Categoria: Alceu Sperança

  • A maldição do cemitério 2

    A maldição do cemitério 2

    Povoação formada a partir de 1889, Foz do Iguaçu sepultava seus mortos em qualquer lugar junto à vila. Com a organização da vida religiosa, no início do século XX, os corpos eram enterrados em um lugar consagrado, ainda no espaço urbano, até que a Prefeitura foi criada e o primeiro prefeito, Jorge Schimmelpfeng, em novembro de 1915, pela necessidade da expansão urbana, determinou um local fora da cidade para os enterros.

    Desde 1922, quando a primeira família chegou para viver em terras que hoje compõem a cidade de Cascavel, os mortos era enterrados em lugares aleatórios. Depois, com a formação da vila, em março de 1930, próximo a um banhado existente nas proximidades baixas da Encruzilhada do Gomes, esta assinalada pelo Marco Zero da atual Praça Getúlio Vargas.

    Ficava entre as ruas Castro Alves, Marechal Cândido Rondon, Paraná e Rio Grande do Sul, que ainda não existiam quando o campo santo passou a ser usado pelos primeiros cascavelenses.  

    Quando foi criado o Distrito de Cascavel, em 1938, o então cemitério distrital ainda era extenso e as mortes ocorriam raramente. Os doentes eram transferidos para centros nos quais havia tratamento médico e faleciam por lá mesmo.

    Não havia violências nem assassinatos, que passam a ser mais frequentes a partir da guerra entre jagunços e posseiros, depois da morte do ex-governador Manoel Ribas, em 1946. 

    O cemitério distrital recebeu corpos até 1953, quando o prefeito José Neves Formighieri sancionou projeto de lei do vereador Adelino Cattani determinando recursos para o fechamento e a transferência das ossadas para a nova localização, o atual Cemitério Central Dom Mauro, próximo ao atual Centro Esportivo Ciro Nardi, delimitado pelas ruas da Lapa, Alexandre de Gusmão, Cuiabá, Barão do Cerro Azul e sua extensão para a Avenida Carlos Gomes.

    Caveiras no quintal

    Publicação anterior, “A maldição do cemitério” (https://x.gd/E6u6F) lembra o desconforto causado pelo fim do cemitério distrital. A lenda sobre a “maldição” prosperou desde que o proponente da transferência, Adelino Cattani, foi morto em um inacreditável duelo com seu amigo João Miotto em pleno centro da cidade.   

    A transferência dos corpos para o novo cemitério foi lenta, mas parecia já resolvida sem mais maldições em 1963, já esgotado o prazo para a transferência dos corpos ao novo cemitério, quando o Departamento Autônomo de Águas e Esgotos da Prefeitura (hoje, Sanepar) começou a abrir valetas para a canalização de água e, na altura da esquina das ruas Visconde de Guarapuava e Rio Grande do Sul, onde ficava o setor Leste do antigo cemitério, foram encontrados crânios e muitos ossos. 

    Durante os anos seguintes ossos humanos foram esparsamente encontrados no coração de Cascavel, nos arredores de onde se encontrava o cemitério distrital da cidade. 

    “Aqui em Cascavel tem gente com mansão de uma quadra, que não sabe que está morando em cima de um cemitério”, disse o cabeleireiro Sebastião Miranda, o Bastroco, filho de uma das primeiras famílias de Cascavel. “E fica bem aqui no centro da cidade. Se cavar um pouquinho, vai tirar caveira debaixo da terra”.

    Uma necessidade urbana 

    O velho cemitério distrital se tornou um entrave ao desenvolvimento urbano com a criação do Patrimônio Novo e do Município, em novembro de 1951. O Patrimônio Novo seguia da atual Rua Sete de Setembro em direção ao Leste.

    Passou a ser assim chamado para diferenciar a área do Patrimônio Velho, ou seja, o antigo Patrimônio Municipal de Aparecida dos Portos de Cascavel, criado pelo Município de Foz do Iguaçu em 1931 e referendado pelo Estado em 1936.

    Por sua vez, o Patrimônio Novo resultou da iniciativa do governo do Estado de transferir ao novo Município, para uso e comercialização da Prefeitura, uma área loteada, piqueteada e com reservas próprias para futuras repartições públicas, jardins e parques, num total de 2.500 lotes (Cascavel, das Origens ao Século XXI, https://x.gd/Br72J).

    No projeto de integração dos dois patrimônios, além do estímulo à rápida venda de lotes na área nova da cidade, o vereador Adelino Cattani apresentou a proposta de fechar o velho cemitério e abrir o novo, transformada na lei 20 pelo prefeito José Neves Formighieri em 3 de agosto de 1953.

    A lei desapareceu porque a Câmara de Cascavel apagou do acervo municipal em nuvem o teor das leis antigas. Grave erro de apagamento da memória do Município que pode ser corrigido com a criação de um repositório das leis históricas na integra, em homenagem aos legisladores e prefeitos que as idealizaram e sancionaram. 

    O Museu Histórico Celso Sperança pode adotar o material cancelado, para que não se perca e seja acessível permanentemente à população, estudantes, imprensa e historiadores.

    A eliminação das leis originais é uma impropriedade. Funciona como o incêndio criminoso que em 1960 destruiu as leis municipais do período 1953-1960, restando cópias somente das leis e normas municipais anexadas a processos judiciais.

    As almas penadas

    Ainda em 1953 a Prefeitura deu um prazo para as famílias transferirem os entes queridos mortos para o novo cemitério, mas a maioria dos parentes dos mortos já não morava mais na cidade ou se concentrava na zona rural.

    No transcorrer das décadas, desde os anos 1930, o cemitério sem manutenção e exposto às intempéries teve as covas misturadas e as cruzes com indicações sobre as pessoas falecidas esparramadas sem mais condições de apurar as correspondências entre as inscrições e as ossadas.

    Com o cemitério distrital em desmonte e o novo já construído, deu-se que a população da cidade, na época, era majoritariamente saudável.

    Ninguém morria para a inauguração efetiva do novo cemitério. Ao mesmo tempo, os envolvidos com o fim do velho cemitério sofriam sérios problemas pessoais.

    Era a “maldição do cemitério”. O vereador que propôs a transferência do velho cemitério por atrapalhar o desenvolvimento urbano, Adelino Cattani, morreu prematuramente, aos 34 anos, com um tiro de revólver. 

    O prefeito que executou a lei, José Neves Formighieri, foi preso após o golpe de 1964 e nunca mais conseguiu se candidatar. O administrador da transferência, Mário Thomasi, teve que abandonar a cidade para também não ser preso.

    As histórias sobre o velho cemitério deram origem a suposições baseadas no medo irracional e crendices. Pirilampos que se deslocavam em grupo à noite pela área do antigo campo santo eram descritos como almas penadas se manifestando.

    Logo a vida seguiu, as mortes foram acontecendo, povoou-se o novo cemitério e se apagou a lenda da “maldição”. Mas há duas décadas, em 2005, ocorria o inverso: não havia mais espaço legal na cidade para enterrar os mortos.  

    Mortos nas ruas

    Os burocratas municipais foram forçados a reconhecer que ao ritmo das mortes se ampliando a cada mês o espaço para enterrá-los estava no fim. Mesmo com três cemitérios, a persistência das mortes logo iria resultar no esgotamento completo das vagas disponíveis.

    Seria deprimente – e inaceitável – que famílias, sobretudo as mais pobres, ficassem sem opções para dar uma digna morada final aos falecidos.

    No sucessor do cemitério distrital já não havia mais espaço, a não ser nos jazigos das famílias. A superintendente da Acesc, Fátima Pértile, classificou na época o problema como “gravíssimo”. 

    Correu pelo mundo a informação de que em Cascavel se enterrava os mortos nas ruas, o que não estava longe da verdade, já que as ruas internas do Cemitério São Luiz, no bairro São Cristóvão, foram usadas para sepultamentos por falta de espaço.

    Medidas alternativas foram tomadas, mas o conjunto dos episódios revelou que a verdadeira “maldição” era o rápido desenvolvimento da cidade, que tornava obsoletas as estruturas mais antigas. 

    No fim das contas, apesar dos apuros dos burocratas e da emoção que naturalmente cerca a morte, a “maldição” era de fato só a parte aparente de um benefício que só requeria melhor planejamento: o progresso da cidade. 

    100 anos da revolução: Isidoro entrega o comando 

    A mensagem escrita aos comandados por Isidoro, naquele momento de tanta angústia pelas derrotas, era digna de sua capacidade de comando:Srs. Generais Bernardo Padilha, Miguel Costa, Coronéis Estillac e Prestes. 

    Vós e as tropas que comandais tendes cumprido, valente e imperterritamente , os vossos deveres cívicos e patrióticos. Os revezes que acabamos de sofrer não vos devem fazer corar e sim encher-vos de orgulho, pois há seis meses que seminus, descalços e sem recursos bélicos suficientes, em número de mil e tantos homens, enfrentais com estoicismo as poderosas forças bernardistas, sendo que o último de vós, com as tropas do sul, fez uma marcha épica, depois de haver rompido o cerco de uns dez mil inimigos, com pouco mais de mil revolucionários.

    Assim, os soldados e chefes da Divisão São Paulo e da Coluna Sul-Riograndense bem mereceram a gratidão da República e da Pátria e eu tenho a maior honra e glória de vos haver comandado. Nada mais posso e nem devo exigir de vós, a quem dou completa liberdade de ação, acatando a deliberação que a situação atual vos obrigue a tomar. 

    Com a maior admiração pelos sacrifícios que abnegadamente fizestes e com a amizade e a gratidão que não posso medir, abraço-vos fraternalmente e assino com o posto que me destes. 

    a) Marechal Isidoro Dias Lopes

    O problema a resolver era de solução muito difícil depois que precipitadamente o comando paulista deu a ordem para a retirada do estratégico porto de Guaíra.

    Sem ele, romper o cerco imposto pelas poderosas forças que comprimiam os revoltosos contra a fronteira passava a ser uma tarefa quase impossível.

    Isidoro Dias Lopes com Miguel Costa 

     

     

    Fonte: Alceu Sperança

  • Cada José tem sua própria história

    Cada José tem sua própria história

     

    O sobrenome Oliveira está presente em grande parte das famílias brasileiras e no Oeste do Paraná tem como destaque o iniciador da cidade de Cascavel, José Silvério de Oliveira, líder político regional com uma história recheada de eventos extraordinários.

