O Paraná descrito no fim da década de 1940 mapeava com detalhes apenas as regiões aristocráticas do eixo capital-litoral, Campos Gerais, Guarapuava e Sul histórico. O mapa político exibido já apresentava o grande Estado que é hoje, mas o Oeste e o Sudoeste ficaram isolados no período em que vigorou o Território Federal do Iguaçu e seu Norte era na realidade uma extensão do Sul de São Paulo.
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Tanto o Norte velho quanto o novo sofriam a influência paulista em toda a cadeia da cafeicultura e no projeto ferroviário, vinculado ao aparecimento de novas grandes fazendas, vilas e cidades ligadas a São Paulo.
Para o historiador maletense Valfrido Piloto (1903–2006), nascido no Sul paranaense, o Norte do Estado “é tudo, menos Paraná” (Onde o Paraná desaparece, Gazeta do Povo, 9/4/1947).
“As riquezas geradas por suas terras férteis, ainda pouco exploradas, voltavam-se todas para o Estado vizinho, São Paulo, através da rede ferroviária que ligava o sertão paranista ao Porto de Santos” (Ayrton João Cornelsen, secretário do governador Moysés Lupion).
Energia e ensino, duas bases
Diante disso, o governo estadual apostou em uma ousada estratégia para dinamizar a economia e fazer o Paraná funcionar em um bloco só, começando por viabilizar energia elétrica a todas as regiões.
Em outubro de 1948, o Daee (Departamento de Águas e Energia Elétrica) é criado para executar o Plano Hidrelétrico do Estado. O PHE determinava o aproveitamento dos sistemas elétricos do Sul (apoiado nas usinas de Capivari-Cachoeira e Salto Grande do Iguaçu), do Norte (abastecido pelas usinas de Salto Grande e Capivara, no rio Paranapanema, e Mourão), e do Oeste (contando com centros geradores isolados).
O Daee passa a instalar motores e conjuntos a diesel com capacidade entre 70 e 154 kVA em muitas localidades, em caráter de emergência, para atender às exigências do crescimento industrial e urbano da capital e interior, declarada prioridade do governo Moysés Lupion, da qual se orgulhava, já em campanha aberta rumo ao Senado.
Estratégia semelhante foi aplicada no setor de ensino. A popularidade do governador subiu às alturas em consequência da criação rápida e disseminada de escolas por todo o interior, começando pela “sua” Cascavel.
Ainda em 1948 foi inaugurada a modelar Escola de Trabalhadores Rurais de Foz do Iguaçu, embrião do futuro Centro Estadual de Educação Profissional Manoel Moreira Pena.
Até no mais escondido interior, na vila de São João do Oeste, cercada por ainda poucas propriedades de colonos eslavos, o governo plantou uma Escola Isolada Estadual, futuro Grupo Escolar Rocha Pombo.
Polarização e propaganda
Enquanto o governo do Paraná se preocupava em colar suas regiões ainda desconexas, o país vibrava com a Convenção Nacional de Defesa do Petróleo, que iniciou a campanha “O Petróleo é Nosso” em 18 de outubro de 1948.
A campanha levou às massas a polarização entre nacionalistas (adeptos do monopólio estatal do petróleo) e entreguistas (defensores do livre mercado).
A polarização habitualmente institui e fortalece mecanismos de propaganda pró e contra, o que vai explicar as decisões tomadas pelo governo Lupion a partir da lei 121, de 30 de outubro de 1948, ao criar a Câmara de Expansão Econômica e Propaganda do Estado. Com ela, a Secretaria de Educação e Cultura passava a ter um Departamento da Cultura e Divulgação.
Havia também a propaganda comunista. O envolvimento do PCB na luta dos posseiros de Porecatu em 1948 se deu por meio do Comitê de Jaguapitã, dirigido pela família Gajardoni, que vendeu sua farmácia para comprar terras de mata virgem nas margens do ribeirão Tenente para apoiar os posseiros.
“Aos poucos, conseguiram organizar os posseiros em grupos, conscientizando-os da importância de defenderem suas posses: primeiro legalmente, depois pelas armas” (Angelo Priori, A revolta camponesa de Porecatu).
Entre dois fogos
Apoiaram a luta armada dos posseiros o vereador londrinense Manoel Jacinto Corrêa, que na época também esteve em Cascavel, o advogado Flávio Ribeiro e o médico Newton Câmara, levando-lhes roupas, suprimentos alimentares, remédios e dinheiro.
