Autor: Alceu Sperança

  • O militar escalado para perseguir Prestes

    O militar escalado para perseguir Prestes

    Faltavam ainda 60 quilômetros para acabar, mas os militares da Engenharia Militar consideraram cumprida ainda em 1944 a missão de construir a então BR-35, depois BR-277, com a entrega ao tráfego de 40 km da rodovia entre Imbituva e Prudentópolis.

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    Em seu livro “Rodovias Paranaenses Construídas pelo Exército”, o major Oscar Ramos Pereira descreveu a rodovia de cuja construção participou:

    “Saindo de Ponta Grossa com a altitude de 949.890 metros no marco zero, na direção de Periquitos e Conchas, atravessa-se o grande Rio Tibagi (ponte de concreto com 128 metros de vão) e toma-se a direção de Imbituva, onde se chega com 60 km”, descreve Ramos Pereira.

    “Daqui toma-se o rumo dos lugarejos Natal e Manduri, para atravessar, em seguida, o rio dos Patos (ponte General Lúcio Esteves, com 92 metros de vão) e atingir a cidade de Prudentópolis com o km 100. Prossegue-se ao encalço do rio Barra Grande e de Bracatinga, passando-se depois pelo banhadão formado pelos rios Relógio e Areia e que vai até ao sopé da Serra da Esperança (Km 125). Aqui se começa a escalada suave rumo ao cimo da serra (1.200m de altitude) e segue-se pelo chapadão, na direção de Guarapuava, onde se chega ao Km 179 após ter atravessado os rios Xaxim, Pedras e das Mortes”.

    Um militar excepcional

    A Ponte General [Emílio] Lúcio Esteves foi assim denominada em homenagem ao militar que em 1939 passou por uma encolhida vila do remoto sertão paranaense e profetizou que o lugar seria um importante centro urbano no futuro.

    A caminho da Companhia Isolada de Foz do Iguaçu, durante a viagem o general completava seus estudos sobre a região sob seu aspecto estratégico, iniciados com a malograda revolução de 1924 que ele combateu desde o início.

    Esteves se convenceu de que era necessário de imediato pensar em construir uma estrutura militar, então ausente no interior do Paraná entre Guarapuava e Foz do Iguaçu.

    Na fronteira havia o quartel da Companhia Isolada, mas para Esteves aquele entroncamento de antigas trilhas ervateiras seria o lugar ideal para a instalação de uma unidade militar do Exército. Os viajantes chamavam o lugar de “Encruzilhada dos Gomes”, os religiosos o designavam com “Aparecida dos Portos” mas os mapas já o assinalavam como “Cascavel”.

    E assim o general Emílio Esteves determinou a realização de estudos acerca das possibilidades estratégicas de Cascavel no sentido de ali ser implantada uma unidade do Exército Nacional.

    A II Guerra Mundial adiou os planos: fortalecer o quartel de Foz do Iguaçu passou a ser prioritário, inclusive pela simpatia da Argentina com o nazismo e as pretensões expansionistas daquele país sobre áreas do Brasil e do Paraguai.

    A procura interminável

    Nascido em Taquara (RS) em 23 de dezembro de 1883, Emílio Lúcio Esteves recebeu em 1924 o comando do batalhão da Brigada Militar gaúcha e foi posto à disposição do governo federal para combater em São Paulo a revolta tenentista de 5 de julho.

    Nessa data, os rebeldes comandados por Isidoro Dias Lopes ocuparam a capital paulista por três semanas, abandonando então a cidade e deslocando-se para o interior, vindo a ocupar o Oeste do Paraná por sete meses.

    Esteves foi mandado em perseguição a Luís Carlos Prestes, o ousado capitão que para apoiar os rebeldes paulistas sublevou os militares em Santo Ângelo, no oeste gaúcho. Prestes driblou os perseguidores com grande habilidade e nunca foi apanhado em sua marcha pelo Brasil.

    Esteves foi novamente mandado a persegui-lo em Goiás, em 1925, já durante a marcha da Coluna Miguel Costa-Prestes, que percorreu grande parte do Brasil até 1927, mas jamais pôs as mãos nos comandantes revolucionários.

    Escolta de Vargas, assessor de Aranha

    Em fevereiro de 1929, Esteves foi promovido a tenente-coronel. No Rio de Janeiro, servia no Departamento de Guerra em outubro de 1930 quando foi mandado a Ponta Grossa (PR) encontrar Getúlio Vargas, líder da revolução, para acompanhá-lo até o Rio de Janeiro, onde completaria a derrubada do presidente Washington Luís.

    Em novembro foi assessorar o ministro da Justiça, Osvaldo Aranha. General-de-brigada em 1932, presidente do Clube Militar entre 1934 e 1935, nessa função foi acusado pelo interventor no Rio Grande do Sul, Flores da Cunha, de conspirar contra o governo.

    Em abril de 1936, quando comandava a 3ª Região Militar, em Porto Alegre, o governo federal determinou o desarmamento das forças estaduais gaúchas, tirou do governador Flores da Cunha o direito de executar o estado de guerra e o passou ao general Lúcio Esteves.

    Esteves não gostou da ideia de desarmar as polícias. Quando o ministro da Guerra, Eurico Dutra, ordenou que ele ocupasse militarmente a cidade gaúcha de Marcelino Ramos, Esteves desacatou a ordem, seguido também pelo general Guedes da Fontoura, comandante da 5ª RM, sediada em Curitiba.

    Desacatando ordens, visitando o interior

    Em agosto de 1937, por conta de suas interferências, compromissos e influência no Sul, Lúcio Esteves perdeu o comando da 3ª RM e foi mandado para a 4ª RM, em Juiz de Fora (MG). Promovido a general-de-divisão em maio de 1939, foi mandado a Curitiba, para comandar a 5ª RM. Causando resistência no poder, só foi promovido a general de Exército depois de sua morte.

    Foi na posição de comando no Paraná que passou pela vila de Cascavel em 1939 e definiu o local como adequado para sediar uma unidade militar, mas aí o Brasil parou por causa da II Guerra Mundial. Antes de conseguir concretizar o objetivo, o general morreu em acidente de automóvel, em 10 de dezembro de 1943.

    A determinação de considerar Cascavel como sede de unidade militar só começou a ser cumprida em 1972, quando o 2° Grupamento de Fronteira, então inexplicavelmente instalado em Guarapuava, foi transferido para Cascavel, dando origem à 15ª Brigada de Infantaria Motorizada, em 1980.

    Os dois rios chamados “Cascavel”

    Em sua viagem literária pelo trecho da BR-35 entregue em 1944, prossegue o relato de Oscar Ramos Pereira:

    “A subida da serra da Esperança é um verdadeiro espetáculo de beleza e técnica. O panorama descortinado é simplesmente deslumbrante, convidando à demorada contemplação. A altitude de Guarapuava é 1.087,691m. Desta importante cidade continua-se, pelos seus admiráveis campos de pastagem, em direção aos rios Cascavel*, Coutinho, Cachoeirinha e Campo Real até atingir Lagoa Seca (Km 230) e, logo após, Três Pinheiros (Km 235)”.

    De Três Pinheiros, à direita de Retiro e à esquerda da povoação Fachinal de Santo Antônio, em terreno acidentado, chega-se ao Rio Cavernoso, continua a descrição do militar: “É um vale relativamente profundo, cujo nome batismal bem fala e muito caracteriza as suas cavernosas profundezas. O Rio Cavernoso tem numerosas corredeiras que dão passagem a vau e as dos Campos de Candói que podem muito bem ser aproveitadas, como fontes de energia pelos fazendeiros da região”.

    Os demais 60 km ainda permaneciam em obras, mas foi dada uma nova missão aos militares: construir estrada no Paraguai. Tarefa polêmica e difícil, que não lhes traria a satisfação de construir a infraestrutura de seu próprio país. Foi espinhosa e desgastante, redundando em fracasso que contribuiu para apressar a queda de Vargas.

    * Rio Cascavel localizado em Guarapuava. É habitual haver confusão entre o rio guarapuavano e o riacho que dá nome à grande cidade-polo do Médio-Oeste, mas são muito distantes entre si.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O ano mais difícil do Iguaçu

    O ano mais difícil do Iguaçu

    Criado em setembro de 1943, o Território Federal do Iguaçu teve um primeiro ano desafiador. As famílias de imigrantes chegavam em busca do Eldorado que os salvaria da minifundiarização resultante do retalhamento das propriedades das famílias numerosas no Sul.

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    A família numerosa era uma necessidade para os diversos trabalhos da economia rural, mas duas gerações, muitas crises nacionais e a Guerra Mundial semearam inseguranças no interior brasileiro.

    Sendo a novidade do ano, o Território Federal do Iguaçu daria ânimo às famílias de migrantes/filhos de imigrantes. Circulava no Sul a noticia de que bastava a família chegar e tomar posse das terras que conseguisse ocupar.

    A Lei de Terras, que obrigava a aquisição de terras somente mediante compra, de fato liberou as áreas de terras devolutas para os posseiros, mas antes que a corrida ao Oeste começasse as terras mais propícias já estavam griladas em cartórios e ocupadas por empresas colonizadoras.

    Para complicar, havia a dupla ou tripla titulação, fruto de uma interminável guerra judicial entre a União e o Estado. Com isso, quem trazia algum dinheiro se dava melhor, adquirindo áreas sem contestação.

    No entanto, quem precisou tomar posse das terras que o Estado do Paraná havia liberado em seus projetos de colonização teve que enfrentar as manobras federais, grileiros e jagunços armados.

    Garcez: sob pressão e sem apoio

    As tratativas, a burocracia e o ditador Getúlio Vargas demoraram, erraram e não planejaram com cuidado, criando o Território Federal do nada, apenas com algumas escassas instalações estaduais ex-paranaenses e o quartel do 1.º Batalhão de Fronteira em Foz do Iguaçu.

    O primeiro governador territorial, João Garcez do Nascimento, só foi nomeado em 6 de janeiro de 1944. Velho conhecido de Vargas, Garcez se desdobrou para tomar as primeiras providências para instalar o Território e receber o presidente em Foz do Iguaçu, em 27 de janeiro.

