Com a vitória na “Guerra de Porecatu”, na primavera de 1950, os posseiros que chegavam ao interior do Paraná passaram nas regiões Norte e Oeste do Paraná a receber lotes legalizados e sem mais jagunços mancomunados com a polícia estadual.
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Na grande conciliação promovida para desmobilizar os jagunços das colonizadoras e inibir o levante armado dos posseiros, “as terras de primeira qualidade, apropriadas à cultura de café na região de Porecatu, ficaram mesmo em poder dos fazendeiros” (Elpídio Serra, Processos de ocupação e luta pela terra agrícola no Paraná).
Depois, ambicionando a Presidência da República, Munhoz da Rocha cometeria o erro de abandonar o Estado para assumir um Ministério no precário governo federal sob ataque e abriu o caminho para o retorno de Moysés Lupion. E do jaguncismo.
Mas no início dos anos 1950 o interior do Paraná, especialmente nas regiões Oeste e Sudoeste, ainda tinha amplas faixas de terras de alta qualidade para posse, aquisição junto ao Estado e projetos de empresas colonizadoras.
É nesse contexto que se dá o processo de colonização de Corbélia, em área pertencente ao Distrito de Cascavel, Município de Foz do Iguaçu, iniciado no segundo semestre de 1951.
Essa nova frente de colonização é empreendida pela Fundação Paranaense de Colonização e Imigração, que contrata Armando Zanato (1907–1973) para procurar entendimentos com os posseiros da região relativos à demarcação e promover a venda de terras.
O desafio postes x fios
Em Toledo, ocorre a colheita dos frutos da estruturação do modelo de negócios da empresa Maripá, combinando a colonização com a exploração da madeira. É assim que cerca de 1.500 colonos chegam à antiga Fazenda Britânia, onde brotam as colônias Dez de Maio, General Rondon, Novo Sarandi e Quatro Pontes. O Oeste assiste ao germinar de dezenas de vilas e cidades.
A população de Foz do Iguaçu, no entanto, demonstrava inconformismo com as dificuldades de comunicação, que não acompanharam as melhorias no transporte.
A fronteira ainda estava mais integrada a Buenos Aires, pela generosa estrada fluvial do Rio Paraná, que a Curitiba, acessível apenas por longas e incertas viagens nos períodos de chuvas.
A linha telegráfica que deveria acompanhar a rodovia principal estacionou em Guarapuava. Sobrou para Foz do Iguaçu apenas um telégrafo rudimentar, herança da antiga Comissão Estratégica.
O telégrafo tinha na época o mesmo significado do acesso à internet. Era a única forma de estabelecer comunicação imediata em tempos nos quais o Correio demorava semanas para entregar uma carta.
Mas as linhas eram feitas de postes e fios. Tomadas pelo mato, caíam muito e os reparos demoravam. Os líderes iguaçuenses exigiam que uma linha desmatada e protegida se estendesse até a fronteira com a máxima urgência.
No entanto, perceberam que não dispunham de força política para garantir a conquista de imediato. O governador Bento Munhoz só garantiu a colocação dos postes e a extensão dos fios até Cascavel.
Nas negociações entre o governo e as lideranças de Foz do Iguaçu, destaca-se a personalidade forte e ousada de um italiano que lidera o embrião de uma forte entidade representativa da força da comunidade: a Associação Comercial e Industrial de Foz do Iguaçu (Acifi).
Pedro Basso, que durante a II Guerra foi ameaçado de ser expulso da fronteira, não aceitou a limitação anunciada pelo governador e chamou para si a responsabilidade de unir a população e exigir a rede até Foz do Iguaçu.
Tragédias forjadas pelas guerras mundiais
Nascido na região italiana do Vêneto em 1908, Pedro Basso viu sua família de agricultores sofrer com as terras devastadas durante a I Guerra Mundial. Migrando para o Brasil em 1921, foi trabalhar nos cafezais de São José do Rio Preto (SP).
Da Itália também veio a namorada, Assumpta Gallo, que morava em Presidente Prudente (SP). Depois, em busca de oportunidade melhor, transferiu-se em 1929 para Santa Helena, onde havia um projeto de colonização com italianos pela Companhia Espéria.
Trabalhando duro, Pedro se casou em 1933 e o primeiro filho, Victório, nasceu lá. Com o capital acumulado nas tarefas desenvolvidas até então, em 1938 ele se estabeleceu em Foz do Iguaçu, abrindo uma pensão que recebia principalmente turistas argentinos.
