Autor: Alceu Sperança

  • Cultura, saúde, caminhos, desafios

    Cultura, saúde, caminhos, desafios

    As interações sociais das famílias Galafassi, Lopes, Pompeu e Paim, ao se entrelaçar com muitas outras ao longo de sua trajetória na região, são encontradas em raras outras famílias vindas para a vila de Cascavel  até o final da década de 1940 porque a maioria dos novos moradores seguia para posses no interior, das quais seriam expulsos por jagunços, negociariam transferência aos moradores da vila já com acúmulo de capital ou desistiriam devido às dificuldades de infraestrutura.

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    A numerosa família Villaca, como outras que também conseguiram se instalar em chácaras próximas à vila, concentrou-se em uma área rural caracterizada por belos pomares nos arredores de Cascavel.

    Pela proximidade, a poucos minutos de carroça até a vila, em breve os domínios da família Villaca seriam incorporados ao perímetro urbano.

    Em 1947, já haviam chegado Francisco e Luíza Villaca, trazendo vários de seus doze filhos, provenientes de Candói (https://bityli.com/05vVvP), região de onde também vieram os pioneiros José Silvério de Oliveira, Manoel Ludgero Pompeu e João Turrok.

    Os filhos de Francisco

    Em junho de 1948 chegava mais um filho de Francisco, o agricultor Euvídio Ferreira Villaca, trazendo a esposa Alexandrina Maria, cujos filhos por sua vez tiveram sempre destacada participação na sociedade cascavelense.

    Safrista, Euvídio veio para trabalhar com a criação de suínos e se instalou, como outros familiares já chegados, na região que no futuro viria a ser o bairro Cancelli.

    Euvídio foi um dos agricultores que se reuniram para formar a Associação Rural de Cascavel, iniciada por Tarquínio Joslin dos Santos em 1953. 

    Pioneiros em vários setores, como no setor de saúde, os Villaca também estiveram presentes nas primeiras manifestações culturais, na música e na comunicação radiofônica.

    A partir dos anos 1960, Darci Israel dominou os ares com sua arte, mas a música ao vivo irradiada em Cascavel começou com a dupla “Villaca & Brizola” (o primeiro ao violão e o segundo na sanfona), que abriram caminho a outras duplas e trios musicais, um deles o Trio Coração de Ouro, de Israel.

    Aliado ao famoso sanfoneiro Brizola, o violeiro era Enezon Subtil Villaca, um multi-instrumentista, filho do rezador* Francisco e da parteira Epiphânia. A própria família Villaca tinha sua própria banda, formada por violão, sanfona e outros instrumentos.

    *Rezador era o farmacêutico prático que atendia doentes com ervas e compostos. Usava rezas e passes para reforçar a cura com a fé dos enfermos

    Os trabalhadores da Imapar

    Além dessas famílias, as campeãs em interação com a comunidade regional, as que mais viriam a tecer relações de parentesco e associações com as demais famílias já radicadas em Cascavel e Foz do Iguaçu foram os núcleos familiares formados pelos trabalhadores trazidos pela Industrial Madeireira do Paraná, contratados na fronteira por Renato Festugato e em Cascavel por Florêncio Galafassi.

    Januário Machado Portinho chegou a Foz do Iguaçu em setembro de 1949 já tendo como destino as tarefas que iria desenvolver a serviço da empresa.

    Gaúcho de São Luiz Gonzaga, aos 24 anos, sua função, como gerente de transporte, de oficina e máquinas pesadas, era fazer a madeira chegar das serrarias de Cascavel e ser depositada às margens do Rio Paraná, onde as cargas eram colocadas em barcos e chatas para seguir à Argentina.

    “O forte mesmo era o pinho. Tinha algumas madeireiras que exportavam em toras canela, magaratuva, peroba, todas essas madeiras de lei que existiam na região e que hoje não tem” (Januário Portinho, Foz do Iguaçu – Retratos).

    “Nós tínhamos mais ou menos 180 empregados. Essa madeireira tinha uma vila perto do Batalhão, dava casa para os empregados” e no futuro viria a ser o Jardim Festugato.

    Cada jornada de transporte era uma aventura diferente, pelas dificuldades do trajeto, na estrada velha de Guarapuava.

    O caminho, na verdade, era uma coleção de diferentes estradas carroçáveis do passado, cujos piores trechos eram atacados pelo poder público para garantir melhor trafegabilidade.

    “Esta estrada, longa e sinuosa, sem cortes ou aterros e sem sol, era um dos principais obstáculos para o escoamento da produção que crescia em progressão geométrica”, segundo Roberto Côco Grinet, que também trabalhou na Imapar.

    “De 1948 em diante, foram largamente empregados os caminhões Ford F-6, F-7 e F-8 valentes nos atoleiros e nas picadas por onde andavam até chegar ao ponto de carregar os porcos” (Elcio Zanato, História de Corbélia).

    Comida argentina, gasolina curitibana

    Nas ruas e perto das vilas, o Jeep era o novo “cavalo” dos pioneiros. Depois do antigo “Fordeco” de Nhô Jeca Silvério, o primeiro automóvel a circular pelas clareiras do distrito iguaçuense de Cascavel, ainda em 1948, foi um Jeep* de Florêncio Galafassi.

    Portinho contou que saía pela manhã com seu Jeep e chegava a Cascavel pouco depois do meio-dia, mas a volta acompanhando o caminhão carregado nunca seria tão rápida, demorando entre 16 e 17 horas.

    Não havia fornecedores locais na região. Pelo rio, chegavam alimentos em latas e conservas vindos de Buenos Aires. O que não vinha da Argentina era preciso trazer de Curitiba.

    “A gasolina que nós usávamos para nosso consumo, nossos caminhões, era tudo transportado em tambores. Nós tínhamos quatro caminhões permanentemente viajando daqui para Curitiba buscando gasolina e material”.

    Quando a Imapar se transferiu toda para Cascavel, nos anos 1960, Portinho, a esposa Lilita da Fontoura e os filhos Paulo e Leila preferiram continuar em Foz do Iguaçu e desenvolver negócios próprios, com pneus, combustíveis, turismo e pequenos negócios com madeira.

    *Jeep era marca da indústria Willys, mas carros similares eram também chamados genericamente de “jipes”.

    Madeireiros e ação social

    O pessoal que trabalhou na fronteira a serviço da Industrial Madeireira do Paraná veio de diversas origens. Roberto Côco Grinet era argentino, nascido em San Tomé (Corrientes), e desde os 17 anos já vivia em Foz do Iguaçu, onde aos 19 começou a trabalhar na Imapar e pouco depois se casaria com Vicentina Requião, o casal tendo três filhos.

    Grinet destacou a participação de Flávio Azambuja Marder na administração da madeireira, que a seu ver “representou o que de mais moderno existiu naquele momento no Sul pais, sucedendo a empresa paranaense M. Lupion – que iniciara a indústria extrativa vegetal (pinho) vários anos antes” (Foz do Iguaçu – Retratos, 1997).

    Além de modernizar e ampliar as instalações portuárias de Foz do Iguaçu, a Industrial Madeireira do Paraná “representou muito para o desenvolvimento de Foz, tanto que houve um momento em que muitas decisões comunitárias só foram tomadas depois de ouvida a direção”, segundo Grinet.

    “A madeireira também fez atendimento social. Não só aos seus funcionários, mas também à comunidade, tendo inclusive, distribuído cortes de casas populares de madeira de pinho aos necessitados”.

    Nesse sentido, a Imapar avançou na concretização dos planos da família Lupion, que agora concentrava esforços para chegar ao Congresso Nacional por meio de seu agente político, o governador Moysés Lupion.

    No interior do distrito de Cascavel, novas frentes de colonização se abriam pela iniciativa de colonos que não só adquiriam terras, mas também se dedicavam a ações de infraestrutura.

    Neste caso, um dos exemplos mais destacados foi o de Eugênio Kluska, que se meteu no mato com a família ainda em 1948 na região da Corbélia de hoje, então pertencente a Cascavel, construindo estradas e pontes, escolas e igrejas, só adquirindo terras na região quatro anos depois de sua chegada, para constituir lavouras.

    O eterno problema da infraestrutura

    Famílias chegando em várias frentes só pensavam em trabalhar, mas as crianças cresciam, precisavam de escola e se a juventude geral dos aventureiros não trazia problemas de saúde influenciados pelo transcorrer da idade, acidentes com cobras eram frequentes nas lidas na mata.

    Sem médicos nem postos de saúde e raras farmácias em Cascavel e Foz do Iguaçu, os pioneiros levavam seus doentes em penosas viagens de carroção em busca de um dos rezadores afamados, como Francisco Chico Villaca, que foi aprendiz do monge João Maria do Contestado.

    Em 1948, no bojo de interesses eleitorais do clã Lupion, foi lançado um plano de obras para a saúde pública, visando aparelhar as unidades sanitárias existentes nos municípios.

    “Nessa época, ainda, lançaram-se campanhas de vacinação e de combate à malária, à doença de Chagas, à lepra e à tuberculose. É interessante notar que, no discurso dos governadores, nesses anos, há uma tendência a atribuir parte dos novos problemas a características da população que chega, fazendo do Estado um herdeiro dos problemas do Brasil” (Demian Castro, Mudança, Permanência e Crise no Setor Público Paranaense).

    Os problemas, via de regra, eram atribuídos a quem chegava, mas as soluções vinham sempre anunciadas como presentes e virtudes do governo. De qualquer forma, boa base da futura organização do Estado começou de fato com Lupion.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Galafassi: uma saga vitoriosa e um crime insolúvel

    Galafassi: uma saga vitoriosa e um crime insolúvel

     

    Não foi por acaso que Florêncio Galafassi recebeu o chamado de Renato Festugato em 1948 para se juntar ao ambicioso projeto de absorver as serrarias e os amplos pinhais da família Lupion em Cascavel.

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    Galafassi começou a se tornar uma lenda na indústria madeireira gaúcha no final dos anos 1920, quando, com a esposa Emília e já as três primeiras filhas nascidas em Bento Gonçalves – Inês, Olga e Adyles –, transferiu-se para Salto, no interior de São Francisco de Paula, região formada pelo tropeiro português Pedro da Silva Chaves.

     

     

    Em Barragem do Salto, abriu uma pequena serraria para explorar os recursos florestais da propriedade e a expandiu adquirindo propriedades vizinhas, seguindo-se a abertura de outras cinco serrarias e o início de um projeto de reflorestamento com pinheiros.

     

    Adquirindo notoriedade como formador de madeireiras, Galafassi recebeu a proposta de se associar a Renato Festugato na Industrial Madeireira do Paraná, que fechava a compra das serrarias e propriedades da família Lupion em Cascavel.

     

    “Sacrato”

    “Quando contaram que esse novo braço da empresa seria sediado em Cascavel, Florêncio disse que nunca tinha sequer ouvido falar do povoado. Mostraram no mapa e ele viu que se localizava no meio de uma imensa floresta”, narra o filho Dercio Galafassi, reproduzindo o diálogo:

    – É aqui, Florêncio.

    – E como faço pra chegar aí?

