Boi cascavelense evita deserção em massa

Sempre de prontidão, o tradicional desfile dos soldados pelas ruas de Foz do Iguaçu. Abaixo, jipe anfíbio utilizado pelo Exército

Como quase todos os soldados do 1º Batalhão de Fronteira, Júlio Bruczcnitski trabalhava com os pais na lavoura quando foi chamado a cumprir serviço militar em tempos ainda tensos de pós-guerra. 

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Filho de pai polonês e mãe ucraniana, Júlio nasceu em Irati (PR) em 1925. A família trabalhou em Laranjeiras do Sul na época em que essa cidade recebeu o nome de “Iguaçu” e toda a região formava o Território Federal, somada ao Sudoeste do Paraná e Oeste de Santa Catarina.

Em 1946, Júlio foi apanhado em pleno trabalho na roça pela convocação para se apresentar ao serviço militar. Foz do Iguaçu foi o destino escolhido pelo grupo de jovens de Laranjeiras do Sul em idade de servir ao Exército, por conta da propaganda Paraná Maior, com a qual o Estado assegurava progresso para quem escolhesse viver na região. 

“Era desejo meu e de um grupo de amigos que íamos prestar o serviço militar e queríamos vir para a fronteira. Nosso desejo foi satisfeito pelos militares e, em fevereiro de 1946 embarcamos num comboio de quatro caminhões e viemos para cá” (depoimento a Juvêncio Mazzarollo, Gazeta do Iguaçu, 23/6/93).

Vindos de toda a região do centro paranaense, os caminhões foram alugados pelo exército porque na época não havia linhas regulares de ônibus entre Laranjeiras e Foz do Iguaçu.

Canhões e jipe anfíbio

Ao todo, eram 140 os novos recrutas a ser entregues ao 1º Batalhão. Foram oito dias de viagem, iniciada aos gritos felizes e algazarras até alcançar o primeiro dos inúmeros atoladouros encontrados pela expedição.

“Choveu muito na viagem, tivemos que tirar os caminhões dos atoladouros no braço. Já no caminho havia recrutas querendo voltar para casa, desertar” lembrou Júlio. “Mas chegando a Cascavel recobramos o ânimo: o comandante conseguiu um boi e nos serviu uma churrascada. Mais adiante carneamos um porco”. 

Ao chegar à fronteira, alcançado o ponto final, na Sanga Funda, Júlio contou que dormiu em pé, encostado a um caminhão, tamanho era o cansaço que sentia. “Tomamos banho e ganhamos farda nova para vestir. A roupa que tínhamos no corpo jogamos fora, pois estava toda rasgada e suja devido às peripécias da viagem”.

A Segunda Guerra havia acabado em 1945, mas o regime no quartel permaneceu o mesmo dos tempos em que os militares viviam diante da possibilidade permanente de ser chamados para a guerra. 

Além dos tradicionais fuzis, o Batalhão de Fronteira contava com metralhadoras, morteiros “e uns pequenos canhões puxados por burros – só mais tarde passaram a ser puxados por Jeep”, detalhou Júlio. “Tínhamos inclusive um Jeep anfíbio”.

Das armas às obras

“Frequentemente o comandante determinava uma prontidão, para exercício”, recorda Júlio. “Soldados e ex-soldados tinham que se apresentar, e ai de quem não atendesse à convocação. Do quartel saíamos em marchas pela cidade. Quase todos os sábados desfilávamos pela cidade. Eu era do serviço de comunicações e tinha que carregar nos braços aqueles rádios e amplificadores pesados e enormes, que funcionavam com baterias”.

Depois de três anos no quartel, Júlio se viu promovido a cabo e foi encarregado de comandar o pessoal que aterrava o banhado existente no local onde foi construído o primeiro prédio, à entrada do Batalhão.

Então, ou Júlio esperava a promoção a sargento ou embarcava no surto de desenvolvimento do Oeste paranaense dos anos 1950. A vanguarda, agora, era a construção civil: as casas se multiplicavam na face urbana de Foz do Iguaçu. 

Cinco dias depois de dar baixa, já metido em obras, Júlio foi chamado de volta pelo comandante do Batalhão com a promessa de imediata promoção a sargento.

Mas não quis voltar à vida militar, a não ser por uma satisfatória participação nas obras de um barracão para o quartel instalado em Guaíra, origem da 15ª Companhia de Infantaria Motorizada, que em 1949 se limitava a uns poucos galpões cobertos de capim.

Em 1950, além de construir novas casas na fronteira o agora construtor Júlio Bruczcnitski passou a fazer a instalação da rede elétrica nos novos espaços urbanos. A energia provinha da Usina São João, instalada no Parque Nacional.  