    Sua biografia não deixou paralelos com outros dois Josés de Oliveira também inscritos na história da região: o Zezinho da Inspetoria e o comendador José de Oliveira, com histórias menos conhecidas que a do fundador da vila inicial de Cascavel, mas já apresentadas parcialmente em “Os mundos paralelos de Pompeu e Silvério” (https://x.gd/FneI0) e “Os mordedores de gorjetas” (https://x.gd/D6gmK). 

    José Silvério de Oliveira era paranaense de Candói, filho de pais comerciantes, nascido em março de 1888. Seguindo os negócios da família, trabalhou no safrismo, o plantio de milho para engordar suínos e vendê-los em feiras. 

    Nessa atividade, conheceu em 1923 a Encruzilhada dos Gomes, encontro de trilhas localizado na propriedade rural de Antônio José Elias, iniciada um ano antes. Nesse local, em março de 1930, Silvério começou a formar a vila de Cascavel (https://x.gd/mOvXR).

    Por sua vez, Zezinho da Inspetoria e o comendador José de Oliveira eram paulistas e, para confundir ainda mais suas histórias, os dois tinham propriedades no Parque São Paulo. 

    As duas vidas de Zezinho  

    Inicialmente conhecido como o inspetor de Terras do Estado que lidava com jagunços, posseiros, grileiros e colonos que chegavam à região ansiosos para obter boas terras, Zezinho da Inspetoria fazia negócios vantajosos usando o cargo, na lei ou no “jeitinho”.

    Nascido em 18 de setembro de 1927 em Bernardino de Campos (SP), Zezinho veio para Cascavel em 1956, onde começou uma biografia que se divide praticamente em duas vidas. 

    A primeira, como inspetor de terras, anterior ao golpe de Estado que derrubou o presidente João Goulart, em 1º de abril de 1964, é uma história da qual ficaram apenas alguns poucos registros.  

    A segunda vida de Zezinho veio após ser denunciado aos inquisidores da ditadura civil-militar, da qual ele emergiu inocentado e comprometido com o novo regime, ganhando força e riqueza.

    Com o sucesso de seus negócios com terras e empresário agropecuarista ele se elegeu para a Câmara de Cascavel em cinco mandatos consecutivos, ao longo de 22 anos. Elegeu-se pela primeira vez em 1960, pelo PSD, o partido do governador Moysés Lupion, reelegendo-se em 1964, quando caiu em desgraça.

    Reabilitado pelo partido do governo ditatorial, a Arena, reelegeu-se em 1968 e por fim em 1976, para um mandato ampliado de seis anos, até 1982. Foi presidente e primeiro-secretário da Câmara.

    A perda dos Bartnik

    Zezinho ficou foragido por algum tempo, denunciado aos ditadores como favorável ao jaguncismo por famílias como a de Vitor Bartnik, que perdeu as terras para grileiros favorecidos pela Inspetoria de Terras.

    Era um cenário comum na época: os grileiros roubavam as terras dos pioneiros – a família Bartnik foi uma das primeiras a chegar – e as vendiam aos colonos que vinham ao Oeste depois de vender as propriedades nas regiões de origem. 

    Os pioneiros esbulhados tentavam recuperar as terras pela força, mas enfrentavam a reação dos novos ocupantes, que haviam investido suas economias e recorriam à polícia para se manter nas propriedades.

    Quem conta esse episódio é Janine Bartnik Gonçalves, sobrinha de José e Ana Bartnik, casal de hoteleiros dos tempos iniciais da colonização, filha do colono Vitor e da costureira Inês Bartnik. 

    Vitor Bartnik plantava na área que depois viria a ser desapropriada à força por Zezinho da Inspetoria, apoiado por Marins Belo, tido como chefe de um bando de jagunços. Marins também teve duas vidas: inicialmente hostilizado pelos ditadores, depois passou a trabalhar para o governo. 

    O caso do teodolito

    Foi o vereador e presidente da Câmara de Cascavel, Alir Silva, quem acusou Zezinho de pertencer à Gangue da Terra. Após uma troca de ameaças de morte, o inspetor foi denunciado em 1963 pelo desaparecimento de um teodolito, instrumento para medição de terras, que estaria sob sua guarda. 

    O caso foi abafado pelo engenheiro Ludovico Axel Surjus, de Paranavaí, ao contar que Zezinho lhe havia emprestado o aparelho sob compromisso de devolução, o que efetivamente ocorreu. 

    O teodolito foi o ponto de passagem da primeira vida de Zezinho para a segunda. Quando o líder estudantil Luiz Picoli começou uma campanha pela criação de uma Casa do Estudante em Cascavel para abrigar os jovens da região que viessem estudar nas escolas de Cascavel, Oliveira fez a primeira ação que positivou sua trajetória comunitária.

    Doou uma quadra no Parque São Paulo para construir a Casa do Estudante, terrenos depois desperdiçados pelos sucessores de Picoli à frente da Associação Cascavelense dos Estudantes. 

    O posseiro e os militares

    O agricultor Afonso Accordi, de Cafelândia, esteve no centro dos embates entre os colonos que chegavam e os agentes do governo mancomunados com grileiros. “Era uma panela só, que atuava em conjunto na grilagem de terras por toda esta região”, disse ele à revista Oeste (n° 21, 1987). 

    Accordi planejou um atentado dos posseiros contra policiais a serviço dos grileiros, mas foi impedido por um pelotão do Exército alertado pelos líderes regionais do PTB, entre os quais o ex-prefeito José Neves Formighieri. 

    Mas assim que os militares deixaram Cafelândia a polícia atacou os posseiros de surpresa. “Quem não conseguiu escapar, apanhou feito cachorro leproso”, lembrou Accordi, jogado ao chão aos chutes e imobilizado.

    A casa dele foi crivada de balas. Preso com mais onze colonos, acusados pela polícia de serem “jagunços de alta periculosidade”, Accordi ficou mais de um mês detido. A situação dos colonos, presos sem condenação, chamou a atenção do Exército, que requisitou Accordi para prestar um depoimento reservado.

    “Não perdi a oportunidade. Alcaguetei todos eles: o juiz Alvim Messias, o Zé da Inspetoria, o delegado Aroldo Cruz, o sargento Dito – que era o carrasco da Delegacia. Entreguei todo mundo. Contei das perseguições, das grilagens de terras, das mortes… Não deixei nada pra trás: rasguei o pala”.

    Segunda vida foi exemplar 

    Mesmo jurado de morte pela Gangue da Terra, Accordi só foi morrer naturalmente, aos 99 anos, em 2010. Suas declarações foram confirmadas por outras pessoas prejudicadas. Jairo Fabrício Lemos, por exemplo, trabalhou com o médico Wilson Joffre e constatou a ação dos grileiros.

    Joffre possuía vários terrenos na Avenida Brasil e duas chácaras no Parque São Paulo. “Conseguiram tomar tudo dele. O que puderam fazer para acabar com ele, fizeram”, afirmou Lemos. “O pessoal responsável era da Inspetoria de Terras. Existia um comandante, o José de Oliveira, e outras pessoas, que titulavam as terras para quem bem entendessem, principalmente mediante bom pagamento” (Prisma Cascavel, 4/11/1994).

    Já em sua segunda vida, ordeira e participativa, Zezinho foi também proprietário da Rádio Colmeia, diretor do Tuiuti Esporte Clube e iniciador do movimento pelo ensino superior em Cascavel. Morreu em 7 de maio de 1990.

    Histórias que se misturam

    Por sua vez, foi o comendador José de Oliveira e não Zezinho da Inspetoria quem criou o bairro Parque São Paulo, em 12 de maio de 1964, em sociedade com o advogado Paulo de Abreu, embora muitos acreditem que o bairro foi criado por Zezinho, também com muitos imóveis naquela área.

    O bairro surgiu porque o comendador Oliveira e Abreu pretendiam criar uma colônia de imigrantes japoneses em Cascavel. Experiente colonizador, Paulo de Abreu, já ligado à colonização de Nova Aurora, associou-se no empreendimento ao comendador, vindo de longa trajetória de sucesso em empreendimentos no interior paulista.

    Ofereciam terras no campo e lotes na cidade a imigrantes japoneses que tinham interesse em expandir suas atividades pela nova fronteira agrícola. A convite deles, veio a Cascavel em 10 de agosto de 1965 uma comitiva de membros do governo japonês para avaliar o potencial do Oeste.

    Antes de todos eles, José de Oliveira Schiels nasceu em 1933, sobrinho do primeiro morador oficial do território da atual Cascavel, Antônio José Elias, filho do casal Ernesto e Laurentina Schiels, com história bem discreta a serviço do Exército. 

    100 anos da revolução: Forma-se a Coluna

    O encontro decisivo entre os oficiais da Divisão São Paulo e Divisão Rio Grande se deu em 12 de abril de 1925, com a presença do marechal Isidoro Lopes, que retornara da Argentina após a queda de Catanduvas. 

    O comando das forças paulistas estava sob a responsabilidade do general Miguel Costa. Ele e Luiz Carlos Prestes defenderam a necessidade de deslocamento imediato para o Mato Grosso. O resumo das decisões desse dia foi relatado por Juarez Távora:

    1. Considerar frustradas as tentativas de pacificação começadas por iniciativa dos chefes do governismo em 16 de fevereiro.

    2. Prosseguir as operações de guerra de acordo com as diretrizes baixadas pelo general Miguel Costa.

    3. Grupar numa divisão, sob o comando do general Miguel Costa, os remanescentes das forças paulistas, sob comando do tenente-coronel Juarez Távora, e os elementos chegados do Rio Grande do Sul, sob o comando do coronel Luiz Carlos Prestes.

    Por motivos de idade e abatimento físico, as dificuldades da próxima etapa tornaram necessário que o marechal Isidoro Lopes, o general Padilha e o coronel Estillac Leal – tendo sofrido um ferimento por estilhaço de granada no pescoço – ficassem no estrangeiro para se recuperar “até que fosse possível retornarem ao exercício revolucionário”.

