Autor: Alceu Sperança

  • O policial e o jagunço

    O policial e o jagunço

    Se nos grandes centros urbanos do país as preocupações no início da década de 1950 se concentravam no aumento do custo de vida, que levou a fortes protestos dos trabalhadores, no interior do Paraná persistia a ânsia por melhorar a infraestrutura de transportes.

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    História iniciada quando os exploradores ibéricos aproveitaram o Caminho do Peabiru para se locomover, continuou com os tropeiros abrindo a Estrada de Laguna/Viamão, mais próxima ao litoral, e se interiorizou com a Ferrovia São Paulo–Rio Grande, que deu origem à Guerra do Contestado e aos conflitos de terras no Oeste paranaense. 

    Abrir estradas para escoar a crescente produção agrícola e colonizar o interior de onde os índios foram expulsos ou massacrados eram as tarefas da época no Paraná, mas no Rio de Janeiro estava em discussão o planejamento governamental e, com a contribuição dos geógrafos, a divisão regional do Brasil. 

    São Paulo pertencia ao Sul, mas em breve se destacará para compor a região Sudeste, evitando a pretensão de um novo e poderoso país reunindo SP, PR, SC e RS. 

    Vida ou morte

    O debate sobre a definição de regiões também empolgava os meios acadêmicos paranaenses. “A imprensa, por sua vez, criticava o governo do Paraná, que não encontrava meios de ligar a região Norte à Sul” (Elzio dos Reis Marson, No Limiar do Horizonte).

    Nesse ainda caótico Paraná, que em 1946 recuperou seu Oeste e Sudoeste aliviando o trauma de perder território a SC em 1916, o resgatado Sudoeste sofria a invasão de colonos gaúchos e o Norte araucariano pretendia acompanhar São Paulo como parte da Região Sudeste. 

    Mesmo calado pela pronta ação do governador Munhoz da Rocha em seus primeiros meses de gestão, ainda era forte o projeto de emancipar o Norte do Paraná como novo Estado, facilitando o atrelamento a São Paulo e assim deixar de pertencer à região Sul do Brasil.

    Longe dos meios acadêmicos, na dura realidade das frentes de colonização, obter e manter a posse da terra era uma questão de vida ou morte para os colonos do Centro e Sul do Paraná, filhos de imigrantes europeus, que tentavam vida nova nas frentes de colonização enfrentando as dificuldades da mata e os jagunços.

    Um estimado ex-governador do Paraná – Manoel Ribas – havia prometido terras para quem quisesse trabalhar e o novo governador, Bento Munhoz, reforçou o compromisso de garantir aos posseiros o direito à terra ocupada, mas a prática não seria tão simples.

    Expulsando posseiros e índios

    Atormentado pela pressão paulista e com dificuldades para atender às necessidades do vasto interior onde tudo era necessário, Bento tentou reforçar o apoio do Estado à colonização dando carta branca aos empreendimentos particulares e buscando retomar na Justiça o domínio das terras antes ocupadas pelo Território Federal do Iguaçu.

    No entanto, a Justiça enfrentava dificuldades pela complexidade de interesses envolvidos. Havia uma cascata de ações em curso para definir questões de domínio, titulação legal ou ilegal e posse comprovada ou usurpação. 

    Bento ficou alheio ao fato de que colonizadores gananciosos corrompiam agentes do Estado para apoiar suas milícias particulares – os jagunços, que a polícia qualificava como “guarda-costas” –, para servir ao objetivo de “limpar” as terras do interior de posseiros e índios.  

    Escrivão e eventualmente delegado de polícia em Cascavel no auge dos conflitos, Aparício Lara sintetizou a situação desta forma: “Na região do Piquiri havia muita invasão de terras e as companhias grandes tinham a sua equipe de guarda-costas – os jagunços”.

    Para o povo, jagunço era toda pessoa sem farda que portava armas ostensivamente. Para o governo, os milicianos das colonizadoras eram agentes particulares de segurança, os “guarda-costas”.

    Morte à espreita  

    Relatando os tempos em que foi policial, trabalho iniciado em sua terra natal, Foz do Iguaçu, Aparício Lara lamentou o morticínio pela posse da terra, que quase causou uma vítima inesperada: ele mesmo. 

    Na tentativa de mediar um conflito, ele teria sido assassinado por jagunços se não fosse a interferência de dois amigos, um dos quais o vereador Adelino Cattani, que depois viria a tombar atirado em plena Avenida Brasil em um confronto com o comerciante e ex-delegado de polícia João Miotto, em 1953.

     “Aqui todos conheciam a turma dos jagunços, que eram todos empregados dos fazendeiros e das companhias de terras. As grandes firmas vinham se instalar na região com documentação da terra fornecida pelo governo. Encontravam os pequenos fazendeiros, que usavam a terra e acontecia o conflito. Além disso tinha as titulações que eram dadas a mais de uma pessoa” (Aparício Lara, Prisma Cascavel, 5/8/1994).  

    Em geral os posseiros ameaçados se retiravam de imediato, levando o que podiam carregar, saindo da história tão anônimos quanto entraram, mas não foi o caso da família Lozovey. 

    A família ucraniana

    Ameaçados de perder as terras adquiridas por posse familiar, posteriormente tituladas em favor de terceiros com empresa, influência no governo e na polícia, Lara mencionou os três irmãos Lozovey como um exemplo raro de colonos oprimidos pelos jagunços que se recusaram a sair pacificamente das terras.

    Família paranaense de origem ucraniana, os Lovezoy vieram para o Brasil em 1913, estabelecendo-se como lavradores na região de Irati. Com o crescimento da família, alguns foram se estabelecer no interior de Cascavel.

    A área de posse dos Lozovey era reivindicada pela Companhia Brasileira de Imigração e Colonização (Cobrimco), que desde 1950 vendia propriedades a colonos no interior de Cascavel propagando a perspectiva de riqueza com o café. 

    Paulo Bittencourt, diretor da empresa, anunciava “o ganho de mais de um milhão de cruzeiros do sitiante que em 1951 possuía dez mil pés de café, para apregoar o enriquecimento, em curto prazo, de todos aqueles que se estabelecessem na região para cultivar o café” (Cássia Regina Soares Cardoso, O processo de ocupação do Noroeste paranaense nas décadas de 1950 e 1960).

    Na ponte do Rio dos Porcos

    A Cobrimco por várias vezes teve seu nome ligado a expulsões violentas de posseiros e de índios Xetás, contando com jagunços próprios e o apoio de agentes do governo do Estado.

    Foi esse o pano de fundo da ameaça de expulsão supostamente comunicada pelos jagunços da empresa à família Lozovey. 

    Entrincheirados em uma carroça no acesso à cidade de Corbélia, os Lozovey se prepararam para receber os jagunços, que chegaram em um jipe, reforçados com soldados da Polícia Militar. 

    “Um dos maiores e bárbaros crimes dessa época do domínio da terra, aconteceu no córrego denominado Rio dos Porcos em que uma família inteira foi dizimada […] Muitas histórias foram escritas pela violência das armas e a truculência de assassinos profissionais que recebiam somas em dinheiro para assassinar” (Elcio Zanato, Corbélia de minha Juventude).

    Confissões de João do Norte

    Junto ao Rio dos Porcos, nome que tem origem nas varas de porcos do mato encontradas no local, surgiria uma povoação que para suavizar o nome do lugar teve a denominação alterada para “Pingo de Ouro”, que não pegou. 

    Por imposição da colonizadora, o lugar foi finalmente denominado como Anahy, nome da filha de um gerente da empresa.

    Prometendo resistência, os três irmãos Lozovey, negando-se a entregar a terra, atacaram o jipe que trazia os jagunços. “O combate foi na ponte. Dois Lozovey e um guarda-costas morreram. Um dos irmãos escapou” (Aparício Lara).

    De certa forma, os jagunços, empregados pelas colonizadoras, foram os primeiros trabalhadores rurais, assim considerada a mão de obra assalariada no campo. Nessa época, todo o trabalho nas terras era realizado pelos posseiros e suas famílias. Empregados, de fato, só os “guarda-costas”.

    Os jagunços matavam, mas também eram emboscados e sofriam vinganças. Em raro depoimento, um jagunço que sobreviveu aos conflitos e chegou à velhice, coisa rara no meio em que a morte chegava antes dos 30 anos de idade, João Gonçalves de Oliveira, o João do Norte, funcionário da Colonizadora Norte do Paraná, tinha 69 anos quando contou como se deu sua transformação de simples camponês em jagunço.

    Corpos no Rio Piquiri

    Contratado para abrir estradas na mata por Alípio Lopes e José Nini, administradores da empresa, ao iniciar os trabalhos em campo se deparou com posseiros e voltou para comunicar o obstáculo.

    Foi quando recebeu a proposta de um certo Otaviano, que seria cunhado do colonizador Adízio Figueiredo, para matar os posseiros. “Receberia como pagamento, além do revólver e 10 contos de réis, uma área de 4 alqueires de terra” (Jornal Hoje, 25/8/91).  

    João disse à polícia que recusou a oferta, mas confessou que ajudou a enterrar 18 corpos na Fazenda São Silvestre (na época Fazenda Tapejara), ao lado de uma árvore de jequitibá.

    “Disse também que com esta proposta, deixou de trabalhar para a colonizadora, passando a trabalhar como autônomo para posseiros. Afirma que foi obrigado pelos jagunços da colonizadora a ajudar a enterrar os mortos. E que, mesmo depois de deixar a empresa, pescando no Rio Piquiri, várias vezes deparou com corpos boiando na água”.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • A Guerra das Oito Pontes

    A Guerra das Oito Pontes

    Novos projetos de ocupação no Oeste começam a se desenvolver em 1952, mas já sem a marca pacífica da experiência de colonização desenvolvida pela Companhia Maripá na antiga Fazenda Britânia. 

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    Sem conflitos sangrentos entre jagunços e posseiros, a posse tranquila e a titulação incontestável da propriedade adquirida pela Maripá vieram do código de ética pactuado pelas antigas obrages, dentre elas a anglo-argentina Companhia de Maderas Del Alto Paraná, proprietária da Britânia. 

    Iniciada em 1907, a empresa estabeleceu com as demais obrages que exploravam a erva-mate na região desde o século XIX uma regra que manteve o Médio-Oeste livre de povoados e cidades até a década de 1920.

    Só então a Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco) passou a vender terras no Oeste, provenientes de contratos entre o governo e a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande.

    Filho de Pedro Nuñez, sócio de Lázaro Gibaja, o escritor Júlio Nuñez narra no livro Iviraretá que os governantes argentinos tinham o hábito de repartir as terras entre amigos e partidários sem providenciar a medição.

    Os problemas resultantes desse descuido levaram à proibição de “toda povoação permanente nos ervais, desalojando-se as estabelecidas anteriormente”. Em suma, era proibido ter propriedades particulares e formar povoações em toda a região Oeste.

    Promessas em xeque

    Ironicamente, as terras que não possuíam donos até a queda de braço entre a União e o Estado do Paraná sobre qual ente regularia a ocupação do território, quando passaram a ter até três andares de propriedade em diferentes cartórios: área de domínio da União, com títulos por ela emitidos, a mesma área com títulos autorizados pelo Paraná e posses feitas nos mesmos locais por incentivo do ex-governador Manoel Ribas ou espontaneamente.

    Além da administração dos conflitos entre posseiros vindos de todo o país e jagunços, estes sobretudo a serviço de empresas paulistas, o governo de Bento Munhoz foi atrapalhado pela chamada Guerra das Oito Pontes, com a qual os compromissos assumidos por Bento com o Oeste sofreram atrasos. 

    Sob pressão das lideranças pró-paulistas de Londrina, o governador se obrigou a prometer obras rodoviárias para melhorar os transportes no Norte do Paraná para assim integrar essa região rapidamente ao espírito paranista. 

    A reorientação se deu para reagir ao Departamento de Estradas de Rodagem (DER) de São Paulo, que anunciou bombasticamente a construção de oito pontes, distantes 50 quilômetros uma da outra, sobre o rio Paranapanema. 