A luta armada foi decidida pelos posseiros em novembro de 1948, depois de frustradas as tentativas de defesa por meios legais.
A suposta necessidade da luta armada e a maquiagem aplicada na repressão aos posseiros como se fossem ações pacificadoras passaram a se expressar por todos os meios de propaganda possíveis: rádio, jornais, telegramas, panfletos, faixas, placas e cartazes.
Em dezembro de 1948, quando chegou a Cascavel, Mário Thomazi, catarinense de Valões, hoje Irineópolis (SC), primo do agropecuarista José Neves Formighieri, tinha 20 anos de idade.
Ele foi de imediato submetido ao impacto das duas propagandas: a que pregava a defesa armada das terras atacadas por jagunços e grileiros e a que desqualificava a luta dos posseiros como “anarquia e subversão”.
Múltiplas atividades
Thomazi recebia as duas propagandas porque amava dirigir entre a vila de Cascavel e a propriedade da família, na chamada Melissa Velha, situada entre a futura cidade de Corbélia e Central Santa Cruz, onde já chegava a propaganda sugerindo a resistência dos posseiros.
Quando vinha fazer compras na vila, Thomazi se hospedava no Hotel Pompeu Reis, onde conheceu os fundadores do Tuiuti Esporte Clube e também foi alcançado pela propaganda dos posseiros, pois Horácio Reis, dono do hotel, era chefe do PTB local.
Com a criação do Município, Thomazi foi trabalhar como chefe do serviço rodoviário, o que significava dirigir e fazer a manutenção da patrola do Município, empregada para abrir ruas e seguir a orientação de Manoel Ludgero Pompeu na abertura de estradas.
Nas eleições de 1960, Thomazi obteve uma suplência da bancada do PTB e assumiu o mandato em substituição a titulares, aprovando a abertura de ruas, estradas e a construção da usina hidrelétrica do Rio Melissa.
Perseguidor depois foi perseguido
Por seu amor aos carros e ao esporte, Mário Thomazi também foi piloto pioneiro das provas automobilísticas, fundador do Automóvel Clube e do Cascavel Country Clube.
Em janeiro de 1964, presidia o Tuiuti Esporte Clube quando foi chamado pelo presidente João Goulart para chefiar o serviço de repressão ao contrabando no Oeste.
Não chegou a assumir. Em 1º de abril um golpe de Estado depôs o presidente e Mário entrou na lista dos perseguidos, por sua militância no PTB.
Ironicamente, Thomazi havia se qualificado para o cargo com atividades desenvolvidas como suplente de delegado de polícia. Nessas funções, testemunhou a gravidade das lutas travadas na região do Piquiri, onde os posseiros acossados pelos jagunços reagiam à altura.
Mesmo sendo simpatizante da causa dos posseiros, como policial foi mandado para reprimir o levante armado.
“Em uma ocasião nós fomos até o Piquiri e trouxemos de lá 14 presos e depois vieram de lá dois cadáveres para serem enterrados aqui no cemitério antigo na rua Rio Grande do Sul” (Mário Thomazi, depoimento a Regina Sperança).
Posseiros chegam e dinamizam o comércio
Na região Norte conflitada pela questão agrária, atrocidades desumanas eram cometidas. Cruzar desconhecidos nas empoeiradas estradas poderia levar a um tiroteio sangrento, condenando corpos a boiar nas águas dos rios mais próximos.
Exatamente nesse período, em dezembro de 1948 a ONU proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Como se atendendo a um pedido dos já estropiados posseiros, que morriam sob as balas dos jagunços e da polícia, a Declaração aceitava o direito à rebelião como “supremo recurso” contra a tirania e determinava que “ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade”.
Driblando as tragédias, a indústria cascavelense começava forte e exportando, pois o boom madeireiro não parava. Começava pelo corte das árvores, logo transformadas em toras que serradas viravam tábuas, vigas, caibros e ripas.
Os produtos da madeira eram transportados a Foz do Iguaçu “nos valentes caminhões International KB-7 e KB-11” para abastecer os grandes centros (Elcio Zanato, Corbélia da Minha Juventude).
A madeira fez Cascavel se transformar de vila em cidade já em 1948, desenhando as bases da futura metrópole pelo dinamismo do comércio e da prestação de serviços no trecho da rodovia federal denominado Avenida Brasil.
Atraídas pela madeira e a perspectiva de praticar a agropecuária sobre as terras desmatadas, famílias de colonos chegavam diariamente ao interior, passando em Cascavel e se abastecendo de alimentos e combustíveis.
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