    – Não te preocupes. Nós vamos te colocar num avião em Porto Alegre. Alguém lá em Cascavel está avisado e vai te esperar, pra tu veres o nosso negócio lá.

    – Mas, sacrato! Nunca entrei num avião!

    “Sacrato” era uma expressão usual de Florêncio para demonstrar surpresa ou incômodo. Tanto falou que acabou tornando-se sua alcunha.

    A empolgante história de Galafassi é narrada em pormenores no livro de Dercio, Saga de Imigrante (https://bityli.com/v5wmgE).

    Ao chegar à pequena vila, a família Galafassi começou a transformar a cidade, estrutural e socialmente, na medida em que os três filhos e as quatro filhas de Florêncio e Emília Galafassi se entrelaçaram em relações de amizade, negócios e também casamentos com a comunidade cascavelense.

    Os sete não puderam acompanhar os pais logo de início pela falta de recursos do lugar, como na educação e os serviços e confortos que já havia no Sul.

    Sete filhos, sete histórias

    Inês casou-se no Rio Grande do Sul com Helberto Edwino Schwarz, nascido em 2 de julho de 1918 em Campo Vicente, no Município de Taquara (RS). Vieram de Canela (RS) para Cascavel a chamado de Florêncio e Emília.

    Helberto passou a ajudar Galafassi na administração da Imapar e foi eleito vereador na primeira legislatura do Município de Cascavel, em 1952, e seu segundo prefeito, em 1956.

    No final da gestão, a Prefeitura sofreu um incêndio criminoso e a família foi assombrada por acusações sem provas de que Helberto teria culpa no sinistro.

    Para preservar a família, transferiu residência para Curitiba e em seguida Brasília, até, reabilitado, retornar a Cascavel, onde morreu em 2009. Ele e Inês tiveram quatro filhos: Sérgio Clóvis, Sauro Cláudio, Carlos Alberto e Maria Emília.

    Olga Carmela, por sua vez, também antes de vir para Cascavel, casou-se com Higino Varisco, nascido em São Sebastião do Caí (RS) em 17 de fevereiro de 1920. Tiveram os filhos Juarez e Joni, que foi deputado federal e secretário de Estado do Emprego e Trabalho do Paraná.  

    Adyles Elzina Galafassi se casou também no Sul, com Adelar Bertolucci, nascido em Canela (RS), em 16 de dezembro de 1928, convidado pelo sogro a assumir a gerência da Imapar. O casal teve três filhos: Victor Hugo, João Carlos e Tânia Mara.

    Adelar Bertolucci se destacou como vereador em dois mandatos, nos primeiros anos do Município. Adyles e Adelar morreram em 2012.

    Sucessos no esporte e na política

    Alcides, um dos filhos de Florêncio e Emília já nascidos em São Francisco de Paula, em 9 de abril de 1932, casou-se com Leonilda Campagnollo, tendo com ela os filhos Florêncio, Maristela, Fernando e Flávio.

    Também atuou no setor madeireiro e na política, mas se destacou no apoio à comunidade católica, como fundador do Seminário Diocesano.

    Dercio nasceu em Salto, São Francisco de Paula, em 23 de julho de 1935. Destacou-se no esporte, na política e na presidência da Acic. Vindo para Cascavel em 1950, casou-se com Darlene Gomes, tendo com ela os filhos Daniel Roberto, Rita Silvana, Edmilson Antônio e Marta Cristiane.

    Darlene veio de uma tradicional família de pioneiros provenientes de São Paulo: o cafeicultor Júlio Gomes Sobrinho e a professora Amélia Melo.

    Amália Galafassi, por sua vez, casou-se com o agente aéreo Lyrio Bertoli. Jornalista ligado a Celso Formighieri Sperança no jornal Correio d’Oeste, Lyrio foi o primeiro deputado federal de Cascavel e região, eleito em 1962.  Tiveram os filhos Lyrio César, Cícero e Wilson Marcelo. 

    Nascido em 1° de Julho de 1933 também em São Francisco, o filho de Florêncio e Emília que ainda permanecia em Caxias do Sul, Danilo, logo também veio para Cascavel, já casado com Marília Oliva Travi, com quem teve cinco filhos: Junior, Milton Luiz, João Augusto, Simone e Lisiane.

    A exemplo de Dercio, Danilo também se destacou no esporte e na política, além do setor imobiliário. Os dois são figuras históricas do Tuiuti Esporte Clube.

    No auge do sucesso 

    Muito bem-sucedido em seus empreendimentos e um líder de influência crescente na região, Danilo tinha grandes planos para Cascavel quando alguém decidiu eliminá-lo.

    Em misteriosa trama que ainda não teve todas as dúvidas esclarecidas, Danilo foi assassinado quando exercia as funções de secretário geral da Prefeitura de Cascavel.

    Em 29 de junho de 1978, dois invasores entraram sem autorização na chácara Recanto Azul Ordaga, de Galafassi, no quilômetro 401 da BR-277, e ao se deparar com Danilo o executaram com seis tiros.

    Enquanto a polícia procurava os pistoleiros, diferentes narrativas disputavam as atenções dos investigadores.

    Ninguém tinha dúvidas sobre ser crime de encomenda, mas nomes diferentes eram sussurrados pelos mais curiosos e conhecedores dos meandros da política cascavelense como supostos mandantes. Para alguns, sobretudo personalidades ligadas à Prefeitura, havia sido um crime passional.

    Para outros, atentos aos tensos ambientes políticos da época, em que murros na mesa e ameaças de morte eram comuns, o mandante foi alguém inconformado com o prefeito Jacy Scanagatta ter escolhido Danilo para candidato a deputado estadual do grupo nas eleições daquele ano.

    Delegado especial

    O governo do Estado se empenhou diretamente na elucidação do caso, devido às pressões sobre a polícia de Cascavel para escolher uma das versões, designando o delegado especial Dorval Simões para comandar as investigações.

    Com a prisão dos pistoleiros Joaquim Batista de Mello, vulgo Gaúcho, e Lóris Luiz dos Santos, o Índio, eles negaram conhecer o mandante, mas confessaram que receberam dez mil cruzeiros cada um de um ex-sapateiro chamado Pedro Oquendo de Oliveira Montanha, alcunhado Pedro Mineiro.

    Montanha, por sua vez, alegou que o mandante havia sido Juarez Junqueira, ex-marido da secretária municipal da Educação, Maria do Rocio Garzuze Santos, e o pagamento teria sido um automóvel Opala marrom.

    Convertendo o carro em 32 mil cruzeiros, Pedro disse que foi a Foz do Iguaçu e lá contratou os dois pistoleiros, aos quais forneceu dois revólveres marca Taurus, calibre 38, e diversas balas, algumas delas explosivas.

    Orientados quando ao endereço e informações sobre como identificar Danilo e matá-lo quando estivesse desprevenido, em sua chácara, a trama incluiu até a morte da cadela de guarda do sítio com carne envenenada.

    Ao se aproximar, viram que Danilo estava na companhia da secretária municipal da Educação, Maria do Rocio, e uma criança, mas não recuaram.

    Danilo, surpreso com a visita inesperada, supôs que fossem pessoas em busca de trabalho. Sem se dar conta de que eles caminhavam com as armas em punho com as mãos às costas, adiantou-se para atendê-los.

    A três metros de distância, Índio desferiu cinco tiros, três no peito da vítima, que rodopiou com o impacto e ao cair foi silenciado de vez com um tiro mortal nas costas, desferido por Gaúcho.

    Era o primeiro episódio de impacto de uma série que se estendeu pelos meses e anos seguintes, até porque nenhuma prova confirmou a participação de Junqueira na trama e a versão de crime político ganhou força.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Paim, um ativo e influente engenheiro militar

    Paim, um ativo e influente engenheiro militar

    Um dos mais precisos memorialistas da colonização da Rota Oeste, Arlindo Mosé Cavalca, recordou que os primeiros sócios da Colonizadora Gaúcha, além dele, foram Alberto e Luiz Dalcanale, Benvenuto Verona e Alfredo Paschoal Ruaro, que deu início ao projeto e seguiu adiante em novas frentes.

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    Para o grupo, era mais um negócio, sem a intenção real de deixar o conforto do Sul, conquistado por décadas de trabalho dos avós e pais italianos desde a chegada ao Brasil, em fins do século XIX.

    Dos primeiros associados à Gaúcha, só Cavalca foi logo morar na região, desviar de cobras e aguentar picadas de mosquitos.

    Em 1949 os diretores da Gaúcha foram Benvenuto Verona, que depois também veio se instalar na região, e Luiz Dalcanale Filho, que a exemplo de Ruaro também repartia as atenções com outros projetos de colonização e atividades correlatas.

    Em lugar de Luiz Dalcanale entrou Frederico Zilio, cuja família é também uma das mais importantes da história da colonização no Sul do Brasil.

    Foi com Bernardo Zílio que Alberto Dalcanale pisou pela primeira vez no solo da Fazenda Britânia, em novembro de 1945. Eles vieram para conhecer e vistoriar a gleba, oferecida pelos proprietários anglo-argentinos, valendo-se do único meio de transporte existente na época: o lombo de burro.

    Gleba da Gaúcha tinha muitos donos

    Apesar de haver vários sócios e diretores da Colonizadora Gaúcha, o primeiro colono a realmente efetivar moradia na região da futura São Miguel do Iguaçu e deixar raízes na economia e na formação do lugar foi a de Vitório de Toni, que acreditou no lugar ainda sem nada.

    Só em 1953 a direção da Colonizadora Gaúcha passou a ser exercida por colonizadores com planos mais estruturados, como Henrique Ghellere, unido ao traquejado Afonso Marin, que em 1946, com sucesso, também começou a formar São Miguel do Oeste (SC).

    A Gaúcha resultava da compra de 9.073 alqueires registrados anteriormente em nome de João Emílio Matte.

    A maior parte dessas terras pertencia originalmente ao Município de Foz do Iguaçu, mas no decorrer dos anos também teve partes transferidas a outros proprietários, como o Banco da Província do Rio Grande do Sul, a Companhia Brasileira de Viação e Comércio (Braviaco), a Caixa Econômica Federal e a União Popular de Venâncio Ayres.

    Criada pelo padre suíço Theodor Amstad, a UPVA tinha a finalidade de incentivar os descendentes de imigrantes a promover atividades de desenvolvimento econômico, dentre os quais a abertura de novas fronteiras agrícolas, como no Oeste do Paraná.

    Cobra sugeriu a necessidade de estrutura

    Os mapas projetados no período de 1948 a 1954 pela Colonizadora Gaúcha apresentaram um total de 907 colônias, loteadas e medidas em alqueires por engenheiros como Adolpho Strabel e Hercílio Felippi.

    Em pleno trabalho de campo, Felippi foi atacado por uma cobra, morrendo em seguida pela ausência de soro antiofídico e dificuldade para se mover na mata cerrada até buscar socorro médico.

    Com eles estiveram os topógrafos João Félix Rolim de Moura, José de Moura Torres, Marciano Batista, Leodato Fernandes e Euclides Felippi, irmão de Hercílio.