Tudo ia bem, com os bons serviços da pensão prestigiados pelas autoridades que chegavam de outras regiões, até que a II Guerra Mundial eclode em 1939 e em seus desdobramentos vai trazer a Basso o incômodo de entrar na lista de eventuais inimigos da pátria por conta da perseguição aos estrangeiros provenientes de um dos três países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão – ver https://x.gd/dpBwM).
Sendo italiano, ainda tropeçando no idioma português, Pedro Basso sentiu-se muito próximo de perder tudo que havia construído em sua ativa permanência no Brasil.
Expulso com filho recém-nascido
“Os estrangeiros eram proibidos de permanecer na fronteira. Meu pai, sendo italiano, tinha que ir embora de Foz do Iguaçu” (Irineu Basso, jornal Gazeta do Iguaçu, 27/06/93).
Aos 34 anos, com a esposa Assumpta acabando de dar à luz o filho Irineu e com Victório ainda pequeno, sair de Foz do Iguaçu para o isolamento em Guarapuava seria muito difícil para a família.
O absurdo da inclusão de Basso na lista dos estrangeiros suspeitos é que em seu Hotel Três Fronteiras se hospedavam no período da guerra o delegado de polícia, o promotor público e família, além de outros funcionários governamentais.
Mesmo assim, Pedro teve seu rádio receptor tomado pela polícia para ser impedido de ouvir emissoras estrangeiras com notícias censuradas sobre a guerra.
Depois de muitas reclamações, teve o rádio devolvido e recebeu por fim autorização do Exército para permanecer, “porque as autoridades utilizavam muito seu hotel e restaurante”, contou Irineu.
Depois, a família abriu um estabelecimento comercial que vendia de tudo: tecidos, secos e molhados e armarinhos. Em seguida veio o cinema, o Cine Star, em 1951, que funcionou até 1980.
Cinema, futebol e muita briga
Italiano turrão, fundador de um clube de futebol – o Flamengo local –, Basso frequentemente entrava em campo para brigar ao lado dos filhos com os adversários nas frequentes confusões dos jogos sem VAR nem árbitros formados.
“Todos os jogos tinham brigas. Certa vez, Pedro Basso entrou uma briga feia no campo do ABC. Os filhos dele (Irineu e Victório) entraram na briga também, e o Victório escapou de ser morto porque o camarada adversário puxou a arma e ela não detonou. Era um soldado do Exército” (Kid Chocolate, Gazeta do Iguaçu, 1994).
Irineu, que a exemplo do pai também presidiu o Flamengo iguaçuense, decidiu encerrar as atividades com o futebol depois de uma grande confusão envolvendo facas, facões e espetos de churrasco.
“Vi a morte na frente. Era espeto, faca e facão estrilando por todos os lados. Cheguei em casa, esfriei a cabeça, chamei meu filho e disse: olha, para mim chega de futebol”.
Já fortalecido como empresário e a família consolidada, em 1951 o líder comunitário Pedro Basso desafiou o governador bento Munhoz da Rocha, comprometendo-se a plantar todos os postes entre Foz do Iguaçu e Cascavel se as autoridades prometessem estender os fios sobre eles.
A conquista do telégrafo
Era uma proposta incomum, abrindo campo a uma parceria público-privada inédita. “Pedro Basso apelou então para todos os segmentos da sociedade e levantou em apenas 35 dias o posteamento necessário para este fim” (João Adelino de Souza, revista Memória).
Esse movimento comunitário deixa um fruto: a Associação Comercial e Industrial de Foz do Iguaçu (Acifi), que futuramente seria presidida pelo filho Victório, também eleito vereador.
Pedro Basso morreu em 1961, com 58 anos, vitimado pela doença de Chagas, já reconhecido como um dos heróis da fronteira.
Enquanto Foz do Iguaçu se mobilizava para trazer o telégrafo, tudo continuava difícil em Toledo, que só contava com um precaríssimo acesso rodoviário.
Nesse isolamento, uma surpresa tomou conta dos colonos que transitavam no centro da vila: algo caiu do céu. Na rota de Cascavel, o avião NA, do Correio Aéreo Nacional, acabara de dar um voo rasante sobre a vila, já com cinco anos de existência.
Dele se desprendeu um pacote misterioso. Os encantados pioneiros toledanos que observam a passagem do avião correm em direção ao pacote e ao abri-lo encontram um exemplar da revista O Cruzeiro e dois jornais curitibanos daquele mesmo dia.
Enquanto o avião monomotor continuava sobrevoando a vila, eles acenavam agradecidos e felizes aos tripulantes, que não tinham como pousar na mata fechada, sem ao menos um campo de pouso improvisado. Aquele gentil pacote vai motivar nos toledanos o desejo ardente de construir um campo de aviação.
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