Com o fim do Iguaçu, desorganização e conflitos

Com Vargas recolhido à sua estância no Rio Grande do Sul, Jeca Silvério perdeu influência no Oeste e posseiros atacados por grileiros perderam seu fiador – Manuel Ribas Crédito: Pedro Flores/MIS/Reprodução

Quem lucrava prestando serviços ao Território Federal do Iguaçu não se conformou com o retorno do Oeste e Sudoeste do Paraná e Oeste de Santa Catarina aos respectivos estados.

PRINCIPAIS NOTÍCIAS PELO WHATS: ENTRE NO GRUPO. TAMBÉM ESTAMOS NO TELEGRAM: ENTRE AQUI

Apesar de impossível nos termos da nova Constituição, deram divulgação à delirante proposta de um funcionário do Ministério da Justiça segundo a qual o ex-Território passaria a ser uma área à parte submetida à gestão da paz ministerial a que o proponente servia.

A manobra não teria como vingar, mas quem estava disposto a lutar para não perder as posições conquistadas passou buscar soluções mais viáveis.

Voltaram à carga com um abaixo-assinado para reivindicar o retorno do Território Federal do Iguaçu, não mais por medida autoritária, do alto, mas por um instrumento democrático: permitir aos residentes na área votar em plebiscito se queriam manter ou extinguir o Território Federal.

O movimento pela restauração do TFI foi denunciado pelo jornal Diário dos Campos, de Ponta Grossa: “Pessoas grandes, comerciantes e industriais, estão à frente da campanha”.

No mesmo jornal, repudiando a denúncia, um grupo de 16 pessoas contestava, requerendo direito de resposta, para reclamar o retorno do Território extinto e assim confirmando sem qualquer dúvida a existência da orquestração.

Paraná satisfeito, mas posseiros desamparados

Os paranistas, entretanto, estavam satisfeitos com a reconquista e jamais iriam aceitar o retorno do Território Federal.

“O que pesava mais, o que mais nos afligia era simplesmente ver arrebatado de nosso sentimento regional uma parte de nossa região, uma parte da tradição de nossos mortos, das nossas crenças, das nossas lendas, das sensações de nossa gente, das nossas árvores, das nossas riquezas latentes, com que estávamos acostumados e que eram sinais nossos que nos arrancavam” (Temístocles Linhares).

Elite intelectual e econômica do Estado, os paranistas e seu espírito combativo estimulavam os operários nos centros urbanos a também lutar por direitos inscritos na Constituição, mas só encontravam repressão policial.

Os camponeses também acreditavam que chegara a sua vez de ter voz, nos marcos da nova Carta Magna, mas os grileiros de terras se mantinham na ofensiva, beneficiados pela omissão e/ou conivência do Estado, que não atuava mais conclusivamente em defesa dos camponeses desde que o governador Manuel Ribas for afastado da liderança estadual.

Sem Vargas, Jeca Silvério perde influência

Desde a deposição de Vargas no fim de 1945 e a extinção do Território Federal do Iguaçu, em 1946, com o consequente retorno ao Paraná, houve uma espécie de vácuo de poder em Cascavel.

Se confiar em Ribas era a garantia dos posseiros, tudo em Cascavel, desde sua origem, estava ligado a Vargas, em processo iniciado com a campanha da Aliança Liberal, ainda em 1929, quando Jeca Silvério travou contato com Sandálio dos Santos.

No futuro, a amizade deles se desdobraria também em parentesco. A Aliança Liberal que os uniu foi a resposta de Minas Gerais ao arranjo da elite paulista do café de se manter na Presidência com o governador Júlio Prestes.

Com o mundo em crise e o abalo na economia cafeeira, São Paulo precisava proteger seus cafeicultores e não abriu mão de manter o controle do país, rejeitando desta vez o arranjo de sua elite com Minas Gerais – a política do café com leite.

Minas então decidiu apoiar a candidatura Getúlio Vargas¬-João Pessoa nas eleições de 1⁰ de março de 1930. Vencendo em apenas três estados (MG, RS e PB), somando 40,41% dos votos contra 59,39% do paulista Júlio Prestes, a chapa de Vargas também foi derrotada no Paraná, onde os grandes fazendeiros de café eram paulistas.

Fugindo à polarização eleitoral

Em tempos de polarização ardente, a derrota custou a José Silvério de Oliveira perseguições e ameaças. Ele decidiu fugir às violências de inimigos vencedores se transferindo no fim daquele mesmo março de 1930 para a Encruzilhada dos Gomes, no Médio-Oeste do Paraná, onde a família e empregados já trabalhavam no sistema safrista – a criação de suínos baseada na safra do milho.