    João Félix resistiu a todos os obstáculos e perigos encontrados, teve uma vida longa e cheia de realizações junto aos pioneiros, morrendo só em 2021, em Foz do Iguaçu, aos 88 anos.

    A sentida perda do engenheiro Felippi em 1948 fez com que nesse mesmo ano o governo do Estado elaborasse um plano para estender postos de saúde pelas regiões de desbravamento para prestar socorro em caso de acidentes como esse.

    Em lugar de Felippi, o trabalho de divisão e loteamento das colônias de terras foi concluído pelo engenheiro militar Anísio Paim da Rocha.

    Paim, agente da estruturação regional

    Não se pode contar a história da região Oeste desde a década de 1940 sem reservar um capítulo à polêmica Estrada do Colono e menos ainda sem lembrar o engenheiro militar Anísio Paim da Rocha, cuja equipe fez a abertura do caminho entre o Rio Iguaçu e Capanema.

    Desde essa época o trecho é motivo de intensa polêmica e frequentes batalhas judiciais entre desenvolvimentistas e ambientalistas. Os primeiros ganharam forte apoio popular e político, mas os ecologistas tiveram a seu favor importantes sentenças na Justiça.

    Caso em aberto, apesar de receber parecer negativo do Ministério Público do Paraná o projeto deputado federal Vermelho (PSD-PR) pela reabertura está prestes a ser votado no plenário da Câmara.   

    Anísio Paim da Rocha nasceu em Vila Jary, então Município de São Martinho, hoje Julio de Castilhos (RS) em 8 de setembro de 1901, filho de Luiz Rocha dos Santos e Marfiza Paim dos Santos.

    Ele e a esposa Ida Gomide, natural de Passo Fundo (RS), tiveram Cloé Zita (casada com Mário Hofmann), Nizo (casado com Guiomar Belotto), Suely (com Oscar Salazar), Aura Terezinha (com Joé Cechet), Cecy (com Eduardo Ferreira), Idilio (com Nilza Borghezan), Celi (com Clóvis Trevisan), Brasil (com Sueli Peres) e Elisabeth (com Lino Rodrigues).

    Trabalhando com Festugato

    Nas funções de agrimensor, Anísio Paim fixou-se na região desde 1951, medindo terras na Rota Oeste e na década de 1960 passou a trabalhar em apoio à estruturação do principal ramo da economia regional na época, a serviço da Industrial Madeireira de Cascavel, da família Festugato.

    O engenheiro militar também participou da organização do próximo grande salto do desenvolvimento regional: com uma fazenda modelar em Cascavel, Anísio Paim da Rocha foi um dos pioneiros da mecanização agrícola na região e um dos fundadores da Coopavel, em 1970.

    Também participou da formação da cidade de Brasnorte (MT) e morreu em 22 de maio de 1988. Foi uma jornada de quatro décadas de atuação em frentes pioneiras.

    Por sua vez, instalada na região desde 1948, a Imapar de Renato Festugato veio encerrar de vez o ciclo dos latifúndios anglo-argentinos no Médio-Oeste.

    A transferência à família Festugato das propriedades da família Lupion, restos do latifúndio do franco-argentino Domingo Barthe, completou-se em 1˚ de agosto de 1948, com a instalação em Foz do Iguaçu da Industrial Madeireira do Paraná, que viria a ser um dos motores da economia da fronteira e o principal elemento de apoio ao desenvolvimento de Cascavel na década de 1950.

    A Imapar, com sede em Caxias do Sul, incorporava assim o patrimônio da antiga Companhia Domingo Barthe, reserva florestal que abastecia as duas serrarias de Moysés Lupion em Cascavel, embora o negócio só viesse a se completar em 1967.

    Começa um novo ciclo

    “O filho do sapateiro* ergue uma taça e anuncia o motivo de reunir a família naquela data: acabara de quitar a última parcela de uma longa transação imobiliária, que consumira as energias de seu grupo empresarial por 18 anos: a aquisição da maior floresta de araucária que já existiu sobre a Terra: 87 mil hectares entre Catanduvas e Santa Tereza do Oeste, incluindo franjas de Guaraniaçu, Corbélia e a joia da coroa, Cascavel” (Pitoco, edição 2.193, 19/4/2019).

    As terras adquiridas pela Imapar contavam com cerca de 600 mil pinheiros, além de peroba, cabriúva, canjerana, cedro, marfim e outras espécies.

    A Industrial Madeireira começou operando com um capital de Cr$ 26.000,00. Quando decidiu fazer o negócio, Festugato estava em Lages (SC), onde nasceu o filho Sérgio Mauro, em 1939.

    Festugato instalou a Imapar em 1º de agosto de 1948 em Foz do Iguaçu e no dia 4 seu associado Florêncio Galafassi já começava a trabalhar em Cascavel, onde estavam as duas serrarias.

    Florêncio Galafassi encontrou a vila de Cascavel tão pequena que sequer parecia ser a sede de um distrito, mas com a instalação da Imapar em seu centro tudo mudou.

    Começava ali, ao redor da antiga Encruzilhada dos Gomes, a formação de uma nova metrópole.

    *Renato Festugato.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Quando uma aventura se torna empresas e cidades

    Quando uma aventura se torna empresas e cidades

    1948. Rumo ao Oeste do Paraná, orientada pelo colonizador Alfredo Ruaro, sai da cidade de Farroupilha, na Serra Gaúcha, uma caravana de filhos de imigrantes.

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    Estão interessados em aplicar bem o capital acumulado por suas famílias em meio século de trabalho nas colônias sulinas. Vivem em região montanhosa e as propriedades inicialmente obtidas pelas famílias se repartiram em minifúndios por herança passada em duas gerações de proles numerosas.  

    Puxada por dois táxis, a caravana passa por Erechim, Chapecó, Xanxerê, Laranjeiras do Sul, Mangueirinha e Cascavel, de onde segue com mais dificuldades para Foz do Iguaçu, onde estava concentrada a política regional, na Prefeitura e na Câmara do Município, que na época abrangia toda a região Oeste do Paraná.

    Arlindo Mosé Cavalca, Benvenuto Verona, Armando Mangoni, Silvio de Cézaro, Italvino Colussi e outros pioneiros da Rota Oeste faziam parte da caravana.

    “Passamos rios em balsas ou pontes em precárias condições”, contou Cavalca, mas até Cascavel a viagem foi normal, mesmo considerando os conhecidos contratempos em estradas de terra, que dependiam do clima e de eventuais trabalhos de conservação por parte dos governos estaduais.

    A aventura de fato começou ao partir de Cascavel, contou Arlindo Mosé Cavalca em depoimento ao livro São Miguel do Iguaçu – Estórias e Histórias, de Hélio Pomorski e Neusa Benatti (Projeto Memória de SMI).

    As sedutoras Cataratas

    Mais lentamente que o previsto, a caravana costeou o Parque Nacional pela Picada do Benjamim, na época a única opção para seguir a Foz do Iguaçu sem amargar o dissabor de empacar velha na estrada militar.

    “Não existia estrada que passasse por Matelândia e Medianeira e nem essas localidades existiam ainda. Existia sim uma floresta fechada, o caminho que levava à futura Gaúcha [São Miguel do Iguaçu] era precário, parecia um túnel verde e sombrio”, prossegue Cavalca em sua narrativa.

    “Fizemos várias paradas, admirados pela exuberância e planície das terras isentas de pedras. Jamais havíamos visto uma mata tão levantada e com tanta madeira de lei: cedro, louro, cabriúva, ipê, marfim e muitas outras”.

    Tudo era maravilha, novidade, atração. “Havia muitos animais: onças, jaguatiricas, tamanduá bandeira, antas, capivaras e uma infinidade animais menores. Nas águas cristalinas, lindos peixes, e não faltavam as temíveis serpentes, cascavel, urutu, jararacuçu e outras. Havia também inúmeras aves, entre as quais jacu, jacutinga, macuco, tucanos, araras e papagaios”.

    “Tudo era muito bonito: o canto das aves, a algazarra dos papagaios, mas existiam também insetos minúsculos que infernizavam a vida, entre eles, principalmente os mosquitos borrachudos, que só deixavam de atacar de noite”.

    Apesar dos incômodos que no futuro iriam atrapalhar o rápido desenvolvimento do projeto, uma visita às Cataratas do Iguaçu arrematou a sedução lançada por Alfredo Ruaro, que colheu dos viajantes admirados com a beleza e exuberância da flora e da fauna e a fertilidade do solo a concordância a participar da sociedade proposta pelo experiente colonizador.

    Neto de colonizador italiano

    A volta ao Sul começou seguindo a Curitiba, para um encontro com Alberto e Luiz Dalcanale Filho, sócios de Ruaro na colonizadora Pinho e Terras Ltda, intermediária da venda das terras do antigo projeto de Miguel Matte.

    “Nesta ocasião foi documentada a transação de 900 colônias, ou 9.000 alqueires, formando o patrimônio da recém formada Colonizadora Gaúcha Ltda”, contou Arlindo Cavalca.

    A viagem ao Oeste, a passagem pela capital paranaense e o encontro com os Dalcanale representaram uma inflexão decisiva na vida de Arlindo Cavalca. Seu pai, Alcides, tinha apenas seis meses de idade quando veio para o Brasil em 1877, trazido da Itália pelo pai, Júlio Cavalca e mãe Melani, no navio Isabella.

    Alcides era o primeiro filho de Júlio, que ainda jovem, aos 25 anos, instalou-se nas terras montanhosas de Bento Gonçalves. Lá Alcides cresceu e se casou com Eulália Umiltá, cuja família também veio no Isabella, formando sua própria família, que iria crescer em 5 de fevereiro de 1921 com o nascimento do filho caçula: Arlindo.

    Em 1948, na aventura pelo Oeste do Paraná em companhia de Alfredo Ruaro, Arlindo estava com 27 anos e ainda era solteiro. Ele se casou em 1952 com Addy Maria Dall’Oglio, filha de Celeste Dall’Oglio e Irene Berlani.

    Dall’Oglio, referência na colonização

    Dall’Oglio era um dos sócios da Indústria Agrícola Bento Gonçalves, dirigida por Pedro Soccol e José Callegari, empresa que deu origem a Medianeira.

    Celeste Dall’Oglio é também uma referência histórica de Santa Helena. O distrito de Vila Celeste é uma homenagem a ele, pioneiro também no interior daquele Município.

    “A maioria dos diretores de outras colonizações liquidaram as vendas das terras ou dividiram entre os acionistas o saldo das mesmas, regressando para a terra natal”, segundo Cavalca.

    “Isto não ocorreu comigo, minha esposa Addy e minha família. Fascinados pelos inúmeros trabalhos começados e pela bondade do povo da Gaúcha, vendo o progresso a passos gigantes e a vinda das Irmãs Franciscanas, acreditamos ser aqui o lugar ideal para criar uma família sadia de corpo e espírito”.

    Embora os moradores chamassem o lugar de “Gaúcha”, nome da empresa colonizadora derivada da matriz Pinho e Terra, a influência religiosa determinou chamar ao lugar “São Miguel do Iguaçu”.

    Vinha de uma antiga lenda que circulava na região, segundo a qual um cavaleiro chamado Miguel enfrentou sozinho um bando de saqueadores que prejudicava os colonos, mas seguiu seu caminho sem esperar agradecimentos.