     

    Tudo indicava que Miguel Costa seria o comandante da Coluna

     

    Fonte: Alceu Sperança

  • Foz do Iguaçu sofre, Cascavel cresce

    Foz do Iguaçu sofre, Cascavel cresce

    1945, o ano em que a II Guerra terminou, foi, para Foz do Iguaçu, um tempo de penúria e escassez, não só resultante da expulsão dos colonos de origem italiana e alemã por conta da paranoia da ditadura com a suposta influência dos simpatizantes argentinos do nazifascismo sobre colonos descendentes de imigrantes, mas também em consequência de ataques de gafanhotos.

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    Quem estava na cidade de Foz do Iguaçu e tinha dinheiro se abastecia nos navios que traziam mercadorias da Argentina, mas eram sobretudo mercadorias enlatadas ou em potes e garrafas.

    Verduras não havia nas terras desprovidas de colonos e os paióis de cereais se esvaziaram logo que eles se retiraram para Cascavel, Guarapuava, Sul do Paraná, Curitiba e Santa Catarina.

    Quem chegava a Foz do Iguaçu para visitar parentes ou ocupar terras no interior se decepcionava.

    Dois anos depois da criação, o Território Federal do Iguaçu estava em frangalhos, triplamente afetado pelas difíceis condições da época: a desestruturação da economia colonial da fronteira pela perseguição aos imigrantes, o afastamento da gestão paranaense de ações na região, cujos projetos de colonização só continuaram a se desenvolver e região Norte do Paraná, e o esgotamento da ditadura, que se esfarelou ao longo de 1945.

    Tudo vira comida

    Raimundo dos Santos Leal transportava periodicamente alimentos de Guarapuava para Foz do Iguaçu e ainda no curso da II Guerra encontrou fome e abandono na fronteira durante a vigência do Território Federal do Iguaçu.

    Levando as provisões em cargueiros*, duas mulas carregadas com bruacas, ao chegar à fronteira vendia tudo que levava. Em certa ocasião impressionou-se quando até as bruacas, grandes sacolas de couro cru de boi usadas para o transporte, foram compradas e de imediato assadas para consumo imediato como se fossem saborosas iguarias.

    Estruturando-se lentamente, primeiro pela ineficiência administrativa da ditadura mas também pela dificuldade para encontrar gente disposta a ir para um lugar desconhecido e potencialmente perigoso para o gosto refinado da burocracia do Distrito Federal, só em 9 de março de 1945 o Território Federal do Iguaçu conseguiu instalar seu Poder Judiciário.

    *Cargueiros: muares levando malas e bruacas nos lombos.

    Entusiasmo passageiro

    No discurso de posse, o juiz Joel Quaresma de Moura chegou a entusiasmar a assistência, tentando convencer a si mesmo com o discurso padrão da época, de era louvar o governo federal na suposição “mágica” de que as afirmações positivas automaticamente transformam as realidades adversas:

    “Aproveitando este momento, não queria deixar passá-lo sem louvar de público o ato do Governo Federal, sábio, honesto, criterioso e bem orientado que criou as novas Unidades Federadas, porque este ato é o início, o marco da melhor participação administrativa do Território Nacional, cujos efeitos benéficos e duradouros não tardarão a aparecer, consubstanciando a velha aspiração de sábios geógrafos, economistas, sociólogos e geólogos pátrios, além de sua alta significação de bandeirantismo e progresso que representa para o nosso, até a pouco abandonado ou esquecido sertão, fontes de todos os nossos bens e de todos os nossos males, força latente de pujança, casa forte, cuja porta só agora se cuidou de abrir para assombrar-nos com o seu potencial de riquezas e capacidade produtiva, cujo efeito estávamos tão longe de imaginar”.

    Estrada ruim, carroça proibida

    Logo que pôde, Quaresma também abandonou Foz do Iguaçu. Foi para o Norte do Paraná, pulando em seguida para o Norte do país e lá sendo cassado, arrastado pelos expurgos de outra ditadura.

    Em Rondônia, sua empolgação de 1945 passou por uma espécie de autocrítica: a criação dos territórios federais “foi uma solução de emergência, solução provisória (…) àquele tempo não mais do que uma experiência e um ensaio destinado a promover a efetiva integração nacional de regiões afastadas e longínquas, sem lei nem administração” (citado por José Júlio Guimarães Lima, O Ministério Público e a realidade dos Territórios Federais).

    Ao contrário, deu-se bem quem parava em Cascavel, detido pelos convites gentis de Jeca Silvério para não continuar até a fronteira por conta de estradas ruins ou restritas.

    Até Foz do Iguaçu as carroças foram proibidas pela necessidade da passagem dos caminhões carregados de madeira para exportar com destino à reconstrução da Europa.

    Até Porto Mendes havia diversos caminhos de origem indígena, mas intransitáveis para carroças e difíceis até para a passagem dos cargueiros.

    Luiz Sganzerla, por exemplo, partiu de Viadutos (RS) em março de 1945 com uma caravana com destino a Santa Helena, formada por três carroças puxadas por bois. Depois de 41 dias de viagem, acampando em um pequeno povoado, foram informados de que não havia estrada a Santa Helena.

    “Pela dificuldade de fazer esse trajeto de navio, Luiz Sganzerla e as outras três famílias decidiram ficar aí mesmo. Essa localidade se chamava Encruzilhada. Mais tarde o nome mudou para Aparecida dos Portos e, finalmente, Cascavel” (Rolvi Martini, histórico da família Sganzerla).

    Foi, mas voltou

    João Miotto, nascido em Nova Prata (RS), até conseguiu chegar a Santa Helena, mas lá percebeu que não poderia permanecer e decidiu retornar a Cascavel, onde foi bem recebido em sua primeira passagem.

    A decisão de Miotto foi favorecida por um dos últimos atos da ditadura para corrigir o desastre de desviar recursos do Paraná e Santa Catarina para a fracassada aventura de construir uma estrada no Paraguai.

    O decreto-lei 7.362, datado de 8 de março de 1945, abria ao Ministério da Viação e Obras Públicas crédito especial de Cr$ 10 milhões para prosseguimento da rodovia Ponta Grossa-Foz do Iguaçu.

    João Miotto foi trabalhar na obra, fazendo parte da equipe que derrubava as árvores para a abertura de novos trechos da estrada, entre Céu Azul e Matelândia.

    Italianos, campeões em associativismo

    Em abril, quem chegava a Cascavel era Carlos Cancelli. Nascido em Guaporé (RS) em 1897, vinha já na plena maturidade. Hospedou-se no Hotel Pompeu Reis e decidiu apostar no desenvolvimento da cidade, adquirindo lotes rurais que transformou no bem-sucedido loteamento Vila Cancelli.

    Os filhos de italianos impedidos de chegar ao destino sonhado logo trataram de se organizar, de ardo com a tradição do filó, prática dos imigrantes que deu força às comunidades nas quais se enraizavam.

    Ao lado das demais forças da nascente sociedade cascavelense, os filhos de italianos participaram da criação do Tuiuti Esporte Clube, da luta pela criação do Município, apoiando e fortalecendo a Associação Rural de Cascavel.

    Foi na ARC que a extensão rural se estruturou e se construiu o projeto cooperativista, durante décadas bombardeado como “coisa de comunista” pelos atravessadores que exploravam os agricultores.

    Devido aos trabalhos da Associação Rural, Cascavel chegou a ser o único Município a contar com duas cooperativas no início do ciclo da soja: a Copacol, no distrito de Cafelândia, e a Coopavel, na sede.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Sonho do coronel, pesadelo dos imigrantes

    Sonho do coronel, pesadelo dos imigrantes

    Foz do Iguaçu foi idealizada como Colônia Militar desde a descoberta de diamantes no centro do atual Paraná, no século XVII.

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    A ordem partiu do Conde de Oeiras (futuro Marquês de Pombal), que determinou em 1765 ao governador paulista, o Morgado de Mateus, a fundação de um estabelecimento militar na fronteira com o Paraguai.

    Os assuntos de governo já não costumavam ser rápidos naquela época e só um século depois começaram os estudos concretos em torno da fundação de Foz do Iguaçu.

    Criada finalmente em 1889, a Colônia Militar fracassou no início do século XX por ineficiência, corrupção e contrabando, levando a União a entregar a área ao governo do Paraná, que em 1914 criou o Município de Foz do Iguaçu.

    O prefeito designado, coronel Jorge Schimmelpfeng (1876−1929), descendente de alemães, tinha grandes projetos para a região. Em 1907, representando capitais ingleses, iniciou a formação da Fazenda Britânia, que futuramente resultaria na bem-sucedida colonização da Companhia Maripá (origem de Toledo, Marechal Cândido Rondon e municípios derivados).

    Em 1922, na até então desprezada Encruzilhada dos Gomes, ele projetava uma futura “grande cidade”.

    De onde vinha o dinheiro

    Para tirar a Vila Iguaçu, como era chamada, de sua situação de abandono e falta de perspectivas, o coronel Jorge jogou com todas as armas de que dispunha.

    Jorge era habituado à luta. Militar, sempre envolvido em disputas (chegou a ser expulso da Academia Militar em 1895), destacou-se como vereador em Curitiba no início do século XX por seu empenho na atividade política.

    Foi nessa atividade, também conflituosa, que recebeu a missão de fazer a transição da Colônia Militar para um Município paranaense.

    Seguiu para a fronteira e investiu de todas as formas, como em 6 de abril de 1905, ao comprar 250 mil hectares de terras devolutas que viriam dois anos depois a constituir a Fazenda Britânia.

    Em tempos de penúria, na I Guerra, o coronel Jorge assumiu a Prefeitura sem nada e de saída mandou construir uma Prefeitura com dois andares, em alvenaria, em imóvel pessoal e com seu dinheiro, mas também avisou aos ricos sonegadores que a partir de agora teriam que pagar os impostos.

    Da vila abandonada à cidade iluminada

    “A cidade, construída em terreno bastante acidentado, a cavaleiro do rio Paraná tem suas ruas niveladas, e algumas arborizadas, e é iluminada a luz elétrica”, surpreendeu-se Jayme Ballão (A Foz do Iguaçu e as Cataratas, 1921).

    Para Foz do Iguaçu progredir, Jorge Schimmelpfeng fazia coisas inacreditáveis. Ia para a Argentina e Paraguai e tentava convencer famílias empreendedoras a se mudar para o Brasil.

    E não apenas isso, mas também caluniava outras regiões, para as quais pretendiam seguir os atraídos por ele que não foram bem-sucedidos aqui logo de início.