    O objetivo do governador paulista, o engenheiro Lucas Garcez, era facilitar o escoamento da produção paranaense de café pelo Porto de Santos. Bento as pretendia para o Porto de Paranaguá, projeto de vida de seu pai, o médico Caetano Munhoz da Rocha (1879–1944), que também governou o Paraná, entre 1920 e 1928.

    Solução federal 

    Nascido em Antonina, os negócios de Caetano Munhoz da Rocha sempre estiveram ligados ao litoral, sobretudo ao ser eleito para a Prefeitura de Paranaguá, que administrou entre 1908 e 1915, quando Bento era menino.

    Na Prefeitura de Paranaguá, Caetano se revelou um magnífico administrador. O historiador Romário Martins escreveu que Paranaguá deve a ele “todo o seu progresso urbanístico”. 

    Acabou com a dívida do Município, drenou e aterrou grande parte da zona baixa da cidade, instalou água encanada, fez a rede de esgotos e instalou a telefonia da cidade. Paranaguá perder para Santos a produção paranaense seria uma derrota para Bento. 

    “É justo que queiramos que o café paranaense se escoe pelo porto de Paranaguá”, afirmou o governador em artigo intitulado O café é o nosso sangue.

    “O engenheiro Luiz Carlos Pereira Tourinho, então secretário de Obras Públicas, elaborou um novo projeto […], visando a capitanear a produção agrícola das regiões interioranas para o Porto de Paranaguá” (Elzio dos Reis Marson, No Limiar do Horizonte).

    Herdando do pai sua refinada habilidade política, Bento manobrou para bloquear a iniciativa do governo paulista, defendendo a tese de que as obras de pontes no Rio Paranapanema deveriam ser de iniciativa federal, por envolver dois estados limítrofes.

    Regiões do Estado estavam desconexas

    Embora a Guerra das Oito Pontes desviasse recursos do Oeste para o Norte, o governador conseguiu um desfecho favorável: a federalização das obras as reduziu a cinco pontes, evitando que o grosso da produção do Norte paranaense fosse desviada para Santos.  

    Mas os problemas persistiam porque faltava tudo para o interior, principalmente para o Oeste. Se nos centros urbanos maiores as preocupações se concentravam no aumento do custo de vida, que levou a fortes protestos dos trabalhadores, no interior a luta era por melhor infraestrutura de transportes.

    As necessidades aumentavam. O sempre problemático acesso rodoviário a Foz do Iguaçu via Cascavel agora tinha também a concorrência do acesso a Guaíra e Santa Helena, via Toledo.  

    Também se discutia nos meios geográficos a divisão regional do Brasil. São Paulo, que ainda pertencia ao Sul, em breve se destacará para compor a região Sudeste.

    O Norte do Paraná continuava mantendo mais ligações com a capital paulista que com Curitiba. “A imprensa, por sua vez, criticava o governo do Paraná, que não encontrava meios de ligar a região Norte à Sul” (Elzio dos Reis Marson). 

    No Paraná, se o Oeste e o Sudoeste recebiam a invasão maciça de colonos gaúchos, que traziam do RS costumes e saudades, no Norte araucariano as lideranças eram paulistas e gostariam de acompanhar São Paulo como parte da Região Sudeste. 

    Mesmo calado pela pronta ação do governador Munhoz da Rocha em seus primeiros meses de gestão, ainda se mantinha o projeto de emancipar o Norte do Paraná como novo Estado, de modo a facilitar seu atrelamento a São Paulo e deixar de pertencer à região Sul do Brasil. 

    Obras caras na capital 

    As geadas do início da década de 1950 não abateram o ânimo dos produtores de café e a cultura deu peso ao Paraná na economia nacional, mas em 1953 a obsessão do governador pelas vultosas e caras obras comemorativas do centenário do Paraná criam no interior, especialmente no Oeste, com as prefeituras de Cascavel e Toledo dando seus primeiros passos, uma forte sensação de abandono. 

    Os novos municípios não receberam a ajuda de custo prometida na Lei 790/51 e a oposição criticava acidamente o governador por pretender construir o Palácio Iguaçu, o “elefante branco” central das obras previstas em seu plano para o centenário.  

    Mas o governo do Paraná continuava estimulando as iniciativas particulares de colonização e levou adiante os seus próprios projetos, embora em 1952 já estivessem longe da ampla reforma agrária idealizada por Manoel Ribas, também prometida pelo governador Bento Munhoz.

    O governador começou justamente em 1952 a sentir o peso das dificuldades para levar adiante o projeto inicial de distribuir terras a quem as requeresse, baseado na ilusão de que estar sobre a terra por si só já resolvesse todos os problemas sociais, estruturais e econômicos.

    “Miséria acompanha o progresso”

    Sem crédito para plantações nem estradas para escoar a produção, a terra no máximo propicia subsistência, que significa pobreza. O Estado precisava mais da área federal e não recebia. 

    “A avalanche da onda cafeeira traz riquezas, mas é acompanhada também por multidões de desajustados e de doentes”, afirmou Bento, em mensagem à Assembleia Legislativa. “Percebe-se a miséria que acompanha o progresso”. 

    Tornou-se imperioso ao governo do Paraná incentivar ainda mais a colonização do seu interior, especialmente a região que havia sido podada do Estado na ditadura Vargas: as regiões Oeste e Sudoeste separadas no Território Federal do Iguaçu. 

    A essa altura, as grandes motivações econômicas são a expansão das lavouras de café no Norte e a extração da madeira no Oeste. Com elas, aumentava a corrida entre as empresas colonizadoras e os posseiros pelo registro legal das terras anunciadas como as melhores do mundo. 

    O corretor imobiliário Guilherme Schmitt, representante da Maripá no interior gaúcho, anunciava o Oeste paranaense como “terra de cultura livre de morros, pedras, formigas e rica em águas, clima saudável, terra fértil e de fácil escoamento dos produtos”.

    O exemplo de Altônia

    “O fácil escoamento” era meia verdade: maior quanto à exportação via Rio Paraná, mas pequena em relação à malha viária do interior paranaense. De qualquer forma, os empreendedores que compraram a ideia de criar um interior paranaense forte e produtivo fizeram a sua parte com maestria.

    A Companhia Byington, por exemplo, não hesitou em se lançar à colonização de novas glebas abrindo uma estrada ligando Xambrê a Guaíra pelo Porto Byington, onde construiu uma balsa para a travessia do Rio Piquiri.

    O engenheiro Arthur Bruno Junges decidiu homenagear Alberto Jackson Byington, proprietário das glebas em colonização, e juntando as silabas “Al” de Alberto, “ton” de Byington e finalizando com “ia” de Companhia, deu início a formação da cidade de Altônia. 

    As safras de café produzidas em Altônia se destacaram de imediato pela excelente qualidade do produto, que fez a cidade ser chamada “Rainha do Café”. A Fazenda Ouro Verde, de Gordon Robert Mackinnon, tornou-se um modelo assegurado pelas boas técnicas empregadas no cultivo.

    Iniciativas concretas, com grande poder de convencimento, atraíam muitas famílias à região, casando a abertura de estradas com amplas derrubadas e queimadas. 

    Não sem motivos, o engenheiro alemão Reinhard Maack, conhecedor profundo da terra paranaense, faz um alerta sobre as consequências futuras do intenso desmatamento no interior do Estado, como as modificações no ciclo hídrico e a erosão do solo.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Monteiro e a “Brasília” oestina

    Monteiro e a “Brasília” oestina

    Em 1952, como se não bastasse a divisão nas Forças Armadas entre nacionalistas e “entreguistas”, a crise econômica que afetava os trabalhadores e extratos mais pobres da população motivou uma série de greves nos centros urbanos.

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    O presidente Getúlio Vargas reorganizou o ministério tentando administrar as pressões. Para acalmar os trabalhadores, nomeia o presidente nacional do PTB, João Goulart (1919–1976), um amigo próximo, para o Ministério do Trabalho. 

    Embora Goulart, o Jango, fosse um típico estancieiro gaúcho encarregado de amortecer as lutas dos trabalhadores, a oposição, vinculada aos interesses estadunidenses, interpretou a escolha como viragem à esquerda e um plano para implantar um hipotético “regime sindicalista”, similar ao do presidente argentino Juán Domingo Perón (1895–1974).

    Vargas merecia a suspeita, pela estrutura criptofascista montada no Estado Novo e sofreu severos ataques na imprensa e no Congresso, com o fogo centrado em seu ministro do Trabalho. 

    Entra Formighieri, sai Luíse

    O Brasil fervia na crise, mas Cascavel fervilhava de confiança no futuro, sem imaginar que sua posição estratégica estava para ser arruinada por uma ação do governo estadual. 

    O ano de 1952 foi ótimo para os cascavelenses, com a eleição em novembro do primeiro prefeito, José Neves Formighieri, empossado em dezembro. Compadre de Goulart e partidário do PTB, mas com ligações importantes no governo federal, Formighieri se empenhou em criar a estrutura do Município, começando pela educação, ruas e estradas. 

    Um acordo com o candidato derrotado, Tarquínio Joslin dos Santos, que tinha maioria na Câmara, garantiu harmonia no Município e a aprovação de todas as leis propostas. 

    Já sem a necessidade de liderar comunidade, que passava a ter o prefeito e nove vereadores, o padre Luiz Luíse continuou insistindo em dirigir os rumos da cidade, como havia feito no vácuo de liderança entre a criação do Município e a posse do primeiro prefeito.

    Enfrentando os interesses de madeireiros, comerciantes e burocratas do governo com ideias laicas, diferentes da vontade do padre de submeter as decisões ao crivo religioso, a insistência de Luiz Luíse em continuar comandando a cidade o levou a ser chamado de volta por seus superiores a Erechim, para onde retornou em março de 1953.

    Sai Luíse, entra Monteiro

    Dez anos depois, em março de 1963, quando já nem se pensava mais no padre e em sua teimosa vontade de comandar, Luiz Luíse voltava para Cascavel, agora não mais para chefiar a paróquia, entregue aos cuidados do padre Santo Pelizzer.

    Ia chefiar a paróquia do Distrito de Cafelândia do Oeste, onde voltou a ser um padre-prefeito e criou a Cooperativa Consolata. 

    Mais dez anos depois estava de volta a Cascavel, assumindo a igreja e paróquia do Parque São Paulo em perfeita harmonia com as lideranças locais. Morreu em 2 de novembro de 1988, em acidente automobilístico.

    Padre Luiz dizia que veio cumprir missões religiosas, mas as circunstâncias o levaram a fazer muito mais. O mesmo aconteceu com o arquiteto Gustavo Gama Monteiro (1925–2005).

    Ele veio encarregado de uma missão que os cascavelenses ignoravam: criar artificialmente um novo polo para a região, que anularia as vantagens geográficas da antiga Encruzilhada, destruindo assim as chances de Cascavel se tornar uma futura metrópole.

    O ideal urbano-rural

    Enviado pelo presidente da Fundação Paranaense de Colonização e Imigração, Djalma Rocha Al-Chueyr, Monteiro iniciou um ambicioso plano de colonização na “Colônia A”, no interior do então vasto Município de Cascavel, com terras fertilíssimas banhadas pelos rios Tourinho, Melissa e Piquiri. 

    A primeira parte do projeto consistia em promover a locação das glebas, “levantando-se os espigões e os rios, para se parcelar a terra em lotes de 200 ha ou 80 alqueires, visando desenvolver nesses locais fazendas de café” (Rubens Nascimento, Histórias Venenosas). 

    A segunda parte seria construir uma grande cidade-polo que tiraria de Cascavel as características que fariam dela a grande cidade do Oeste nas décadas seguintes.

    Monteiro planejava construir uma “Brasília” no interior do Paraná, oito anos antes da inauguração da futura capital federal. A Cidade Governador Munhoz da Rocha era um projeto espetacular, elogiado por arquitetos e planejadores em geral.

    Política liquidou as boas intenções

    O gerente bancário Rubens Nascimento era amigo do arquiteto e conheceu os detalhes do projeto de criar uma cidade perfeita no Oeste paranaense, prevista para inicialmente acolher cem mil habitantes:

    – Era realmente um projeto ambicioso, corajoso e inédito, e tudo corria bem, naturalmente que com grande investimento uma vez que o Estado gastou cerca de “cinquenta e três milhões de cruzeiros”, que era a moeda da época para abrir ruas e avenidas, construir galerias águas pluviais e locar 20.000 lotes, construir a rede elétrica e um campo de aviação.