    Herói anônimo, santo público    

    A atitude generosa do valente Miguel logo foi considerada pela comunidade profundamente católica a ação de um santo. Uma das fazendas do lugar logo recebeu o nome de São Miguel, que passou a ser o padroeiro e por fim o nome da cidade e Município.

    A lenda predileta na região, entretanto, era a da existência de tesouros deixados pelos jesuítas. O misterioso salvador Miguel também foi imaginado como o fantasma que vinha indicar tesouros aos pioneiros – os fazendeiros de maior sucesso em seus negócios eram acusados de ter recebido a suposta visita do espectro.

    Na trilha da lenda sobre tesouros, o governo do Paraná se cansou dos aventureiros que vinham, esburacavam o solo e seguiam em frente sem participar do processo de colonização.

    Foram criminalizadas as incursões que saiam levando relíquias e pedaços das ruínas da Ciudad Real del Guayrá, de onde no século XVII partiram os jesuítas para fundar no Sul os Sete Povos das Missões.

    Só entidades voltadas ao resgate arqueológico ou pesquisadores e empresários autorizados a prospectar na região podiam cavar sem ser abordados pela polícia.

    Diamantino se dizia chefe indígena

    Autorizado primeiramente pelo próprio nome, Antônio Diamantino Néri (ou Nery) pediu licença ao governo federal para pesquisar minérios no Município de Foz do Iguaçu, ainda durante a vigência do território Federal do Iguaçu.

    A autorização veio por um decreto presidencial datado de 14 de junho de 1948, depois do fim do TFI, assinado pelo general Eurico Gaspar Dutra.

    Néri não recebeu licença para explorar toda a área do vasto Município de Foz do Iguaçu. Poderia buscar minério de cobre apenas em sua propriedade, no lugar denominado Córrego do Barreiro, no distrito de Cascavel.

    Mas ele queria mais, e assim em 1952 outro decreto presidencial, desta vez de Getúlio Vargas, autorizava-o a procurar mais que cobre – também vanádio, titânio, ouro “e associados”.

    A propriedade de Néri tinha cem hectares e ficava na confluência do Barreiro com o arroio Porvenir. Ali, por décadas, apresentando-se como chefe dos índios, Néri coletava erva-mate.

    Depois não se ouviu falar mais nele. Supunha-se que achou o tesouro e partiu incógnito para gozar as riquezas encontradas. 

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Grileiros, jagunços e vampiros

    Grileiros, jagunços e vampiros

    Por todos os ângulos, em meio à crise política, econômica e social brasileira dos anos 1940, o Paraná se apresentava quase como um oásis de prosperidade, ao menos para quem não resolvesse ir ao remoto interior.

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    Nele, jagunços a serviço de grileiros de terras atacavam posseiros com apoio policial, recebidos com surpresa pelos colonos, pois desde o governo Manuel Ribas foram estimulados a ocupar as terras devolutas.

    O retrato do Paraná em Curitiba era róseo: o crescimento da arrecadação do Departamento do Departamento de Geografia, Terras e Colonização (DGTC) para o quadriênio 1947–1950 apontou o aumento de 420,13% (1948) e 737% (1949) na movimentação financeira.

    Vinham “do aumento significativo das concessões de glebas de terras e/ou venda direta de propriedades disponíveis nos terrenos devolutos, mediante o avanço das frentes cafeeiras, principalmente nas regiões norte/noroeste paranaense” (Edson Noriyuki Yokoo, A Dinâmica das Frentes de Ocupação Territorial na Mesorregião Centro-Ocidental Paranaense).

    Os fatores mundiais

    A bomba social armada no interior paranaense pelas disputas entre União e Estado foi ignorada pelo contexto paranaense de progresso intenso, tanto na produção rural quanto na industrialização e consequente urbanização.

    No entanto, para obscurecer esse clima de franco progresso, a política voltava a ferver no país por conta do clima de Guerra Fria entre os EUA e a União Soviética, que dividiram o mundo em duas áreas de influência, como havia sido com Portugal e Espanha no passado.

    Logo em janeiro de 1948 foram cassados todos os mandatos dos parlamentares comunistas no Congresso Nacional, assembleias legislativas e câmaras municipais. Sem mandatos e tendo sua atividade política criminalizada, eles se reuniram em torno da campanha O Petróleo é Nosso.

    Nesse mesmo janeiro também ocorreu o assassinato a tiros, em Nova Déli, de Mahatma Gandhi, líder da Índia recém-independente, por um fanático brâmane – a elite privilegiada no regime de castas.

    Os EUA já promoviam os desembolsos do Plano Marshall, arma de ataque da Doutrina Truman, e havia brasileiros se perguntando se não teria sido melhor ter perdido a guerra. O Plano Marshall parecia um prêmio e não um castigo aos vencidos.

    A sombra de um conflito nuclear que levaria o mundo à destruição pouco afetava a ânsia de progresso no interior do Paraná, mas a criminalização dos movimentos sociais alcançou todo o país e foi o estopim das revoltas dos posseiros.

    Toledo, um mundo à parte

    Durante a ditadura vencida, reclamar de qualquer coisa significava comprar passagem para a cadeia, mas com a redemocratização as queixas se multiplicaram e pela necessidade de votos os governantes procuravam corrigir os piores problemas.

    Aos poucos, porém, os velhos hábitos autoritários da ditadura foram novamente se impondo, dentre os quais a prática de desprezar as demandas vindas de quem não tinha mais poder nos parlamentos do país, o que levou ao crescimento da repressão sobre os movimentos sociais.

    Fora do território de conflito dominial entre União e Estado, a antiga Fazenda Britânia estava sob total controle da colonizadora Maripá, que em fevereiro de 1948 levou a Toledo três irmãs da Congregação das Filhas de São Vicente de Paulo – Verônica Sawtczuk, Lúcia Mikosz e Elia Bassani.

    Elas criaram a primeira escola de Toledo, o Instituto Imaculado Coração de Maria, embora na região portuária já houvesse uma rara e derradeira herança dos ingleses: a escola do Rio Branco.

    No antigo pouso Toledo, partindo do nada, o Incomar começou a funcionar ainda antes da construção do prédio escolar, usando os bancos da igreja.

    “Os alunos sentavam no genuflexório e escreviam sobre o assento ou colocavam os cadernos sobre a estreita tábua onde apoiamos os braços no genuflexório” (irmã Verônica Sawtczuk, depoimento).

    A sulista e o alagoano

    Sobrenomes eslavos como os das freiras Sawtczuk e Mikosz eram frequentes nos requerimentos de terras apresentados à Prefeitura de Foz do Iguaçu.

    Na região desde os anos 1920, suas famílias se multiplicavam e as filhas se casavam ou com rapazes da própria colônia ou com aventureiros que chegavam cheios de vontade de trabalhar.   

    Foi assim com Ana Rodinski, nascida em Foz do Iguaçu, e o alagoano Francisco Mota, que constituíram uma família bem representativa daqueles tempos pioneiros.

    O pai dela, Pedro, conheceu Foz do Iguaçu quando trazia gado de Laranjeiras do Sul para abastecer a cidade. Com o capital do transporte de gado ele se estabeleceu na fronteira com um armazém de secos e molhados em sociedade com Gregório Dotto, filho de italianos, influente personalidade da fronteira.

    Balconista do armazém dos pais, o comerciante Pedro Rodinsk e Felícia Martins, que vinha da área hotelaria, Ana vendia tudo que covos e militares pediam.

    Desde produtos alimentícios até querosene em litro, graxa para carro, soda cáustica, armarinhos, sapatos, roupas e acessórios como capas e chapéus, as mercadorias vinham de Ponta Grossa.  Ana saía da loja cheirando querosene e ia preparar massa na padaria.

    Por sua vez, o jovem alagoano Francisco Ferreira Mota rejeitava a ideia de ser um aventureiro, pois logo ao chegar à fronteira foi trabalhar com o alfaiate Idalino Favassa, ligado à família Pietsch, que viria para Cascavel.

    Motinha era um homem de sete instrumentos: fazia de tudo. Além de alfaiate, tendo feito roupas até para o prefeito Júlio Pasa, foi militar, caminhoneiro, músico e taxista. Como se não bastasse, foi também líder sindical por décadas e também militou politicamente.

    Foi como alfaiate que Mota se relacionou com a família Rodinski, estabelecendo sua loja de confecções no mesmo prédio em que Pedro tinha o açougue e se casando com Ana, com quem teria cinco filhos.

    Posseiros reagem e oposição os defende

    No interior do Estado, o final da década de 1940 apresentou a intensificação do conflito agrário, sobretudo porque em 1948 os posseiros atacados pelos grileiros por sua milícia armada – os jagunços – passaram a se defender.

    Pelas armas, na Justiça e pela imprensa não-lupionista, eles em breve também partirão para uma ofensiva maior.

    Ironicamente, o homem do interior – Lupion – que prometeu dar voz e vez às comunidades esquecidas do sertão, enfrentava a metralhadora verbal de um Bento Munhoz conservador, criado no litoral monárquico dos barões e viscondes

    No vazio de providências do Estado ausente e do PCB declarado ilegal desde maio de 1947, é Bento quem vai se apresentar como o defensor dos posseiros, aproveitando o vácuo político progressista.

    Nesse quadro, faz uma denúncia gravíssima: o envolvimento da polícia do Paraná com os grileiros.

    “Enganados pelos inspetores de terras, muitos posseiros reclamam seus direitos e uma caravana policial incendiou ranchos, destruiu roças, violentou mulheres e matou muita gente” (Noel Nascimento, A Revolução Brasileira e Lutas Sociais no Paraná).

    “Uma força policial efetuou diligência de despejo em Porecatu, matando quatro lavradores que estavam roçando”.

    Os jagunços matavam posseiros e seguiam em frente, deixando os cadáveres insepultos. Vem daí a crendice regional em vampiros, presentes no imaginário dos imigrantes e popularizados no Ocidente pelo romance Drácula, de Bram Stoker (1897).

    A origem do medo

    Na antiga tradição eslava, a alma podia se tornar impura se o corpo não tivesse enterro apropriado, passível assim de ser possuído por maus espíritos. O assunto foi tratado na pesquisa acadêmica Vampires of the Slavs, de Jan Louis Perkowski.

    O temor de ataques vampirescos logo virou denúncia à polícia, como acontecia nos tempos da influência do monge do Contestado, quando foram relatadas visagens e aparições consideradas sobrenaturais. Foi assim que o caso dos ataques de vampiros também chegou à imprensa:

    “Correm insistentes rumores pela cidade, que vampiros ou leprosos* andam praticando atos de pravidades** com crianças e jovens. Em vista de tais rumores, a nossa reportagem procurou apurar os fatos. Procurou assim, saber do chefe da Secção de Investigações, sr. Alir Silva, o qual declarou-nos que até o presente momento não havia recebido nenhuma queixa de tais ocorrências” (Jornal Paraná Norte, Londrina, 8 de outubro de 1949).