    Para Schimmelpfeng, o Mato Grosso era “terra de bandidos” e voltar ao Sul seria uma demonstração de fracasso e vergonha (Alceu A. Sperança, Quem Manda no Paraná Livro 2: A Era Camargo–Munhoz).

    Até a estrada para Catanduvas, então intransitável na época em que Cascavel nem existia, ele reparou com seu próprio dinheiro, apoiado pelos cidadãos com mais posses.

    Desde a origem, muito sofrimento

    Schimmelpfeng morreu em 1929 e não viu a emergência da ditadura do Estado Novo nem a criação do Território Federal do Iguaçu, período em que Foz do Iguaçu viveu enormes dificuldades e os imigrantes e seus filhos passaram dias de horror.

    No livro Filha de Imigrantes, a professora Elizabeth [Nieuwenhoff] Neumann recorda o que a família passou, instalada às margens do Rio Carimã, próximo ao local onde hoje se encontra o hotel do mesmo nome, no caminho das Cataratas do Iguaçu.

    Os holandeses Nieuwenhoff chegaram à região em 1928, quando o coronel Jorge ainda era vivo, acompanhando um grupo de 29 famílias que se arrastaram em demorada caravana vinda de Cruz Machado, no Sul do Paraná, também origem das famílias Gurgacz e Wypych.

    Antes de chegar a Cruz Machado já haviam sofrido maus bocados. Uma viagem de navio sem recursos, nenhuma assistência de saúde nem preparação para a vinda ao Paraná. “Pegaram piolhos, bichos-de-pé e outras pragas que não conheciam”.

    Produzir alimentos, vocação e destino

    Chegar a Foz do Iguaçu e ser bem recebidos foi o melhor que aconteceu a eles desde que, sofrendo uma realidade de desemprego e pobreza, saíram da Europa seduzidos pela propaganda das maravilhas da América.

    “Foz do Iguaçu precisava de alimentos, por isso, os colonos foram bem-vindos, mas o que mais preocupava era a malária, uma doença grave e com poucos recursos para tratamento na época”.

    Instalados na região das vilas Yolanda e Carimã, eles participaram da criação da primeira cooperativa do Oeste, em 1932, da qual um dos fundadores foi Manoel Ludgero Pompeu, que depois viria se tornar subprefeito de Cascavel, substituindo o iniciador da cidade, Jeca Silvério.

    A Sociedade Cooperativista Agrícola Ltda, que eles chamavam de “Bauerferein” (Associação Rural) surgiu pelo esforço dos imigrantes e seus filhos.

    A entidade contribuiu ativamente para a prosperidade da população da fronteira até que as agressões nazistas na Europa resultaram na II Guerra Mundial, que por medo à Argentina pró-nazismo resultaram aqui, embora longe do conflito, em perseguição insana aos colonos de origem estrangeira.

    “Naquela época nosso contato maior era com a Argentina. As comunicações e o comércio com cidades brasileiras, quase impossíveis, em virtude das estradas intransitáveis, tornava Porto Aguirre, hoje Puerto Iguazú, o local para suprir nossas necessidades de mantimentos de compra e venda de produtos agrícolas” (Elizabeth Neumann).

    Ida triste, retorno feliz

    A informação era recebida por meio de um jornal impresso em alemão que eles compravam na Argentina. O pai de Elizabeth, Martin Nieuwenhoff, foi preso pelo “crime” de ler esse jornal e as famílias de imigrantes acabaram expulsas pela ditadura só por não saber falar corretamente o idioma português.

    Escorraçado, tendo que deixar tudo para trás, Martin seguiu para Guarapuava, chegando um mês depois com a família em sua carroça, pois ainda não dispunha de veículo motorizado para o transporte.

    Só depois da vitória dos Aliados na II Guerra e o fim da ditadura a família Nieuwenhoff conseguiu voltar para a fronteira, agora em condições melhores, na carroceria de um caminhão.

    Encontraram uma cidade em dificuldades, sofrendo fome e desabastecimento, mas ao retornar se integraram de imediato ao trabalho de legar dinamismo econômico, organização comunitária e um futuro melhor à região escolhida. Era o que Foz do Iguaçu, cidade organizada por um filho de imigrantes, mais precisava.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O final da II Guerra e a Companhia Melhoramentos

    O final da II Guerra e a Companhia Melhoramentos

    Embora distante do teatro de operações, o Oeste do Paraná sofreu influências indiretas da II Guerra Mundial. Tais influências também se deram porque a Argentina de Perón era mais simpatizante e ligada ao nazismo que o núcleo duro estado-novista de Getúlio Vargas, mais próxima do fascismo italiano.

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    O alcance maior das consequências históricas veio do fato de que, sendo tempos restritivos de guerra, a Inglaterra buscava repatriar seus capitais. Além das urgências internas na Europa, os proprietários estrangeiros sentiam o crescimento do nacionalismo getulista e crescentes restrições para manter a posse de grandes latifúndios no Brasil.

    Foi com esse pano de fundo derivado da guerra que a companhia inglesa Paraná Plantations Limited, no Brasil representada pela Companhia de Terras Norte do Paraná, foi vendida em 1944 a um grupo de capitalistas de São Paulo.

    Surge então no cenário paranaense a Companhia Melhoramentos Norte do Paraná. Idealizadas pela companhia inglesa e completadas pela paulista, surgem e progridem cidades como Londrina, Cambé, Arapongas, Mandaguari, Apucarana e Jandaia do Sul.

    No Norte, colonização acelerada

    A rigor, o empreendimento permanecia o mesmo da iniciativa britânica. “(…) ainda em 1944, fundou-se Maringá e prosseguiram as vendas das glebas Ivaí e Cruzeiro, que hoje têm por cidades principais Cianorte e Umuarama, respectivamente, no Norte Novíssimo” (Ana Yara Dania Paulino Lopes, Pioneiros do capital: a colonização do Norte novo do Paraná).

    “De Maringá, a expansão partiu em direção ao noroeste, sobre a área arenosa entre os rios Paraná, Paranapanema e Ivaí. E, ainda, rumo ao sudoeste, para Cianorte, ao longo da ferrovia, até Cruzeiro do Oeste e Guaíra” (Noel Nascimento, A Revolução do Brasil).

    De onde a paulista Melhoramentos parou, logo partiriam as ações dos gaúchos da colonizadora Maripá.

    É de notar que a Companhia Melhoramentos estava fora do Território Federal do Iguaçu. Tinha motor paulista e incentivo paranaense. O Oeste paranaense, sem o primeiro e fora da gestão paranaense, trocada por centenas de burocratas trazidos de fora pelos chefes federais, sofrerá imposições que por não ter base popular não conseguirão perdurar.

    Um governador desconhecido

    Em 1944, por decisão do Território, a atual Avenida Brasil tinha dois nomes em diferentes trechos de seu percurso.

    A partir do antigo aeroporto, na região do atual Terminal Rodoviário Helenise Pereira Tolentino, o trecho foi redefinido pelas autoridades do Iguaçu como “Rua Frederico Trotta” até a Rua Moysés Lupion (atualmente Rua Sete de Setembro). A partir daí, na direção do bairro São Cristóvão, sua denominação passava a ser Avenida Iguaçu. Em suma, não havia uma Avenida Brasil.

    O Território do Iguaçu se caracterizou por erros de formação, ineficiência frente às demandas e carências da área e imposições descabidas, como o culto à personalidade do governador Trotta, que a população regional sequer chegou a conhecer e só permaneceu em Laranjeiras do Sul por breve período.

    No entanto, as falhas de gestão – dentre as quais a concentração de seus chefes em escritórios especiais no Distrito Federal (RJ) e em Curitiba – tiveram inimigos poderosos.

    Os principais foram os governos do Paraná e de Santa Catarina, inconformados com a perda de áreas a Oeste. Além disso, o corte brusco às ações de colonização do Paraná foi seguido de uma atração de colonos sulistas sem planejamento e à intensificação das disputas judiciais entre Estado, União e empresas colonizadoras.

    *Frederico Trotta foi um coronel designado pelo ditador Getúlio Vargas para ser o governador do Território do Iguaçu.

    As armas de cada um

    Em tempo de guerra, conflitos pela posse da terra e armas na cintura para se defender das feras das matas, os colonos entravam com suas foices, o Estado com sua polícia e a União nem sempre podia contar com os militares. Oficiais e soldados rebeldes ou inconvenientes eram remanejados para Foz do Iguaçu como se esta fosse uma espécie de “Sibéria” brasileira.

    Com o fim do segredo sobre os documentos da fronteira ficou ainda mais saliente a disputa existente entre o comando do 1.º Batalhão de Fronteira e os prefeitos nomeados pela ditadura.

    Por sua vez, as colonizadoras contavam com os préstimos dos famigerados jagunços, como eram chamadas as pessoas que portavam armas ostensivamente fora das tropas regulares e forças policiais. Para as empresas, eles eram seu corpo de segurança para se defender da revolta dos posseiros.

    Para piorar o caos, havia a decadência da ditadura, que se esfarelava na ineficiência da gestão e incompetência na administração dos recursos, como na frustrada rodovia bancada pelo Brasil entre Assunção e a fronteira.

    Completava o caos a queda brusca na produção agrícola. Como já havia sido registrado pelos colonos de Guarapuava em 1909, em 1944 o interior sofreu com uma nova praga de gafanhotos (Valdenir Gonçalves, Saga e Colendas, História de São João do Oeste).

    Pracinhas vão à guerra

    Na reta final da II Guerra Mundial, depois de muita pressão popular, em 2 de julho de 1944 o primeiro contingente de pracinhas da Força Expedicionária Brasileira (FEB) partiu do Rio de Janeiro rumo à Itália.

    Até instantes antes da partida eles estavam convictos de que iriam lutar na África. Só embarcados souberam que seu destino era a Itália, onde os primeiros soldados brasileiros aportam em 16 de julho.

    O batismo de fogo da FEB se dá em Vada-Ospedaletto, dois meses depois. Todo o contingente brasileiro mobilizado na guerra somou 25 mil soldados.

    Ainda sob o estímulo do incentivo dado aos posseiros no interior do Paraná, no interior do futuro Município de Cascavel, sem se importar que a que a área agora fazia parte do Território Federal do Iguaçu, chegava para se fixar na região da atual São Salvador, a Sudeste da atual cidade de Cascavel, a família do catarinense Domingos Manoel dos Santos, o Dominguinhos.