    O arquiteto pretendia criar um modelo de harmonia entre homem e terra: os moradores da cidade seriam as famílias dos colonos que ocupariam os lotes de uma também perfeita reforma agrária.

    Tais boas intenções se perderam, porém, pelo interesse político em bajular o governador e a seu falecido pai, Caetano Munhoz da Rocha, que também governou o Paraná.

    Picado pela mosca-azul da ambição de vir a ser candidato à Presidência da República se fosse também um bom ministro da Agricultura, Bento Munhoz renunciou ao governo do Paraná. 

    Não imaginava que ao virar as costas para ser ministro de um governo capenga, o ex-governador Moysés Lupion voltaria ao poder no Paraná e logo varreria do mapa a ideal Cidade Munhoz da Rocha.

    A vingança cascavelense 

    Cascavel, a cidade que iria minguar com a “Brasília” paranaense, foi a principal beneficiada pelo desmonte: o prefeito José Neves Formighieri reuniu sua equipe, foi lá e trouxe postes, fiação, máquinas e equipamentos.

    A farta coleta, deixando para trás uma cidade fantasma, área atualmente no interior de Braganey, foi de grande utilidade para estruturar a grande cidade que Cascavel veio a se tornar a partir dali. 

    O sonho urbano-ecológico de Monteiro ruiu, mas o arquiteto foi adotado pelos cascavelenses, segundo Rubens Nascimento:

    – No entrementes, nem por isso o amigo e arquiteto Gama deve ser considerado persona non grata pelos habitantes de Cascavel, uma vez que posteriormente passou a residir na cidade, onde muito cooperou com o seu progresso, com base ao seu vasto conhecimento sobre projetos arquitetônicos.

    – Inclusive tendo sido procurado pelo prefeito Octacílio Mion para fazer o projeto urbano da cidade, e imprimindo novo conceito à Avenida Brasil ao projetá-la com 60 metros de largura com bolsões de estacionamento, jardins e rótulas de circulação de carros no meio das quadras, devidos bloqueamentos de ruas e interceptações, praticamente colocando em seus sonhos de outrora o que estamos vendo hoje.

    Deduragem era aceita como verdade

    Monteiro de fato apostou em Cascavel, mas dentre as propriedades que adquiriu na cidade, uma lhe deu fortes dores de cabeça: “Área de 939,23m2, destacada da Reserva II, da Comarca de Cascavel, vendida em 21 de maio de 1958, pela importância de NCr$* 50,00 a Gustavo Gama Monteiro”.

    Em 15 de setembro de 1969, a ditadura militar, controlada pelos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, confiscou com base em delações aceitas em inquérito sumário contra o professor Antônio Cid, a propriedade de Gama Monteiro e muitas outras em Cascavel. 

    Dentre elas bens do jogador Vevé (Vespasiano Saraiva), Julio Tozzo (vereador em Cascavel e prefeito em Corbélia) e o topógrafo Sergio Djalma Holanda. 

    Apesar dos dissabores, Gama Monteiro imprimou sua marca a Cascavel, imortalizado pelo projeto final da Catedral e da Avenida Brasil. Apagou-se da memória a cidade planejada, mas perdurou até a demolição a obra que mais o divertiu durante o tempo em que morou em Cascavel: o Cine Delfim.

    *NCr$: Cruzeiro Novo, padrão monetário criado para mascarar a inflação.

    Placa falsa, projeto real

    Monteiro cismou de trazer para o interior algo que só grandes capitais possuíam. Uma sala de espetáculos em que a modernidade estava presente desde o desenho arquitetônico até a forma cooperativa do financiamento da obra.

    A diversão começou em uma rodada de cervejas no Bar Amarelinho, segundo Rubens Nascimento, “o ponto de encontro onde se discutia de tudo, e no mais das vezes a respeito de novos investimentos de interesse para a cidade de Cascavel”.

    – Foi lá que começou a surgir o Cine Delfim com 10 acionistas, como vemos, inicialmente movidos pela cerveja do Amarelinho, e mais tarde até o autódromo da cidade (…), sempre com o dedinho mágico do professor Gustavo Gama Monteiro. 

    Dercio Galafassi contou que na frente do cinema da cidade, onde hoje é a Caixa Econômica Federal do Calçadão, para irritar o proprietário, João Deckmann, os gozadores da cidade colocaram uma placa junto às obras de demolição do Hotel Mariluz: “Em breve aqui, cinema de luxo”.

    Era só uma brincadeira para ironizar o desleixo do velho cinema, mas a cerveja e o fervilhar das ideias originaram uma sociedade que de fato construiu um cinema de luxo, segundo ainda Rubens Nascimento:

    – Cascavel conseguiu construir um cinema inédito, pois foi o segundo cinerama do Brasil, sendo que o primeiro era o Comodoro de São Paulo, executado com tela parabólica, acústica perfeita, com 16 alto-falantes localizados nas laterais e um projetor de 70 mm (Vitória 8), de origem italiana e reputado como o melhor construído do mundo.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O general rebelde que tomou Guaíra

    O general rebelde que tomou Guaíra

    Em 1952, o remoto interior do Paraná sofria com o enfrentamento entre jagunços e posseiros. Na cena nacional, a frágil democracia brasileira estava em disputa entre dois grupos civis e militares – um exigia a ação nacionalista do governo e outro pretendia atrelar o Brasil aos EUA, então em disputa com a URSS pelo controle mundial. 

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    Em momento crucial para o destino do País, o Congresso Nacional aprovou em março polêmico Acordo Militar com os EUA, que em troca do fornecimento exclusivo de minerais estratégicos oferecia armas que sobraram da II Guerra. 

    A corrente nacionalista do Exército manifestou profundo desagrado com o acordo e o ministro da Guerra, general Newton Estillac Leal, pediu demissão. 

    Um dos líderes da corrente nacionalista, Leal viveu no Oeste do Paraná as experiências que o levaram a esta e várias outras decisões de impacto para a história brasileira. 

    Constatar a ausência de progresso para a população das áreas dominadas por interesses estrangeiros no Paraná marcou sua trajetória militar e política.

    “Se há mais de um século proclamamos nossa independência política, é chegado o momento de construirmos com energia e firmeza a independência econômica de nosso país, quebrando os grilhões do colonialismo garroteador do nosso desenvolvimento”, disse Estillac Leal. 

    O estopim da Revolução de 1924

    Nascido no Rio de Janeiro em 1893, filho de um oficial do Exército que chegou a marechal, Newton ingressou no Colégio Militar do RJ em 1905. Primeiro-tenente em junho de 1919, especializou-se nas armas de infantaria, cavalaria e artilharia. 

    Ao eclodir a revolta do forte de Copacabana em 5 de julho de 1922, cujo objetivo principal era impedir a posse do presidente eleito, Artur Bernardes, Estillac apoiou discretamente os rebeldes. Fora de suspeitas, dois meses depois, em setembro, foi promovido a capitão.

    Em São Paulo, exatamente dois anos depois da derrota do tenentismo em 1922, Estillac Leal comandava ao lado de Joaquim Távora o ataque ao bloco de quartéis da Estação da Luz que deu início à Revolução Paulista de 1924. 

    Com a capital paulista ocupada pelos rebeldes, o presidente Bernardes, sem poupar a população civil, mandou bombardear a cidade impiedosamente. 

    Chefes divididos

    O comandante da revolução, Isidoro Dias Lopes, decidiu abandonar a capital paulista “no desejo de poupar São Paulo de uma destruição desoladora, grosseira e infame”. 

    Os revolucionários, entretanto, não tinham um plano para a situação e estavam divididos. Alguns defendiam tomar o Mato Grosso, enquanto outros, como Estillac Leal, preferiam o Paraná, onde poderiam fazer junção com os revoltosos do Rio Grande do Sul, possibilitando a continuidade da revolução.

    Em 25 de agosto começou a descida do Rio Paraná em direção a Guaíra, com Estillac comandando as tropas de ataque no posto de tenente-coronel.

    Tomando Guaíra, o objetivo de Estillac, reforçado com destacamentos de infantaria sob o comando de Nélson de Melo, era fazer de Catanduvas o centro de resistência às tropas do governo até a chegada de Luiz Carlos Prestes e sua coluna gaúcha.

    Antes de atingir Catanduvas, porém, Estillac alcançou Formiga (PR), onde, após um mês de combate, derrotou as forças federais que tentaram romper aquele setor.

    Agostini, herói revolucionário

    Eduardo Agostini, filho adotivo de Alípio de Souza Leal, que em 1930, ao lado de Jeca Silvério, iria iniciar a cidade de Cascavel, acabara de chegar ao Médio-Oeste em plena revolução e de imediato aderiu aos rebeldes.

    Um dos fundadores de Santa Tereza do Oeste, Agostini participou das ações comandadas por Estillac Leal na condição de soldado revolucionário e fez um relato de sua participação ao jornal Hoje-Cascavel: 

    – O primeiro combate que nós tivemos foi na Rocinha, perto de Catanduvas. As forças legalistas de São Paulo atacaram a Rocinha mas não deixamos eles entrar. Ali foi baleado um soldado da Polícia de São Paulo e aí alguém disse: “Olha, vem um batalhão para cortar a retaguarda de vocês, comandado pelo Capitão Sarmento*”. 

    – Newton Estillac Leal ordenou o recuo a Catanduvas, para não sermos sitiados na Rocinha. Quando estávamos passando num lugar chamado Vinte-e-Quatro, para lá de Catanduvas, saíram o capitão Sarmento e sua tropa atrás de nós.

    A derrota de Formiga preocupou seriamente o governo, que tratou de fortificar seus efetivos, agora sob as ordens do general Cândido Mariano da Silva Rondon.

    *Joaquim Antônio de Moraes Sarmento, comandante do 1º Batalhão de Infantaria, criado pelo governo do Paraná 

    Lutas intensas e a fuga

    A estratégia governista era barrar o acesso de Prestes a Catanduvas, onde a artilharia de Estillac e a infantaria de Nélson de Mello repeliam as investidas inimigas. 

    Prestes de fato não pôde chegar a tempo e os revolucionários se renderam em 29 de março de 1925, mas antes trataram de proteger a fuga de seus chefes. 

    Eduardo Agostini contou como conseguiu driblar as tropas do general Rondon para evitar a morte ou a prisão de Estillac Leal, Filinto Müller, Nélson de Mello e Juarez Távora:

    – As forças do Governo estavam na Fazenda dos Gomes* e no Rio Tormenta brigando com a tropa de João Cabanas e numa noite eu e o tenente Domingos viemos de Catanduvas a pé, até o Rio Tormentinha, para ver se havia inimigos ali. Não tinha ninguém. 

    – Paralelamente ao Rio Tormentinha havia uma picada que saía na Linha Velha. Quando constatamos que não havia ninguém, voltamos ligeiro e avisamos o pessoal: “Vamos embora, que dá pra gente sair”. E foi isso que aconteceu: quando clareou o dia, nós saímos na Linha Velha. De lá varamos até Foz do Iguaçu. 

    *Família que no ciclo ervateiro formou a Encruzilhada dos Gomes, onde surgiu a vila de Cascavel.

    Fora da Coluna Prestes

    Estillac adoeceu na fuga e se refugiou na Argentina, deixando por isso de participar da Coluna Miguel Costa-Prestes, que se formaria logo depois, em Foz do Iguaçu, em abril de 1925.

    De lá, Estillac organizou forças militares para invadir o Rio Grande do Sul, na tentativa de obrigar o governo federal a deslocar tropas, desafogando assim a pressão militar sobre a Coluna Prestes.

    A resistência encontrada, porém, foi superior à capacidade ofensiva dos revolucionários. Estillac foi preso em Seival, mas conseguiu escapar, retornando à Argentina. De 1926 até 1930, Leal se dedicou a estudar o socialismo.