    Alir Silva, primo do desembargador José Munhoz de Mello, depois foi deslocado para Cascavel com a tarefa de investigar casos de roubos de terras. Tornou-se uma liderança popular, elegendo-se vereador e assumindo a Presidência da Câmara Municipal, função na qual foi perseguido e ameaçado de morte pela chamada Gangue da Terra.

    *Leprosos: depravados, doentios

    **Pravidades: maldades, perversidades

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Italianos movem suas peças na política oestina

    Italianos movem suas peças na política oestina

     

    Sem dispor de vereadores que representassem diretamente Cascavel e a colonizadora Maripá na Câmara de Foz do Iguaçu ou o Médio-Oeste na Assembleia do Estado, o colonizador Alfredo Ruaro assumiu o papel reivindicatório se dirigindo à Prefeitura de Foz do Iguaçu, onde apresentou em dezembro de 1947 a proposta de instalar uma rede de energia elétrica no Distrito de Cascavel.

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    Para Ruaro, fundador de Toledo, era um dever levar a energia elétrica ao Médio-Oeste: a crescente exploração econômica do pinheiro atraía diversos grupos de colonos oriundos de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, os futuros plantadores de soja e trigo.

    Havia muita oferta de terras devolutas, mas as melhores áreas requeriam a segurança oferecida pelas empresas do ramo: documentação, assistência técnica e apoio às famílias.

    Era interesse público favorecer a ação das companhias colonizadoras, portanto. Foi assim que, de imediato, em 17 de dezembro de 1947, assim que recebeu o requerimento entregue por Ruaro ao prefeito Júlio Pasa, o presidente da Câmara de Foz do Iguaçu, Paulo Montanari, tratou  de incluir a proposta nos debates sobre o projeto de orçamento geral do Município para 1948, marcando sessão legislativa para o dia seguinte.

    Urgência verbalizada

    A Prefeitura teria que autorizar obras e ações no Distrito de Cascavel, mas a delimitação da área determinada na legislação estadual não abarcava de fato toda a área distrital presumida com o início da colonização em Toledo.

    O vereador João de Camargo (PSD, o mesmo partido de Jeca Silvério), que tinha propriedades no distrito, de imediato reagiu requerendo verbalmente para posterior redação que o distrito de Cascavel tinha os seguintes limites:

    “Foz do Rio Benjamin até sua cabeceira, da cabeceira do Rio Benjamin em linha sua até o Km 5, da estrada do Toledo e desta até o Km 50, da estrada da Alice* em linha reta, pela estrada geral até o Rio Piquiri mantendo os demais limites”, que seriam os da legislação estadual que criou o distrito administrativo de Cascavel.

    *“Alice” foi um erro na redação da ata. Referia-se ao antigo latifundiário (obragero) argentino Júlio Tomás Allica. Outro erro na ata é que nela consta como requerente da energia elétrica o nome “Alfredo Rorato”, ato falho decorrente do fato de a família Rorato ser tradicional em Foz do Iguaçu, a mesma do deputado federal Cláudio Rorato.

    Aproveitando a urgência e o recurso do requerimento verbal, o vereador Antônio Alves do Amaral (UDN, mesmo partido do prefeito Pasa) pediu que a Prefeitura determinasse a abertura de concorrência pública para instalação de luz elétrica em Cascavel.

    Etnia, amizades e parentesco

    Amaral foi para a sessão com os dados necessários previamente anotados por Alfredo Ruaro, justificando a necessidade da instalação da energia elétrica em Cascavel não só por suas necessidades urbanas mas também rurais e preparando o futuro.

    Hoje pode parecer surpreendente e irreal, mas na década de 1940 havia povoados com casas de empregados em serrarias, a iniciante colonização de Toledo e locais do interior do Distrito de Cascavel, como São João, com população ainda maior que a da vila de Cascavel.

    A população toledana, considerando os primeiros colonos e a peonagem da colonizadora Maripá, já era de 130 moradores no final da década de 1940 (Toledo e Sua História, Oscar Silva et alia).

    Ninguém na Câmara de Foz do Iguaçu se opôs à rápida tramitação do pedido cascavelense porque de um  lado o prefeito Júlio Pasa era amigo da comunidade italiana do distrito e, de outro, o presidente da Câmara, vereador Paulo Montanari, hoje nome de avenida em Foz do Iguaçu, tinha parentes no interior de Cascavel.

    José Neves Formighieri, futuro prefeito de Cascavel, também descendia da família Montanari. Sua bisavó Maria Montanari, casada com Francesco Formighieri, pai de Virgílio Formighieri, integrava numerosa família com vários membros que migraram da Itália para o Brasil

    Toda vila queria ser cidade

    O mínimo que se podia concluir em 1947, primeiro ano de democracia municipal, é que os antigos prefeitos nomeados pela ditadura não demonstravam grande interesse pelo interior, a não ser que tivessem propriedades nele.

    O mesmo processo de fortalecimento do Distrito de Cascavel em 1947 se verificava por todo o Estado. Apoiar a fundação de cidades e municípios foi uma das iniciativas mais estimuladas pelo governador Lupion, que assim fez o PSD se estruturar fortemente em todos os núcleos criados.

    Dezenas de novas vilas e cidades brotavam em todo o Paraná e pretendiam se tornar municípios. Só em 1947 foram criados os municípios de Abatiá, Arapongas, Bela Vista do Paraíso, Cambé, Campo Mourão, Curiúva, Floraí, Ibaiti, Ibiporã, Jaguapitã, Jundiaí do Sul, Mandaguari, Porecatu, Porto Amazonas, Quatiguá, Ribeirão do Pinhal, Santa Mariana e Uraí.

    Muitos outros municípios em breve iriam brotar dos distritos mais antigos e das frentes pioneiras de colonização.

    Uma das exigências mais frequentes feitas pelas famílias que chegavam do Sul era dispor de comodidades que já usufruíam em suas regiões de origem – principalmente a energia elétrica.

    Por isso Cascavel elegeu como prioridade conquistar a energia elétrica, lançando o apelo tanto para a sede municipal, Foz do Iguaçu, como para o governo do Estado, até porque Moysés Lupion e sua família ainda eram donos de serrarias em Cascavel.

    Assuntos da capital pressionaram Lupion

    No entanto, Lupion já não pensava mais no local de reduzida população onde a cada eleição tinha a totalidade ou a imensa maioria dos votos.

    A aceleração administrativa inicial do governo Lupion aos poucos dará lugar a uma feroz disputa entre as diversas tendências aninhadas na nova estrutura de poder e o ninho das serpentes  políticas dominantes estava em Curitiba.

    Tais rachaduras eram estimuladas e assistidas com prazer pela antiga oligarquia Camargo-Munhoz, já reorganizada em torno de Bento Munhoz da Rocha Neto.

    A liderança de Bento vai absorver rapidamente as dissidências do lupionismo. Sinal da ebulição política reinante na capital é o fato de que só em 1947 Curitiba teve quatro prefeitos: Ângelo Lopes, chamado para a Secretaria de Estado da Fazenda, Raul de Azevedo Macedo (1891–1981), João Kracik Netto e João Macedo Souza.

    Mas é inegável que o primeiro governo de Moysés Lupion caracterizou-se pela arrancada desenvolvimentista do interior do Paraná.

    Havia condições favoráveis para isso: contornada a crise de 1929/30, a cultura do café voltava a atrair as atenções dos consumidores mundiais e o mercado interno também se ampliava. O algodão, na mesma trilha, fazia brotar mais vilas e cidades ao redor das culturas.

    A transformação do interior paranaense num novo Eldorado brasileiro traria também um subproduto do progresso: com uma estrutura fundiária esgarçada e conflituosa, o país sempre expôs as fronteiras agrícolas a sangrentas questões em torno do reconhecimento da posse e da legitimação da propriedade da terra, fenômeno que ainda hoje ocorre em regiões entre o Centro-Oeste e o Norte do país.

    Em Toledo, paz e boa comida

    O cenário do Paraná então era de um universo rural amplo e regiões inexploradas. Havia também disparidades entre a colonização sem conflitos na antiga fazenda dos ingleses e as áreas em que a União e o Estado esgrimiam leis contraditórias, como na região do Piquiri, ao Norte do Distrito de Cascavel, e no Sudoeste, que o Território Federal do Iguaçu deixou desorganizado.

    No front de Toledo, a paz com que a colonizadora Maripá desenvolvia a estrutura de seu projeto foi encarnada pela atuante Vergínia Drago Ruaro. Nascida na comunidade de Ana Rech (Caxias do Sul, RS), cunhada de Alfredo Ruaro e esposa de Zulmiro, que trouxe a primeira turma de toledanos para trabalhar na região, ela tomou conta do rancho às margens do Arroio Toledo.

    “O calor, o medo dos animais da floresta, mas principalmente as nuvens de insetos haviam se transformado num suplício quase insuportável”, escreve Moema Viezzer no livro As Mulheres no Alvorecer de Toledo.

    A maior dificuldade e o maior desafio para conseguir implantar o projeto da vila, prossegue Moema, foi a alimentação dos primeiros trabalhadores, uma exigência para que não abandonassem a obra:

    “Os desbravadores necessitavam, acima de tudo, comida abundante, reforçada e bem feita para aguentar o peso de seu trabalho definido inicialmente: abrir o mato e construir a estrada que ligaria o Pouso Toledo a Porto Britânia para o transporte da madeira a ser exportada para a Argentina e Inglaterra”.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Os três Bartnik, uma história de famílias eslavas

    Os três Bartnik, uma história de famílias eslavas

    Com o fim da ditadura, em julho de 1947 o coronel José Rodrigues da Silva foi dispensado das funções de chefe da Comissão de Estradas de Rodagem (CER-1) apesar da competência e dedicação que seu trabalho sempre fez notar.

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    No entanto, relações muito próximas com o ditador deposto, Getúlio Vargas, dificultavam sua permanência no comando. Mesmo tendo avisado para os riscos do fracassado empreendimento rodoviário no Paraguai, uma insensata aventura geopolítica do núcleo duro da ditadura, Rodrigues foi encarregado de executá-lo.

    Militar, devendo obediência aos superiores, cumpriu a missão até segunda ordem, mas o que importava aos governos de Paraná e Santa Catarina era que o governo ditatorial lhes havia tomado suas partes a Oeste para formar o frustrado Território Federal do Iguaçu e como se não bastasse drenou os recursos que deveriam ser aplicados na construção da rodovia Ponta Grossa-Foz do Iguaçu e outras obras rodoviárias nos dois estados, desviando-os ao Paraguai.

    Agora que novamente havia verbas para levar adiante o projeto de complementação da futura BR-277, Rodrigues era afastado da posição por estar “contaminado” pelas relações com o governo derrotado.

    Horta, o novo chefe

    A despedida do coronel foi emocionante, cercada pelo carinho da população e da imprensa, mas logo ele seria esquecido, como geralmente ocorre com os militares profissionais, cujas principais características são a “mudez” (proibição de envolvimento político-partidário) e a movibilidade.

    O governador Moysés Lupion puxou os elogios à atuação do ex-chefe da CER-1, substituído em 1º de julho de 1947 pelo tenente-coronel Paulo Horta Rodrigues, este “com um excelente crédito financeiro aberto à sua frente” (Oscar Ramos Pereira, Estradas Paranaenses Construídas pelo Exército).