    Vargas, que também visitaria as Sete Quedas, em Guaíra, veio e participou de ato no 1º Batalhão de Fronteira, em Foz do Iguaçu.

    O escritor Euclides da Cunha, ao estudar a Amazônia, em 1909, escreveu que “A geografia prefigura a história”. Vargas pôde sentir isso ao ser agraciado com uma de recepção solene, com baile, em um clube que tinha o nome do Estado mutilado: “Oeste Paraná Clube”.

    O Iguaçu tentava sair do Paraná, mas o Paraná não saía do Iguaçu. Ficava sem sentido O estado do Paraná ter quase todo o Rio Iguaçu em seu território e não ter mais o Rio Paraná, que lhe justificava o nome.

    Algo não estava funcionando, desde o início, mas na mídia tudo funcionava bem. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura fazia uma intensa divulgação do programa “Marcha para o Oeste” como realização atual, embora fosse ação já em curso desde os bandeirantes, melhorada nem depois por Cândido Rondon.

    Primeira promessa: 90 milhões. Segunda: 5 milhões 

    Percorrendo longos trechos de estradas que notou em péssimo estado, o Iguaçu que o chefe da Nação encontrou foi um apelo dramático por infraestrutura, ao qual respondeu com uma promessa:

    “O presidente Vargas, indo de automóvel até a ponte do Rio Tibagi, a todos cativou, prometendo 90 milhões de cruzeiros para terminar com a construção [da atual BR-277] até o fim de 1946” (Oscar Ramos Pereira, Rodovias Paranaenses Construídas Pelo Exército).

    O Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, que veio suceder à antiga Comissão de Estradas de Rodagem Federais, de fato elaborou o Plano Rodoviário Nacional, com o Decreto 15.093, de 20 de março de 1944, mas fixou para a obra investimentos de apenas cinco milhões de cruzeiros.

    Os recursos restantes prometidos por Vargas até o final de 1946 esbarraram na marcha da história: ele não terminaria nem a obra nem seu governo. Seria derrubado antes disso.

    O Plano Rodoviário previa a construção de 27 linhas principais em todo o país. Uma delas, a rodovia “Paranaguá–Iguaçu”, com a extensão aproximada prevista de 878 quilômetros, que jamais chegou a ser chamada de “Estrada XVIII”, como constava no Plano Rodoviário original.

    Surge o primeiro prefeito de Cascavel

    Também feito sem cuidado, o Plano Rodoviário Nacional teve que sofrer uma revisão. Nela, a rodovia “transversal” ligando Paranaguá, Curitiba, Prudentópolis, Relógio, Guarapuava, Laranjeiras do Sul, Guaraniaçu, Cascavel e Foz do Iguaçu teria o número 35, com uma extensão de 773 quilômetros. Sua numeração definitiva viria a ser “BR-277”.

    Habituado a construir estradas em Santa Catarina, para participar dessa construção  José Neves Formighieri se mudou para Curitiba. Futuro prefeito de Cascavel, na época com 27 anos e trabalhando com o pai, Virgílio Formighieri, Jose Neves assumiu a empreitada de trechos da atual BR-277 na Serra do Cavernoso e da estrada Laranjeiras–Pato Branco.

    O resultado das pesquisas sobre as necessidades da região feitas às pressas pelo major João Garcez do Nascimento chegou ao Rio de Janeiro, então a capital federal, em abril de 1944.

    Foi dirigido ao ministro Alexandre Marcondes Filho (1892–1974), da Justiça e Negócios Interiores, que se mostrou inoperante frente às necessidades apontadas.

    O curioso caso de Marcondes

    Inimigo de Vargas nas eleições de 1930, o paulista Marcondes Filho também o atacou na Revolução Constitucionalista (1932), mas foi cooptado e se tornou um superministro na ditadura do Estado Novo.

    Foi Alexandre Marcondes quem montou a estrutura fascista de controle dos trabalhadores durante o regime do Estado Novo e preparou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que a esquerda via como cópia da Carta del Lavoro de Mussolini (1927) e os liberais criticavam por aumentar o Custo Brasil.

    Em seu relatório, o major Garcez do Nascimento fez ver ao superministro que havia extrema necessidade de instalar energia elétrica no Iguaçu por meio de geradores movidos a motores.

    Sugeriu, nesse caso, a destinação de recursos para montar a estrutura de fornecimento de energia elétrica para as principais cidades da região, que teria o custo de 60 milhões de cruzeiros, mas o governo ignorou o assunto até o fim da ditadura.

    O quartel da antiga colônia Militar do Iguaçu chegou a ter energia elétrica a diesel, mas só em 1942 Foz do Iguaçu ganhou a Usina de São João. Mas até Laranjeiras, a nova capital, estava às escuras.

    Cascavel, a chave rodoviária

    O governador nomeado para o Território também sugeriu abrir uma rodovia entre Cascavel e o Porto Britânia, com 80 km, outra de Cascavel a Central Santa Cruz e dali ao Piquiri, também com total de 80 km. Garcez compreendeu que era fácil pedir, mas difícil ser atendido.

    Como reflexo das trapalhadas que envolveram a criação do Território, a escolha da capital também foi um parto: os militares do 1.º Batalhão esperavam que fosse Foz do Iguaçu e o engenheiro Luiz Carlos Tourinho, que estudou profundamente a região, sugeriu Cascavel por sua localização geográfica invulgar. “A geografia prefigura a história”…

    Com isso, a definição da capital só foi resolvida pelo decreto 6.550, em 31 de maio de 1944, oito meses depois da criação. Aliás, mal resolvida, pois determinou a cidade de Laranjeiras do Sul como a capital, sem perceber que esta cidade continuava pertencendo ao Paraná.

    No fim, um ano perdido

    Para contornar mais esse lance de comédia pastelão, os burocratas da ditadura tiraram da cartola em 21 de setembro de 1944, um ano depois de criado o TFI, o decreto federal 6.887, que tomava Laranjeiras do Paraná e lhe dava o novo nome de “Iguaçu”.

    O decreto se referia à organização judiciária do Território Federal, determinando que ele seria dividido em quatro comarcas judiciárias, com sedes nas cidades de Iguaçu (ex-Laranjeiras do Sul), Foz do Iguaçu, Chapecó e Clevelândia.

    Também resultado das confusões da época entre os militares do 1.º Batalhão de Fronteira e os prefeitos nomeados pela ditadura, em 1944 o Município de Foz do Iguaçu teve dois prefeitos: Emílio Correia de Oliveira, nomeado em outubro, mas sem qualquer registro de ações, substituído em dezembro pelo professor Acácio Pedroso. O ano foi praticamente nulo.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Surge o Território Federal do Iguaçu

    Surge o Território Federal do Iguaçu

    A grande produção de café obtida pelo Paraná em 1941 não pôde ser repetida por obra das arrasadoras geadas de 1942, embora tenha facilitado a sustentação dos preços em alta no mercado interno.

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    Mesmo com as geadas, portanto, o café paranaense manteve forte a economia estadual nesse início de década. No entanto, as condições sociais da maioria da população eram deprimentes.

    Se a realidade que o médico Altamiro Vianna encontrou em Foz do Iguaçu era de miséria e abandono sobretudo pela expulsão dos colonos de origem alemã e italiana, nas demais regiões também assoladas pelas geadas de 1942 a pobreza dos colonos e posseiros foi piorada pela ação dos jagunços* das companhias colonizadoras, enviados para lhes tomar as terras e destruir as benfeitorias.

    Com o governo federal e o estadual em conflito jurídico, o que mais preocupava no interior paranaense não era a guerra na Europa, já estendida à África, mas a crescente violência pela posse de terras aqui mesmo.

    *Jagunço: civil ostensivamente armado

    Briga Estado x União estimulava corrupção

    Havia intrusões documentadas pelo governo do Estado em quase um terço do território paranaense. Só no Norte Novo havia cinco grandes grilos* registrados: Bandeirantes (403.340 alqueires), Pirapó (369.570), Boa Esperança (255.980), Barra do Tibagi (148.290) e Ribeirão Vermelho (45 mil).

    A intrusagem, para o interventor Manoel Ribas, tornou-se uma indústria lucrativa “e tranquilamente exercida a apropriação indébita das terras pertencentes ao patrimônio do Estado, seja por processos violentos de invasão, seja ardilosamente arranjados, com aparência de legalidade, favorecidos, às vezes, pela complacência de altas autoridades administrativas” (Mensagem à Assembleia Legislativa, 1936).

    Para as autoridades corrompidas, a confusão entre o grileiro, o sertanejo, o posseiro e o intruso criava condições para reprimir os humildes colonos como se fossem invasores, beneficiando os “senhores feudais”, na expressão do interventor Manoel Ribas.

    Para as autoridades prevaricadoras, interessava nivelar as quadrilhas de intrusos aos movimentos de resistência dos colonos e posseiros: a criminalização de todos facilitava atacar os resistentes e abrir caminho aos grileiros, a pretexto de ação para “pacificar” o campo.

    *Grilo – Manobra cartorial fraudulenta. A escritura era posta em gaveta com grilos mortos que davam ao papel a aparência de antigo

    Golpe militar na Argentina trouxe medo

    Nessa confusão generalizada, o Estado do Paraná sofria o confisco de suas terras por parte do governo federal e perdeu vastas áreas, griladas e invadidas pelas quadrilhas de intrusos.

    Tentou reagir, mas timidamente: era tempo de ditadura, mandava quem podia. Mesmo com a ditadura dividida e em fim de feira, o Paraná foi vencido nas duas frentes de batalha.

    Enquanto fermentava o conflito de terras ao Norte, a primeira locomotiva da Estrada de Ferro São Paulo-Paraná alcançava Apucarana em 19 de abril de 1943 e Foz do Iguaçu ganhava sua primeira usina hidrelétrica: a Usina Rio São João, construída no interior do Parque Nacional do Iguaçu.

    Do outro lado da fronteira, na Argentina, a tensões vinham do golpe militar desfechado em junho de 1943. Temia-se no Brasil uma ofensiva platina sobre o Sul brasileiro.