Depois passou a também fazer a entrega das contas de luz nas casas e trabalhou na construção da Usina de Ocoí, que futuramente seria inundada pelo lago de Itaipu.  

Telefone, arma contra o crime 

As moradias de Foz do Iguaçu já contavam com energia domiciliar, mas o telefone ainda era um luxo inalcançável. A instalação do primeiro aparelho foi motivada por uma situação tensa.

Ao contrário do sogro, Mário Câmara Canto, primeiro diretor do Parque Nacional do Iguaçu, o fiscal Francisco Guaraná de Menezes não gostava de usar armas sequer para a proteção do lar. Gostava de cavalos e das carreiras, preferindo morar na chácara e não na cidade. 

No entanto, segundo a esposa Ana Alda, que se casara com Menezes em 1946, ele tinha a casa de campo sempre vigiada por contrabandistas que acompanhavam as movimentações do fiscal. 

Em 1949, porém, o marido sofreu um forte abalo emocional que o levou a se preocupar com a segurança da família ao se deparar na vizinhança com um assalto seguido de morte.

A mulher assaltada, segundo Ana Alda, clamou pelo socorro do desarmado Menezes aos berros antes de ser executada com vários tiros. A partir desse episódio infeliz, o fiscal decidiu instalar um telefone na residência da família, para segurança da esposa e dos filhos, contou Ana Alda (depoimento a Adriana Alencar, revista Cabeza nº 11, julho de 2003).

O despreocupado fiscal que gostava de cavalos de raça passou a ser um cidadão vigilante e dois anos depois daquele angustiante episódio ele seria eleito para a Prefeitura de Foz do Iguaçu.

O curioso caso da Rua “Osvaldo” Cruz

Tendo recebido a oficialização de seu distrito policial logo em 1934, a polícia de Cascavel estava instalada desde 1947 na quadra delimitada pelas atuais ruas Pio XII, Osvaldo Cruz e Rio Grande do Sul.

Sobre a Rua Osvaldo Cruz, com essa grafia errada (o nome correto do célebre sanitarista é Oswaldo Gonçalves Cruz), deu-se um curioso episódio. 

Desde os anos 1950 era de conhecimento geral que a grafia estava errada e a Câmara se dispôs a corrigi-la, mas não agiu. Assim, em 31 de dezembro de 1966, com a morte de Jeca Silvério, iniciador da cidade de Cascavel, o prefeito Odilon Reinhardt se adiantou e decidiu trocar o nome errado “Osvaldo” pelo nome de José Silvério.

Não se sabe porque, mas a lei 480/67, que fez a correção, jamais foi cumprida. As disposições em contrário não foram revogadas e até hoje a rua continua com o mesmo nome e a grafia errada, depois de meia dúzia de prefeitos e centenas de vereadores indiferentes.

Quanto à polícia, a instalação da delegacia na quadra citada, próxima à então Praça da Matriz (hoje, Praça Getúlio Vargas), reunia desde a escrivania até a detenção. Sendo na época o coração da cidade, foi também nessa quadra que o governador Moysés Lupion determinou em 1947 a construção do novo e amplo grupo escolar da cidade, cumprindo promessa de campanha eleitoral. 

Pátio da escola, a “TV” dos presos  

Lupion anunciou em 1949 que havia aberto 500 escolas no Estado – e a de Cascavel foi uma das primeiras do rol. Seriam escolas rurais, apenas com a primeira série e uma cartilha bem simples para facilitar aos professores sem grande preparo a aplicação do método rápido.

O responsável pela educação do Estado, professor Erasmo Pilotto, tomou diretamente para si a tarefa de instruir os professores rurais, com a “oferta de cursos de aperfeiçoamento para professoras, geralmente leigas, que trabalhavam em escolas rurais” (Jehnny Zélia Kalb Facchi, História da formação de professores em Cascavel entre 1951 e 1971: a trajetória das escolas normais Carola Moreira e Irene Rickli).

Assim se formava o Oeste do Paraná entre o fim dos anos 1940 e o início da década de 1950: roceiros que se tornam bravos soldados, militares construtores e meninas pobres levadas aos cursos de formação propiciados pelo secretário Erasmo Pilotto.

O grande Grupo Escolar de Cascavel, obra-símbolo do governo Lupion, tinha o pátio de recreio vizinho à carceragem da polícia, mas eram tempos em que as obras importavam mais que nuances e moralismos.

“Construíram a cadeia muito próxima, de fundos com a escola. Na hora do recreio os presos se distraíam assistindo, agarrados às grades, o futebol dos meninos e as cantigas de roda das meninas” (Maria Tereza Samways Lazari, aluna da escola na época).  

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