    Na primeira hora da Revolução de 1930, em 3 de outubro, Estillac e João Alberto tomaram de assalto o morro do Menino Deus, em Porto Alegre, conquista prioritária no plano de ataque às forças governamentais.

    Atravessando Santa Catarina e o Paraná ao lado de Getúlio Vargas, Estillac recebeu na divisa com São Paulo a notícia de que o presidente Washington Luís foi deposto no Rio de Janeiro. 

    Depois de tantas lutas e derrotas, o persistente revolucionário, já com 47 anos, obtinha a vitória que sempre desejou desde que discretamente conspirou pela primeira vez contra o governo Bernardes, em julho de 1922.

    Sempre em combate

    A vitória na Revolução de 1930 coroava a lenda de Newton Estillac Leal, mas havia muito mais. Promovido a major em abril de 1932 e em 1938 promovido por merecimento a coronel, Leal pronunciou então um violento discurso contra o líder nazista Adolf Hitler. 

    Em agosto de 1942, o Brasil iria declarar guerra aos países do Eixo. Promovido a general-de-brigada em 1943, em setembro de 1945 denunciou as conspirações militares para depor Vargas no golpe de 29 de outubro. 

    General-de-divisão em outubro de 1946, no primeiro ano do governo do general Dutra, em 1949 foi nomeado comandante da 5ª RM e 5ª DI, com sede em Curitiba, mas logo saiu para comandar a Zona Militar Sul, antecessora do III Exército, em Porto Alegre. 

    A questão do petróleo era o principal assunto da campanha presidencial com vistas às eleições marcadas para 3 de outubro de 1950. Estillac defendia abertamente o monopólio estatal, afirmando que a missão principal das Forças Armadas consistia “em defender a soberania e a independência nacional, garantindo, internamente, a legalidade constitucional em todos os seus aspectos”. 

    Vargas foi eleito presidente e em fevereiro de 1951 Estillac deixava o comando da Zona Militar Sul para assumir o Ministério da Guerra. Era o auge da carreira.

    A morte surpreendente

    Fazendo um acerto de contas com sua própria história, Estillac Leal fez uma contundente defesa da legalidade constitucional:“Quaisquer que sejam os resultados das urnas, é dever dos soldados dignos desse nome aceitá-los como expressão dessa opinião e dessa vontade”.

    “Advirto, mais uma vez: qualquer golpe, astucioso ou de força, sejam quais forem as razões invocadas, poderá provocar no país perturbações imprevisíveis e possivelmente de gravíssimas consequências e, talvez mesmo, nos lançar em profundas e cruentas convulsões sociais. Estejamos atentos contra semelhante eventualidade, como paladinos – agora mais do que nunca – da legalidade democrática”.

    As facções de esquerda descontentes com a candidatura de Juscelino Kubitschek às eleições presidenciais de 1955 tentaram lançar Estillac Leal como candidato à presidência da República, mas Leal morreu de súbito em 1º de maio daquele ano. 

    Sobreviveu a todos os confrontos militares, mudou profundamente a história do Oeste paranaense e do Brasil, mas foi abatido na luta política.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O alfaiate que perdeu Cafelândia

    O alfaiate que perdeu Cafelândia

    O rigoroso inverno de 1952 foi compensado pela afirmação das comunidades que compunham a Rota Oeste, qualificação que se deu ao trecho da atual BR-277 entre Cascavel e Foz do Iguaçu.

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    Embora mais próxima a Cascavel, que se tornara Município em novembro do ano anterior, o jovem povoado de Matelândia e o território de sua colonização não foram integrados ao território cascavelense.

    Se isso acontecesse, o território do Município de Cascavel ficaria excessivamente grande para os parcos recursos da Prefeitura que só seria instalada em dezembro, após a eleição do primeiro prefeito, marcada para novembro. 

    Por isso Matelândia, em 21 de julho, passou à categoria de Distrito Administrativo de Foz do Iguaçu. O mesmo aconteceu dez dias depois com Medianeira. Uma espécie de irmã de Matelândia, a colonização de Medianeira foi empreendida pela Companhia Industrial Agrícola Bento Gonçalves, de Alberto e Luiz Dalcanale.

    Os dois estavam associados a Alfredo Paschoal Ruaro, todos também participantes da formação de Toledo e da colonização da Fazenda Britânia, promovida pela Companhia Maripá. 

    Os três também fundaram a colonizadora a Pinho e Terras para administrar uma ampla área outrora pertencente à família Matte que se estendia no entorno de Foz do Iguaçu.

    O núcleo urbano de Medianeira, nome definido como homenagem à santa padroeira, consolidou-se rapidamente. Matelândia, por sua vez, teceu ligações essenciais com a comunidade de Cascavel, por conta da proximidade.     

    Milholândia ou Sojalândia? 

    Por essa época, às vésperas de se tornar Município de fato e de direito, que aconteceria com a eleição e posse de primeiro prefeito, Cascavel recebe um grupo de famílias atraídas pela oferta de riqueza, que viria ao adquirir terras para plantar café na região de Cafelândia.

    O nome de Cafelândia é uma herança do atraso na estrutura de extensão rural e da ânsia dos colonizadores para atrair compradores, oferecendo a garantia de ótimas safras de café, cultura que fazia o Norte do Estado progredir. 

    Os compradores ignoravam duas coisas, pelo menos, ao se entusiasmar com a perspectiva de enriquecer em poucos anos. 

    Primeiro, a região sofria o crescimento da luta pela terra, sobretudo entre posseiros já com anos de presença na região e colonizadores privados, tendo como pano de fundo a disputa judicial sobre questões dominais de terras entre a União e o Estado do Paraná na faixa de fronteira.

    Segundo, os compradores de terras não estavam informados de que grande parte das áreas oferecidas pelos corretores alternavam safras razoáveis de café com quebras enormes por conta das geadas.

    Por conta disso, sem assessoria imobiliária e legal, os colonos do Sul ansiosos para trabalhar com o café chegavam sem saber que a lábia dos corretores, legais ou ilegais, omitia as frequentes geadas.

    As famílias que vieram e não foram expulsas pelos jagunços nem pelas geadas precisaram migrar logo do café para hortelã e em seguida para outras culturas favorecidas pelo mercado internacional – em breve, com seu território agrícola amplamente coberto de soja, milho e trigo, do café só restou o nome Cafelândia.

    O sonho negado pela insegurança agrária

    O gaúcho Ítelo Webber, nascido em 1919 em uma localidade chamada Estação Erechim, decidiu vir ao Paraná confiando na qualidade da terra vermelha. Estação Erechim, situada no Noroeste do RS, mudou de nome para Getúlio Vargas em 1934, ao se tornar Município.    

    Já casado com Rosa Webber, com quem teve os filhos Dimer José, Valdir Antônio e Mirtes Maria, Ítelo se transferiu para Videira (SC), onde trabalhou até vir para a região de Cafelândia.

    Ítelo Webber partiu da região central catarinense sem informações sobre o agravamento da guerra no campo, que confrontava posseiros e jagunços.

    A propriedade em que os Webber iriam se instalar não estava regularizada e a família perdeu tudo o que investiu na transferência ao Paraná. De resto, o tumulto criado pelos conflitos forçou o governo do Paraná a suspender o registro de novas posses de terras devolutas.

    Webber, assim, viu-se desamparado naquele frio julho de 1952, com a família à espera de uma definição e a mudança que trouxe ainda em cima de um caminhão que transportava cereais.

    O condutor do caminhão avisou:

    “Seu Ítelo, eu preciso carregar o milho e voltar logo pra Videira. O senhor dê um jeito de encontrar um local para descarregar a sua mudança ou me obrigarei a derrubá-la em qualquer lugar por aí”.    

    A tática de segurar viajantes

    A cidade de Cascavel então se limitava às quadras mais próximas da Avenida Brasil entre a Igreja de Santo Antônio, então sede da recém-criada Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, e a Rua Moysés Lupion (atual Sete de Setembro). 

    Autorizado a montar acampamento precariamente no campo de aviação, junto ao um poço, Ítelo foi procurado por Sabino, administrador de um dos hotéis:

    “Seu Webber, eu não posso deixá-lo expor a sua família, assim, em uma barraca. Quero que fiquem no meu hotel”.

    Webber recusou, porque não teria como pagar pela hospedagem nem onde colocar a mudança. Seguiu-se um diálogo (transcrito por Valdir Pacini no livro O Sonho de um Pioneiro) somente possível naqueles dias de pioneirismo, em que os cascavelenses seguravam na cidade quem pudesse contribuir para a afirmação do local como centro-polo da região:

    – Não se preocupe. Tenho uma pequena casa nos fundos do hotel onde o senhor poderá amontoar a sua mudança e ficar com a sua família.

    – Mas e o aluguel? Quanto o senhor vai me cobrar?

    – Não se preocupe com isso também. O senhor não deve ter dinheiro, mas certamente sabe fazer alguma coisa…

    – Eu vinha trabalhando de vendedor, mas já trabalhei de alfaiate.

    Como a cidade não tinha alfaiate, Ítelo aproveitou a oportunidade aberta e começou a trabalhar de imediato

    A tática de segurar viajantes para povoar Cascavel vinha desde que Jeca Silvério conseguiu a posse das terras ao redor da Encruzilhada, em 1930, formando a cidade e oferecendo oportunidades aos viajantes.

    Atividades rurais e urbanas  

    Com a família trabalhando, o filho mais velho, Dimer José, 14 anos, já em atividade e o do meio, Valdir Antônio, 13, vindo no fim do ano após terminar estudos em Videira, Ítelo tratou de distribuir os negócios da família entre a cidade e o campo.

    Na esquina da Avenida Brasil com a Rua Osvaldo Cruz, em sociedade com o futuro vereador e prefeito Helberto Schwarz, iniciou-se no comércio de calçados. A esposa Rosa completava os serviços da alfaiataria como costureira de calças

    No campo, Webber foi o pioneiro da avicultura cascavelense com uma granja de poedeiras.  Logo em janeiro de 1953 ele se associou a Tarquínio Joslin dos Santos na fundação da Associação Rural de Cascavel. 

    Ítelo foi muito ativo na ARC, entidade que ditava os rumos da economia cascavelense antes de ser forçada pelo governo ditatorial de 1964 a se transformar em sindicato.

    Em 1965, o presidente da ARC, Antônio Simões de Araújo, tendo Webber como seu vice, retardava a formação do sindicato, procurando centrar esforços na preparação técnica dos agricultores. 

    Focado no aprimoramento da agropecuária, Webber encomendou naquele mesmo ano uma análise do solo cascavelense ao Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas do Estado com amostras de terra para saber a viabilidade da produção de leguminosas e de cereais.

    Os técnicos concluíram que as amostras indicavam elevada acidez e deficiência em fósforo na terra, recomendando atenuar a acidez com calcário e adubar com fosfatos no plantio.

    Renúncia honrou a família 

    Acima de tudo, a intenção de Simões e Webber era transformar a ARC em cooperativa independente e não um instrumento do governo, mas havia uma intensa propaganda dos atravessadores contra o cooperativismo.

    Simões não suportava as pressões que por todos os meios bloqueavam o cooperativismo, sistema acusado de ser “comunista”. Adoeceu e se licenciou da presidência para tratamento de saúde, passando o comando da ARC ao vice-presidente Ítelo Webber.

    Eram tempos de ditadura. A máscara do regime caiu em 1968, com a imposição do famigerado AI-5, completando o controle sobre as entidades da sociedade civil. 

    Simões, recuperado, voltou às atividades e Webber à vice-presidência, mas depois de longa resistência decidiu não aceitar mais as pressões que limitavam a atuação da ARC. Em fevereiro de 1972 ele apresentou a renúncia à vice-presidência em caráter irrevogável.

    Embora se confessando surpreso com a atitude, Simões agradeceu a Webber, substituído na função por Antônio Cassol, jovem pecuarista nascido em Ijuí (RS) e estabelecido no Espigão Azul, ligado à família Tombini.

    Nessa época, a ARC já havia se transformado em sindicato e o cooperativismo havia vencido, com a criação da Coopavel em 1970. Webber abria mão de participar do centro de decisões da vida cascavelense, mas os filhos Dimer e Valdir já começavam a influir nos rumos da cidade.

    Dimer se tornou um importante líder empresarial paranaense. O advogado Valdir foi secretário municipal de Cascavel. E Mirtes (casada com José Heitor Dotto, com quem se transferiu para Foz do Iguaçu), contabilista e administradora, é, a exemplo da mãe Rosa, referência importante da força da mulher na sociedade oestina.

    Avô do reitor da Unioeste, Alexandre Webber, por sua vez filho de Valdir Webber, Ítelo morreu em 24 de dezembro de 1991. Para homenagear a memória de Webber o Município emprestou seu nome à avenida que leva ao Aeroporto Coronel Adalberto Mendes da Silva.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O herdeiro do padre e o pato bragado

    O herdeiro do padre e o pato bragado

    Já sem a necessidade de se impor à frente da comunidade de Cascavel, que passava a ter um corpo oficial de lideranças – o prefeito José Neves Formighieri e nove vereadores –, padre Luiz Luíse insistiu em dirigir os rumos da cidade, mas enfrentou os interesses de madeireiros, comerciantes e políticos, cujas ideias de progresso eram laicas, diferentes da vontade do religioso de submeter as decisões ao crivo católico. 

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    Os desentendimentos e a insistência de Luiz Luíse em continuar comandando a cidade o fizeram ser chamado de volta por seus superiores a Erechim, para onde retornou em março de 1953.

    Dez anos depois, em de março de 1963, quando já nem se pensava mais no padre e em sua proverbial teimosia e voz de comando, Luiz Luíse voltava para Cascavel. 

    Desta vez, não mais para chefiar a paróquia, entregue aos cuidados do padre Santo Pelizzer. Cercado pelo carinho dos cascavelenses, recebeu cumprimentos pelo 50º aniversário em 2 de maio de 1963, quando já sabia que seu novo destino seria chefiar a paróquia do Distrito de Cafelândia do Oeste, que ele assumiu em seguida.

    Lá, voltou a ser um padre-prefeito e criou a cooperativa à qual deu o nome de sua ordem religiosa: Consolata. 

    Mais dez anos depois e estava de volta a Cascavel, assumindo a igreja e paróquia do Parque São Paulo. Nessa função, morreu em 2 de novembro de 1987, em acidente automobilístico.

    Mais paranaense que catarinense 

    Cafelândia só viria a ter um prefeito de fato e de direito duas décadas depois de receber o padre Luiz. Em 1983, Agenor Pasquali assumia a Prefeitura de Cafelândia, seguindo o fio histórico da cooperativa. 

    Pasquali se projetou para a vida pública pela habilidade administrativa adquirida a serviço justamente da Copacol. Nascido em Criciúma (SC) em agosto de 1945, é mais paranaense que catarinense, pois aos dois anos, em 1947, a família se mudou para Pato Branco.

    Em busca de terras amplas e férteis, os Pasquali migraram para Cafelândia em 1958, quando Agenor estava com apenas 13 anos. Havia muita confiança em que o café traria a sonhada riqueza, antecipada pela beleza branca da floração da rubiácea, mas acabou arruinada pela indesejável brancura da geada de 1963. 

    Depois, veio a seca e, com ela, o maior incêndio já visto no Estado, que inundou as cidades de fumaça. Em todo o caso, o ano de 1963 trouxe a nova confiança de que o cooperativismo, a partir da eletrificação, traria o progresso para Cafelândia.

    A confiança era depositada tanto no padre Luiz Luíse e em sua liderança quando na força de trabalho da população que chegava do Sul. Mas o esforço cooperativista era pressionado de várias formas, primeiro pelos atravessadores, depois pela forma de organização cooperativista engendrada pelo governo ditatorial, que planejava liquidar a cooperativa de Cafelândia.

    Problemas e frustrações

    Em 1969 a cooperativa de Cafelândia estava nas cordas. O presidente Severino Squizatto adoeceu e o vice Jacob Berkembrock não queria assumir o comando, mas foi empurrado à liderança pelo padre Luiz Luíse.

    Nesse interim, a família Pasquali sofria sua segunda tragédia, depois da frustração do café. Muitos colonos da região aviam optado pela cultura da hortelã, também logo inviabilizada.

    Em mais uma tentativa, os Pasquali também não tiveram o sucesso esperado embarcando na cultura da cidreira (capim limão), apanhados por embaraços burocráticos.

    Foi lidando com eles que a capacidade administrativa de Agenor começou a se destacar, mas logo a cultura da cidreira também se mostrou inviável economicamente e Agenor pôs fim à experiência promovendo uma espetacular fogueira com os restos da cultura.

    “Queimou tudo, levantou uma parede de fumaça branca que todos da cidade ficaram assustados”, disse ele a Gabriella Tiscoski (GiroOeste). 

    A virada na Copacol   

    Pasquali, porém, avançava na compreensão da realidade local e acompanhou toda a tensa situação em que as autoridades do setor tentavam impor a incorporação da cooperativa pioneira de Cafelândia à Coopavel, criada em 1970. 

    Com padre Luíse à frente da resistência, a Copacol se impôs e retomou sua trajetória. Passou o setor de energia à Copel e se voltou estritamente ao setor produtivo rural.

    Um fato extraordinário que deu projeção a Pasquali se deu quando era presidente da Associação de Pais e Professores da única escola de Cafelândia. Em ruínas, escorada por cepos de madeira para não cair, “quando chovia, muitos pais nem mandavam os filhos para a escola, tinham medo de que tudo caísse”. 

    Pressionando a Prefeitura de Cascavel para providenciar a reforma, chamou a imprensa a mostrar por inteiro a situação do estabelecimento de ensino. Já eram os traços do gestor de força e iniciativa que viria a ser no futuro. 

    35º entre os 399 municípios 

    Nas difíceis lutas para a Copacol virar o jogo a seu favor, embora Agenor Pasquali tenha dito não saber como isso aconteceu, foi chamado para assumir a função de diretor-secretário da Copacol.

    Ele supôs que a convocação se deveu à sua escolaridade. Mãos à obra, logo fez toda a diferença, determinando a exclusão de quem não cooperava e impondo o foco nos resultados.

    Os resultados vieram, foram administrativamente corretos e produtivamente esplêndidos. Um dos bons resultados, aliás, foi político: nas eleições de 1982 Pasquali se elegeu para comandar a Prefeitura do novo Município de Cafelândia. 

    Depois dos fracassos com o café, a hortelã e a cidreira, sua gestão na Copacol foi de muito sucesso, mas ao assumir a Prefeitura Pasquali encontrou Cafelândia na última colocação entre os municípios do Estado, reduzido de tamanho e às voltas com as severas inundações de 1983. 

    A força da água arrastou pontes e criou um caos no interior. “O que a água não havia levado, estava podre”, disse.

    Diante da necessidade de construir 240 obras de bueiros e pontes, instalou uma fábrica de tubos e lajotas para agilizar os consertos (Gabriella Tiscoski).   

    O Município que em 1983 teve o território mutilado, estava debaixo de água e em último lugar no Estado hoje é o 35º entre os 399 municípios do Paraná em IDH.

    O curioso caso de Pato Bragado

    Um animal é bragado quando o pelo das pernas é de cor diferente do corpo. Já o pato bragado (variedade da espécie Cairina moschata) se caracteriza por ter mancha branca na asa. É um grande pato selvagem, que deixou herdeiros menores ao se misturar com outras espécies.

    A população desse pato, que os Guaranis conheciam como ype guasu, reduziu-se drasticamente com a caça descontrolada e pelo cruzamento com patos domésticos. Na época ainda bem distribuído pela região das águas, o pato bragado deu nome a uma igualmente grande embarcação argentina que navegava no Rio Paraná fazendo o transporte de passageiros, erva-mate e madeira. 

    A admiração causada pela passagem do imponente navio Pato Bragado, considerada a maior embarcação que fazia o trajeto entre os portos do Alto Paraná e Buenos Aires, foi a origem da atual cidade e Município de Pato Bragado.

    Um dos marcos da colonização empreendida na região da antiga Fazenda Britânia pela empresa Maripá, até a admiração pelo navio se sobrepor o local era conhecido apenas como “Km 10”, marca feita em um mapa para indicar a localização da primeira olaria criada pela Maripá, situada a dez quilômetros a partir do Porto Britânia e gerenciada por Arthur João Thober.

    Como o gerente não sabia falar Português, a empresa contratou o professor Hugo Frank para ser seu intérprete. Frank, gaúcho de Ijuí, chegou ao lugar em 24 de junho de 1952, trazendo a esposa Nair. Iracema Luiza, sua filha, foi a primeira criança a nascer na localidade.

    Churrascada e sino badalando

    Outros pioneiros memoráveis da área foram Reinold Bais, Luiz Underberg e Conrad Klínger, segundo o historiador Ondy Hélio Niederauer (1923–2012) em sua obra Toledo no Paraná (1992).

    A origem da localidade foi um dos destaques do minucioso relato feito por Niederauer, comentando que os primeiros moradores do Km 10 foram teuto-gaúchos que a partir da agricultura de subsistência também se dedicaram à criação de bovinos e suínos. 

    “Era previsto que estrada de Foz do Iguaçu a Guaira deveria cruzar a estrada de Toledo a Porto Britânia, naquele ponto”, narra o historiador. “Daí a necessidade de a Maripá construir ali uma nova vila”. 

    “A planta já estava pronta e as primeiras casas, inclusive o hotel, já estavam prontos. Faltava dar-lhe um nome. Eis que atracou em Porto Britânia um enorme barco. Quando os maiores que conseguiam chegar tinham capacidade de carga até 300.000 p2, neste foram embarcados 400.000 p2” (Ondy Hélio Niederauer, Toledo no Paraná).

     A admiração quanto ao tamanho da embarcação aumentou ao verificar o insólito nome do navio: Pato Bragado. 

    “Willy Barth teve então a ideia de batizar a nova vila com este nome. Mandou preparar uma churrascada para a tripulação do barco, convidando também o pessoal da administração do Porto Britânia, da ervateira, e dos moradores da vila. O batismo foi feito com muitos discursos e cervejas. No dia seguinte, passada a ressaca, o Pato Bragado, com apito e badalar do seu sino, partiu galhardo rumo a Buenos Aires” (Niederauer).

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Um voto muda toda a história

    Um voto muda toda a história

    9 de novembro de 1952. Nesse dia, os eleitores de Cascavel, Toledo e Guaíra iriam às urnas pela primeira vez. Cascavel e Guaíra eram ex-distritos de Foz do Iguaçu. Toledo pulou diretamente de um empreendimento particular, gerido pela Companhia Maripá, para uma unidade administrativa do Estado do Paraná. 

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    Toledo, mesmo virando município e tendo um prefeito, continuaria sob o comando da empresa colonizadora que fez prosperar a antiga Fazenda Britânia com um excelente projeto de colonização e reforma agrária. 

    Guaíra também havia sido o domínio de uma empresa: a Matte Larangeira*, desde 1902. Em 1938 a área foi anexada ao Município de Foz do Iguaçu e em 1943 a empresa perdeu direitos sobre a região. 

    Permaneceu distrito de Foz do Iguaçu até a eleição do dia 9 de novembro de 1952, dia em que elegeu seu primeiro prefeito, Gabriel Fialho Gurgel, que era quase um estranho em Guaíra. Até recentemente ele morava em Cascavel.*Grafia original: refere-se ao proprietário, Tomás Larangeira https://x.gd/dj6gN 

    Fundador do Tuiuti

    Gurgel, entretanto, era um líder. Reunia carisma e uma oratória animada que o levaram a fundar o Tuiuti Esporte Clube. Além de orador oficial do clube, Gurgel liderou a comissão que construiu a primeira sede do clube, na qual foram feitas as reuniões que iniciaram a formação do Município de Cascavel.

    Cearense, formado em Odontologia, Gurgel veio para Cascavel depois de trabalhar na Prefeitura de Curitiba. Foi eleito em 1952 para a Prefeitura de Guaíra pelo PTB, mesmo partido pelo qual também se elegeram os primeiros prefeitos de Cascavel e Toledo, sinal da força do getulismo no país.