    Nascido em Rio do Sul (SC), onde as oportunidades se estreitavam, Dominguinhos e a carroça da família se deslocaram até Guarapuava, de onde partiram para o Oeste até encontrar uma área de mato fechado na qual estabeleceram a posse.

    Carroça trocada por milho

    Os colonos que tentavam se estabelecer na região do antigo Território federal não tinham apoio para nada, apenas a promessa do governo do Paraná de que poderiam se apossar de terras desocupadas no interior.

    Em São Salvador, chegando sem nada, a família de Dominguinhos se viu na necessidade de trocar a carroça por uma roça de milho. “Sobrevivíamos de carne de caça” (Revista SindiRural, ed. 43).

    Contornando os terríveis gafanhotos, era preciso repor o milho e espalhar roças de mandioca e feijão, lançando as bases da pecuária, de modo particular a suinocultura, paralela ao milho.

    A guerra, de fato, estava muito longe, mas alguns efeitos perniciosos da crise que causou chegavam até ao isolado interior em 1945, o ano em que a II Guerra Mundial iria acabar e o Território Federal do Iguaçu tentava finalmente começar a ser uma região autônoma.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Dinheiro desviado da infraestrutura paranaense

    Dinheiro desviado da infraestrutura paranaense

    Com os estados do Paraná e de Santa Catarina desmoralizados pela perda de suas porções a Oeste para a formação do Território Federal do Iguaçu, a ditadura do Estado Novo decidiu se imiscuir no Paraguai, que tinha como grande projeto a construção de uma boa rodovia entre a capital, Assunção, e a fronteira com o Brasil.

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    Com a construção da atual BR-277 ainda em pleno andamento, Getúlio Vargas atendeu a um pedido do embaixador Negrão de Lima e chamou ao Palácio do Catete, sede do governo brasileiro, no Rio de Janeiro, o chefe das obras, coronel José Rodrigues da Silva.

    Vargas disse a Rodrigues que o sucessor do marechal José Félix Estigarribia (1888–1940) à frente do governo paraguaio, o futuro ditador colorado Higinio Morínigo Martínez (1897–1985), pretendia construir uma ligação rodoviária entre Assunção e Foz do Iguaçu.

    O presidente brasileiro pretendia impedir que a Argentina controlasse o Paraguai. Supunha que se o nazismo vencesse, a Argentina, pró-Hitler, iria ter apoio para também conta do Brasil. Mapas foram forjados para simular uma grande Argentina que também incluía o Paraguai e o Brasil.

    Vantagens sob nenhum aspecto

    Negrão de Lima sustentava e Vargas se convenceu disso, que além de importante para o desenvolvimento do Paraguai, a obra seria uma homenagem ao marechal Estigarribia, que sonhava com o acesso dos produtos paraguaios ao Atlântico, mas morreu em acidente aéreo, em 7 de setembro de 1940, antes de iniciar ações concretas nesse sentido.

    Mandado a estudar a obra no Paraguai, o coronel José Rodrigues da Silva a considerou a obra um mau negócio para o Brasil, mas estava sob ordens, obedeceu à determinação e deu o melhor de si para que o Paraguai tivesse a rodovia necessária para chegar no futuro ao Oceano Atlântico por meio da BR-35 (futura BR-277).

    No entanto, Rodrigues, em antológico relatório secreto datado de novembro de 1944, escrito com pormenores e recursos de hábil escritor, sustenta que o Brasil não teria vantagens econômicas bancando a estrada – quem teria vantagem seria a Argentina, que absorvia 66% da produção paraguaia.

    Também não teria vantagens militares, motivo pelo qual Estado Maior do Exército brasileiro era contra construir a dita estrada. A única vantagem seria espionar a região da fronteira com autorização do próprio governo paraguaio. “Só esses conhecimentos justificariam as despesas”, supunha o coronel Rodrigues.

    A origem do dinheiro

    No livro “Rodovias Paranaenses construídas pelo Exército”, o major Oscar Ramos Pereira relatou o rumo dos acontecimentos:

     “Entabolados os entendimentos com o general Morínigo, por intermédio do coronel José Rodrigues, para saber ao certo com que recursos entraria o Paraguai, ficou combinado que seriam feitos, em primeiro lugar, os trabalhos de campo (reconhecimento e exploração) entre Foz e Coronel Oviedo”.

    Foi então organizada uma turma de exploração para os serviços, composta pelo capitão de corveta paraguaio Marcos González e pelo tenente-coronel brasileiro Othon Fragoso, que em 1945 seria substituído pelo tenente-coronel Hugo de Castro.

    As despesas foram custeadas só com os recursos brasileiros, desviados da Comissão Paraná−Santa Catarina. Nos dois estados, perguntava-se porque a Comissão passava a servir ao Paraguai.

    Seria justo que recursos necessários para a infraestrutura paranaense e catarinense fossem despejados no país vizinho se nem o Exército considerava a obra realmente útil para o Brasil?

    Faltaram 70 quilômetros

    Rodrigues, sob as ordens expressas de Vargas, ainda em 1944 levou ao Paraguai uma turma de topografia da CER-l, com todo o equipamento necessário e comandou com a máxima rapidez os trabalhos de campo (reconhecimento e exploração) entre Foz do Iguaçu e a localidade paraguaia de Coronel Oviedo, de onde já havia ligação com a capital paraguaia.

    Em meados de 1944 já estavam concluídos os estudos do terreno e começou a se desenhar o traçado entre Assunção e Foz do Iguaçu. Passaria por Caaguazú, seguindo até o Porto Presidente Franco, com extensão encurtada para 135 quilômetros.

    As obras começaram em fevereiro de 1945, mas depois desse início competente da Engenharia Militar brasileira, a estratégia montada pela ditadura desabou como um castelo de cartas quando os trabalhos foram paralisados por falta de recursos financeiros, em dezembro daquele ano, ainda a 70 quilômetros do Rio Paraná.

    24 anos de atraso

    Enquanto os recursos e pessoal técnico eram desviados ao Paraguai, o Território Federal do Iguaçu sofria com o cipoal de dificuldades para sua implantação: as obras necessárias tinham a projeção de recursos, mas iam para as gavetas do poder, sem chegar às cidades para a execução.

    Em plena ditadura, o que menos interessava era respeitar leis e aguardar que a Justiça decidisse validades e competências. A pressa, a vontade do ditador, a propaganda em torno da Marcha para o Oeste e a busca pelo progresso justificavam qualquer desvio de finalidades.

    Com isso, recursos destinados ao Paraná e Santa Catarina foram desviados para o Paraguai sem o retorno esperado. Arrastando-se ao longo do tempo, a BR-277 somente foi concluída em 1968, 24 anos depois que o ditador Vargas prometeu na ponte do Tibagi que iria liberar os recursos necessários para concluir a obra, então estimados em 90 milhões de cruzeiros. Apenas cinco milhões foram de fato liberados.

    Enquanto esse desastre se consumava, a roda da história continuava se movendo. Historicamente obrigadas a explorar só a erva-mate, mas descaradamente tirando madeira, cuja exportação disparou após a destruição causada pela II Guerra, as obrages estabelecidas no Rio Paraná se recusavam a cumprir as leis brasileiras.

    A até então poderosa Companhia Matte Laranjeira sofreu encampação ainda em 1944 pelo Serviço de Navegação da Bacia do Prata.

    Mundo em mudanças

    Na Europa, o 6 de junho de 1944 será para sempre lembrado como o Dia D: os Aliados desembarcavam na Normandia (França), então ocupada pelos nazistas.

    Um mês depois, em 7 de julho, a Conferência de Bretton Woods é uma espécie de declaração de posse do planeta por parte dos EUA: determina-se ali como será a ordem financeira mundial no pós-guerra, pautada pelo Banco Mundial e pelo FMI.

    A guerra se encaminha ao final, com vitórias incessantes dos Aliados sobre as forças do Eixo, já empurradas para uma desalentada defensiva. Em paralelo, no Brasil, a mobilização pela democracia se intensificava.

    Os impactos desses acontecimentos no Paraná serão decisivos: o capitalismo avançará vitorioso por todo o interior e a geopolítica frustrada na aventura rodoviária paraguaia será compensada futuramente pela Ponte da Amizade e Itaipu.

    Em 26 de janeiro de 1945, o I Congresso Brasileiro de Escritores, no Rio de Janeiro, reclamou eleições diretas para presidente. Em todo o mundo, a vitória sobre o nazifascismo estimulava os povos a derrubar governos autoritários que simpatizavam com as ideias derrotadas no conflito.

    Getúlio Vargas não tinha mais como resistir. Em 28 de fevereiro um “Ato Adicional” reinstituiu as eleições para presidente e governadores, além de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte. Negociava a entrega do poder para não sofrer uma revolução. 

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O militar escalado para perseguir Prestes

    O militar escalado para perseguir Prestes

    Faltavam ainda 60 quilômetros para acabar, mas os militares da Engenharia Militar consideraram cumprida ainda em 1944 a missão de construir a então BR-35, depois BR-277, com a entrega ao tráfego de 40 km da rodovia entre Imbituva e Prudentópolis.

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    Em seu livro “Rodovias Paranaenses Construídas pelo Exército”, o major Oscar Ramos Pereira descreveu a rodovia de cuja construção participou:

    “Saindo de Ponta Grossa com a altitude de 949.890 metros no marco zero, na direção de Periquitos e Conchas, atravessa-se o grande Rio Tibagi (ponte de concreto com 128 metros de vão) e toma-se a direção de Imbituva, onde se chega com 60 km”, descreve Ramos Pereira.

    “Daqui toma-se o rumo dos lugarejos Natal e Manduri, para atravessar, em seguida, o rio dos Patos (ponte General Lúcio Esteves, com 92 metros de vão) e atingir a cidade de Prudentópolis com o km 100. Prossegue-se ao encalço do rio Barra Grande e de Bracatinga, passando-se depois pelo banhadão formado pelos rios Relógio e Areia e que vai até ao sopé da Serra da Esperança (Km 125). Aqui se começa a escalada suave rumo ao cimo da serra (1.200m de altitude) e segue-se pelo chapadão, na direção de Guarapuava, onde se chega ao Km 179 após ter atravessado os rios Xaxim, Pedras e das Mortes”.