    Tal ação, aliás, faria pouco sentido, já que a feroz disputa entre dois grupos pelo poder em Buenos Aires e a precária conjuntura econômica argentina inviabilizariam uma aventura guerreira.

    Vantagens para Cascavel

    Com as agitações fronteiriças, o impedimento da presença de imigrantes italianos nessas áreas é responsável pelo grande salto de Cascavel: em 1943, a pequena vila recebe um grupo de famílias dessa etnia provenientes do Rio Grande do Sul, puxadas pelas famílias de Pedro Zandoná e Pedro Dal Prá.

    A partir daí, até o fim da guerra, famílias que vieram do Rio Grande do Sul para a região de Santa Helena conseguiram passar de Cascavel por falta de estradas carroçáveis e ali se estabeleceram, iniciando a transformação do lugar em uma das cidades mais importantes do interior brasileiro.

    Na medida em que o Paraguai não atrapalhava e a Argentina se mantinha neutra na guerra, a providência de fortalecer a presença militar na fronteira passou a ter o objetivo de estruturar o já decidido mas ainda não criado Território Federal do Iguaçu.

    O novo Território Federal, supunha-se, deveria ter Foz do Iguaçu como capital. Mas essa definição jamais viria: a cidade da fronteira foi considerada remota demais, uma espécie de fim de mundo para os funcionários federais que deveriam se transferir do Rio de Janeiro para administrar a nova unidade da Federação.

    Frustração em Foz, trapalhada no RJ

    Em 13 de setembro de 1943, quando o decreto-lei 5.812 finalmente cria o Território Federal do Iguaçu, com uma área de 65 mil km², o Paraná perdia mais 44 mil km² de suas terras. Outros 21 mil km² que Santa Catarina já havia tomado na batalha judicial do Contestado também se somaram ao TFI.

    O Território Federal do Iguaçu aparece no mapa do Brasil formado por quatro municípios: Foz do Iguaçu, Clevelândia, Mangueirinha e Chapecó.

    Em 16 de dezembro de 1943, o decreto-lei 6.117 vem estabelecer as normas para colonização a ser seguidas no Território Federal do Iguaçu. A autoridade paranaense, que já era muito limitada, desaparecia completamente da região Oeste.

    O Oeste do Paraná, agora, ficaria em Laranjeiras do Sul. Mas os burocratas do Rio de Janeiro deram um jeito de tomar também esta cidade paranaense, a mais bem estruturada a Oeste de Guarapuava, e fizeram dela a capital do TFI, por ser o ponto mais “civilizado” e com boa estrada até o Rio de Janeiro.

    A frustração dos militares e civis de Foz do Iguaçu só não foi maior que a trapalhada feita na capital da República (o RJ): Laranjeiras foi escolhida para ser a capital, mas não fazia parte do território do Iguaçu.

    Garcez, o primeiro governador

    Houve então apressado esforço burocrático para esticar a área do TFI e tomar do Paraná também Laranjeiras do Sul, para atender aos interesses dos burocratas federais.

    Com a trapalhada e o contorcionismo para corrigi-la, atrasou-se a vigência do Território Federal do Iguaçu. Criado em setembro de 1943, só foi instalado em 6 de janeiro do ano seguinte, quando o ditador Getúlio Vargas nomeou o primeiro governador – João Garcez do Nascimento (1893−1971).

    Ter sido ajudante-de-ordens de Vargas garantiu ao major Garcez do Nascimento a confiança do chefe para a tarefa de governar o Território Federal do Iguaçu.

    De origem paranaense, membro de uma família tradicional das Araucárias, a primeira missão de Garcez foi fazer um levantamento confiável da região compreendida pelo Território Federal do Iguaçu, já criado oficialmente mas ainda não instalado.

    Precisava ser um documento confiável porque o relatório forçado pela Comissão de Zeno Silva, apreciação negativa que atribuiu ao Paraná o papel de vilão da história, foi encomendada para facilitar a tomada do território Oeste.

    Por sua vez, os relatórios paranaenses, na tentativa de evitar que o Estado perdesse ainda mais áreas depois do desastre do Contestado, davam destaque a providências cujos resultados não pareciam consistentes com a realidade.

    Sendo Garcez natural de Curitiba, onde serviu no antigo 9° Regimento de Artilharia Montada, ao designá-lo o arguto Vargas passava a impressão de que o Território não havia sido perdido pelo Paraná, como lamentavam as tradicionais lideranças políticas paranistas.

    O Território Federal do Iguaçu nasceu mal e iria durar pouco, mas ao ser divulgado como Terra Prometida trouxe alento às famílias do Sul que fugiam da crise confiando que o Oeste do Paraná seria seu Eldorado.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Missão: transformar doentes em soldados

    Missão: transformar doentes em soldados

    Em 1943, quando o Brasil sinalizou o envio da FEB para participar dos combates da II Guerra Mundial, chegaram a Foz do Iguaçu ordens expressas do Rio de Janeiro para adaptar a força militar às exigências de um país em estado de guerra.

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    O recém-criado 1.º Batalhão teria que redobrar a vigilância na fronteira com a Argentina e o Paraguai e os soldados em serviço no Oeste paranaense já bem preparados para combater deviam ser enviados para lutar na África, foco de ação dos Aliados nessa época.

    A tática empregada era forçar as tropas nazifascistas a recuar para suas linhas. Elas reagiam às derrotas sofridas na Ucrânia para o Exército Vermelho e a SS alemã até conseguiu libertar o ditador fascista italiano Benito Mussolini, que preso pelo rei da Itália.

    A urgência de enviar tropas à guerra deu origem a um dos episódios mais emocionantes da história das Forças Armadas no isolado território oestino porque o 1º Batalhão de Fronteira recebeu também a ordem de adestrar centenas de novos soldados.

    “Recrutar às avessas”

    Remanescente da extinta Companhia Independente de Foz do Iguaçu, o primeiro tenente médico Altamiro Vianna (1916–2004), que um ano antes chegara do Rio de Janeiro recém-casado, recebeu a incumbência de selecionar cerca de 600 jovens para conscrever como recrutas.

    Logo ao chegar, o médico se deparou com o povo miserável, ignorante e doente. Os colonos de origem alemã e italiana haviam sido expulsos da região. Agora, seu dever patriótico era selecionar em meio a essa população empobrecida os jovens mais capazes para se incorporar à tropa.

    Vianna, encantado por uma revolucionária literatura estrangeira(*), calculou que se tirasse os homens aptos do trabalho que faziam no campo e na cidade iria desestruturar toda a vida fronteiriça, já destroçada pela expulsão dos colonos de origem italiana e alemã.

    A seu ver, deslocar os jovens capazes da produção agrícola para incorporá-los à tropa iria piorar o quadro de miséria e até desabastecer o quartel.

    “Resolvi, então, recrutar os recrutas às avessas: o homem forte, robusto, ficava de lado para que pudesse continuar seu trabalho no campo”, contou o médico em depoimento sobre o drama que protagonizou na isolada Foz do Iguaçu na década de 1940.

    *A Odisséia de um médico americano, de Victor George Heiser (1873–1972), narra a história de um sanitarista atuando na salvação de vidas em dezenas de nações pobres.

    O susto do comandante

    Aproveitar os mais capazes era o dever de Vianna, mas contra toda a lógica de uma correta seleção de homens para a defesa da Pátria, o médico recrutou apenas jovens desnutridos e anêmicos, alheios à produção de gêneros alimentícios e que não davam vitalidade econômica à cidade.

    “No dia em que aqueles recrutas, ainda à paisana, desfilaram, desajeitados, sem energia, diante do comandante, este se assustou pela precária qualidade do material humano que via”, escreveria Vianna, relatando suas memórias.

    Ao ver soldados incapazes de defender a Pátria se arrastando no desfile para se perfilar, o já estressado comandante, capitão Moacyr Lopes de Resende, sempre envolvido em conflitos com a Prefeitura e a Polícia, advertiu severamente o médico sobre a imprudência cometida.

    Vianna retrucou: “Esses lastimáveis recrutas, depois de tratados e alimentados, darão ao Exército um contingente que encherá seu comandante de orgulho”.

    Resende não se deixou convencer e pediu um inquérito a seus superiores. “Eu estava em atividade febril”, contou o médico, ao atestar como “aptos” centenas de elementos incapazes de servir às Forças Armadas, especialmente em tempo de guerra.

    A defesa do médico

    Vianna estava com a carreira em risco, pois o comandante do Batalhão não tinha alternativa a não ser relatar o caso aos superiores, cumprindo o dever militar de apurar qualquer irregularidade.

    Resende, portanto, não poderia ocultar o procedimento incomum do médico de considerar aqueles frangalhos humanos aptos para servir, mas nos meses seguintes ignorou o assunto.

    “Fora dos meus olhos, porém, a máquina burocrático-militar se movimentava com lentidão, dentro da extrema dificuldade de comunicação existente, para proceder ao inquérito solicitado”, narrou o médico.

    O major médico Henrique Moss de Almeida, oficial superior de saúde encarregado de levar a cabo a investigação, finalmente chegou a Foz de Iguaçu, vindo de Curitiba.

    Recolheu a documentação disponível e instaurou o inquérito sobre os procedimentos inusitados do médico militar, que precisou se defender sozinho frente à punição iminente por desobediência em tempo de guerra.

    “Tratei tensamente a verminose e o paludismo que instava quase a totalidade do contingente”, depôs Vianna no inquérito. “Curei a anemia resultante daquelas infestações. Em colaboração com o dentista do batalhão, participei da extração dos dentes com foco de infecção, na grande maioria dos recrutas”.

    A decisão final

    Enquanto o pedido de inquérito se arrastava, os precários recrutas recebiam alimentação regular e praticavam os exercícios físicos normais da tropa, com regime de trabalho e repouso regulares.

    Com outros cuidados profiláticos, eles se transformavam em verdadeiros soldados. A engorda média observada em menos de três meses foi de 13 quilos por individuo.

    O que o major Henrique Moss de Almeida encontrou no quartel, portanto, foi uma tropa de homens corados e bem nutridos.