    Vindo de elogiadas atuações anteriores em Lagoa Vermelha (RS) e Lages (SC), Horta Rodrigues assumia a CER-1, portanto, com os recursos que faltaram ao antecessor durante o fracasso da obra rodoviária no Paraguai.

    De início, o trabalho do novo chefe foi imenso, “pois os serviços estavam paralisados desde outubro de 1946 e foram reorganizadas as secções de construção localizadas em Imbituva, Bracatinga, Cavernoso, Laranjeiras e Cascavel” (Oscar Ramos Pereira).

    A segunda onda eslava

    Assim que as obras recomeçaram com vigor, o projeto de colonização do interior do governo paranaense teve um sólido argumento para intensificar a propaganda.

    As empresas colonizadoras antes apreensivas com a paralisia das obras no último ano, já vendiam terras com grande facilidade aos colonos que chegavam, filhos e netos de imigrantes capitalizados por décadas de trabalho de suas famílias no Rio Grande do Sul e Santa Catarina.    

    Foi assim que a vinda de a vinda de colonos italianos se intensificou e também ocorreu uma segunda leva de colonos de origem eslava, que em primeira instância começaram a chegar nos anos 1920.

    Um dos mais representativos desta nova onda foi Francisco Bartnik, não porque a região lhe fosse desconhecida, mas pela opção de passar a viver no setor urbano.

    Ele e outros patriarcas da família Bartnik – José (https://bit.ly/3HwUWzn) e Vítor – constituíram a partir dessa época um dos principais eixos familiares da formação da cidade de Cascavel.  

    A história de José é a mais conhecida, por conta de seu hotel pioneiro, a presença na formação do Tuiuti Esporte Clube e atuação como vereador.

    Por sua vez, Francisco, que nasceu em Itaiópolis (SC) em 5 de outubro de 1912, tornou-se esmerado carpinteiro, já conhecia bem o meio rural e veio para se fixar na vila de Cascavel em 1947, já traquejado e disposto a fazer tudo que estivesse a seu alcance – e uma dessas tarefas foi construir a primeira sede do Tuiuti.

    A transição do rural ao urbano

    De origem eslava, como tantos poloneses, ucranianos e russos que iniciaram a colonização efetiva do Paraná, na década de 1920, Francisco Bartnik veio para o Oeste do Paraná antes da formação da vila de Cascavel e foi um dos grandes colaboradores de Tio Jeca Silvério para iniciar a cidade ainda antes de vir se radicar no setor urbano.

    Uma das primeiras serrarias de Cascavel foi montada em 1932 pelos dois, às margens do Rio Melissa. Eles aproveitaram os recursos hídricos que mais tarde dariam à região de Cascavel sua primeira usina hidrelétrica: a usina do Melissa, hoje incorporada à estrutura da Copel.

    Casado com a estimada professora Stanislava Boiarski, tiveram cinco filhos: Dirceu Lúcio, Elza (Fosqueira), Beatriz (Soares), Francisco Filho e Dinéia (Formighieri).

    Além de carpinteiro, Francisco foi comerciante e fundou a Associação Rural de Cascavel ao lado de Tarquínio Joslin dos Santos, Antônio Rodrigues de Almeida, Antônio Alves Massaneiro, Celso Sperança e dezenas de outros pioneiros.

    Ao morrer, em 12 de maio de 1962, Francisco servia à fiscalização da Receita Estadual.

    Trabalho incansável e sofrimento intenso

    Vitor Bartnik, por outro lado, teve uma biografia igualmente de muito trabalho, mas também muito sofrimento. Irmão de José, Vitor nasceu em 15 de novembro de 1915, no interior de Canoinhas (SC).

    Seus pais, Valentin e Maria Galeski Bartnik, vieram da Polônia de navio e tiveram os filhos em Santa Catarina, que depois se instalaram inicialmente em Formiga, Catanduvas, próxima à futura Ibema.

    Já carroceiro em Cantagalo (PR), Vítor puxava sal de Ponta Grossa para Foz do Iguaçu e veio para Cascavel com a família Tfardoski, também uma das mais antigas da região.

    Sua esposa, a costureira Inês, filha de Plila e Thomas Babinsk, um sapateiro de origem alemã, teve oito filhos com Vitor Bartnik: Jaime, Janine, Ezídio, Navilha, Marlineide, Elim, Cleusa e Maria.

    Inês costurava para as famílias pioneiras e também fazia fardas para a Polícia Militar. Claro que era também muito requisitada para costurar bombachas, segundo a filha Janine.

    Tudo nos tempos em que tiveram paz, pois perderam as terras para grileiros encastelados na Inspetoria Regional de Terras no primeiro o governo Lupion, revelou Janine, que morreu em abril de 2021, vítima  de complicações da Covid.

    O difícil recomeço

    As terras tomadas dos Bartnik foram vendidas a pioneiros vindos do Sul. Era um cenário comum na época: os grileiros roubavam as terras dos pioneiros – a família Bartnik foi uma as primeiras a fazer o Oeste – e as vendiam aos colonos que chegavam para se estabelecer na região.

    Em consequência, os pioneiros esbulhados mas sem apoio na Justiça e na autoridade policial, tentavam recuperar as terras pelas armas e enfrentavam a reação também armada dos novos ocupantes, que haviam investido suas economias e recorriam também à força para se manter na propriedade.

    Os posseiros espoliados só começaram a ser defendidos por advogados depois da criação da Comarca de Cascavel, em 1954. Até lá, quem podia mais perdia menos.

    Até perder a propriedade, escorraçado por jagunços a serviço dos grileiros, Vitor Bartnik vivia da agricultura e ao perder as terras também perdeu a colheita da estação e os animais que possuía.

    “Os pistoleiros entraram atirando e prometendo matar não só os animais como a família”, contou Janine. Todos foram expulsos do lugar e Vitor foi se esconder dos inimigos nas cercanias do Lago Azul, onde tomou posse de algumas terras e recomeçou a vida, plantando e criando animais.

    O Natal mais triste dos Bartnik

    Bartnik trabalhava com afinco no dia a dia, mas não escondia sua revolta com os jagunços. Chegou a ficar doente, com dificuldades para trabalhar na criação e abate de bovinos, que geralmente vendia aos açougueiros Zardo e Gabana.

    Enquanto o pai ficava escondido no mato, disse Janine, os familiares ficaram instalados num lote no centro da cidade, onde funcionou o Bar Amarelinho, que depois foi vendido.

    Por essa época, Vitor Bartnik resolveu tentar recuperar alguns animais. Foi, juntamente com a corajosa esposa Inês, que o acompanhava, recebido a tiros.

    Não era uma situação anormal na Cascavel daqueles tempos.  Janine recordou que certa vez, diante do Posto Bomm, na Avenida Brasil, viu um pistoleiro matar três homens e jogá-los sobre uma camioneta como se fossem animais.

    Ainda adolescente, sequer se assustou, pois já estava acostumada com a violência: todos na cidade andavam armados. A vida naquela época não era mesmo fácil. Tanto que a vida de lutas de Vitor Bartnik acabou tragicamente, assassinado na véspera do Natal de 1969.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • A longa viagem de patrola

    A longa viagem de patrola

    Depois dos embates iniciais entre o governador Moysés Lupion com a oligarquia Camargo-Munhoz e os opositores que desembarcavam de sua frente eleitoral, em outubro de 1947, ao cabo de apenas quatro meses de trabalho, estava aprovada a nova Constituição do Estado.

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    Sob a presidência de Alcides Pereira Júnior, a Comissão Constituinte era também formada pelo vice-presidente Aldo Silva, o relator geral Ostoja Roguski (substituído eventualmente por Ruy Cunha) e tinha entre seus relatores temáticos Accioly Filho, Pedro Firman Neto e Oscar Lopes Munhoz, tendo como suplentes Rivadávia Vargas, Atílio Barbosa e o comunista Vieira Neto.

    Com as leis definidas, a primeira medida concreta do governo Lupion para organizar a ocupação planejada da região Oeste foi a criação, em 25 de outubro de 1947, do Departamento Administrativo do Oeste do Paraná.

    Como se fosse uma espécie de “Território Paranaense do Iguaçu”, o Departamento do Oeste compreendia os municípios de Foz do Iguaçu (incluindo o Distrito de Cascavel e a colonização iniciada na antiga Fazenda Britânia), Laranjeiras do Sul, Mangueirinha e Clevelândia.

    Plano para dois anos

    Ao substituir a parte paranaense do antigo Território Federal, Lupion cumpria a promessa de equalizar os ainda atrasados Oeste e Sudoeste com as demais regiões.

    “Art. 1° – Fica criado o Departamento Administrativo do Oeste do Paraná, com sede em Laranjeiras do Sul, e jurisdição nos municípios de Laranjeiras do Sul, Foz do Iguaçu, Clevelândia e Mangueirinha, com a função de elaborar e executar o plano de desenvolvimento geral da referida região”.

    O artigo 7° detalhava as regras do jogo:

    “Constituído o Conselho Técnico, os municípios compreendidos na jurisdição do Departamento serão convidados a expor seus problemas e planos de realizações municipais, acompanhados dos necessários elementos elucidativos, como plantas, levantamentos, dados estatísticos e outros”.

    “De posse desses elementos, o Conselho Técnico elaborará um plano geral de desenvolvimento da região e um plano para a respectiva execução em dois anos, ouvindo os órgãos técnicos especializados do Estado e com assistência permanente dos municípios interessados”.

    No entanto, o Departamento Administrativo do Oeste foi um fracasso. Além de não funcionar, os homens de confiança do governo aproveitavam a estrutura do Estado para transações suspeitas.

    Os antigos costumes imperiais e as más práticas da ditadura reapareciam, inclusive ações policiais contra adversários e favoráveis a amigos.

    Obras rápidas, gastos sem controle

    Em novembro de 1947, durante a campanha eleitoral para prefeituras, pela primeira vez pelo voto direto, o Partido Republicano de Bento Munhoz partiu para um feroz ataque ao governo Lupion.

    Habilidoso, usando a máquina pública, Lupion tratou inicialmente de pacificar as resistências oposicionistas em seu partido, o PSD, e manteve o apoio do partido coligado PTB, cuja esquerda foi neutralizada por favores palacianos aos chamados “pelegos”.

    Enquanto esperava as eleições locais, o governador tratou de divulgar os primeiros e ambiciosos planos de desenvolvimento do Estado. Logo de saída, Lupion apresentou as bases dos planos rodoferroviário, hidrelétrico e educacional, que serviriam de guia para as obras prometidas.

    Foi um dos megaplanos de Lupion que permitiu à oposição liderada pelo Partido Republicano atacar sistematicamente o governo: a Plataforma Paraná Maior.

    Os republicanos apontavam irresponsabilidade no planejamento, falhas na execução e falta de critério na liberação de recursos para a execução de muitas obras tocadas simultaneamente por todo o Estado.