    Um militar excepcional

    A Ponte General [Emílio] Lúcio Esteves foi assim denominada em homenagem ao militar que em 1939 passou por uma encolhida vila do remoto sertão paranaense e profetizou que o lugar seria um importante centro urbano no futuro.

    A caminho da Companhia Isolada de Foz do Iguaçu, durante a viagem o general completava seus estudos sobre a região sob seu aspecto estratégico, iniciados com a malograda revolução de 1924 que ele combateu desde o início.

    Esteves se convenceu de que era necessário de imediato pensar em construir uma estrutura militar, então ausente no interior do Paraná entre Guarapuava e Foz do Iguaçu.

    Na fronteira havia o quartel da Companhia Isolada, mas para Esteves aquele entroncamento de antigas trilhas ervateiras seria o lugar ideal para a instalação de uma unidade militar do Exército. Os viajantes chamavam o lugar de “Encruzilhada dos Gomes”, os religiosos o designavam com “Aparecida dos Portos” mas os mapas já o assinalavam como “Cascavel”.

    E assim o general Emílio Esteves determinou a realização de estudos acerca das possibilidades estratégicas de Cascavel no sentido de ali ser implantada uma unidade do Exército Nacional.

    A II Guerra Mundial adiou os planos: fortalecer o quartel de Foz do Iguaçu passou a ser prioritário, inclusive pela simpatia da Argentina com o nazismo e as pretensões expansionistas daquele país sobre áreas do Brasil e do Paraguai.

    A procura interminável

    Nascido em Taquara (RS) em 23 de dezembro de 1883, Emílio Lúcio Esteves recebeu em 1924 o comando do batalhão da Brigada Militar gaúcha e foi posto à disposição do governo federal para combater em São Paulo a revolta tenentista de 5 de julho.

    Nessa data, os rebeldes comandados por Isidoro Dias Lopes ocuparam a capital paulista por três semanas, abandonando então a cidade e deslocando-se para o interior, vindo a ocupar o Oeste do Paraná por sete meses.

    Esteves foi mandado em perseguição a Luís Carlos Prestes, o ousado capitão que para apoiar os rebeldes paulistas sublevou os militares em Santo Ângelo, no oeste gaúcho. Prestes driblou os perseguidores com grande habilidade e nunca foi apanhado em sua marcha pelo Brasil.

    Esteves foi novamente mandado a persegui-lo em Goiás, em 1925, já durante a marcha da Coluna Miguel Costa-Prestes, que percorreu grande parte do Brasil até 1927, mas jamais pôs as mãos nos comandantes revolucionários.

    Escolta de Vargas, assessor de Aranha

    Em fevereiro de 1929, Esteves foi promovido a tenente-coronel. No Rio de Janeiro, servia no Departamento de Guerra em outubro de 1930 quando foi mandado a Ponta Grossa (PR) encontrar Getúlio Vargas, líder da revolução, para acompanhá-lo até o Rio de Janeiro, onde completaria a derrubada do presidente Washington Luís.

    Em novembro foi assessorar o ministro da Justiça, Osvaldo Aranha. General-de-brigada em 1932, presidente do Clube Militar entre 1934 e 1935, nessa função foi acusado pelo interventor no Rio Grande do Sul, Flores da Cunha, de conspirar contra o governo.

    Em abril de 1936, quando comandava a 3ª Região Militar, em Porto Alegre, o governo federal determinou o desarmamento das forças estaduais gaúchas, tirou do governador Flores da Cunha o direito de executar o estado de guerra e o passou ao general Lúcio Esteves.

    Esteves não gostou da ideia de desarmar as polícias. Quando o ministro da Guerra, Eurico Dutra, ordenou que ele ocupasse militarmente a cidade gaúcha de Marcelino Ramos, Esteves desacatou a ordem, seguido também pelo general Guedes da Fontoura, comandante da 5ª RM, sediada em Curitiba.

    Desacatando ordens, visitando o interior

    Em agosto de 1937, por conta de suas interferências, compromissos e influência no Sul, Lúcio Esteves perdeu o comando da 3ª RM e foi mandado para a 4ª RM, em Juiz de Fora (MG). Promovido a general-de-divisão em maio de 1939, foi mandado a Curitiba, para comandar a 5ª RM. Causando resistência no poder, só foi promovido a general de Exército depois de sua morte.

    Foi na posição de comando no Paraná que passou pela vila de Cascavel em 1939 e definiu o local como adequado para sediar uma unidade militar, mas aí o Brasil parou por causa da II Guerra Mundial. Antes de conseguir concretizar o objetivo, o general morreu em acidente de automóvel, em 10 de dezembro de 1943.

    A determinação de considerar Cascavel como sede de unidade militar só começou a ser cumprida em 1972, quando o 2° Grupamento de Fronteira, então inexplicavelmente instalado em Guarapuava, foi transferido para Cascavel, dando origem à 15ª Brigada de Infantaria Motorizada, em 1980.

    Os dois rios chamados “Cascavel”

    Em sua viagem literária pelo trecho da BR-35 entregue em 1944, prossegue o relato de Oscar Ramos Pereira:

    “A subida da serra da Esperança é um verdadeiro espetáculo de beleza e técnica. O panorama descortinado é simplesmente deslumbrante, convidando à demorada contemplação. A altitude de Guarapuava é 1.087,691m. Desta importante cidade continua-se, pelos seus admiráveis campos de pastagem, em direção aos rios Cascavel*, Coutinho, Cachoeirinha e Campo Real até atingir Lagoa Seca (Km 230) e, logo após, Três Pinheiros (Km 235)”.

    De Três Pinheiros, à direita de Retiro e à esquerda da povoação Fachinal de Santo Antônio, em terreno acidentado, chega-se ao Rio Cavernoso, continua a descrição do militar: “É um vale relativamente profundo, cujo nome batismal bem fala e muito caracteriza as suas cavernosas profundezas. O Rio Cavernoso tem numerosas corredeiras que dão passagem a vau e as dos Campos de Candói que podem muito bem ser aproveitadas, como fontes de energia pelos fazendeiros da região”.

    Os demais 60 km ainda permaneciam em obras, mas foi dada uma nova missão aos militares: construir estrada no Paraguai. Tarefa polêmica e difícil, que não lhes traria a satisfação de construir a infraestrutura de seu próprio país. Foi espinhosa e desgastante, redundando em fracasso que contribuiu para apressar a queda de Vargas.

    * Rio Cascavel localizado em Guarapuava. É habitual haver confusão entre o rio guarapuavano e o riacho que dá nome à grande cidade-polo do Médio-Oeste, mas são muito distantes entre si.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • O ano mais difícil do Iguaçu

    O ano mais difícil do Iguaçu

    Criado em setembro de 1943, o Território Federal do Iguaçu teve um primeiro ano desafiador. As famílias de imigrantes chegavam em busca do Eldorado que os salvaria da minifundiarização resultante do retalhamento das propriedades das famílias numerosas no Sul.

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    A família numerosa era uma necessidade para os diversos trabalhos da economia rural, mas duas gerações, muitas crises nacionais e a Guerra Mundial semearam inseguranças no interior brasileiro.

    Sendo a novidade do ano, o Território Federal do Iguaçu daria ânimo às famílias de migrantes/filhos de imigrantes. Circulava no Sul a noticia de que bastava a família chegar e tomar posse das terras que conseguisse ocupar.

    A Lei de Terras, que obrigava a aquisição de terras somente mediante compra, de fato liberou as áreas de terras devolutas para os posseiros, mas antes que a corrida ao Oeste começasse as terras mais propícias já estavam griladas em cartórios e ocupadas por empresas colonizadoras.

    Para complicar, havia a dupla ou tripla titulação, fruto de uma interminável guerra judicial entre a União e o Estado. Com isso, quem trazia algum dinheiro se dava melhor, adquirindo áreas sem contestação.

    No entanto, quem precisou tomar posse das terras que o Estado do Paraná havia liberado em seus projetos de colonização teve que enfrentar as manobras federais, grileiros e jagunços armados.

    Garcez: sob pressão e sem apoio

    As tratativas, a burocracia e o ditador Getúlio Vargas demoraram, erraram e não planejaram com cuidado, criando o Território Federal do nada, apenas com algumas escassas instalações estaduais ex-paranaenses e o quartel do 1.º Batalhão de Fronteira em Foz do Iguaçu.

    O primeiro governador territorial, João Garcez do Nascimento, só foi nomeado em 6 de janeiro de 1944. Velho conhecido de Vargas, Garcez se desdobrou para tomar as primeiras providências para instalar o Território e receber o presidente em Foz do Iguaçu, em 27 de janeiro.

    Vargas, que também visitaria as Sete Quedas, em Guaíra, veio e participou de ato no 1º Batalhão de Fronteira, em Foz do Iguaçu.

    O escritor Euclides da Cunha, ao estudar a Amazônia, em 1909, escreveu que “A geografia prefigura a história”. Vargas pôde sentir isso ao ser agraciado com uma de recepção solene, com baile, em um clube que tinha o nome do Estado mutilado: “Oeste Paraná Clube”.

    O Iguaçu tentava sair do Paraná, mas o Paraná não saía do Iguaçu. Ficava sem sentido O estado do Paraná ter quase todo o Rio Iguaçu em seu território e não ter mais o Rio Paraná, que lhe justificava o nome.

    Algo não estava funcionando, desde o início, mas na mídia tudo funcionava bem. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura fazia uma intensa divulgação do programa “Marcha para o Oeste” como realização atual, embora fosse ação já em curso desde os bandeirantes, melhorada nem depois por Cândido Rondon.

    Primeira promessa: 90 milhões. Segunda: 5 milhões 

    Percorrendo longos trechos de estradas que notou em péssimo estado, o Iguaçu que o chefe da Nação encontrou foi um apelo dramático por infraestrutura, ao qual respondeu com uma promessa:

    “O presidente Vargas, indo de automóvel até a ponte do Rio Tibagi, a todos cativou, prometendo 90 milhões de cruzeiros para terminar com a construção [da atual BR-277] até o fim de 1946” (Oscar Ramos Pereira, Rodovias Paranaenses Construídas Pelo Exército).