    Em lugar da punição esperada, o médico Altamiro Vianna recebeu então um entusiasmado elogio por parte do responsável pelo inquérito e também do próprio capitão Moacyr Lopes de Resende, seu comandante já orgulhoso.

    Aliás, Resende se destacou depois junto aos superiores por ter agido nesse episódio estritamente de acordo com a severa disciplina militar.

    Desde o início de seu comando sempre enviou relatórios com denúncias sérias e severas críticas, em guerra aberta com os prefeitos nomeados pela ditadura.

    O almoço da concórdia

    Naqueles tempos de guerra, com a missão de espionar a movimentação dos elementos pró-nazistas no Brasil e na Argentina, o comandante Resende sofreu a acusação de violar a correspondência diplomática platina.

    Certo dia, Resende recebe um aviso do hotel: chegaram ao Porto Aguirre em vários caminhões novos um contingente de trinta praças e seis oficiais da Gendarmería de Buenos Aires que vinham reagir à espionagem brasileira.

    O cônsul brasileiro em Posadas, Lúcio Schiavo, denunciara aos militares brasileiros que o cônsul argentino em Foz do Iguaçu, Eduardo Bianchi, simpatizante nazista, fazia operações financeiras no Rio de Janeiro para o cônsul alemão.

    Houve, de fato, a censura às correspondências do consulado. Ao saber da presença do intimidador contingente estrangeiro em Porto Aguirre o comandante Resende agiu com sagacidade: convidou o comandante argentino, coronel Adolfo Orandi, seu estado maior e respectivas esposas para um almoço no Batalhão de Fronteira. 

    Quando os argentinos foram embora o comandante continuou sua guerra particular com o prefeito (nomeado) Nélson Nascimento Ribeiro, que também controlava a polícia.

    Três anos depois a ditadura caiu e houve a primeira eleição direta para prefeito. Com a volta da democracia, Resende fez uma bela carreira no Exército, granjeando estima e elogios por sua dedicação à história militar, chegando ao generalato.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Cascavel, talhada para ser a capital do Iguaçu

    Cascavel, talhada para ser a capital do Iguaçu

    Cumprindo missão para a inteligência militar da fronteira, o terceiro sargento Manoel Corsino Dias Paredes, então com 25 anos, percorreu a cavalo em 1943 os portos de Foz do Iguaçu e o interior do Município.

    PRINCIPAIS NOTÍCIAS PELO WHATS. ENTRE NO GRUPO

    Eram os tempos da II Guerra Mundial e da ditadura do Estado Novo. Durante 15 dias, o sargento Paredes, que no futuro viria a ser comandante da Polícia Militar do Paraná, percorreu o Oeste do Paraná então conhecido para investigar a segurança na área.

    O relatório da missão não trouxe lances cinematográficos de espionagem, incursões inimigas ou ação de terroristas. Só um crime apareceu: a crueldade cometida pelo regime ao expulsar os colonos italianos e alemães, cuja “culpa” era não saber falar direito o idioma português.

    Sem os colonos filhos de imigrantes, os locais visitados pela equipe do sargento Paredes exibiam uma situação de abandono e destruição.

    “Mantida de maneira a elogiar”

    Evitando o enorme trecho desabitado entre Foz do Iguaçu e Cascavel, encurtando a viagem em vários dias, Paredes encontrou “muita dificuldade, em virtude das pontes estarem caídas, como a de São Francisco Falso”.

    “Passando a serra de Boa Vista e Diamante, onde existe um depósito velho da Cia. Barthe”, o sargento Paredes encontrou mais instalações abandonadas em Barro Preto e seguiu até a Picada do Benjamin.

    Passando por Boa Vista, onde mais tarde seria formada a comunidade de Céu Azul, Paredes seguiu “daí até Cascavel, passando por 2 de Maio, Tatu Jupi, Botu e Depósito Central da Cia. Barthe”.

    Até essa altura da viagem, de todos os lugares que percorreu Paredes só teve elogios para o persistente Valentim Agostini, em Santa Helena. Mas no dia 6 de abril de 1943 outra comunidade o surpreendeu, pela ordem que encontrou:

    “Cascavel […] nenhuma irregularidade ocorre nesse distrito, tendo notado que o povo dessa localidade está consciente do momento atual e a discreta vigilância policial está sendo mantida de maneira a elogiar”.

    Crescimento com educação

    A apreciação positiva da vila de Cascavel e sua gente fez Paredes passar dois dias no local, para descanso dos animais e da equipe. Depois retomou a viagem rumo a Porto Mendes acompanhando os fios da linha telefônica e seguindo a Lopeí, onde encontrou o guarda-linha Jorge Maceno, cuja família teve longa tradição de serviços prestados aos Correios no Paraná.

    Mas até Lopeí e depois de lá, só queixas: “A estrada de rodagem de Cascavel a [Porto] Mendes Gonçalves está abandonada e com quase todas as pontes caídas, não permitindo mais o trânsito de carroças”.

    Cascavel mereceu os elogios do sargento Paredes. A vila progredia e um indicador claro desse fato é que em 1943 a Casa Escolar recebeu a matrícula de 140 alunos, tendo que aumentar o quadro docente de uma para três professoras, dentre elas Dilair, filha do patriarca Jeca Silvério.

    A estranha desculpa do governador

    O sargento Paredes não foi o único a elogiar Cascavel em 1943. Nesse mesmo ano, o engenheiro militar Luiz Carlos Tourinho comunicou a João Garcez do Nascimento, amigo do presidente Getúlio Vargas e primeiro governador do Território Federal do Iguaçu, que havia uma localidade perfeita para ser a capital:

    “Expus-lhe a magnífica situação de Cascavel como capital, chapadão apropriado para ali assentar uma grande e plana cidade, com possibilidade de obter água potável por gravidade. Bastaria, então, para povoar o Oeste com mais rapidez, construir estradas Cascavel-Guaíra e Cascavel-Foz do Iguaçu”.

    No entanto, Garcez rejeitou Cascavel por um motivo que não convenceu: considerou impróprias as instalações postais da vila, alojadas em um casebre. Com a autoridade de governador ele poderia resolver essa deficiência, pois mandou construir um palácio de governo em Laranjeiras.

    O Brasil vai à guerra

    Em 9 de agosto de 1943, quando a União Soviética virava na Europa o jogo contra as forças nazifascistas, no Brasil o Ministério da Guerra criava a FEB (Força Expedicionária Brasileira).

    Finalmente, depois de muita pressão sobre Vargas, surgia a possibilidade efetiva de uma intervenção militar brasileira na guerra, já que os Aliados planejavam uma ofensiva na Itália.

    A estruturação da FEB coincide, em 23 de agosto de 1943, com a extinção da Companhia Independente da Fronteira, de 250 homens, instalada em Foz do Iguaçu. Em seu lugar o decreto 5.770 criou em 1º de setembro o 1.º Batalhão de Fronteira, que teria um efetivo de 700 homens.

    A medida indicava que Foz do Iguaçu seria a capital do Território Federal do Iguaçu, criado por sua vez em 13 de setembro pelo Decreto-Lei 5.812.

    Com uma área de 65.000 km², extraindo 44.000 km² do Paraná e 21.000 km² de Santa Catarina, o Iguaçu foi dividido em quatro municípios: Foz do Iguaçu (todo o Oeste paranaense), Clevelândia, Mangueirinha e Chapecó (o Oeste catarinense). Laranjeiras do Sul, que sequer fazia parte da área inicial do Território, foi escolhida para ser a capital.

    Onde fica “Guairacá”?

    As autoridades do Iguaçu decidiram também tirar de Cascavel seu nome histórico para diferenciá-lo da cidade homônima no Ceará. Tempos de ditadura, no embalo nacional-patriótico fascista da época, decidiram sem consultar a população, dar a Cascavel o nome de “Guairacá”, que a população recusou.

    O novo nome ficou só na burocracia do TFI: a correspondência encaminhada à região era dirigia a essa fantasiosa “Guairacá”, que ninguém sabia onde ficava.

    Por sua vez, confiando que o Território do Iguaçu lhes traria dias melhores que a perseguição injustificada, os colonos de origem italiana começaram a chegar em maior número. As famílias de Pedro Zandoná e Pedro Dal Prá foram as primeiras a se estabelecer em Guairacá/Cascavel.

    Outras viriam porque os colonos que pretendiam se instalar ou voltar a Santa Helena não podiam seguir adiante pela impossibilidade de trânsito para as carroças, como alertou o sargento Paredes.

    Prefeito brigou com o açougueiro

    Apesar dos elogios à segurança da comunidade, quem chegava com carroça carregada de mudanças tinha o plano de seguir à fronteira, de onde teria acesso fluvial aos excelentes produtos vindos de Buenos Aires.

    “[quando chegamos] Cascavel tinha quatro casas. A área onde hoje está a Avenida Brasil nós abrimos em 1943, com uma patrola que levamos de caminhão. Praticamente abrimos a estrada, a partir de Guarapuava, pois fomos obrigados a refazer o leito para passagem de nossos caminhões” (David Lupion).

    Nesse ano, Foz do Iguaçu teve dois prefeitos. O tenente Nelson Nascimento Ribeiro, também chefe de polícia, atritou-se com os militares:

    “Cerca de uns 3 meses [o tenente], brigou com o açougueiro […] e deixou a população praticamente sem carne. Interessante é que este mesmo açougueiro é agora seu substituto na delegacia. Aqui tem tanta gente em condições, mas o tenente escolheu o mais bronco, e mais rude, o mais ignorante. Parece até que houve um propósito em ofender o pessoal daqui” (Informe do comando do 1.º  Batalhão datado de 13 de outubro de 1943).

    Futebol diplomático irritou militares

    Os atritos se explicavam pela crescente reação à ditadura tanto entre os civis como entre os militares.

    Não é de estranhar que os ataques chegassem a minúcias na intenção de desqualificar adversários: o prefeito-delegado jogou futebol no dia 7 de setembro daquele ano em Foz do Iguaçu à frente de uma equipe formada por paraguaios e supostos bandidos da fronteira, o que lhe rendeu uma denúncia dos militares por associação com maus elementos.