    Fialho elegeu uma superbancada para apoiá-lo na Câmara Municipal: oito dos nove vereadores eram também do PTB – Alexandre José da Silva; Arnaldo Bacchi; Osíres Soley; Gody Werner; João Campos Lopes; Fernando Maciel Foster; Joaquim Dornelles Vargas e Vicente Augusto Brilhante, o presidente. 

    Só o vereador Otacílio Amaral dos Santos pertencia ao Partido Republicano. Com tanto apoio, fez aprovar uma lei polêmica para facilitar o custeio da administração: criou uma taxa por árvore derrubada – 20 cruzeiros (a moeda vigente) por árvore de madeira de lei abatida, a metade para pinheiros e outras árvores. 

    Gurgel também viveu em 1953 o início das cogitações para a construção de Itaipu, que inicialmente resultaria da exploração das Sete Quedas. Vieram estudar a área engenheiros da Alemanha, EUA, Inglaterra, Japão e União Soviética. 

    Dall’Oglio, carreira brilhante

    O primeiro prefeito de Toledo, eleito na mesma data, também era um profissional da área de saúde. O médico Ernesto Dall’Oglio (https://x.gd/lqaqo), referendado pela Maripá, mas ligado ao PTB, não teve oponentes, recebendo 737 dos 824 votos válidos. 

    Para a Câmara, prevaleceu o Partido Libertador, por conta das ligações de chefes da empresa com esse partido no Sul. O Partido Libertador (não confundir com o PL de Valdemar Costa Neto e Jair Bolsonaro) foi criado por Assis Brasil, apoiador da Revolução de 1924, e Raul Pilla. Defendia o parlamentarismo e teve como grande destaque depois de sua dissolução o senador e ministro da Justiça Paulo Brossard, que também foi membro do STF.   

    O PL elegeu oito dos nove vereadores toledanos: Guerino Viccari, Alcebíades Formighieri, Rubens Stresser, Clecio Zeni, o historiador Ondy Niederauer, Wilibaldo Finkler, Leopoldo Schmidt e Waldi Winter, ligado à futura Marechal Cândido Rondon. O PR, do governador Bento Munhoz, elegeu apenas José Ayres da Silva.

    Acusado de descumprir a Lei Orgânica Municipal, Dall’Oglio foi cassado em abril de 1953, mas recorreu, sendo reconduzido à Prefeitura em dezembro. Eleito para a Câmara em 1956, voltou mais uma vez à Prefeitura em 1962, em condições extraordinárias.    

    Os três candidatos de Cascavel 

    Em Cascavel, até o início de novembro de 1952 era dada como certa a vitória do farmacêutico Tarquínio Joslin dos Santos (https://x.gd/etOTg) para a Prefeitura, com a Câmara formada por vereadores ligados à indústria madeireira e ao comércio. 

    Comunista, com o PCB posto na ilegalidade pelo governo do marechal Eurico Gaspar Dutra, Tarquínio concorreu pelo PR (Partido Republicano), controlado pelo governador Bento Munhoz da Rocha Neto.

    Tarquínio era amado pela população da cidade, que seguia do atual Terminal Rodoviário até a Rua Sete de Setembro, e tinha o apoio da primeira família que se instalou em Cascavel.

    A matriarca Laurentina Lopes Schiels, desde os anos 1940 já estabelecida na área urbana de Cascavel, procedente do Cascavel Velho, morava na mesma rua que Tarquínio: a Rua Moysés Lupion, atual Sete de Setembro.

    Concorriam também à Prefeitura o agropecuarista José Neves Formighieri (https://x.gd/xM7tq), pelo PTB, com maior apoio no interior do distrito, menos no Cascavel Velho, e pela UDN o respeitado Ramiro de Siqueira, pioneiro que acompanhou José Silvério na formação da vila de Cascavel, em 1930.

    Na correria, a falta de ar

    Choveu, o que prejudicou o acesso à urna localizada na cidade, mas os caminhões que puxaram eleitores do interior conseguiram chegar a tempo. Na época os candidatos eram autorizados a transportar os eleitores às seções eleitorais e lhes davam as cédulas para depositar na urna.

    Tarquínio Santos estava no interior para reforçar a campanha onde estava mais fraco, mas seu veículo enguiçou, ficando retido pela chuva. Quando conseguiu chegar à cidade, a votação estava encerrada e ele não conseguiu votar.

    Fechada a votação à tarde, os votos partiram em comboio para Foz do Iguaçu, sede da Comarca, onde seria feita a apuração. 

    Santos saiu de imediato no encalço da comitiva que se dirigia a Foz do Iguaçu para a contagem dos votos entre os quais não estava o seu, pois não conseguiu votar.

    Chegando quase sem ar a Foz do Iguaçu, a contagem dos votos já em andamento o mostrava com dezenas de votos na dianteira.

    Sentindo-se mal, saiu para tomar um ar e quando retornou ouviu o alarido: José Neves Formighieri havia vencido por um voto. 

    Refletiu que se chegasse a tempo de depositar o voto estaria eleito, pois provocaria o empate com o candidato José Neves Formighieri e seria proclamado eleito por ser o mais idoso entre os postulantes. 

    Perdeu, mas não complicou 

    Tarquínio recorreu à Justiça Estadual por conta de dezenas de votos dados a Formighieri apresentando pingos de barro. No entanto, naquela época os eleitores traziam as cédulas distribuídas pelos candidatos. Os pingos de lama se deviam ao transporte em estradas de terra em tempo chuvoso e não a qualquer irregularidade.  

    Assim, o candidato José Neves Formighieri, do Partido Trabalhista Brasileiro, estava eleito com 383 votos, apenas um a mais que Tarquínio Santos, que não conseguiu votar em si mesmo. 

    Formighieri assume em 14 de dezembro o cargo de prefeito no prédio de madeira destinado por Jeca Silvério à subprefeitura. Com ele assumem os componentes da primeira legislatura da Câmara Municipal. 

    O PTB, além do chefe do Executivo, elegera quatro vereadores: Francisco Stocker, Helberto Schwarz, Antônio Massaneiro e Jacob Munhak. O Partido Republicano, todavia, alcançou a maioria, assegurando cinco vagas: Dimas Pires Bastos, Adelar Bertolucci, Adelino André Cattani, Donato Matheus Antônio e José Bartnik. 

    Tarquínio tentou obter o mandato com recurso na Justiça Estadual. Seu partido tinha maioria na Câmara e poderia embaraçar a administração, mas ao concordar com as primeiras medidas tomadas por Formighieri decidiu apoiar as iniciativas do novo prefeito. 

    O acordo da governabilidade

    O secretário municipal Celso Formighieri Sperança foi o encarregado de fazer os contatos com Tarquinio, que por motivos de saúde se transferiu para Foz do Iguaçu. Os vereadores do PR concordaram em fazer a administração fluir sem embaraços. 

    A decisão de Tarquinio de apoiar a gestão Formighieri se deveu ao empenho da administração municipal em criar escolas no interior e preparar bem os professores. Por sua vez, Formighieri se filiou à Associação Rural de Cascavel, criada por Tarquinio.

    Os três prefeitos oestinos eleitos em 1952 também se elegeram em 1956 para suas câmaras municipais, mas só Ernesto Dall’Oglio fez carreira política nacionalmente, chegando à Câmara Federal.

    Antes, porém, Dall’Oglio foi reeleito para a Prefeitura de Toledo em 1962, em corrida apertada contra Lamartine Braga Cortes no pleito suplementar determinado para substituir o prefeito Willy Barth, morto no exercício do cargo.

    Presidente da Associação Rural de Toledo, o médico se elegeu deputado estadual pelo MDB antiditatorial em 1974 e deputado federal em 1978. Morreu em 2006.

    Seu herdeiro político foi o genro Nelton Friedrich, igualmente com uma brilhante carreira na área federal, notabilizando-se como secretário estadual do Interior e gestor do programa Cultivando Água Boa, da Itaipu Binacional. 

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O padre-prefeito

    O padre-prefeito

    Em 1951, três líderes da comunidade cascavelense – Helberto Schwarz, Álvaro Lemos e Ernesto Farina –, foram a Laranjeiras do Sul pedir ao bispo Manoel Koenner (https://x.gd/UhVyd) a criação da Paróquia de Cascavel e a designação de um padre para conduzi-la. Obtendo a anuência de Koenner, começaram imediatamente os preparativos para a criação da nova Paróquia, já sonhando com uma futura catedral.

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    Por essa época, a família Biazus, que colonizava Matelândia, pediu ao padre Domingos Fiorina, superior dos padres missionários de Nossa Senhora Consoladora, em Erechim (RS), que enviasse um padre para assistir espiritualmente aos colonos. No início de 1952, Fiorina designou para a missão o padre italiano Luiz Luíse, já com ampla experiência em cidades do interior. 

    Nascido em Martellago (Veneza) em maio de 1913, filho de agricultores, Luíse se formou em 1938 na Congregação dos Padres Missionários de Nossa Senhora Consolata (Consoladora), de Turim.

    Ordenado sacerdote ainda em 1938, Luíse permaneceu por alguns anos em missões pastorais na Europa antes de ser enviado às regiões pioneiras colonizadas por imigrantes do Norte italiano na América do Sul.

    Cascavel não despertou atenção

    Chegando ao Brasil em 1º de dezembro de 1946, Luíz Luíse assumiu a Paróquia de Aparecida em São Manoel (SP). Em 1949 foi transferido ao Norte do Rio Grande do Sul, em Erechim, de onde viria ao desconhecido Oeste paranaense já demonstrando grande espírito de liderança comunitária.

    Orientado para conhecer Matelândia e em seguida se apresentar ao bispo de Laranjeiras do Sul, d. Manoel Koenner, Luíse voou até Foz do Iguaçu, pois em Cascavel não havia campo de pouso para aviões de carreira.

    Viajando de Foz do Iguaçu a Matelândia por automóvel, conheceu a Rota Oeste e depois passou brevemente pela pequena cidade de Cascavel, à qual sequer prestou atenção, a caminho de Laranjeiras do Sul, onde se entrevistaria com o bispo. 

    “Dom Manoel aceitou a presença do missionário de Nossa Senhora Consoladora na sua prelazia, mas determinou que padre Luiz fosse trabalhar em Cascavel, atendendo a insistentes pedidos da comunidade local” (Alceu A. Sperança, Cascavel, A História).

    Eleição marcada para a Prefeitura  

    De volta a Erechim para reportar suas observações, Luíse embarcou novamente em 3 de maio de 1952 para Foz do Iguaçu, de onde partiu para Cascavel no dia seguinte, conduzido pelo madeireiro Florêncio Galafassi, em cuja residência o religioso se hospedou até completar as instalações paroquiais.

    Como vigário da Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, Luíse a instalou no local em que hoje se encontra a Igreja de Santo Antônio, local histórico da primeira capela da vila.

    No rural Cascavel Velho, a matriarca Laurentina Lopes Schiels, muito religiosa, tinha desde os anos 1920 uma capela também frequentada pelos vizinhos até a família se transferir para a sede urbana, na década seguinte. 

    Com o Município criado em novembro de 1951, Cascavel ainda era sede distrital quando Luíse chegou à cidade, em maio de 1952. Entre a pequena população urbana e o enorme interior do distrito, o assunto mais comentado era a campanha eleitoral. 

    A eleição estava marcada para o dia 9 de novembro de 1952. Assim, entre maio de 1952, ao chegar, até a eleição para a escolha do primeiro prefeito, padre Luiz assumiu a liderança na cidade.

    Divergência: onde construir a catedral?

    Instalando a Paróquia de Nossa Senhora Aparecida em reunião solene com a comunidade em 1º de junho de 1952, o padre se surpreendeu com o tamanho do Município que estava para se emancipar de Foz do Iguaçu. 

    “O novo Município era grande como um território. Como pequenos populados tinha Capela São João, Capela São Pedro, Colônia Esperança, Sapucaia, São Domingos, Centralito, Serraria Piquiri, Cafelândia, Iguaçuzinho, Roda de Carro, Memória, Santa Tereza, Bela Vista [Céu Azul], Melissa e Santa Cruz” (padre Luiz Luíse, depoimento ao livro Cascavel, a História).