    O Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, que veio suceder à antiga Comissão de Estradas de Rodagem Federais, de fato elaborou o Plano Rodoviário Nacional, com o Decreto 15.093, de 20 de março de 1944, mas fixou para a obra investimentos de apenas cinco milhões de cruzeiros.

    Os recursos restantes prometidos por Vargas até o final de 1946 esbarraram na marcha da história: ele não terminaria nem a obra nem seu governo. Seria derrubado antes disso.

    O Plano Rodoviário previa a construção de 27 linhas principais em todo o país. Uma delas, a rodovia “Paranaguá–Iguaçu”, com a extensão aproximada prevista de 878 quilômetros, que jamais chegou a ser chamada de “Estrada XVIII”, como constava no Plano Rodoviário original.

    Surge o primeiro prefeito de Cascavel

    Também feito sem cuidado, o Plano Rodoviário Nacional teve que sofrer uma revisão. Nela, a rodovia “transversal” ligando Paranaguá, Curitiba, Prudentópolis, Relógio, Guarapuava, Laranjeiras do Sul, Guaraniaçu, Cascavel e Foz do Iguaçu teria o número 35, com uma extensão de 773 quilômetros. Sua numeração definitiva viria a ser “BR-277”.

    Habituado a construir estradas em Santa Catarina, para participar dessa construção  José Neves Formighieri se mudou para Curitiba. Futuro prefeito de Cascavel, na época com 27 anos e trabalhando com o pai, Virgílio Formighieri, Jose Neves assumiu a empreitada de trechos da atual BR-277 na Serra do Cavernoso e da estrada Laranjeiras–Pato Branco.

    O resultado das pesquisas sobre as necessidades da região feitas às pressas pelo major João Garcez do Nascimento chegou ao Rio de Janeiro, então a capital federal, em abril de 1944.

    Foi dirigido ao ministro Alexandre Marcondes Filho (1892–1974), da Justiça e Negócios Interiores, que se mostrou inoperante frente às necessidades apontadas.

    O curioso caso de Marcondes

    Inimigo de Vargas nas eleições de 1930, o paulista Marcondes Filho também o atacou na Revolução Constitucionalista (1932), mas foi cooptado e se tornou um superministro na ditadura do Estado Novo.

    Foi Alexandre Marcondes quem montou a estrutura fascista de controle dos trabalhadores durante o regime do Estado Novo e preparou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que a esquerda via como cópia da Carta del Lavoro de Mussolini (1927) e os liberais criticavam por aumentar o Custo Brasil.

    Em seu relatório, o major Garcez do Nascimento fez ver ao superministro que havia extrema necessidade de instalar energia elétrica no Iguaçu por meio de geradores movidos a motores.

    Sugeriu, nesse caso, a destinação de recursos para montar a estrutura de fornecimento de energia elétrica para as principais cidades da região, que teria o custo de 60 milhões de cruzeiros, mas o governo ignorou o assunto até o fim da ditadura.

    O quartel da antiga colônia Militar do Iguaçu chegou a ter energia elétrica a diesel, mas só em 1942 Foz do Iguaçu ganhou a Usina de São João. Mas até Laranjeiras, a nova capital, estava às escuras.

    Cascavel, a chave rodoviária

    O governador nomeado para o Território também sugeriu abrir uma rodovia entre Cascavel e o Porto Britânia, com 80 km, outra de Cascavel a Central Santa Cruz e dali ao Piquiri, também com total de 80 km. Garcez compreendeu que era fácil pedir, mas difícil ser atendido.

    Como reflexo das trapalhadas que envolveram a criação do Território, a escolha da capital também foi um parto: os militares do 1.º Batalhão esperavam que fosse Foz do Iguaçu e o engenheiro Luiz Carlos Tourinho, que estudou profundamente a região, sugeriu Cascavel por sua localização geográfica invulgar. “A geografia prefigura a história”…

    Com isso, a definição da capital só foi resolvida pelo decreto 6.550, em 31 de maio de 1944, oito meses depois da criação. Aliás, mal resolvida, pois determinou a cidade de Laranjeiras do Sul como a capital, sem perceber que esta cidade continuava pertencendo ao Paraná.

    No fim, um ano perdido

    Para contornar mais esse lance de comédia pastelão, os burocratas da ditadura tiraram da cartola em 21 de setembro de 1944, um ano depois de criado o TFI, o decreto federal 6.887, que tomava Laranjeiras do Paraná e lhe dava o novo nome de “Iguaçu”.

    O decreto se referia à organização judiciária do Território Federal, determinando que ele seria dividido em quatro comarcas judiciárias, com sedes nas cidades de Iguaçu (ex-Laranjeiras do Sul), Foz do Iguaçu, Chapecó e Clevelândia.

    Também resultado das confusões da época entre os militares do 1.º Batalhão de Fronteira e os prefeitos nomeados pela ditadura, em 1944 o Município de Foz do Iguaçu teve dois prefeitos: Emílio Correia de Oliveira, nomeado em outubro, mas sem qualquer registro de ações, substituído em dezembro pelo professor Acácio Pedroso. O ano foi praticamente nulo.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Surge o Território Federal do Iguaçu

    Surge o Território Federal do Iguaçu

    A grande produção de café obtida pelo Paraná em 1941 não pôde ser repetida por obra das arrasadoras geadas de 1942, embora tenha facilitado a sustentação dos preços em alta no mercado interno.

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    Mesmo com as geadas, portanto, o café paranaense manteve forte a economia estadual nesse início de década. No entanto, as condições sociais da maioria da população eram deprimentes.

    Se a realidade que o médico Altamiro Vianna encontrou em Foz do Iguaçu era de miséria e abandono sobretudo pela expulsão dos colonos de origem alemã e italiana, nas demais regiões também assoladas pelas geadas de 1942 a pobreza dos colonos e posseiros foi piorada pela ação dos jagunços* das companhias colonizadoras, enviados para lhes tomar as terras e destruir as benfeitorias.

    Com o governo federal e o estadual em conflito jurídico, o que mais preocupava no interior paranaense não era a guerra na Europa, já estendida à África, mas a crescente violência pela posse de terras aqui mesmo.

    *Jagunço: civil ostensivamente armado

    Briga Estado x União estimulava corrupção

    Havia intrusões documentadas pelo governo do Estado em quase um terço do território paranaense. Só no Norte Novo havia cinco grandes grilos* registrados: Bandeirantes (403.340 alqueires), Pirapó (369.570), Boa Esperança (255.980), Barra do Tibagi (148.290) e Ribeirão Vermelho (45 mil).

    A intrusagem, para o interventor Manoel Ribas, tornou-se uma indústria lucrativa “e tranquilamente exercida a apropriação indébita das terras pertencentes ao patrimônio do Estado, seja por processos violentos de invasão, seja ardilosamente arranjados, com aparência de legalidade, favorecidos, às vezes, pela complacência de altas autoridades administrativas” (Mensagem à Assembleia Legislativa, 1936).

    Para as autoridades corrompidas, a confusão entre o grileiro, o sertanejo, o posseiro e o intruso criava condições para reprimir os humildes colonos como se fossem invasores, beneficiando os “senhores feudais”, na expressão do interventor Manoel Ribas.

    Para as autoridades prevaricadoras, interessava nivelar as quadrilhas de intrusos aos movimentos de resistência dos colonos e posseiros: a criminalização de todos facilitava atacar os resistentes e abrir caminho aos grileiros, a pretexto de ação para “pacificar” o campo.

    *Grilo – Manobra cartorial fraudulenta. A escritura era posta em gaveta com grilos mortos que davam ao papel a aparência de antigo

    Golpe militar na Argentina trouxe medo

    Nessa confusão generalizada, o Estado do Paraná sofria o confisco de suas terras por parte do governo federal e perdeu vastas áreas, griladas e invadidas pelas quadrilhas de intrusos.

    Tentou reagir, mas timidamente: era tempo de ditadura, mandava quem podia. Mesmo com a ditadura dividida e em fim de feira, o Paraná foi vencido nas duas frentes de batalha.

    Enquanto fermentava o conflito de terras ao Norte, a primeira locomotiva da Estrada de Ferro São Paulo-Paraná alcançava Apucarana em 19 de abril de 1943 e Foz do Iguaçu ganhava sua primeira usina hidrelétrica: a Usina Rio São João, construída no interior do Parque Nacional do Iguaçu.

    Do outro lado da fronteira, na Argentina, a tensões vinham do golpe militar desfechado em junho de 1943. Temia-se no Brasil uma ofensiva platina sobre o Sul brasileiro.

    Tal ação, aliás, faria pouco sentido, já que a feroz disputa entre dois grupos pelo poder em Buenos Aires e a precária conjuntura econômica argentina inviabilizariam uma aventura guerreira.

    Vantagens para Cascavel

    Com as agitações fronteiriças, o impedimento da presença de imigrantes italianos nessas áreas é responsável pelo grande salto de Cascavel: em 1943, a pequena vila recebe um grupo de famílias dessa etnia provenientes do Rio Grande do Sul, puxadas pelas famílias de Pedro Zandoná e Pedro Dal Prá.

    A partir daí, até o fim da guerra, famílias que vieram do Rio Grande do Sul para a região de Santa Helena conseguiram passar de Cascavel por falta de estradas carroçáveis e ali se estabeleceram, iniciando a transformação do lugar em uma das cidades mais importantes do interior brasileiro.

    Na medida em que o Paraguai não atrapalhava e a Argentina se mantinha neutra na guerra, a providência de fortalecer a presença militar na fronteira passou a ter o objetivo de estruturar o já decidido mas ainda não criado Território Federal do Iguaçu.

    O novo Território Federal, supunha-se, deveria ter Foz do Iguaçu como capital. Mas essa definição jamais viria: a cidade da fronteira foi considerada remota demais, uma espécie de fim de mundo para os funcionários federais que deveriam se transferir do Rio de Janeiro para administrar a nova unidade da Federação.

    Frustração em Foz, trapalhada no RJ

    Em 13 de setembro de 1943, quando o decreto-lei 5.812 finalmente cria o Território Federal do Iguaçu, com uma área de 65 mil km², o Paraná perdia mais 44 mil km² de suas terras. Outros 21 mil km² que Santa Catarina já havia tomado na batalha judicial do Contestado também se somaram ao TFI.