    Se não fossem os atritos e as intrigas, a atitude festiva do prefeito no feriado seria tida apenas como ressocialização de prisioneiros e um ato diplomático com os vizinhos do outro lado da fronteira.

    Mas a denúncia funcionou: em 3 de novembro, Ribeiro foi substituído na Prefeitura por Ayrton Ramos, o tesoureiro municipal.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Viagem a cavalo traçou retrato do Oeste

    Viagem a cavalo traçou retrato do Oeste

    Cascavel já estava solidamente colocada no mapa da madeira paranaense desde a primeira metade da década de 1940, vivendo uma saudável sensação de prosperidade crescente, mas o Brasil em geral vivia um estado de apreensão generalizada.

    Supunha-se que muitas vantagens viriam da adesão imediata do Brasil aos esforços dos Aliados para vencer o nazifascismo. A ditadura, dividida, hesitava entre a neutralidade e a declaração de guerra ao Eixo, exigência dos movimentos pela redemocratização do país.

    Getúlio Vargas relutava em enviar tropas à Europa. O jornalista Assis Chateaubriand (1892–1968), que viria a dar nome a uma importante cidade da região, tomou a iniciativa de organizar a Legião Latino-Americana, composta de voluntários brasileiros, argentinos, uruguaios e paraguaios dispostos a lutar junto aos Aliados.

    Chateaubriand comunicou a iniciativa ao ministro da Aeronáutica, Salgado Filho (1888–1950): “Agora já temos várias dezenas de cadáveres de brasileiros vitimados por torpedos nazistas disparados contra navios mercantes nossos e neste governo ninguém quer nem ouvir falar em luta armada. O Estado Novo não quer saber de entrar para valer na guerra, e Getúlio muito menos. (…) Estamos transformados num magote de sapos acovardados”.

    No último dia de agosto sai finalmente a declaração de guerra à Alemanha e Itália. Há manifestações de regozijo pela atitude corajosa finalmente tomada pelo governo brasileiro depois de muita hesitação.

     

    Cascavel mais aconchegante

    Alheio a essas movimentações, o interior do Paraná viveu um rigoroso inverno em 1942. Os viajantes que transitavam pela vila de Cascavel, a cada dia em maior número, para negociar pinhais, explorar e exportar madeira, sofriam para se alojar em boas condições.

    Eles chegavam a cavalo, de caminhão ou carroça à procura dos serviços oferecidos pela vila, como cuidados com os animais de montaria, consertos de carroças e alimentação.

    Para maior comodidade dos viajantes, José Bartnik e a esposa Bertha abriram um hotel com o nome da família, na Avenida Brasil, diante da futura loja Auriverde.

    Grande construção com 30 quartos e uma freguesia composta majoritariamente pelos motoristas de caminhão que transportavam madeira a Foz do Iguaçu, ali foram realizadas muitas festas de casamento e vários bailes. O médico Wilson Joffre se hospedava no Hotel Bartnik e deu consultas em seu quarto até construir o Hospital Nossa Senhora da Aparecida.

     

    Nazistas são rechaçados

    Entra setembro e oficialmente o Brasil já figurava como parte ativa no conflito mundial, mas a guerra declarada à Alemanha e Itália continuava só no papel. O ano de 1942 termina com todo o território nacional se preparando para viver em estado de guerra.

    No Rio de Janeiro, puxada pelos estudantes da UNE, cresceu em janeiro de 1943 a pressão popular pelo imediato ingresso do Brasil com força armada no conflito mundial.

    Aproveitavam que no final desse mês o ditador Vargas se encontraria com o presidente americano Franklin Roosevelt (1882–1945) em Natal (RN), no curso de negociações para o ingresso efetivo do Brasil na guerra.

    Fevereiro de 1943 começa com uma espetacular virada estratégica, jamais esperada pelos agressores nazistas: a União Soviética resistiu à invasão sofrida e venceu a batalha de Stalingrado, abatendo 200 mil soldados invasores e aprisionando outros 90 mil.

    A partir de agora, Hitler começará a se encolher para posições defensivas e a simpatia do governo brasileiro pelo nazifascismo se reduzirá na proporção direta da agora já concreta perspectiva de sua derrota e dos acenos dos EUA de vantagens ao Brasil em troca da adesão aos Aliados.

     

    O Oeste sem filhos de imigrantes

    A situação desoladora do Oeste depois da expulsão dos colonos de origem italiana e alemã ficou evidente por um relato bastante objetivo feito pelo terceiro sargento Manoel Corsino Dias Paredes, então com 25 anos.

    Ele percorreu a cavalo os portos de Foz do Iguaçu e o interior do Município a serviço da Delegacia Regional de Polícia. Inspecionando portos nos rios Iguaçu e Paraná, evitando o enorme trecho desabitado entre Foz do Iguaçu e Cascavel, Paredes fez um significativo retrato do Oeste paranaense durante a II Guerra Mundial.

    Expondo os esforços dos raros colonos que ficaram e as dificuldades da região com o conflito, mesmo distante do teatro das ações militares, o relato de Manoel Paredes trata mais da geografia que de crimes.

    O maior deles, aliás, foi a expulsão dos colonos alemães e italianos, que sem culpa, apenas com base nas etnias, foram jogados no desespero, despojados e partindo sem direito à defesa, deixando um quadro de graves prejuízos à economia da região.

     

    Paisagem de abandono

    O sargento Paredes partiu em 13 de março de 1943 e diariamente anotava o que via, mencionando os nomes dos raros colonos que encontrava e a situação dos portos e vilas esvaziadas.

    Relatou os serviços de balsa e travessias feitos por argentinos e paraguaios, a economia baseada nas culturas de subsistência, predominando plantações de milho, arroz, feijão, mandioca e fumo, além de criações de gado, carneiros, porcos e galinhas.

    Encontrou o Porto Ipiranga abandonado, com apenas um morador, o paraguaio Rozário Benítez. No Porto Ocoy, o mesmo Benítez, ali residente desde 1903, criava porcos e tinha um campo de aviação particular.

    O Porto Sete de Setembro, igualmente abandonado. No Porto Itacorá, nenhum movimento, a não ser a extração de madeira feita por Jerônimo Vargas. O Porto Sol de Maio, antiga sede da Companhia Espéria, desativado e sob a intervenção do administrador Agenor Silveira, que ficou para cuidar de lavouras e criação.

     

    Cooperativa quebrada

    Encontrando várias casas da companhia Espéria abandonadas e a Cooperativa Manoel Ribas, formada por 60 famílias de agricultores, quase à falência, havia um sinal de prosperidade desafiando tanta desolação: a casa comercial de Valentin Agostini.

    A história de Agostini é um dos mais significativos exemplos do esforço dos filhos de italianos que vieram para o Oeste desafiar as adversidades da época.

    Nascido em Estrela (RS), Valentim plantou milho em Buenos Aires até 1921, quando decidiu seguir para a anunciada colonização de Santa Helena, atendendo a um convite do colonizador André Zílio.

    Saindo de Porto Belo (RS), contratado por Zílio, a missão inicial de Agostini era construir um barco particular para o transporte da diretoria e empregados da colonizadora Méier, Annes & Cia, iniciadora do projeto inicial de Santa Helena, que ficou conhecido como “Santa Helena Velha”.

     

    O barco da honra

    Logo ao chegar ao Oeste do Paraná, ainda em 1921, Agostini construiu um moinho e descascador de arroz movido a roda d’água porque o projeto de construção do barco inicialmente projetado foi posto de lado com a falência da empresa.

    Mas Agostini não desistiu. Não só ficou, para trabalhar com o novo filão da exportação de madeira, como também manteve a ideia de construir o barco, que fez por sua própria conta.

    Na época em que foi visitado pelo sargento Paredes, Agostini dava continuidade ao antigo projeto de construir o sonhado grande barco brasileiro para navegar no Rio Paraná, finalmente lançado às águas em 1944. Ele morreu no ano seguinte, mas seu compromisso de honra foi cumprido.

    Depois de dar um dia de descanso aos cavalos da expedição, em 3 de abril de 1943 o sargento Paredes decidiu iniciar a viagem de Santa Helena a Cascavel por uma antiga estrada ervateira.

    Reduzida a um carreiro por onde carroças carregadas não mais passavam, o resultado da penosa viagem foi atestar a inviabilidade da estrada. No entanto, ao chegar à sede distrital de Cascavel o sargento Paredes, que no futuro iria comandar a Polícia Militar do Paraná, teve uma grande surpresa, que o fez permanecer dois dias no local.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Longe da guerra, a luta contra a perseguição

    Longe da guerra, a luta contra a perseguição

    Em novembro de 1942, o prelado (bispo) de Foz do Iguaçu, dom Manoel Koenner, regressava de viagem a Minas Gerais, onde participou de evento religioso. No porto, ao desembarcar do navio Cruz de Malta, foi revistado pela polícia da fronteira, que encontrou na bagagem uma carta escrita em alemão.

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    Em tempo de guerra, e em plena ditadura, qualquer suspeita de ligação com a Alemanha ou Itália valia por uma condenação. A carta era do religioso Irmão Gregório (Paulo [ou Pedro] Backers), que viveu em Foz do Iguaçu na década de 1930 e foi transferido para Belo Horizonte. Esta endereçada a um morador na fronteira, João Jorge Roth.

    Na carta, traduzida pelo engenheiro holandês Otto Trompczynski, o religioso apresentava condolências pela morte de uma pessoa da família Roth e lamentava as más condições da assistência de saúde à população (“nós estamos no Brasil, onde tudo é pesteado”), da carestia (“hoje em dia tudo é tão caro”) e da criminalidade desenfreada (“a canalhada entrou por aqui e quebrou tudo”), que a polícia considerou ofensivas ao Brasil.

    Uma vida sem paz

    Foi apenas o começo das dificuldades enfrentadas por Manoel Koenner. Ele e a família Roth foram convidados a se retirar da cidade. mas o religioso não acatou a ordem, por falta de motivo real para se afastar de suas atividades religiosas.