Em 24 de outubro de 1930, quando a Revolução armada reagiu vitoriosamente à eleição de Prestes e Vargas começou sua jornada rumo ao poder, Silvério passou a ser o dono das terras que arrendou em 1923 e documentou em 1928 junto ao proprietário Antônio José Elias.

Por apoiar o governo, Elias já havia sofrido grandes perdas na revolução de 1924. Mantendo o apoio ao governo também em 1930, teve suas propriedades confiscadas e foi o maior prejudicado no Oeste com a derrubada do presidente Washington Luís.

O maior vencedor, então, havia sido Jeca Silvério, que distribuiu terras a parentes e agregados para dar início à cidade de Cascavel, mas em 1946, com Vargas derrubado do governo pelos generais nos quais mais confiava, Jeca Silvério chegava aos 58 anos de idade já sem respaldo na nova ordem brasileira.

A ascensão dos italianos

No vácuo de poder existente em Cascavel desde o fracasso do Território Federal, os industriais madeireiros e fazendeiros de origem italiana se projetaram economicamente, beneficiados pelo boom madeireiro registrado no pós-guerra e pelo aumento da população atraída pelos empregos nas serrarias, na prestação de serviços a elas e pela oferta de terras a colonos sulistas em troca de trabalho no interior.

A Europa precisava ser reconstruída e a madeira de Cascavel foi para lá, além de ganhar mais espaços no mercado nacional.

Ao ampliar rapidamente seus negócios, os empresários de origem italiana ocupavam a cena urbana enquanto os filhos dos caboclos que no passado prestaram serviços na vila corriam para ocupar os espaços rurais que o governador Manuel Ribas autorizou nos sertões do Paraná, estendendo assim as fronteiras agrícolas.

Esses posseiros, que tanto confiavam no governador paranaense, viram- soar um sinal de alerta em 6 de novembro de 1945, quando Ribas foi obrigado a deixar o Palácio São Francisco (então sede do governo, depois transformado no  Museu Paranaense), sofrendo ataques dos jagunços das colonizadoras até cair no desespero com a morte do ex-governador, em janeiro de 1946.

Posseiros duplamente atacados

“Em Jaguapitã, milhares de lavradores, integrando cerca de 1.500 famílias, posseiros de terras devolutas, ou intrusos em terras particulares, desde 1946, passaram a viver em estado de alarma, face aos problemas de terras e, sobretudo, o comportamento do Governo do Estado ante os mesmos. Muitos foram esbulhados em suas posses, em favor dos grandes proprietários, outros despejados com violência” (Cecília Maria Westphalen, Altiva Pilatti Balhana e Brasil Pinheiro Machado, em Campos Gerais, estruturas agrárias).

Já sem Ribas no governo para respaldá-los, agora a gente do campo sofria a pressão raivosa dos grileiros que os pressionavam a se retirar das terras nas quais haviam promovido benfeitorias, aberto estradas vicinais e iniciado lavouras já em produção.

Com Manuel Ribas morto eles já não tinham mais quem os defendesse, a não ser sua própria capacidade de organização. Por isso, estimulados pelos comunistas, decidiram também se armar e lutar para se defender.

A situação se complicou, pois a partir daí além de sofrer ataques dos jagunços também passaram a sofrer a repressão policial que já alcançava os operários nas cidades.

Interior sem obras e posseiros revoltados

Tendo como consequência um rastro confuso de leis, decretos e normas contraditórias, a desorganização no interior do Paraná se agravou por conta da crise em que o país se encontrava.

Tudo que a ditadura do Estado Novo calou com censura e violência saía agora dos porões e chegava à luz, exigindo um plano de reajustamento da economia nacional.

As medidas draconianas que vieram levaram em outubro de 1946 à suspensão dos trabalhos da CER-1, a comissão construtora da estrada federal, que depois do afastamento da autoridade paranaense sobre Cascavel se tornou o motor da comunidade no Território do Iguaçu.

Agora o interior se tornava um teatro de guerra, sem obras para dar confiança aos colonos, ameaçados de perder suas terras, vivendo o triplo conflito Estado x União, paranistas x iguaçuanos e jagunços x posseiros.

Tendo à frente a mentalidade italiana (filó) de unir a comunidade para se fortalecer, os líderes cascavelenses que ocupavam o lugar de Jeca Silvério decidiram unir civis e militares em uma organização social, que viria a ser o Tuiuti Esporte Clube.

Fonte: Fonte não encontrada

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *