeia da colonização. Pretendiam o país majoritariamente branco e não africano. “Dentro dessa conjuntura, resolveu o governo imperial acelerar a imigração europeia para o país” (Wachowicz).

    Sem poder comprar escravos legalmente, os capitalistas precisavam reorientar seus investimentos: “A liberação de capitais resultante do fim da importação de escravos deu origem a uma intensa atividade de negócios e de especulação para as condições da época. Surgiram bancos, indústrias, empresas de navegação a vapor etc” (Bóris Fausto, História Concisa do Brasil).

    A Lei Eusébio de Queiroz deu corpo a essa nova realidade, proibindo o tráfico intercontinental em 4 de setembro de 1850, mês e ano em que também seria promulgada a Lei de Terras, engendrada para proteger os latifundiários das iniciativas de índios, ex-escravos e imigrantes de desenvolver projetos independentes do controle imperial.

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    Senador Cândido Baptista: amigo do Paraná e professor da princesa Isabel

     

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Milagreiro santificado e política demonizada

    Milagreiro santificado e política demonizada

    Vindo para a América em 1838, depois de passagens pelos EUA e México o andarilho italiano Giovanni Maria de Agostini (conhecido no Brasil como João Maria de Agostini e João Maria de Jesus) tentou se radicar na Venezuela, onde recebeu apoio das autoridades para fazer pregação religiosa e trabalhar com objetos sacros. 

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    No entanto, fez uma pregação contrária aos interesses das autoridades e fugiu para os Andes. Partindo para a Argentina, onde Rosas o aceitou para catequizar os índios Charruas, também não cumpriu o acordo e foi preso. 

    A repressão ao italiano teve como único resultado criar para o monge rebelde a fama de “santo”. Há relatos de que ele passou pelo Brasil a partir de 1843, mas transitou depois por outras nações sul-americanas até junho de 1849, quando foi notificada sua chegada ao Porto de Santos.

    Em suas andanças, escapou dos conflitos armados e viu o final da década de 1840 marcado por uma epidemia de febre amarela.

    Guerra e varíola 

    O monge D’Agostini, por onde passava, dizia ter vindo para curar. Na peregrinação rumo ao Paraná ele se propôs trazer a cura a um país doente.

    Sua fama de “santo” se espalhava entre os caboclos sofridos do interior. Os locais em que repousou – ele preferia grutas, cavernas ou o alto de montes – também foram considerados lugares santificados.

    “Nas grutas ou cavernas, a pedra onde descansava transmutava-se em pedra santa; dentro das grutas, quase sempre, brotavam fontes de água límpida que eram usadas pelo eremita para saciar sua sede; para o povo devoto, a fonte cristalina transformava-se em água milagrosa que a tudo curava” (Alexandre de Oliveira Karsburg, O peregrino que foi eremita, missionário, artesão e curandeiro).

    Quando o monge João Maria chega a Mafra, então parte de Rio Negro, em 1851, encontra uma população sofrida com a Guerra dos Farrapos e dizimada por uma epidemia de varíola.

    Cruzes pela prosperidade 

    Para trazer a prosperidade, o monge recomendou que 19 (para alguns, 14) cruzes fossem erguidas entre a capela e a ponte. Nas ofensivas revolucionárias, as tropas vindas do Sul derrubaram várias cruzes, mas foi mantida a de 30 de junho de 1851 para representar “a fé do catolicismo rústico do homem simples” (Prefeitura Municipal de Mafra, Histórico).

    Ironicamente, a manutenção da pobreza engendrada pela lei agrária de 1850 facilitou a pregação do monge Agostini.

    Ao sugerir a possibilidade de conquistar um país mais justo pela fé e com luta, passou a ser perseguido pelo ministro Eusébio de Queiroz, da Justiça, dando assim origem ao fanatismo dos sertanejos e à arrogância político-militar que levaram à tragédia do Contestado.

    Prioridade: trazer imigrantes

    No fim da década de 1840 havia grande esperança na atração de imigrantes para povoar os imensos campos do futuro Paraná. Em outubro de 1848 o Império determinou alterações decisivas na política de imigração, criada para substituir o comércio escravagista e levar os estrangeiros aos locais mais necessitados de mão de obra.

    A lei nº 514 dispunha sobre as condições requeridas para a colonização em terras devolutas, designação dada às áreas públicas desabitadas e tratava de outra questão importante para a região: o aproveitamento dos recursos hidroviários. 

    “(…) as províncias do Império receberam concessão, em diferentes lugares de seus territórios, de seis léguas de quadras de terras devolutas que se deveriam ser destinadas à colonização e não poderiam ser roteadas (aradas, cultivadas, tratadas) por braços escravos” (Edrielton dos Santos Garcia, Colonização em Assunguy: A Experiência do Colono Nacional entre 1860 e 1870).

    Excesso de restrições

    As terras concedidas pelo governo não poderiam ser transferidas pelos colonos enquanto não comprovassem aproveitamento efetivo e cultivo regular pelo prazo de cinco anos. Se não houvesse interesse pela ocupação, exefcifa pela exploração do solo com finalidades produtivas, as terras retornariam ao domínio público.

    A lei criou limitações aos processos de colonização. As expedições para a tomada de posse de terras tiveram prazo mínimo para fazer a ocupação porque em 1850 veio a nova Lei de Terras e a partir dela só se poderia possuir terras legalmente por meio de compra. 

    A manobra evitava que os índios fossem possuidores e imigrantes vindos apenas com a roupa do corpo e vontade de trabalhar adquirissem de imediato posses que os tornassem independentes, sem ter que alugar sua força de trabalho aos fazendeiros. Essa foi uma das causas do atraso brasileiro.   

    A expedição Rohan-Lélis

    Desde as primeiras incursões em busca de ouro até os ciclos tropeiro e ervateiro, os cativos (índios e africanos) foram o motor do enriquecimento regional, que alimentou e reforçou as ideias de emancipar a Comarca de Curitiba do domínio paulista.

    Com o Brasil sob pressão para por fim ao trabalho escravo, a lei orçamentária nacional de 1848 procurou se antecipar à crise de abastecimento que se avizinhava, estimulando as Províncias a promover a imigração.

    Oferecia facilidades para a concessão de terras devolutas e criação de núcleos coloniais. Esse pano de fundo legal deu a base para uma nova aventura em busca de estruturar o Oeste do Paraná para receber seus povoadores.

    Entre o final de 1848 e o início do ano seguinte, o capitão Henrique Beaurepaire Rohan e Camilo Lélis da Silva, segundo tenente da Marinha, abriram uma picada de Guarapuava ao Xagu, onde já havia um aldeamento de “índios mansos”.

    Seguir o Rio Iguaçu 

    A formação da comunidade no Xagu foi um dos passos iniciais para a marcha ao Oeste. Beaurepaire Rohan e Camilo Lélis percorrem cerca de 320 km no sentido Leste-Oeste, seguindo paralelamente ao curso do Rio Iguaçu até os limites a fronteira com a República do Paraguai.

    Ao retornar da extenuante aventura, Lélis da Silva trazia um diário de viagem, que publicou em 1865 na Revista Trimensal do Instituto Histórico Geographico e Ethnographico do Brasil. Acrescentou ao diário uma interessante “Resenha da caça, peixe e abelheiras”. 

    A rota para a conquista do Oeste estava definida: seria acompanhar o Rio Iguaçu rumo à sua foz, no Rio Paraná. 

    No entanto, mais de vinte anos depois da publicação de Lélis da Silva o governo imperial ainda não havia feito nada nesse sentido. Mas argentinos já dominavam a foz do Iguaçu e os portos que eles próprios abriram no Rio Paraná.

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    Rio Xagu, de onde partiram Lélis e Rohan (destaque), que foi governador do Paraná e ministro da Guerra

     

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O crime que deu origem ao extremo-Oeste

    O crime que deu origem ao extremo-Oeste

    Na futura Província do Paraná, o início de 1846 registrava rigores climáticos: o “maior dilúvio desde 1796”, segundo o historiador Antônio Vieira dos Santos. 

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    Com a paz posterior à derrota sem perda total do movimento farroupilha*, os anos correram sem que o Paraná independente acontecesse e nada de novo houve nesse ano e em 1847.

    Entretanto, mudanças por acontecer no exterior vão animar o desenvolvimento capitalista, com reflexos no mundo e também aqui.

    Em 1848, o México, vencido na guerra com os EUA, perde para o vizinho dois milhões de quilômetros quadrados. Quando o vigia de um moinho na Califórnia acha pepitas de ouro às margens de um regato começa a Corrida do Ouro. 

    A descoberta de Sutter’s Mill favorecerá o desenvolvimento industrial, acelerando o enriquecimento dos EUA, ao contrário do ouro brasileiro, dissipado na Europa.

    *No tratado de paz, os rebeldes conseguiram anistia plena

    Mundo em transformação

    No início daquele mesmo ano de 1848 é publicado o Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels, sinalizando para a nova etapa da Revolução Francesa, pela primeira vez sob a direção do proletariado, classe formada pelo desenvolvimento capitalista. 

    As barricadas operárias de Paris serão esmagadas com extrema violência pela tropa do general Cavaignac, com o passivo de dez mil mortes, mas a história segue com uma série de levantes burgueses e populares.

    A Primavera dos Povos varrerá a Europa, estimulando movimentos liberais radicais em outras partes do mundo, como a Revolução Praieira em Pernambuco.

    Como os líderes paranaenses ávidos para se livrar da tutela de São Paulo, ficava a conferir se eles continuariam a mandar ofícios pedindo em vão essa conquista ou também recorreriam às armas. 

    Parlamentarismo contorna revoltas

    Uma sucessão de acontecimentos inclinou os coronéis fazendeiros da região a se alinhar aos liberais moderados e também a negociar com os conservadores depois que Pedro II criou, em julho de 1848, o cargo de presidente do Conselho de Ministros do Império, equivalente ao de chefe de governo.

    As revoluções desencadeadas em 1848 se erguiam contra os regimes monárquicos autocráticos afundados em crises econômicas que recusavam a representação política da classe em ascensão – a burguesia.

    O anseio pela formação de governos constitucionais levou à extinção ou adaptação das monarquias.

    O imperador brasileiro engendrou um parlamentarismo em que o presidente e o corpo de ministros eram definidos pelos resultados das eleições parlamentares. Uma ginástica da monarquia para se adaptar aos novos tempos no mundo.

    Interior do Paraná virou prisão

    Na França, a onda revolucionária burguesa se espalhava pela Europa, alcançando Alemanha, Inglaterra, Áustria, Itália, Polônia, Dinamarca, Hungria, Tchecoslováquia e outras nações. 

    Por sua vez, o Brasil se adapta, mas vai ficando mais conservador à medida que o imperador amadurece.

    Militares eram premiados com amplos latifúndios no interior, em regiões que ocupavam pelo interesse de assegurar a propriedade, mas não tinham interesse em colonizar e com isso as intenções de ocupação no Oeste estacionaram. 

    Se na Califórnia os aventureiros partiam em busca do ouro em clima de liberdade, foi a ausência de liberdade que engendrou no futuro Paraná um tipo especial de pioneiro: os condenados à morte deixados em prisão a céu aberto.

    Legítima defesa ou assassinato?

    Sentenciados à pena máxima em São Paulo tinham eventualmente a pena comutada em degredo nos sertões de Guarapuava, abandonados a esmo nos “Campos de Nerinhê”, local em que no futuro brotaria a Colônia de Marechal Mallet, atual Laranjeiras do Sul.

    A consequência da pena comutada em degredo foi torná-los posseiros de terras muito ricas. 

    Começou quando um tenente paulista em desavença com vizinhos por motivos de divisas de terras aproveitou uma folga no trabalho militar para visitar suas plantações. 

    “Na passagem de uma porteira, duas pessoas lhe armaram uma tocaia com o intuito de matá-lo. Houve luta, e José Nogueira do Amaral matou os dois oponentes” (Nerje, João Olivir Camargo). 

    Pistola para um condenado

    O tenente paulista José Nogueira do Amaral foi condenado à morte pela forca. Benquisto na corporação, teve a pena comutada em degredo no remoto sertão de Guarapuava conhecido pelos índios como Campos de Nerinhê (“o mesmo que nerje, laranja em Caingangue”), junto com outros criminosos. 

    “O alferes José Toledo, como era de praxe, deixou ao condenado uma pedra de sal (uma arroba), um facão, alguns víveres e uma pistola pedreira. Esta pistola foi certamente uma gentileza do alferes Toledo, pois não se costumava deixar armas de fogo com os condenados. A longa viagem da escolta e do condenado, desde São Paulo até a nossa região, fez nascer alguma amizade entre estes homens, e quem sabe, um misto de admiração e de piedade por aquele que seria abandonado em terras tão selvagens e cheias de perigos, principalmente pela presença das hordas de índios” (João Olivir Camargo).

    Castigo virou riqueza

    Outros degredados ficaram nas imediações de Guarapuava, mas Amaral foi abandonado em uma região ainda mais inóspita: a “terra dos índios Dorins rudes e bárbaros”, segundo o padre Francisco das Chagas Lima – os Campos de Nerinhê. 

    Com isso, em dezembro 1848 o infeliz José Nogueira do Amaral passava à história como o primeiro posseiro e fundador de Laranjeiras do Sul. 

    O nome do local vinha da presença no local de laranjas silvestres, que o povo conhece como “laranja azeda”.

    Amaral, portanto, não chegou para obter uma recompensa, ao contrário de outros militares que ganharam latifúndios por ações nos campos de batalha. Ao contrário, ele veio ao futuro Paraná como castigo, para cumprir a pena de prisão em degredo, abandonado para morrer na mata.

    Lendas e tesouros

    Com a sentença à morte transformada em liberdade total na mata, Amaral empregou noções de sobrevivência e evitou o contato com os índios até que em certa ocasião foi atacado, mas resistiu com bravura até ser finalmente aprisionado.

    Teve a vida poupada por se defender sem armas. A família que Amaral viria a chefiar foi constituída na convivência com os índios.

    De sua região, 40 anos depois, partiriam os militares encarregados de conquistar o extremo-Oeste: a região de Cascavel a Foz do Iguaçu.

    Entre os sertanejos, a história de sobrevivência e enriquecimento de Amaral virou lenda. Ao morrer, de velhice, em 1884, correu o comentário de que foi sepultado com uma espada com cabo de ouro e outros objetos valiosos. 

    Seu túmulo foi várias vezes violado por aventureiros crentes de que achariam enterrado ali o tesouro do militar que fez da condenação à morte uma vida de riquezas e lendas. 

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    Campos de Nerinhê assinalados em mapa de 1876

     

    Fonte: Fonte não encontrada

  • A história passa e o Paraná fica para trás

    A história passa e o Paraná fica para trás

    A primeira metade da década de 1840 se caracterizou pela instabilidade governamental, prejudicando a demanda dos lideres de Curitiba, Campos Gerais e litoral pela criação do futuro Paraná, que ninguém imaginava com esse nome. A intenção, na época, era criar a “Província da Coritiba”.

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    Em 1843, João da Silva Machado consolidava seu poder no Império, recebendo o título de Barão de Antonina, projeção que facilitaria o esforço pela criação da nova Província, mas os líderes paulistas fariam tudo para impedir essa conquista – inclusive manobras desonestas.

    Havia uma tendência dos políticos conservadores a aceitar a emancipação do futuro Paraná, mas a polarização entre eles e os liberais paralisava tudo que não fosse passível de consenso, como aconteceu com a rejeitada intenção do imperador de perdoar os rebeldes farroupilhas.

    Em 22 de abril de 1844, Manoel Felizardo de Souza e Mello, conservador e partidário da emancipação, encerrava sua gestão à frente do governo provincial paulista sem avançar um centímetro nesse objetivo.

    Perdoar ou punir os revolucionários?

    Assume o governo paulista o brigadeiro Joaquim José de Moraes e Abreu, para ficar na função apenas até 1º de junho e passar o cargo ao general fluminense Manoel da Fonseca Lima e Silva, o Barão de Suruí (1793–1869). 

    Lima e Silva, tio e também cunhado do Barão, futuro Duque de Caxias, permaneceu três anos no governo, mas também não obteve sucesso em emancipar o Paraná. Pior ainda: autorizou a prática de um crime irreparável contra a memória histórica do futuro Paraná. A pretexto de coletar documentos para preservar e mostrar o potencial da região, o grosso da memória paranaense da época foi levado para São Paulo e lá se perdeu. 

    O Paraná ficou praticamente sem memória anterior aos anos 1840 e a emancipação sofreu muito atraso, até por conta da situação nacional: em 24 de maio de 1844 o jovem imperador Pedro II dissolveu a Assembleia Nacional por decreto porque a maioria dos parlamentares era contra perdoar os revolucionários sulistas e o monarca pretendia aprovar o perdão para pacificar o país. 

    Prioridade ao Sul

    Com o tio governando São Paulo e o sobrinho Caxias controlando São Pedro, como o RS era conhecido na época, as atenções do Império estavam inteiramente voltadas ao Sul, onde os revolucionários republicanos farroupilhas perderam a iniciativa das ações e as tropas imperiais do Barão de Caxias avançavam com firmeza, palmo a palmo. 

    A preocupação do Barão de Suruí era a construção do caminho ligando o centro do atual Paraná ao Norte do Rio Grande do Sul, a cargo de Francisco da Rocha Loures, que partiu de Guarapuava em 4 de março de 1845.

    O capitão Hermógenes Lobo e o cacique Vitorino Condá, já eliminados da colonização de Palmas, seguiam na comitiva. 

    Finda a Revolução Farroupilha com o Tratado de Poncho Verde, em março de 1845, o ano de 1846 foi o mais tranquilo para o Brasil no decorrer de uma década de muita agitação.

    Esperando os imigrantes

    Atanagildo Pinto Martins, tropeiro paranaense que iniciou a conquista do Nordeste gaúcho, era um entusiasmado defensor desse novo caminho, que estrategicamente e em definitivo integraria o Paraná ao RS.

    O caminho, porém, atravessaria regiões completamente despovoadas e sem estrutura. Atrair imigrantes para trabalhar na florescente cultura do café foi a opção que se apresentou com a onda de miséria que varreu a Europa nessa época. 

    O ano de 1845 assinalara o início da Grande Fome na Irlanda, maior catástrofe demográfica que atingiu a Europa entre a Guerra dos Trinta Anos e a Primeira Guerra Mundial.

    O país pacificado permitiu ao Barão de Antonina, João da Silva Machado, promover intensas expedições por desde o Sul até o ainda inexplorado Mato Grosso, expandindo frentes de exploração que consistiam primeiramente em identificar as áreas mais ricas e promissoras para se apossar delas e iniciar projetos de colonização.

    Exploração minuciosa

    No interior, a tarefa era conhecer cada palmo da região para explorar melhor seu potencial. O Barão de Antonina reuniu importantes relatórios para traçar seus planos nesse sentido. 

    Nas anotações dos exploradores constará que o Rio Ivaí é, em geral, “ladeado por terra roxa superior, em muitos lugares desde a barranca vestida de boas madeiras, e própria a qualquer cultura; muito abundante em peixe, caça e frutas (havendo até no inverno jabuticabas maduras)” (Resumo de Viagem, Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil).

    “Salve Ivaí, com as tuas grandes corredeiras, com as tuas selvas majestosas, que, por dezenas de léguas, estão até agora livres de penetração humana! Salve rio de caça e pesca assombrosas, e das imensas riquezas ocultas entre as tuas pedras! Salve, praias alvas e puras; pássaros bonitos e ariranhas ariscas! Salve! Brevemente voltaremos com uma Bandeira ideal, não para estragar as tuas opulências, mas sim para ainda mais admirar o supremo encanto da tua pujante natureza; para desvendar os teus mistérios; para conhecer novas belezas e maravilhas!” (Alcides Laffranchi, Nos Sertões do Rio Paraná – Caçadas, Pescarias e Peripécias nas matas e rios).

    Recompondo informações

    A expedição a serviço de Machado entra no Rio Paraná às 7 horas da manhã de 5 de outubro de 1845 e em dezembro, depois de muitas explorações, encontrará o Barão de Antonina “com um relatório e mapa detalhado de viagem, com tabela de distâncias por terra e por águas” (Ledir Marques Pedrosa, Origem histórica e bravura dos Barbosas).  

    A exploração dos rios Verde, Paranapanema e seus afluentes Tibagi e Pirapó, o Paraná e o Ivaí se encerrou com sucesso, também contando com a colaboração dos irmãos Francisco e Antônio Gonçalves Barbosa, trazendo preciosas informações a respeito do potencial das áreas estudadas.

    O Barão de Antonina contou, portanto, com relatórios e dados fundamentais para traçar seus planos e assim começava a compensar o roubo de documentos informativos cometido por ardilosos políticos paulistas. 

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    Imperador Pedro II tinha 18 anos quando fechou o Congresso, ou seja, dissolveu a Assembleia Nacional

     

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