    Nascido na Silésia, Alemanha, em 1885 e ordenado sacerdote em setembro de 1910, Koenner partiu para missão de Moçambique, então colônia lusa. Em 1916, durante a I Guerra, os padres alemães das colônias foram presos, libertos somente em 1919.

    Depois de livre, padre Koenner se dirigiu novamente à Alemanha, de onde foi designado para atuar no Brasil, em 1921. Foi professor em Belo Horizonte (MG), onde chegou a superior provincial de sua congregação e recebeu designação para dirigir a Prelazia* de Foz do Iguaçu em dezembro de 1939, chegando à fronteira em junho do ano seguinte.

    Ignorava que no depósito da Prelazia estavam caixas pertencentes a um nobre húngaro – o arquiduque Karl Albrecht de Habsburg, membro da família real austríaca – que planejava um projeto agrícola no Paraguai e se hospedou na Prelazia, que alugava quartos na ausência de bons hotéis na cidade.

    *Prelazia era uma espécie de diocese católica.

    O flagrante: para agricultura ou terrorismo?

    Acompanhado por um químico, um médico e um aviador*, todos húngaros, o nobre austríaco se hospedou na Casa dos Padres e durante a semana ia ao Paraguai com sua equipe para estudar o solo da fazenda.

    “No início de 1938 foi para a Europa, mas prometeu voltar logo neste mesmo ano. Mas quando em março de 1938 as tropas de Hitler invadiram a Áustria ele foi preso e não voltou mais” (Martinho Seitz, História da Paróquia São João Batista de Foz do Iguaçu).

    Ficaram na Prelazia caixas com objetos pessoais e material de uso para trabalhos agrícolas e explorações minerais, além de fuzis, munição e alguma dinamite. Se portar uma simples carta valeu ao prelado a expulsão da cidade, esse material o levou a ser afastado das atividades religiosas e à prisão.

    Na madrugada de 19 de janeiro de 1943, o delegado regional Glaucio Guiss invadiu a Prelazia e acordou o prelado anunciando diligência policial. No depósito da Prelazia, ao lavrar a prisão em flagrante do prelado, comunicou ter encontrado “máscaras contra gases asfixiantes, dois caixões contendo munição para fuzil e grande quantidade de bombas”.

    “Ao interrogá-lo, o delegado ouviu que o padre desconhecia o conteúdo dos caixotes encontrados na igreja e que sabia apenas que pertencia a uma comissão austro-húngara que estivera em Foz do Iguaçu em 1937” (Micael Alvino da Silva, A Segunda Guerra Mundial e a Tríplice Fronteira).

    *O aviador era o piloto da aeronave própria do arquiduque.

    Três anos de prisão por guardar bombas

    Até ser novamente preso, Koenner atendia a uma vasta região. A Prelazia tinha abrangência do centro do Estado até as barrancas do Rio Paraná. Em Cascavel, rezava missas na pequena capela-escola mandada construir por Jeca Silvério próximo à Encruzilhada.

    Manoel Koenner andava sempre a cavalo em suas jornadas pelas capelas do interior. Usava botas altas, chapéu largo e guarda-pó, que mais tarde trocou por uma blusa de couro.

    Como os religiosos do Verbo Divino vinham da Alemanha, para tirá-los da pressão em Foz do Iguaçu as autoridades religiosas decidiram transferir a Prelazia para a sua capital do território Federal do Iguaçu, Laranjeiras do Sul.

    Destituído da Prelazia sem direito a defesa, em setembro de 1943 o religioso foi levado ao Rio de Janeiro, onde respondeu a processo sob liberdade vigiada, sendo condenado a três anos de prisão pela guarda de explosivos na fronteira.

    No início de 1944, d. Manoel recebeu a solidariedade de personalidades descontentes com o julgamento do ano anterior. Entre os que o defenderam se encontravam o ministro da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra*, e a Nunciatura Apostólica no Rio de Janeiro.

    Motivo: a Santa Sé conseguiu uma declaração do arquiduque austríaco responsável pelo abandono de material bélico na Prelazia. Ele teria sido preso e torturado pelos nazistas e ficou sem condições de retornar às suas atividades.

    *Dutra seria eleito presidente da República em 1945

    O fim do pesadelo

    Koenner foi absolvido em fevereiro de 1944, com seu processo arquivado por carecer de base jurídica. Como consequência, os padres afastados de Foz do Iguaçu puderam retornar e no dia 27 de fevereiro houve a celebração de missa na Igreja de São João Batista em manifestação de júbilo pela correção do erro judicial.

    Koenner foi ordenado bispo em março de 1948. Mas só em 1959 d. Manoel Koenner foi totalmente reabilitado pela Nunciatura Apostólica, que admitiu haver cometido uma injustiça com o prelado por ocasião das denúncias contra ele assacadas durante a II Guerra.

    Koenner morreu em 9 de dezembro de 1968, na Alemanha, reabilitado e sepulto com as honras de bispo no pequeno cemitério da Casa Missionária de Dribug.

    O religioso alemão não foi o único perseguido sem direito a defesa. Cerca de 200 pessoas adultas estavam na relação dos expulsos da fronteira sem culpa formada. Em região pouco habitada, população reduzida e escassas famílias produzindo, perder 200 adultos e suas crianças comprometeu seriamente o desenvolvimento de Foz do Iguaçu e Santa Helena.

    “A maioria dos retirados tinha obtido no passado suas propriedades agrícolas com os militares (Colônia Militar), enquanto outros adquiriram por meio da Companhia Espéria. Eram posses que não tinham como levar consigo e que lhes garantiam pouco mais do que a sobrevivência” (Micael Alvino da Silva, A Segunda Guerra Mundial e a Tríplice Fronteira).

    Fonte: Fonte não encontrada

  • A primeira hidrelétrica do Oeste

    A primeira hidrelétrica do Oeste

     

    No início da década de 1940, os brasileiros que chegavam a Foz do Iguaçu se sentiam humilhados pela dependência da população à Argentina. Toda a energia elétrica consumida na região do Parque Nacional era produzida no país vizinho.

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    Assim, a inauguração da primeira usina hidrelétrica na região, em 1942, foi saudada como uma espécie de nova independência do país, 120 anos depois do 7 de setembro de 1822.

    Represada no pequeno Rio São João, a usina foi projetada pelo arquiteto mineiro Ângelo Murgel (1907–1978). A execução da obra ficou a cargo da empresa Dolabela e Portela, especializada em hidrelétricas.

    Tinha dois geradores Ateliers da fábrica Derlikon. Importados da Suíça, “os equipamentos desembarcavam no Porto de Santos, sendo transportados de trem até Presidente Epitácio, interior de São Paulo e pelo Rio Paraná em barcas especiais até Guaíra. De Guaíra à Foz do Iguaçu eram transportados em carros com tração animal” (Nivaldo Pereira da Silva, História de Foz do Iguaçu).

    Socorro argentino

    A Prefeitura de Foz do Iguaçu, Município formado por todo o Oeste paranaense, foi administrada nos primeiros meses de 1942 pelo capitão-prefeito-delegado Melchíades do Vale, substituído em setembro pelo major Artur Borges Maciel, que era tenente em 1924 e frente de um grupo de 23 soldados não conseguiu impedir os revolucionários de ocupar a região.

    Depois Maciel foi delegado de Polícia de União da Vitória, em 1930, e ao voltar à fronteira como prefeito não deixou saudades. Foz do Iguaçu não estava à altura da situação privilegiada de tríplice fronteira.

    “Pouco acima da margem do porto, um pequeno centro comercial permitia aos moradores locais venderem sua produção agrícola e comprarem produtos de abastecimento, como trigo e enlatados. Somente do lado argentino era possível comprar por reembolso postal e, em termos de serviços públicos, o correio e o telefone foram apontados com agilidade incomparável” (Depoimento de José Schloegoel ao historiador Micael Alvino da Silva).

    Até ler era proibido

    No início de 1942, depois dos torpedeamentos de navios brasileiros por submarinos alemães, o Brasil rompeu relações com o Eixo. O governo federal determinou que todos os imigrantes de origem alemã, japonesa e italiana que não falassem a língua portuguesa fossem retirados a uma “distância segura” de cem quilômetros das linhas divisórias internacionais, com a máxima urgência.

    Depois de levar alimentos para trocar em Puerto Aguirre (hoje Puerto Iguazú) por produtos que vinham de Buenos Aires, como farinha de trigo e querosene, o agricultor Martin Nieuwenhoff pegou em sua caixa de correio na Argentina um jornal escrito em alemão.

    Abordado pela polícia, foi preso pela posse da publicação em nome da “Lei de Fronteiras”, que dava total autonomia às autoridades policiais e militares no controle e repressão às colônias alemãs e italianas no Brasil.

    “A Lei de Fronteiras foi baixada a partir de informações coletadas, que davam conta da existência de uma forte organização ligada ao Partido Nazista Alemão, através da Ação Integralista Brasileira, dirigida por Plínio Salgado (…) Exerciam estas organizações uma flagrante autoridade sobre as escolas, hospitais, maternidades, sociedades de todo o gênero, comércio e indústrias pertencentes a alemães” (Memórias de Foz).

    Prejuízos à colonização

    “Quando a Delegacia Regional de Polícia de Foz do Iguaçu fez um levantamento dos súditos do Eixo que residiam na jurisdição, constatou que havia cerca de 160 famílias […] metade dos quais eram italianos que residiam concentrados na Cooperativa Manoel Ribas (Santa Helena)” (Micael Alvino da Silva, A Segunda Guerra Mundial e a Tríplice Fronteira).

    Ainda em 1942, a ditadura do Estado Novo, sob a alegação de que a empresa pertencia a italianos, baixou o decreto 4.166, confiscando todos os bens da Companhia Espéria, colonizadora que vendia terras localizadas no Oeste paranaense.

    A Espéria havia sido uma iniciativa do Instituto Nacionale di Credito per il Lavoro Italiano All’Estero. A empresa, que com dificuldades atraía colonos sulinos para povoar o Oeste do Paraná, iniciara o projeto da chamada Santa Helena Velha, em 1926, e havia criado os portos Santa Helena e Sol de Maio. Com o fracasso de seu projeto colonizador, a Espéria desativou o setor de colonização e passou a atuar apenas na extração da madeira.