    Só elegeu um vereador

    Algumas obras foram entregues a tempo para as eleições, como o Grupo Escolar de Cascavel e Delegacia de Polícia, mas a vitória nas primeiras eleições diretas municipais de 16 de novembro de 1947, que sepultavam de vez as nomeações feitas pela vencida ditadura, coube ao representante da UDN, Júlio Pasa.

    A União Democrática Nacional, que nessa etapa inicial ainda tinha a inclinação democrática de esquerda, além de eleger o prefeito de Foz do Iguaçu elegeu o presidente da Câmara Municipal (Paulo Montanari) e os vereadores Washington Pereira Lacerda (secretário), Salomão José Zagury e Érico Francisco Pruner.

    Eram quatro vereadores do total de seis. Ao PSD do governador coube uma só cadeira, obtida por João Camargo (PSD). O PTB elegeu José dos Santos Villordo. Em 1949 o número mínimo de vereadores passou a ser ímpar (nove) e foram empossados os vereadores Augusto Araújo (PTB), Balduíno Weirich e Jeca Silvério (PSD).

    Jeca Silvério, de Cascavel, por dificuldades de transporte até Foz do Iguaçu para participar das sessões legislativas pôde comparecer a poucas reuniões e foi definido como subprefeito distrital de Cascavel

    De pedreiro a vinicultor

    Descendente de italianos, nascido em 8 de fevereiro de 1896 na cidade de Vila Rica (RS), que hoje o nome de Júlio de Castilhos, importante líder sulino, jornalista e político positivista que influenciou Getúlio Vargas, o nome de nome Júlio Pasa, dado pelos pais Carlos e Rosa, foi uma homenagem a Castilhos.

    Aventurando-se por terras desconhecidas, em 1918 ele já trabalhava como pedreiro em Guaíra, onde foi um dos construtores da famosa Igreja de Pedra.

    Na volta ao Sul, decidiu parar em Foz do Iguaçu, na época o fracassado resto de uma colônia militar extinta em 1912.

    Pasa passou a trabalhar como agropecuarista e seduziu civis e militares com seu excelente vinho. “Fornecia alimentação para a cavalaria do Batalhão do Exército. Os cavalos eram mantidos com alfafa que meu pai plantava” (professora Letícia Pasa Leopoldino, filha, Gazeta do Iguaçu, 28/9/1994).

    Júlio era casado com Isabel Bonini Pasa, com quem teve 11 filhos, mas adotou ainda outros 6. Com a revolução de 1930, foi nomeado prefeito de Foz do Iguaçu por Getúlio Vargas e tinha a ideia fixa de proporcionar luz à cidade que no futuro teria energia de sobra.

    Domínio argentino e estrada em cacos

    Pasa também se preocupava com o total controle argentino sobre a área que é hoje o Parque Nacional do Iguaçu e definiu como prioridade maior a concretização da Estrada Estratégica, futura BR-277, fazendo até o impossível para manter a trafegabilidade do trecho Foz-Cascavel.

    “Meu pai dizia que Foz do Iguaçu só teria progresso se tivesse estrada ligando o Município a Curitiba” (Letícia).

    Foi com esse objetivo que ele requereu ao governo do Estado uma patrola para corrigir os trechos mais difíceis, mas a máquina nunca chegava. Com um rush de obras por todo o Estado, quando não faltavam máquinas, faltavam operadores.

    Depois de muito reclamar, Pasa recebeu a informação de que a máquina reservada a Foz do Iguaçu estava disponível, mas dependia da designação de um operador.

    Pasa chamou o motorista do único caminhão da Prefeitura, João Vale. e foram de ônibus a Curitiba na firme intenção de trazer a patrola, em viagem que na época demorou vários dias.

    Bate-boca à italiana

    Chegando a Curitiba, Pasa foi informado que por estar ociosa a patrola foi destinada a outra finalidade. O prefeito de Foz do Iguaçu quis saber onde a máquina ficava depois do serviço e partiu para o local.

    Protagonizando um bate-boca à italiana com o garagista, Pasa mandou Vale assumir a patrola. A bagagem que haviam levado foi embarcada de volta em ônibus e os dois vieram de patrola para a fronteira.

    “Meu pai chegou sujo e cansado e levou bronca da mãe”, contou a filha Letícia. Depois ele pediu desculpas ao governador Lupion por ter “roubado” a patrola. O governador não as aceitou, respondendo: “Não, Júlio, eu só queria mais alguns prefeitos assim”.

    Pasa conhecia e se relacionava fraternalmente com as famílias cascavelenses, viajando sempre a cavalo para vistoriar o interior do Município.

    O primeiro prefeito eleito de Foz do Iguaçu morreu pouco antes de completar 61 anos, em 1956. Ao receber a extrema-unção pediu que sua morte fosse anunciada por alto-falantes a toda a população e exigiu ser levado de carroça até o cemitério pelo amigo Alexandre Kozievitch.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Os pioneiros italianos vão chegando

    Os pioneiros italianos vão chegando

    O primeiro objetivo era Campo Grande, no antigo Mato Grosso unificado. Os pinhais da região de Taquara Verde, em Caçador (SC), onde a família Formighieri tinha seus negócios, não resistiram à rápida exploração ditada pelas exigências do mercado no pós-II Guerra.

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    O italiano Augusto Formighieri decidiu aplicar os ganhos com a madeira na expansão do próprio negócio, comprando pinhais próximos, também no interior catarinense, mas sentiu que não seriam suficientes para os planos dele e dos filhos Alcebíades, Ademir, Adelar, Pedro, Almiro e Atílio.

    A solução seria procurar áreas novas para ampliar as atividades. “O vovô sempre sonhava com coisa maior”, segundo o neto Valdir Formighieri, filho de Atílio.

    Partindo para uma exploração que os levou inicialmente sem sucesso a percorrer uma grande distância rumo ao Norte, ao passar pelos arredores de Laranjeiras do Sul encontraram um dos irmãos de Augusto, Virgílio, que construía uma estrada na região do Rio Cavernoso.

    Tudo em família 

    Virgílio os informou sobre as atividades da Colonizadora Maripá, que iniciava a exploração da antiga Fazenda Britânia, no Oeste do Paraná, onde haveria uma vasta área de pinhais.

    A partir daí, segundo Valdir, “o assunto em Taquara Verde era só a fazenda Britânia da Maripá”, a vontade já irrefreável de mudar para uma região “com terras planas e boas” (Jornal do Oeste, 22 de abril de 2007).

    José Neves Formighieri, filho de Virgílio, já vivia no interior de Cascavel desde 1946 e em 1952 seria o primeiro prefeito do novo Município. Os filhos de Augusto Formighieri travaram contato com os administradores da Maripá e foram convidados a montar uma serraria em Toledo.

    Foi assim que em 21 de abril de 1947 também chegavam a Toledo os primeiros familiares do patriarca Augusto Formighieri, vindos de Caçador.

    “Nós viemos com tudo de lá, foram seis meses de viagem para trazer toda a ferragem da serraria”, que se localizava na margem esquerda do arroio Toledo (Almiro Formighieri, Jornal do Oeste, 22 de abril de 2007).

    A Fundação de Colonização

    O lendário espontaneísmo da colonização oestina nunca houve. Na verdade, cada ação empresarial vinha na esteira de ações governamentais e os colonos vinham atraídos pela propaganda das empresas e a chance de abrir posses.

    A Fundação Paranaense de Colonização e Imigração, criada pelo decreto-lei estadual 646, de 19 de junho de 1947 para proceder o loteamento e a venda de terras devolutas do Estado, foi apenas uma das várias ações iniciadas já em 1886, com Alfredo Taunay criou a Sociedade de Imigração do Paiquerê.

    Naturalmente, a década de 1940, com o fim da ditadura, trouxe o fortalecimento da sociedade civil, livre para exercer pressão sobre o poder público, iniciando a simultaneidade de ações entre governo e iniciativa privada.

    Ocorrem, nesse caso, respostas imediatas do governo às demandas inspiradas pela família Lupion e agregados em Cascavel e pelo braço político da Maripá de Toledo, a família Dalcanale.

    Organização oficial de apoio à ocupação do interior paranaense, a Fundação Colonização e Imigração tinha como o filé da atração os filhos de imigrantes europeus já com algum pé-de-meia resultante de meio século de presença (e intenso trabalho) no Brasil. Foi o caso do deslocamento da família Formighieri para Toledo.

    Interesses familiares também sociais

    Tendo serrarias em Cascavel, a família Lupion fez incluir um ramal no Plano Ferroviário de Integração do Estado em 1947 que puxaria o trem em Cruzeiro do Oeste rumo ao Sul, alcançando Cascavel e aqui parando, sem mais objetivos adiante, deixando clara a intenção de beneficiar o transporte da madeira em tempos nos quais as vias rodoviárias não suportavam dois dias de chuva.

    A precariedade do ensino, regulado antes pelo Município de Foz do Iguaçu, foi respondida pelo governador Moysés Lupion em 3 de julho de 1947 determinando a construção de um Grupo Escolar e Escola Reunida em Cascavel.

    O estabelecimento foi rapidamente construído e entregue em 24 de setembro pelo inspetor escolar Acácio Pedroso, ex-prefeito de Foz do Iguaçu, à diretora May Ross Ferreira, até a nomeação da primeira diretora pelo Estado, Theonília Pompeu.

    Vizinho à escola, na mesma época, foi construído o prédio próprio da Delegacia de Polícia, já com o concurso do primeiro policial-militar a atuar em Cascavel, Antônio Saks.

    “Construíram a cadeia muito próxima, de fundos com a escola. Na hora do recreio os presos se distraíam assistindo, agarrados às grades, o futebol dos meninos e as cantigas de roda das meninas” (Maria Tereza Samways Lazari, aluna da escola).

    Procura maior: combustíveis e bebidas

    Aos 20 anos de idade, chegando a Cascavel a chamado do irmão Adelino, Arlindo Cattani encontrou naquele dia 7 de setembro de 1947 uma vila com apenas 40 casas, mas já com o grupo escolar e a delegacia de polícia construídos, além de um velho Correio em atividade.

    O interior de Cascavel tinha a suinocultura mais robusta do Brasil e por conta disso o jovem Arlindo passou a transportar porcos para Ponta Grossa.

    Voltava carregado com mercadorias para abastecer a Comercial Oeste Paraná (Copal), empresa que tinha atividades tanto em Cascavel quanto em Toledo. A maior parte da carga de retorno eram bebidas e combustíveis.

    A primeira contribuição importante da família – Adelino, Arlindo e Aurydes – foi a bem montada empresa Comercial Irmãos Cattani, uma espécie de supermercado da época, fornecendo desde gasolina até comestíveis e tecidos.

    A bomba de gasolina dos Cattani deu início ao Posto Central Shell, depois transferido a Waldemar Bomm.

    Inspiração industrial

    A força do estabelecimento dos Cattani estava nas concessões obtidas, começando pelas companhias Shell e Antárctica.

    Bebidas e combustíveis eram produtos que requeriam rápida reposição. Não havia como plantar gasolina na fértil terra vermelha, mas reunir insumos e produzir bebidas pareceu aos ousados comerciantes gaúchos Ernesto Farina e Victorino Sartori uma empreitada promissora.  