    O Território Federal do Iguaçu aparece no mapa do Brasil formado por quatro municípios: Foz do Iguaçu, Clevelândia, Mangueirinha e Chapecó.

    Em 16 de dezembro de 1943, o decreto-lei 6.117 vem estabelecer as normas para colonização a ser seguidas no Território Federal do Iguaçu. A autoridade paranaense, que já era muito limitada, desaparecia completamente da região Oeste.

    O Oeste do Paraná, agora, ficaria em Laranjeiras do Sul. Mas os burocratas do Rio de Janeiro deram um jeito de tomar também esta cidade paranaense, a mais bem estruturada a Oeste de Guarapuava, e fizeram dela a capital do TFI, por ser o ponto mais “civilizado” e com boa estrada até o Rio de Janeiro.

    A frustração dos militares e civis de Foz do Iguaçu só não foi maior que a trapalhada feita na capital da República (o RJ): Laranjeiras foi escolhida para ser a capital, mas não fazia parte do território do Iguaçu.

    Garcez, o primeiro governador

    Houve então apressado esforço burocrático para esticar a área do TFI e tomar do Paraná também Laranjeiras do Sul, para atender aos interesses dos burocratas federais.

    Com a trapalhada e o contorcionismo para corrigi-la, atrasou-se a vigência do Território Federal do Iguaçu. Criado em setembro de 1943, só foi instalado em 6 de janeiro do ano seguinte, quando o ditador Getúlio Vargas nomeou o primeiro governador – João Garcez do Nascimento (1893−1971).

    Ter sido ajudante-de-ordens de Vargas garantiu ao major Garcez do Nascimento a confiança do chefe para a tarefa de governar o Território Federal do Iguaçu.

    De origem paranaense, membro de uma família tradicional das Araucárias, a primeira missão de Garcez foi fazer um levantamento confiável da região compreendida pelo Território Federal do Iguaçu, já criado oficialmente mas ainda não instalado.

    Precisava ser um documento confiável porque o relatório forçado pela Comissão de Zeno Silva, apreciação negativa que atribuiu ao Paraná o papel de vilão da história, foi encomendada para facilitar a tomada do território Oeste.

    Por sua vez, os relatórios paranaenses, na tentativa de evitar que o Estado perdesse ainda mais áreas depois do desastre do Contestado, davam destaque a providências cujos resultados não pareciam consistentes com a realidade.

    Sendo Garcez natural de Curitiba, onde serviu no antigo 9° Regimento de Artilharia Montada, ao designá-lo o arguto Vargas passava a impressão de que o Território não havia sido perdido pelo Paraná, como lamentavam as tradicionais lideranças políticas paranistas.

    O Território Federal do Iguaçu nasceu mal e iria durar pouco, mas ao ser divulgado como Terra Prometida trouxe alento às famílias do Sul que fugiam da crise confiando que o Oeste do Paraná seria seu Eldorado.

    Fonte: Fonte não encontrada

  • Missão: transformar doentes em soldados

    Missão: transformar doentes em soldados

    Em 1943, quando o Brasil sinalizou o envio da FEB para participar dos combates da II Guerra Mundial, chegaram a Foz do Iguaçu ordens expressas do Rio de Janeiro para adaptar a força militar às exigências de um país em estado de guerra.

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    O recém-criado 1.º Batalhão teria que redobrar a vigilância na fronteira com a Argentina e o Paraguai e os soldados em serviço no Oeste paranaense já bem preparados para combater deviam ser enviados para lutar na África, foco de ação dos Aliados nessa época.

    A tática empregada era forçar as tropas nazifascistas a recuar para suas linhas. Elas reagiam às derrotas sofridas na Ucrânia para o Exército Vermelho e a SS alemã até conseguiu libertar o ditador fascista italiano Benito Mussolini, que preso pelo rei da Itália.

    A urgência de enviar tropas à guerra deu origem a um dos episódios mais emocionantes da história das Forças Armadas no isolado território oestino porque o 1º Batalhão de Fronteira recebeu também a ordem de adestrar centenas de novos soldados.

    “Recrutar às avessas”

    Remanescente da extinta Companhia Independente de Foz do Iguaçu, o primeiro tenente médico Altamiro Vianna (1916–2004), que um ano antes chegara do Rio de Janeiro recém-casado, recebeu a incumbência de selecionar cerca de 600 jovens para conscrever como recrutas.

    Logo ao chegar, o médico se deparou com o povo miserável, ignorante e doente. Os colonos de origem alemã e italiana haviam sido expulsos da região. Agora, seu dever patriótico era selecionar em meio a essa população empobrecida os jovens mais capazes para se incorporar à tropa.

    Vianna, encantado por uma revolucionária literatura estrangeira(*), calculou que se tirasse os homens aptos do trabalho que faziam no campo e na cidade iria desestruturar toda a vida fronteiriça, já destroçada pela expulsão dos colonos de origem italiana e alemã.

    A seu ver, deslocar os jovens capazes da produção agrícola para incorporá-los à tropa iria piorar o quadro de miséria e até desabastecer o quartel.

    “Resolvi, então, recrutar os recrutas às avessas: o homem forte, robusto, ficava de lado para que pudesse continuar seu trabalho no campo”, contou o médico em depoimento sobre o drama que protagonizou na isolada Foz do Iguaçu na década de 1940.

    *A Odisséia de um médico americano, de Victor George Heiser (1873–1972), narra a história de um sanitarista atuando na salvação de vidas em dezenas de nações pobres.

    O susto do comandante

    Aproveitar os mais capazes era o dever de Vianna, mas contra toda a lógica de uma correta seleção de homens para a defesa da Pátria, o médico recrutou apenas jovens desnutridos e anêmicos, alheios à produção de gêneros alimentícios e que não davam vitalidade econômica à cidade.

    “No dia em que aqueles recrutas, ainda à paisana, desfilaram, desajeitados, sem energia, diante do comandante, este se assustou pela precária qualidade do material humano que via”, escreveria Vianna, relatando suas memórias.

    Ao ver soldados incapazes de defender a Pátria se arrastando no desfile para se perfilar, o já estressado comandante, capitão Moacyr Lopes de Resende, sempre envolvido em conflitos com a Prefeitura e a Polícia, advertiu severamente o médico sobre a imprudência cometida.

    Vianna retrucou: “Esses lastimáveis recrutas, depois de tratados e alimentados, darão ao Exército um contingente que encherá seu comandante de orgulho”.

    Resende não se deixou convencer e pediu um inquérito a seus superiores. “Eu estava em atividade febril”, contou o médico, ao atestar como “aptos” centenas de elementos incapazes de servir às Forças Armadas, especialmente em tempo de guerra.

    A defesa do médico

    Vianna estava com a carreira em risco, pois o comandante do Batalhão não tinha alternativa a não ser relatar o caso aos superiores, cumprindo o dever militar de apurar qualquer irregularidade.

    Resende, portanto, não poderia ocultar o procedimento incomum do médico de considerar aqueles frangalhos humanos aptos para servir, mas nos meses seguintes ignorou o assunto.

    “Fora dos meus olhos, porém, a máquina burocrático-militar se movimentava com lentidão, dentro da extrema dificuldade de comunicação existente, para proceder ao inquérito solicitado”, narrou o médico.

    O major médico Henrique Moss de Almeida, oficial superior de saúde encarregado de levar a cabo a investigação, finalmente chegou a Foz de Iguaçu, vindo de Curitiba.

    Recolheu a documentação disponível e instaurou o inquérito sobre os procedimentos inusitados do médico militar, que precisou se defender sozinho frente à punição iminente por desobediência em tempo de guerra.

    “Tratei tensamente a verminose e o paludismo que instava quase a totalidade do contingente”, depôs Vianna no inquérito. “Curei a anemia resultante daquelas infestações. Em colaboração com o dentista do batalhão, participei da extração dos dentes com foco de infecção, na grande maioria dos recrutas”.

    A decisão final

    Enquanto o pedido de inquérito se arrastava, os precários recrutas recebiam alimentação regular e praticavam os exercícios físicos normais da tropa, com regime de trabalho e repouso regulares.

    Com outros cuidados profiláticos, eles se transformavam em verdadeiros soldados. A engorda média observada em menos de três meses foi de 13 quilos por individuo.

    O que o major Henrique Moss de Almeida encontrou no quartel, portanto, foi uma tropa de homens corados e bem nutridos.

    Em lugar da punição esperada, o médico Altamiro Vianna recebeu então um entusiasmado elogio por parte do responsável pelo inquérito e também do próprio capitão Moacyr Lopes de Resende, seu comandante já orgulhoso.

    Aliás, Resende se destacou depois junto aos superiores por ter agido nesse episódio estritamente de acordo com a severa disciplina militar.

    Desde o início de seu comando sempre enviou relatórios com denúncias sérias e severas críticas, em guerra aberta com os prefeitos nomeados pela ditadura.

    O almoço da concórdia

    Naqueles tempos de guerra, com a missão de espionar a movimentação dos elementos pró-nazistas no Brasil e na Argentina, o comandante Resende sofreu a acusação de violar a correspondência diplomática platina.

    Certo dia, Resende recebe um aviso do hotel: chegaram ao Porto Aguirre em vários caminhões novos um contingente de trinta praças e seis oficiais da Gendarmería de Buenos Aires que vinham reagir à espionagem brasileira.

    O cônsul brasileiro em Posadas, Lúcio Schiavo, denunciara aos militares brasileiros que o cônsul argentino em Foz do Iguaçu, Eduardo Bianchi, simpatizante nazista, fazia operações financeiras no Rio de Janeiro para o cônsul alemão.

    Houve, de fato, a censura às correspondências do consulado. Ao saber da presença do intimidador contingente estrangeiro em Porto Aguirre o comandante Resende agiu com sagacidade: convidou o comandante argentino, coronel Adolfo Orandi, seu estado maior e respectivas esposas para um almoço no Batalhão de Fronteira. 

    Quando os argentinos foram embora o comandante continuou sua guerra particular com o prefeito (nomeado) Nélson Nascimento Ribeiro, que também controlava a polícia.

    Três anos depois a ditadura caiu e houve a primeira eleição direta para prefeito. Com a volta da democracia, Resende fez uma bela carreira no Exército, granjeando estima e elogios por sua dedicação à história militar, chegando ao generalato.

    Fonte: Fonte não encontrada