    “Naquela época o medo reinava entre os agricultores de origem alemã e italiana, espalhados em pequenas e médias chácaras ao longo da Estrada Velha para Guarapuava e nos distritos de Santo Alberto e São João, no município de Foz do Iguaçu. Havia rumores de que os colonos estavam fazendo reuniões e que muitos de seus membros colaboravam com o nazismo” (Documentos Revelados, 21/8/2021).

    Delações por bajulação

    O delegado Cláucio Guiss, o escrivão de polícia Aracy Albuquerque Neira e o agrimensor da prefeitura, Otto Kucinski, informaram que “os alemães de Foz do Iguaçu estavam se armando e que durante as reuniões gritavam a famosa saudação nazista Heil Hitler”.

    “Devido a esses boatos, muitos colonos foram presos e enviados para Guarapuava. Os documentos […] informam os desterros e retorno de famílias pioneiras de Foz do Iguaçu, como a família Nadai, Kapfenberger, Holler, e outras” (Documentos Revelados).

    Para o efetivo cumprimento da imposição, criaram-se áreas de concentração para a permanência dessas populações “perigosas”.

    “Os estrangeiros eram proibidos de permanecer na fronteira. Meu pai [Pedro Basso], sendo italiano, tinha que ir embora de Foz do Iguaçu. Recebeu, porém, autorização do Exército para permanecer, porque as autoridades utilizavam muito seu hotel e restaurante” (Irineu Basso, jornal Gazeta do Iguaçu, 27/06/93).

    A desafiadora malária

    Além das perseguições sofridas pelos descendentes de imigrantes na fronteira – só um caso real de ação política nazista foi identificado na região Oeste – a colonização que andava rápida em Foz do Iguaçu sofreu também uma epidemia de malária em 1942.

    Para abalar ainda mais a ditadura do Estado Novo, a ampla divulgação em 1942 de que o mosquito transmissor da malária havia sido erradicado no Brasil teve uma dura resposta do próprio vetor, ao expandir seu ataque também para o Sul do país.

    “Tivemos que ir embora de Foz do Iguaçu devido a uma epidemia de malária. Não havia remédio, e o jeito foi ir embora para Curitiba, aconselhados pelo médico Dirceu Lopes. Levamos 21 dias para chegar a Curitiba, de caminhão. Eu, a mulher e os filhos estávamos quase todos com malária. De Curitiba fomos a Morretes” (Fausto Palma, Gazeta do Iguaçu, 1994).

    Sempre ela, a cloroquina

    Na época da II Guerra Mundial, quando a necessidade de combater a doença exigiu pesquisa e investimentos por parte dos governos envolvidos no conflito, foi anunciado um novo método para dar combate à malária: o sal de cozinha misturado a um medicamento denominado cloroquina.

    A aparente eficácia do método induziu à suposição de que a cloroquina seria a panaceia necessária para erradicar a doença, mas ela também causava problemas à saúde.

    A história da cloroquina é cercada de polêmicas e mortes. Anteriormente com outros nomes e variações, principalmente a resochina, apresentava graves efeitos colaterais derivados da alta toxidade.

    Testada em pacientes com distúrbios psiquiátricos em hospícios, ela esteve no centro de uma disputa entre pesquisadores estadunidenses e alemães. Mas pelo menos em 1942 o mosquito venceu tanto os nazistas quanto os Aliados. 

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Mundo em guerra, Brasil em paz

    Mundo em guerra, Brasil em paz

    Com a criação do Ministério da Aeronáutica, em 1941, o Correio Aéreo Militar passou a se chamar Correio Aéreo Nacional e logo de saída propiciou a inauguração do Aeroporto do Parque Nacional do Iguaçu.

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    Sob a administração do Ministério da Agricultura, foi um marco de progresso que logo levou à conquista da linha internacional Rio de Janeiro-Assunção-Buenos Aires: a empresa Pan American Airways prometeu voos semanais a Foz do Iguaçu.

    A oferta de transporte aéreo abriu campo ao interesse pessoal dos empresários sulistas interessados em investir no Paraná. As visitas começam e se intensificam. Os mapas e as avaliações iniciadas com as primeiras viagens resultariam em projetos ambiciosos de colonização.

    Havia, no entanto, uma preocupação limitante: os empresários que chegavam a bordo dos aviões em seus roteiros semanais a Foz do Iguaçu encontravam praticamente uma terra estrangeira, com moeda e idioma alheios.

    Ao se inteirar da situação de insegurança na fronteira e ainda sem condições de projetar quando a II Guerra poderia terminar, os projetos eram traçados para ficar em compasso de espera, aguardando mais incentivos.

    Não era animador saber que as crianças brasileiras iam estudar na Argentina, onde cantavam o hino nacional daquele país. Foi assim que ainda em 1941 as autoridades locais se viram pressionadas a criar um espaço de brasilidade no “Brasiguai” que o Oeste do Paraná era então.

    Desencadeou-se “uma campanha de alfabetização com o maior sucesso, pois em determinados trechos da fronteira com a Argentina, as crianças brasileiras atravessavam-na para adquirir nas escolas desse país os conhecimentos que não lhes eram ministrados em nosso território” (Ademar Marques Curvo, Livro de Ouro do Ministério da Guerra III Exército).

     

    Hitler invade a Rússia, Japão ataca EUA

    Em junho de 1941 a II Guerra chegava ao auge da violência e insanidade. Hitler invadiu a Rússia com a elite de suas tropas, na Operação Barbarossa, e a União Soviética reagiu com a Grande Guerra Patriótica.

    Os nazistas ocupam a Ucrânia, mas enfrentarão severa resistência russa. O desfecho desse ataque, decisivo para os objetivos dos invasores, custou o sacrifício de 20 milhões de vidas.

    A essa altura, as pressões exercidas pelos EUA sobre a ditadura brasileira já havia produzido efeito. A neutralidade frente ao nazifascismo se convertia em bom negócio em 1º de outubro de 1941, quando foi celebrado o Acordo Brasil-EUA.

    O Brasil cedia Natal (RN) para ser uma base aérea estadunidense em troca do desenvolvimento da siderurgia nacional.

    Em novembro, a URSS vencia os nazistas na Batalha de Moscou e o Eixo tentaria um lance ousado em dezembro, quando o Japão atacou a base dos EUA em Pearl Harbor (Havaí).

    O resto de neutralidade que a ditadura brasileira ainda mantinha em relação aos países do Eixo se dissolve em 28 de janeiro de 1942, quando Vargas determina o rompimento de relações com a Itália e a Alemanha.

    Em represália, em fevereiro um submarino nazista afunda o navio brasileiro Buarque, fazendo 54 mortos, no primeiro de uma escalada de ataques.

     

    Tudo leva à guerra

    Em 18 de agosto de 1942, estudantes ocupam o clube alemão Germânia, no Rio de Janeiro, e o prédio se torna a sede da UNE.

    Como em resposta, a 22 de agosto o submarino alemão U-307 afunda cinco navios mercantes brasileiros, nas costas de Sergipe, com a perda de 607 passageiros. O povo irado sai às ruas exigindo que o Brasil declare guerra ao nazismo.

    A ofensiva alemã vai complicar a situação dos descendentes de imigrantes que vivem nas áreas fronteiriças. O governo federal determina que todos os imigrantes de origem alemã, japonesa e italiana que não falassem a língua portuguesa fossem retirados a uma “distância segura” de cem quilômetros das linhas divisórias internacionais, com a máxima urgência.

    Para o efetivo cumprimento da imposição, criaram-se áreas de concentração para a permanência dessas populações “perigosas”.

    A medida favoreceu a localidade de Cascavel, por exemplo, para onde vieram na época diversas famílias de origem italiana expulsas de Santa Helena.

    Cascavel ganharia de Santa Helena, até então a colonização mais bem-sucedida no Oeste do Paraná, baseada em colonos sulistas e descendentes de etruscos, a sua primeira leva importante de imigrantes italianos.

     

    Fronteira ainda pouco brasileira

    A certeza de que o Brasil precisava nacionalizar rapidamente seu Oeste se impôs acima das desgastantes pendências entre Estado e União que produzirão conflitos também sangrentos, de brasileiros contra brasileiros, em imensos desafios à lei e à Justiça.

    A Comissão Especial da Faixa de Fronteira fez um levantamento de dados sobre a realidade oestina. “Segundo pareceres emitidos […] o município de Foz do Iguaçu era despovoado, com uma densidade demográfica de 0,38 habitantes por quilômetro quadrado” (Luciana Grespan Zago, Fronteira e Segurança Nacional no Extremo Oeste Paranaense). 

    A vila pequena e isolada vive na dependência absoluta da navegação argentina: “[…] Toda zona ribeirinha, […] ligada por via fluvial a Posadas, Corrientes, Buenos Aires e ao mar, não tem sinal algum do Brasil e, não possui núcleos de habitação brasileira dignos de menção. […] A própria vila de Foz do Iguaçu não tem como se desenvolver por falta de meios de comunicação” (Theófilo Andrade (O rio Paraná e o roteiro da marcha para o oeste). 

    A pouco brasileira Foz do Iguaçu, entretanto, unia três nações e fazia parte da “avenida” fluvial que se estendia do Mato Grosso ao Atlântico, enquanto penosamente eram iniciadas as obras da ligação rodoviária entre o litoral paranaense e a isolada Foz do Iguaçu de 1941.

     

    Colonos vinham do Alto Uruguai

    Para o governo federal, o fato de Foz do Iguaçu ser um lugar despovoado preocupava muito, sendo um local de trijunção internacional de fronteira, encontro de três países: Argentina, Brasil e Paraguai. “O medo que estrangeiros dominassem extensas faixas de terra, principalmente na fronteira, era comum” (Luciana Zago).

    O esforço para abrasileirar o Oeste precisava de uma política mais resolutiva de ocupar a região com colonos brasileiros cativados pela propaganda da existência de boas terras acessíveis a qualquer um que chegasse.