    Farina e Sartori também acabavam de chegar à vila de Cascavel e com olho clínico avaliaram o potencial de negócios da região.

    Victorino Sartori era contador e veio prestar serviços em Toledo, mas preferiu se radicar em Cascavel para ampliar seu portfólio de clientes e abrir a indústria de bebidas com Farina.

    A fábrica produzia refrigerantes, vinhos e aguardentes na Rua Pio XII, a mesma rua onde o novo colégio e a nova delegacia ficavam.

    Produziam o apreciado Guaraná Especial e outros refrigerantes com nomes genéricos, tais como Laranjada e Gasosa. “Não existia Coca-Cola e Fanta naquela época”, lembrou Sartori. “As bebidas vinham de Ponta Grossa”.

    Das bebidas ao ramo imobiliário

    A fábrica (“Farina & Companhia”) foi instalada por Victorino em sociedade com o filho de Farina, Valdir, e Silvino Campagnollo. Sartori e Campagnollo venderam depois suas participações a Vitório Guella.

    Com a iniciativa de Guella, a indústria passou a engarrafar cachaça e vinho. O ramo de bebidas também interessou aos empresários toledanos José João Muraro e Antônio Dal Pozo, o primeiro encarregado de transformar em vinho a produção de uvas do segundo.

    Muraro em seguida expandiu a produção para refrigerantes e capilés. Por sua vez, Luiz Gazzoni além de gerir o açougue da colonizadora Maripá também produzia gasosa, o refrigerante preferido na época.

    As iniciativas industriais madeireira e de bebidas, assim como o fortalecimento da educação, ajudaram a reforçar as iniciativas de expansão da estrutura urbana.

    Mesmo na indústria, Sartori não abandonou a contabilidade na Comercial Oeste Paraná Ltda (Copal), a grande empresa cascavelense da época, de Itasyr Luchesa. Além disso, novos clientes começaram a requisitar seus serviços: empresários do ramo imobiliário.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O aprendiz de monge e as freiras

    O aprendiz de monge e as freiras

    Mesmo com a certeza da vitória nas eleições de 1947, Moysés Lupion fez promessas em pencas, desenhando um imenso projeto que abrangia todo o Paraná, agora completo com a recuperação do extinto Território do Iguaçu.

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    Distribuído em dezenas de páginas, o projeto poderia ser resumido em um telegrama: interiorizar o desenvolvimento.

    Para o Norte, transformar cada cidade em uma nova Curitiba. Para o Oeste, igualar-se ao surto de progresso do Norte. Para o Sudoeste, deixar para trás as antigas quedas de braço entre curitibanos e guarapuavanos pelo controle dos Campos de Palmas.

    As eleições municipais no mesmo primeiro ano de governo desarrumaram o arranjo de frente ampla de governo que os partidos apoiadores esperavam.

    No PTB, os interesses trabalhistas foram descartados. No PSD, a intensa disputa entre alas prosseguia e logo de saída a moralista UDN entrou em guerra com os demais partidos. Ao passar para a oposição se entregou a uma agressiva campanha para desmoralizar o governador.

    Famílias chegam a cavalo e em carroças

    Lupion começou o governo cumprindo uma providência essencial ao desenvolvimento do interior, conseguindo do governo federal efeitos imediatos ao decreto nº 22.619: liberação de Cr$ 11 milhões ao Ministério da Viação e Obras Públicas para as obras da rodovia Ponta Grossa-Foz do Iguaçu.

    Cascavel recebeu a medida com festa. Para Toledo, era um elemento a mais para viabilizar a atração de colonos interessados em trocar minifúndios nos estados sulinos por amplos lotes na frente de colonização da antiga Fazenda Britânia.

    Antes vinham esparsamente, mas agora começavam a chegar em levas. Segundo o velho script do pioneiro Jeca Silvério, as famílias que passavam pela antiga Encruzilhada dos Gomes, agora vila de Cascavel e sede distrital, eram convidados a não seguir viagem e se instalar ali mesmo.

    A numerosa família Hotz – o casal e dez filhos – partiu de Itajaí (SC) e ao cabo de 32 dias de viagem optou por se instalar no Centralito, onde Jacob Munhak já havia iniciado a formação de uma comunidade em 1932.

    Constituinte refundou o Paraná

    O governador sabia que obras de transporte, luz, saúde, educação e água demandavam tempo e altos investimentos.

    O Paraná tinha uma das situações econômicas mais equilibradas do país, mas boa parte do orçamento estava comprometido com o pagamento do funcionalismo.

    Lupion havia prometido interiorizar a ação do Estado e unificar as regiões para não sucumbir aos movimentos separatistas que surgiram no interior isolado como reação aos problemas estruturais, inclusive agrários.

    No entanto, antes de conseguir entregar tantas providências necessárias e prometidas havia eleições imediatas para vencer, o que complicava seus planos à medida que os desentendimentos políticos voltavam.

    A primeira urgência era eleger deputados estaduais constituintes, responsáveis pela elaboração das novas leis do Estado. A Assembleia Estadual Constituinte se instalou em 13 de março de 1947 e dela viria a quinta Carta Magna do Paraná.

    O chumbo dos Quatro Granadeiros

    A grande bancada do Partido Social Democrático (PSD), o partido do governador, tinha uma peculiaridade: os chamados Quatro Granadeiros, grupo formado pelos deputados Pinheiro Júnior, Pedro Firman Neto, Accioly Filho e Lopes Munhoz.

    Eles seguiam a orientação política do major Fernando Flores, que já exercera forte predomínio no Estado durante o governo de Manoel Ribas e coordenou a campanha de Lupion ao governo.

    O desgaste de Lupion no governo começou quando os Quatro Granadeiros decidiram propor na Constituinte a criação do cargo de vice-governador, a calhar para o influente Flores. Antes, o governador era substituído pelo presidente da Assembleia.

    Contrariando seus poderosos parlamentares, Lupion boicotou o projeto. Para se vingar, os Quatro Granadeiros apresentaram também um projeto definindo os crimes de responsabilidade do governador.

    O mensalão lupionista

    Para contornar a rebelião, Lupion criou um mensalão paranaense, atraindo para seu lado os deputados do adversário PTB de modo a compensar a perda dos votos dos quatro rebeldes.

    Enquanto Lupion se engalfinhava com seu próprio porão partidário, o planejamento de obras, de estradas a postos de saúde, exigia ação. E na área de saúde, em especial, a urgência era gritante.

    No interior, os “médicos” eram os curandeiros, a “enfermagem” era o benzimento e a “estrutura” se completa com uma imensa farmácia: as matas, com suas ervas, cascas e raízes. 

    Foi exatamente em 1947, quando Lupion sofria para instalar postos de saúde no interior e sem pessoal para atendê-los, que a família do curandeiro Francisco Ferreira Villaca se transferiu para Cascavel, procedente de Candói, no interior do vasto Município de Guarapuava.

    O curandeiro e a parteira

    Nascido lá mesmo, Francisco, o Chico Villaca, chegava com a família formada, já aos 60 anos de idade, trazendo conhecimentos especiais.

    Ainda jovem, ele acompanhara o monge São João Maria, protagonista do trágico episódio do Contestado, no qual um exército de fanáticos religiosos adeptos do Império foi esmagado pela República.

    Villaca aprendeu com o monge rezas de cura e a preparar ervas medicinais, além de ouvir de João Maria uma predição sobre seu futuro, como contou a filha Enedi Rita Villaca da Rocha:

    “Ele disse a meu pai que no futuro ele iria prestar obra de caridade, pois tinha muita capacidade para isso. E como aqui não havia médicos, meu pai indicava os remédios e fazia oração para as pessoas, prestando esse trabalho”.

    Sobrevivente da tragédia do Contestado, Chico Villaca e a esposa Epiphânia Luíza viajaram penosamente ao longo de nove dias com doze filhos, a cavalo e trazendo a mudança em carroça.

    Ao chegar, seriam os primeiros moradores de um amplo sítio com belo pomar na atual Rua Manoel Ribas, na Vila Cancelli.

    Luíza era de família francesa

    Desde o início, a esposa Epiphânia Luíza Villaca, descendente de franceses, integrou-se plenamente ao espírito de caridade que norteava a ação do marido. Parteira, por suas mãos nasceram em Cascavel crianças das famílias de Tio Jeca Silvério, Sandálio dos Santos, Pedro Neppel e, dentre muitas outras crianças, Regina Sperança.

    Luíza não era uma “curiosa”, como as mulheres que faziam partos por exigências circunstanciais. Naqueles tempos de reintrodução do Oeste ao território paranaense, em meio à urgência de proporcionar atenção em saúde à população, Luíza tinha licença para prestar serviços obstétricos concedida pelo Estado.

    Atendia tanto em casa quanto no Hospital Nossa Senhora Aparecida, do médico Wilson Joffre. Depois, também prestou serviços a outros médicos, dentre os quais Álvaro Rabello.

    Chico Villaca, além de receitar compostos com ervas medicinais e preparos homeopáticos, também estava autorizado a receitar produtos farmacêuticos. Quando Luíza morreu, em 1985, uma rua no bairro Canadá recebeu seu nome. Chico dá nome à Fonte dos Mosaicos, na Vila Cancelli.

    As professoras enfermeiras

    Um ano antes da vinda dos Villaca, ao rezar missa em Cascavel, o padre Antonio Patuí se sentiu alvo de sequestro ao ser abordado por dois gaúchos empoeirados e de linguajar confuso.

    Eram Juvenildo Lorandi e Orlando Cambruzzi. “Componentes da primeira caravana que acampou em Toledo, os dois, num papo renitente de enxacocos*, convidavam-no e insistiam para que ele viesse celebrar uma missa no acampamento às margens do arroio” (Oscar Silva et alia, Toledo e sua História).

    O padre cedeu e foi, instalou-se em um barraco, viu que famílias chegavam com crianças e decidiu trazer de Curitiba um grupo de irmãs de São Vicente de Paula para lhes providenciar educação.

    As freiras vieram de táxi aéreo até Cascavel e depois sofreram para chegar a Toledo, onde achavam que iriam lecionar mas foram de imediato transformadas em enfermeiras, atendendo no pequeno ambulatório que a colonizadora Maripá instalou mas não dispunha de pessoal.

    *Enxacocos: linguagem rústica, misturando português com italiano.

    Salário: 36 hectares por mês

    O ambulatório foi a base do futuro Hospital São Paulo, segundo Ondy Hélio Niederauer “equipado com instrumental e medicamentos indispensáveis para tratamento e curativos de emergência”.

    Como não havia médico, as freiras atenderam até o médico Ernesto Dall’Oglio, recém-formado, chegar de Sarandi (RS), contratado pela colonizadora Maripá por Cr$ 10 mil mensais para atender a todos os funcionários da empresa.

    De outras pessoas ele poderia cobrar à parte. O salário combinado correspondia a 36 hectares de terras por mês.

    As irmãs Vicentinas também foram para Foz do Iguaçu, mas lá não precisaram fazer tarefas extras, dedicando-se de imediato a lecionar no Instituto São José. Em Toledo, elas construíram o Colégio Imaculado Coração de Maria (Incomar).

    Fonte: Fonte não encontrada