    A reunião solene de instalação da Paróquia se transformou em debate acalorado sobre se a Igreja Matriz de Nossa Senhora Aparecida seria construída no Patrimônio Velho, a cidade existente na época, ou em área doada para esse fim pelo Departamento Geográfico de Terras e Colonização, órgão do Governo do Estado, situada no ainda desabitado Patrimônio Novo.

    Os pioneiros queriam a futura catedral no Patrimônio Velho, onde morava quase toda a população urbana, mas o padre insistiu que a nova igreja fosse edificada no Patrimônio Novo, de acordo com a planta do governo estadual.

    Um arranjo político e imobiliário 

    O Estado não enviou a verba necessária para a instalação do Município e com isso o primeiro prefeito precisaria vender os lotes do Patrimônio Novo para viabilizar as atividades municipais.

    Ter a igreja nova no Patrimônio Novo facilitaria a venda dos imóveis, puxando a ampliação da cidade para o Leste.

    Contrariando as lideranças tradicionais da cidade, o padre insistiu nisso. Havendo o impasse, formou-se uma comissão composta por Adelino Cattani, Ernesto Farina e Helberto Schwarz para seguir a Laranjeiras do Sul, sede da Prelazia (bispado), para consultar o bispo. 

    Manoel Koenner pesou os prós e contras, determinando que o novo templo fosse construído de acordo com a planta do Estado, que acrescentava o Patrimônio Novo ao perímetro urbano da cidade, a Leste da Rua Moysés Lupion (atual Rua Sete de Setembro).

    Decisão tomada, o movimento para a edificação da nova igreja foi liderado por Florêncio Galafassi, Victorino Sartori, Helberto Schwarz e Itasyr Luchesa, entre outros. A Industrial Madeireira do Paraná cedeu o material de construção.

    Luíse deu estrutura a Cafelândia

    Enquanto a comissão cascavelense tratava com o bispo, padre Luiz conhecia o interior do novo Município, rezando missas nas comunidades do interior. 

    Em 20 de junho de 1952 ele rezava a primeira missa no povoado de Caixão, futura Cafelândia do Oeste, que ele também iria comandar. Ali promoveu seus grandes feitos: enfrentar a corrupção instalada no Banco do Brasil e criar o cooperativismo na região. 

    Por conta dessa conquista, Cascavel foi o único Município brasileiro a ter duas cooperativas: a pioneira cooperativa Consolata (Copacol), de Cafelândia, desde 1963, e a Coopavel, iniciada no contexto do Projeto Iguaçu de Cooperativismo, sete anos depois.  

    Sempre apoiado por Florêncio Galafassi, o primeiro grande feito do religioso como “prefeito” tampão em Cascavel foi coordenar o movimento para a conquista de uma linha regular de aviação.

    Começou em setembro de 1952, dois meses antes da eleição do primeiro prefeito, quando houve uma perseguição policial motorizada pela BR-35, então em obras, que viria a ser a futura BR-277.

    Sofrimento de bandidos motivou aeroporto 

    Um grupo de contrabandistas foragidos de Foz do Iguaçu dirigia-se apressadamente para Cascavel, caçado pela Polícia Militar, e o caminhão em que fugiam tombou, com vários feridos. 

    Diante do sofrimento dos bandidos, alguns em estado grave, sem recursos suficientes para o médico Wilson Joffre atender a todos, o padre perguntou por que Cascavel ainda não tinha um aeroporto com linhas regulares, para facilitar os negócios na região e ter a opção rápida de transporte aos doentes graves.

    “Naquela noite, não dormi, mas fiquei pensando sobre o caso e como formular um plano para conseguir o serviço aéreo civil. (…) Com a Diretoria de Tráfego Aéreo da Real estudei o plano de voos que ligassem Cascavel a São Paulo. Foi determinado que Cascavel fosse servida com quatro voos por semana” (padre Luiz Luíse).

    A linha regular de aviação, cujo voo inaugural se deu em 11 de janeiro de 1953, era feita por um avião Douglas DC-3, “com seus dois motores radiais que expeliam fogo e fumaça quando eram acionados” (Elcio Zanato, Cascavel, A Grande Conquista).

    Quem será o primeiro prefeito?

    Um mês antes da primeira eleição municipal, em 10 de outubro de 1952, o padre Luiz levou a estátua de Nossa Senhora Aparecida em procissão até a atual localização da Catedral de Nossa Senhora Aparecida e ali declarou fundada “a nova cidade de Cascavel”.

    Ele considerava “nova cidade” o Patrimônio Novo, cujos lotes o primeiro prefeito iria vender para custear os serviços municipais. Em 9 de novembro de 1952, finalmente, Cascavel elegeria o prefeito e a igreja localizada no Patrimônio Novo facilitaria à Prefeitura vender terrenos para custear os serviços municipais. 

    A campanha eleitoral se desenvolveu em clima de grande emoção. O farmacêutico Tarquínio Joslin Santos tinha visível maioria na cidade, onde era mais fácil votar, e o agropecuarista Neves Formighieri se destacava no interior. Parecia uma eleição já resolvida em favor do estimadíssimo farmacêutico.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Írio Manganelli, um marinheiro em terra firme

    Írio Manganelli, um marinheiro em terra firme

    Um dos mais importantes marcos da formação da chamada Rota Oeste foi a vinda dos primeiros colonos de Criciúma (SC), em 1952, para o interior do Município de Foz do Iguaçu. Transcorreram dois anos entre o projeto, iniciado em 1950, e a execução, curso no qual se destacou a capacidade organizativa de Írio Manganelli.

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    Nascido lá mesmo, em Criciúma, em 1922, Manganelli só não conseguiu dar o nome da cidade natal ao novo lugar porque tensas batalhas pela terra fariam prevalecer a conciliação sugerida pela medalha que Silvino Dal Bó ganhou da avó italiana, com a efígie de Santa Terezinha.

    Marinheiro desde os 14 anos, Írio trabalhava no navio Cruzador Bahia I, que veio a naufragar logo depois que ele deixou o serviço na embarcação. Chamado para combater na II Guerra Mundial, por quase dois anos serviu em um navio da VI Esquadra Americana como operador de radar.

    Professor de Inglês, jogador de futebol e basquete, foi chamado a trabalhar no projeto de uma empresa colonizadora de Veranópolis (RS) que tinha Silvino Dal Bó à frente (https://x.gd/BC7mq). 

    Nas funções de agrimensor, Írio foi encarregado pela medição de 5,5 mil alqueires pertencentes à Colonizadora Criciúma, dando assim início à formação de Santa Terezinha de Itaipu.

    A cidade começou a partir de 1º de maio de 1952, após a vinda das primeiras famílias trazidas pela Colonizadora Criciúma, determinando a abertura da picada que Írio Manganelli batizou com a data, origem da Rua 1º de Maio.

    Um eficiente organizador

    A medição de terras foi apenas uma das diversas tarefas que Manganelli veio a cumprir. Além de dar feição à colônia no aspecto geral, empenhou-se em criar a infraestrutura econômica e social necessária para facilitar a vida e os negócios das famílias que chegavam.

    De imediato elas pediam escola para os filhos, recreação para os jovens e igreja para seus cultos. Conhecendo cada um que chegava, nas eleições de 1960 Írio se elegeu o vereador mais votado no Município de Foz do Iguaçu.

    Lá, sua capacidade logo prevaleceu, levando-o à presidência da Câmara em 1962, período em que contribuiu para iniciar o asfaltamento da Avenida Brasil e viabilizar a Usina Elétrica do Ocoí, quando Itaipu sequer era um sonho.

    Ter um de seus fundadores no comando do Município de Foz do Iguaçu era o ponto alto de uma comunidade que se impôs em meio a muitas dificuldades. 

    A área havia sido requerida por Miguel Matte em 1925, declarando o interesse em explorar a produção de erva-mate e madeira, mas o título de posse só saiu depois da Revolução de 1930. 

    Sem meios para cumprir as obrigações exigidas, em 1949 a área foi vendida ao paulista Lourenço da Silva, que dividiu a grande propriedade em lotes menores para revenda.

    Um desses retalhos, de 6,5 mil alqueires “compreendidos entre as terras da Colônia Militar de Foz do Iguaçu até a Gleba Santa Maria e da Linha Telegráfica, Estrada Velha, até a Gleba Passo Cuê”, teve a escritura pública lavrada em Mafra (SC), mais tarde transcrita pela Colonizadora Criciúma no Registro de Imóveis de Foz do Iguaçu como área de 15.730.000 m².

    Área com posseiros desde a Colônia Militar

    A Colonizadora Criciúma dividiu a propriedade em lotes de 40 alqueires. A fórmula da venda era similar à de outros projetos: uma entrada para confirmar o interesse real em utilizar a área e o restante parcelado.

    Motivadas, começavam a chegar em caravanas as famílias Dotto, Acordi, Smânia e Manente, dentre outras. Antes deles, entretanto, posseiros autorizados pela Colônia Militar do Iguaçu já haviam iniciado propriedades na região, sobretudo a partir de 1934, como os eslavos Teófilo Kukul e Adão Kultz, cada qual em uma das margens do Rio São João, autorizados pela Prefeitura.

    Importantes pioneiros anteriores à chegada dos colonos de Criciúma foram ainda Bernardino Jorge Velho, famílias Arenhart e Peters, Evaldo Wandscheer, Francisco Scherloski, João Alves Amaral, João Ansoategui, Leonardo Pavlak, Luciano Jakuboski, Ludovico Kalicheski, Raymond Robert de Blasset e Leonardo Wichoski.

    A família Wichoski, aliás, é uma das mais representativas da odisseia que foi a formação colonial do Oeste, destacando-se também como um dos esteios iniciais da comunidade de Cascavel.

    Paz com os índios da região 

    O carroceiro Leonardo e a esposa Helena Eufrásia Wichoski, recém-casados, vieram em 1928 de Itaiópolis (SC) para a região de Cascavel, cidade que ainda não existia, trazendo os filhos Vítor, Rosa, Maria e Justina.

    Com seu carroção puxado por burros, Leonardo fazia o transporte dos produtos coloniais das famílias Elias/Schiels e agregados que desde 1922 já estavam instaladas em propriedade rural no Cascavel Velho. 

    A família Wichoski tem ainda o mérito significativo de ter iniciado a primeira serraria cascavelense. Funcionando junto ao pequeno salto do Rio Cascavel e movida a roda d’água, já serrava madeira logo após a Revolução de 1930.

    De tanto percorrer o Oeste com seu carroção, Leonardo estudava oportunidades e uma das melhores lhe apareceu em 1939, quando requereu a posse de 200 alqueires junto à nascente do atual Rio Guabiroba, onde se estabeleceu e nasceram os filhos Matilde, Ilda, Regino, Terezinha e Adão. 

    Leonardo protagonizou ali, ao lado de outros 60 colonos que vieram logo em seguida, uma cena típica do velho Oeste norte-americano. Havia dezenas de índios na região da atual Santa Terezinha de Itaipu quando ele começou a ocupar a área. 

    “Naquela época, era só entrar no mato adentro e ocupar a terra”, contou ele ao jornal Nosso Tempo, de Foz do Iguaçu. “Isto aqui era terra da União por ser faixa de fronteira. Muitos colonos fizeram o mesmo. Eu escolhi este lugar. Desmatei, preparei a terra e comecei a plantar”.

    Ao contrário do velho “far west” dos EUA, porém, nem foi atacado nem atacou os índios. Seus dissabores viriam bem depois, com a colonização empresarial, que veio acompanhada pelo jaguncismo. 

    Jagunços eram os cobradores

    Com a família trabalhando a terra, Leonardo continuava eventualmente a fazer transporte de mercadorias e materiais de construção, servindo às obras do Hotel Cassino, Hotel das Cataratas e a Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu, por exemplo.

    Quando a Colonizadora Criciúma começou a aplicar seu projeto de minifúndios, em 1952, fixando para cada posseiro 5 ou 10 alqueires para cada família, conforme a área que já haviam desmatado, com possibilidade de outro tanto a preços e condições de pagamento mais favoráveis, Wichoski e outros posseiros mais antigos não concordaram (Sebastião Francisco da Silva, Na trilha dos pioneiros). 