    Os colonos que vinham à fronteira para ocupar os terrenos liberados para posseiros e colonos desde os tempos da Colônia Militar do Iguaçu eram filhos de imigrantes que ainda dominavam precariamente o idioma português, mas serão as principais forças de afirmação da presença brasileira no interior então despovoado.

    Nesse mesmo ano de 1941 chegavam à futura Santa Terezinha de Itaipu o colono Zeferino Ponzoni, a esposa Josefa Stachelski e os filhos, procedentes do Alto Uruguai.

    Da mesma região, denotando uma corrente, vinha Leonardo Pavlak de Marcelino Ramos (RS), com a esposa Maria e o filho Plínio, trazidos de carroça por Ludovi Jakubowski.

     

    Pegue a terra que quiser

    Percebe-se que alguns não chegavam para se apossar de terras devolutas, preferindo adquirir posses já estabelecidas sobre as melhores terras feitas anteriormente.

    Ponzoni, por exemplo, adquiriu a posse do polonês Adão Kultz, mas muitos outros, como Leonardo Pavlak, requeriam áreas de terras na Prefeitura de Foz do Iguaçu. Era tanto espaço disponível e ainda não requisitado que Pavlak saiu da Prefeitura com autorização para ocupar qualquer área, desde que respeitasse as posses já definidas.

    A tarefa foi bem fácil: conseguiu o local ideal depois de percorrer apenas dois quilômetros margeando o Rio São João. Estava orientado a não derrubar árvores, por conta das novas regras do comércio madeireiro.

    Enquanto os colonos gaúchos chegavam para ocupar terras com burocracia zero, a Comissão de Estradas de Rodagem (CER-1), sob as ordens do coronel José Rodrigues da Silva, dava início às obras de construção da nova estrada entre Ponta Grossa e Imbituva.

    Os trabalhos começaram com rapidez, mas sofreriam descontinuidade com o desgaste da ditadura: à medida que o combate ao nazifascismo aumentava mundialmente, seus simpatizantes no interior do governo eram isolados, a inclinação democrática da população crescia e o regime começava a entrar em colapso.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O enredo da BR-277 na trama geopolítica

    O enredo da BR-277 na trama geopolítica

    As agitações políticas continentais (dentre elas a ambição pró-nazista da Argentina de controlar o Brasil) e o recrudescimento da II Guerra Mundial ajudaram a apressar a iniciativa de construir uma boa rodovia ligando os Campos Gerais ao extremo-Oeste, mas foi uma carência histórica paraguaia o principal motor da continuidade das obras.

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    O que havia, até o início da década de 1940, era a antiga Estrada Estratégica, percurso que aproveitara os melhores trechos das picadas ervateiras.

    Enquanto estudava confiscar mais áreas do Paraná – que já havia perdido seu Sudoeste para Santa Catarina –, o governo federal tomou uma providência que ao contrário de prejudicar o Estado contribuiu fortemente para a integração entre suas regiões.

    Os rumores começaram a circular em março de 1941. Em abril houve o anúncio oficial e logo em 14 de maio de 1941 já surgia oficialmente, um mês depois de anunciada, a Comissão de Estradas de Rodagem para os Estados do Paraná e Santa Catarina (CERPSC).

    As primeiras providências vieram rapidamente: em junho era organizada a Comissão Construtora (CCER-PSC), com a missão de construir a rodovia Ponta Grossa–Foz do Iguaçu e também de reparar os trechos catarinenses Herval-Xanxerê-Itapiranga e completar o trecho São João–Barracão, “ficando ainda a seu cargo a conservação da estrada Curitiba-Joinville até 31 de dezembro de 1941” (Oscar Ramos Pereira, Estradas Paranaenses Construídas pelo Exército).

     

    “Pernambucano decidido”

    A Comissão Construtora foi instalada em Ponta Grossa em julho de 1941 com a tarefa de estudar e construir a “rodovia federal de primeira classe Ponta Grossa–Foz do Iguaçu”, segundo a recomendação feita em 6 de junho de 1941.

    “Posteriormente aquela comissão tomou o nome de Comissão de Estradas de Rodagem 1 (CER-1). Seu primeiro chefe foi o saudoso coronel José Rodrigues da Silva, que iniciou as obras de construção entre Ponta Grossa e Imbituva, aproveitando estudos feitos pelo Estado. Em seguida começaram os serviços de exploração e locação do eixo da rodovia estratégica até Foz do Iguaçu, tendo como pontos de passagem obrigatória Prudentópolis, Guarapuava, Laranjeiras do Sul e Cascavel, daqui seguindo diretamente para Foz do Iguaçu pelo divortium aquarium dos vales dos rios Iguaçu e Piquiri. No que tange ao traçado da BR-277 por Cascavel, aproveitou-se o da velha estrada estadual existente, pondo-o naturalmente em condições técnicas modernas e revestindo-o em parte com pedras poliédricas” (Oscar Ramos Pereira, depoimento ao livro Cascavel, a História). 

    O tenente-coronel José Rodrigues da Silva, designado para chefiar a Comissão Construtora, era um “pernambucano decidido, que nela trabalhou árdua e patrioticamente até 1º de julho de 1947”, segundo o major Oscar Ramos Pereira, no livro sobre as estradas paranaenses construídas pelo Exército:

    − O coronel Rodrigues iniciou os trabalhos de campo em agosto e deu começo, a quatro de setembro de 1941, à construção dos 25 km iniciais já projetados pelo Estado do Paraná. É que enxergava muito bem os duros 586 km a serem vencidos, transpondo todo e qualquer obstáculo que se lhe deparasse à frente, para atingir Foz do Iguaçu com uma estrada de primeira classe.

    Era o início da BR-35, mais tarde BR-277.

     

    O interesse do Paraguai

    Como se fosse um roteiro de cinema tendo como época a II Guerra, a Argentina, então inclinada para o nazismo, pretendia dominar o Brasil quando/se Hitler dominasse o mundo.

    Por outro lado, o Paraguai sempre sonhou com o acesso ao mar. Oferecer essa conquista ao Paraguai poderia garantir o apoio do governo guarani em caso de um conflito com a Argentina de Perón.

    O caudilho argentino, secretamente, como constatou a espionagem brasileira em Buenos Aires, aspirava controlar o Brasil a serviço do nazismo.

    Em 1939, o general José Félix Estigarribia assumiu a presidência do Paraguai e se declarou ditador “temporário” em fevereiro de 1940, prometendo entregar o comando quando fosse aprovada uma nova Constituição.

    Enquanto isso, ampliou a reforma agrária, reabriu a universidade e determinou uma série de medidas econômicas e projetos de desenvolvimento. Em agosto de 1940, com uma nova Constituição à sua feição, o general ganhou tempo para avançar em seus projetos.

    Um dos heróis paraguaios da Guerra do Chaco, Estigarribia teve a iniciativa de manter e ampliar intercâmbio comercial com o Brasil e os EUA, dos quais esperava apoio à sua pretensão estratégica: chegar ao mar.

    Era “um desejo veemente”, nas palavras do general, encontrar “saída na costa atlântica, para que o País contasse com duas avenidas* para seus contatos e suas comunicações com o mundo”.

    Não foi uma conquista imediata, mas ela seria facilitada em 1941 pelo primeiro passo para a nova obra, “de feitio homogêneo e de acordo com os padrões de trafegabilidade exigidos pelo transporte de caminhões carregados de madeira”.

    *Uma “avenida” seria o Rio Paraná. A outra, a BR-277.

     

    A força de Juarez Távora

    Quem passava pela antes desprezada Encruzilhada dos Gomes, desde 1938 a sede de um distrito de Foz do Iguaçu, começava a sentir que Cascavel teria um grande futuro.

    Surpreendentemente, ao contrário das demoradas providências governamentais, as obras começaram bem logo, apenas um mês depois de concluídos os trâmites burocráticos, em 7 de julho.

    A surpresa tinha nome: as obras foram apressadas por influência direta do coronel Juarez Távora (1898–1975) junto ao Estado Maior do Exército quando, na condição de subchefe na construção da estrada da Ribeira, estudou as necessidades estratégicas que já havia percebido em seus tempos de jovem revolucionário nas matas do Oeste.

    Távora havia participado da Revolução Paulista de 1924/5 e conhecia bem a região. Avaliava positivamente seu potencial e sabia o quanto a rodovia era importante para o desenvolvimento do interior do Brasil.

    Foi “diante do imperativo em se dar aos oficiais do Quadro Técnico da ativa, provenientes do 1º Batalhão Rodoviário de Curitiba, um aproveitamento de real amplitude no exercício de suas especialidades, que foi criada a Comissão de Estradas de Rodagem nº1; ou, simplesmente CER-1” (DER Paraná, histórico).

    Entre outras tarefas, cabia à CER-1 promover melhoramentos na rodovia Ponta Grossa-Guarapuava e realizar estudos do desafiador – e longo – trecho Guarapuava-Foz do Iguaçu. Com isso, o início foi rápido, mas as obras enfrentariam obstáculos criados pelo próprio governo por falta de democracia.

     

    Madeira, a grande motivação

    Embora a safra de café de 1941 tenha sido um sucesso, repetindo 1940, a nova rodovia seria prioritariamente voltada ao transporte da madeira. No mesmo ano do início das obras da nova estrada foi criado o Instituto Nacional do Pinho.

    Surgindo para promover o comércio desse produto no interior e exterior do País e contribuir para o reflorestamento nas zonas de produção, o INP já sinalizava a preocupação com a rápida devastação das florestas de araucária e a necessidade de ao menos promover e fomentar o reflorestamento.

    O Instituto foi encarregado de ao mesmo tempo defender os interesses da produção madeireira, pela criação de medidas legais e incentivos, e também “promover o reflorestamento das áreas exploradas e desenvolver a educação florestal nos centros madeireiros”.

    Historicamente, refletia a ascensão econômica e política definitiva da classe madeireira sulina junto ao governo federal (Miguel Mundstock Xavier de Carvalho, O desmatamento das florestas de araucária e o Médio Vale do Iguaçu). O chamado ciclo da madeira chegava ao auge.

     

    Fonte: Fonte não encontrada