    “O processo colonizador dessa área envolveu tanto as companhias colonizadoras, como os jagunços, posseiros, colonos e grileiros que, em muitos casos, utilizaram-se da violência física ou moral para se apossarem da terra ou defenderem suas propriedades, ou o que consideravam serem os seus domínios” (Angelo Priori et alia, História do Paraná: séculos XIX e XX).

    Quando os jagunços entraram em cena, agindo como cobradores da colonizadora, muitos pequenos posseiros se assustaram. “Um dia vieram uns fiscais. Queriam cobrar a renda da ocupação da terra, pois nós éramos considerados posseiros. Começou uma demanda. A colonizadora chegou querendo tirar a gente da terra. Vieram os empregados com espingardas 12, prontos para matar os bandidos, como eles diziam (…) Havia 60 posseiros. A Criciúma botou para fora da terra 59. Só sobrou eu” (Leonardo Wichoski, depoimento ao jornal Nosso Tempo).

    20% do que tinham 

    Os Wichoski, muita briga depois, conseguiram manter 40 alqueires dos 200 que haviam requerido em 1939. Alguns filhos ficaram na propriedade, outros mudaram para a sede, Foz do Iguaçu. 

    O filho Vítor preferiu morar em Cascavel e Matilde acompanhou o marido ao Paraguai. A mãe Helena morreu em 1981 e o pai Leonardo dez anos depois, sem jamais esquecer o que sofreu sob a pressão dos jagunços armados.

    Em Santa Catarina, houve a tentativa do governo Esperidião Amin de resgatar como herói a figura do jagunço, por meio do Projeto de Identidade Catarinense, tomando como referência a resistência dos fanáticos religiosos e monarquistas do interior catarinense à força militar paranaense no caso do Contestado. 

    No entanto, a negatividade do termo – a palavra “jagunço” tradicionalmente designa pessoas que portam armas ostensivamente – levou o projeto ao esquecimento. Justamente por isso, o reconhecimento de arbitrariedades cometidas por jagunços da Colonizadora Criciúma impediu que o nome dela permanecesse também como o nome da vila e da cidade que prosperaram depois, em tempos pacíficos. 

    Assim, já em 1959, na criação do distrito, prevaleceu a piedosa medalhinha da família Dal Bó com a efígie de Santa Terezinha. Exatamente o nome da filha mais nova de Leonardo, nascida ali mesmo nos tempos do jaguncismo, quando o lugar ainda era conhecido como “Vila Criciúma”. 

    Fonte: Fonte não encontrada

  • General se impressionou com os negócios na fronteira

    General se impressionou com os negócios na fronteira

    Criada em 1939, a Comissão Especial da Faixa de Fronteiras revelou em janeiro de 1952 preocupação com os inúmeros pedidos de cessão de terras e abertura de negócios em Foz do Iguaçu e outras comunidades fronteiriças.

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    A CEFF era uma espécie de superprefeitura nacional das regiões limítrofes, cabendo-lhe a tarefa homologatória dos pedidos encaminhados. Nessa época sob o comando do general Cyro Espírito Santo Cardoso, cabia à Comissão de Fronteiras a fiscalização das operações com terras públicas e privadas,

    Além de examinar conflitos de jurisdição de terras e conceder permissão para a exploração de bens minerais, cabia à Comissão autorizar a instalação de estabelecimentos comerciais, industriais, agrícolas, de colonização e negócios em geral em sua área de jurisdição.

    Paranaense da Lapa, em julho de 1922, aos 34 anos, Cyro já se destacava como instrutor da Escola Militar do Realengo, que orientou a se integrar ao movimento revolucionário tenentista. Por conta disso, foi preso e condenado a um ano e quatro meses de prisão. 

    Parecia sem futuro quando a anistia recebida com a revolução bem-sucedida de 1930 o levou à direção da Escola Militar de Resende, ali permanecendo até 1950, quando assumiu o comando da 10ª Região Militar em Fortaleza (CE). 

    Já no governo constitucional de Getúlio Vargas, iniciado em janeiro de 1951, foi chefe de gabinete do presidente e ali estava quando, em sua sessão do dia 28 de janeiro de 1952, a CEFF decidiu enviar ofício ao Serviço de Patrimônio da União confessando estar “impressionada com o grande de número de pedidos de concessão de terras na faixa de fronteiras”. 

    Recomendava que nos contratos fosse incluída cláusula obrigando os concessionários a fazer o aproveitamento racional das terras no prazo de três anos, “sob pena de caducidade* das concessões”.

    *Caducidade: decrepitude, velhice incapacitante; neste caso, extinção. 

    Vivendo o tumulto da Era Vargas 

    Cyro saltou do gabinete de Vargas para o Ministério da Guerra, até o tenso mês de fevereiro de 1954, quando foi exonerado do cargo depois da divulgação do Manifesto dos Coronéis, que também derrubou o ministro do Trabalho, João Goulart.

    Os oficiais protestaram contra a elevação do salário mínimo em 100%, negociada por Goulart, queixando-se das manobras para dividir os militares e dos escassos recursos para as necessidades militares do país. Em tempos de redes sociais eles seriam atropelados pela reação popular, mas na época abalaram o governo, tanto que Vargas se suicidou em agosto.

    Deslocado para a diretoria de Ensino do Exército até o final desse 1954, foi para o comando da 4ª Região Militar, em Juiz de Fora, até o início de 1956. Retornou-se ao Rio de Janeiro em março de 1956 como diretor-geral do Serviço Militar e em dezembro foi para a diretoria-geral de Material Bélico, ali atuando até maio de 1957.

    Sua última função de relevo foi comandar o IV Exército, em Recife, até 1959, coroando a trajetória de um dos militares paranaenses mais influentes na transição da ditadura Vargas para a redemocratização. Cyro Espírito Santo Cardoso morreu em 1979.

    O espanto da Comissão de Fronteira no caso dos inúmeros pedidos de concessão de terras e permissão para a abertura de negócios no Município de Foz do Iguaçu tinha muito a ver com uma conjugação de acontecimentos: o fim da ditadura Vargas, com a eleição do prefeito pelo voto, a extinção do Território Federal do Iguaçu e o interesse do Estado do Paraná em retomar o controle de suas devolvidas regiões Oeste e Sudoeste para impedir a volta do TFI.         

    Por conta desses fatos, um novo plano estadual de rodovias estava em elaboração na capital e teria impacto positivo determinante para o futuro do Oeste. 

    Estradas, eterna preocupação

    O esforço viário começa com reparos na estrada principal da rodovia que é hoje a BR-277. Havia sido improvisada, ainda em 1951, uma variante para permitir o tráfego alternativo entre Cascavel a Foz do Iguaçu, que explica o aumento da fluência de colonos ansiosos por obter terras na região.

    Também partindo de Cascavel, Manoel Ludgero Pompeu (1888–1966) formava turmas para abrir estradas a partir do tronco principal. 

    “Juntamente com o falecido Pompeu, fiz a estrada que vai do Tamoio 1 até a Foz do Piquiri, no muque. Esta estrada que passa no Brasmadeira, na Melissa, Meia Lata, Central Santa Cruz, Bananeira, Cafelândia – cujo nome era Caixão –, depois Anta Gorda, Roda de Carro, fomos nós que abrimos” (Aladin de Souza Leal, Prisma Cascavel, 10/2/1995).

    Ao passo em que evolui lentamente a estrutura de transportes no interior do Paraná, também cresce o fluxo de passageiros no transporte fluvial e, com o aumento da população e a circulação de riquezas, o contrabando e a criminalidade.

    Para reforçar a patrulha na fronteira, em 31 de julho de 1951 a Capitania dos Portos festeja em Foz do Iguaçu o recebimento da lancha-patrulha Iguaçu. A embarcação faz uma longa viagem até ser incorporada à estrutura de vigilância da fronteira: transportada em navio mercante que parte do Rio de Janeiro, segue até Montevidéu, onde é lançada às águas do Rio da Prata, navegando pelo Rio Paraná até chegar ao destino.

    Migração produz colônias e cidades  

    O Paraná se enche de pequenos povoados e cidades no interior e os núcleos mais antigos se consolidam. 

    No Oeste, a colonizadora gaúcha Maripá procura atrair os colonos oferecendo assistência médica, abrindo escolas e templos religiosos. 

    “A Companhia contratou um médico, construiu e equipou um hospital em Toledo (Casa de Saúde e Maternidade de Toledo) e ajudou a construir outro em Marechal Cândido Rondon (Hospital e Maternidade Filadélfia). Construiu escolas, pagava salário aos professores” (Valdir Gregory, Os Eurobrasileiros e o Espaço Colonial – Migrações no Oeste do Paraná [1940-1970]).

    A colonizadora de Toledo vai além: contrata o agrônomo curitibano Rubens Stresser (1926–2011) para formar um sítio experimental e promover experiências com variedades de trigo, fumo, oliveiras e árvores frutíferas.

    Era a retomada do fio da meada interrompida pela desistência dos ingleses de prosseguir com o projeto da Fazenda Britânia, onde experimentos agroindustriais resultaram até na exportação do petit grain (extrato de apepú – ver em https://x.gd/mqblV).

    O esperto Almeida

    Cascavel tinha uma subprefeitura de Foz do Iguaçu e em Toledo a colonizadora e madeireira Maripá dirigia a comunidade. Em Guaíra, tudo girava em torno do porto e na sede, Foz do Iguaçu, com a democracia recém-descoberta, tudo passava pela Câmara Municipal. 

    Naquela época, o Poder Executivo nos municípios não era tão dominador quanto na União e nos estados. As câmaras eram de fato centros de legislação e debates estratégicos e não meros apêndices das prefeituras.  

    As sessões legislativas de janeiro de 1952 em Foz do Iguaçu foram marcadas por um intenso debate a respeito de como deveria ser regulamentado e recolhido o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). 

    Em campos opostos, o vereador iguaçuense Moacir Pereira criticava a má redação e a inconstitucionalidade do projeto de cobrança do IPTU remetido à Casa pelo prefeito Francisco Guaraná e o vereador Sadi Vidal defendia a lei como forma de combater os terrenos baldios. 

    Coube ai vereador Antônio Rodrigues de Almeida, do Distrito de Cascavel, apresentar uma fórmula conciliadora, determinando em substitutivo que só pagariam (1% do valor venal) os imóveis “de mau aspecto”, que depunham “contra a paisagem urbana”.

    Almeida foi elogiado por sua “esperteza”, já que na determinação do valor venal não entravam benfeitorias tais quais os muros, as cercas e as calçadas: taxar com maior valor os imóveis com benfeitorias seria um incentivo ao desleixo. 

    Como quem melhorasse o aspecto dos imóveis, valorizando-os, não pagaria imposto, estimulavam-se os cidadãos a melhorar o aspecto da cidade, no melhor espírito do IPTU desde sua formulação. Foi o fim dos debates: o substitutivo de Almeida foi aprovado por unanimidade.

    O esquecido Almeida

    Almeida, fundador do Tuiuti Esporte Clube, além de vereador também foi delegado de polícia em Cascavel. Ligado à família Pompeu, seu nome foi esquecido por uma falha cometida pela Prefeitura que a Câmara Municipal, por desatenção, jamais corrigiu.

    Em entrevista gravada, o pioneiro e ex-vereador Jacob Munhak declarou que antes da criação do Município ia verear na Câmara de Foz do Iguaçu em companhia de Antônio Almeida, mas na degravação (transcrição da entrevista para texto) o nome de Antônio Almeida foi grafado como “Antônio Leivas”.

    Para homenagear os antigos vereadores e lhes dar nomes de ruas, a Prefeitura encaminhou à Câmara projeto de lei com o nome “Antônio Leivas” quando na verdade deveria ter encaminhado “Antônio Almeida” ou, completo, Antônio Rodrigues de Almeida. 

    Por conta disso, a Rua Antônio Leivas passou a homenagear alguém que nunca existiu em Cascavel e Antônio Almeida, personagem histórico, ficou ignorado. O erro nunca foi corrigido e a rua, no bairro Santa Felicidade, continua com o nome errado.

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