Nas primeiras décadas do século XX se aprofundou irreversivelmente o processo de minifundiarização das propriedades no Nordeste gaúcho, fator que determinou a expulsão de muitas famílias de descendentes de imigrantes italianos.
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Estava aberto o caminho para a ação das companhias colonizadoras, que descortinavam espaços para a ocupação do Paraná. Os filhos e netos dos imigrantes já vinham ao Paraná, mas não contavam com estímulos para ficar. Inexistiam condições de trabalho ou um mínimo de infraestrutura favorável.
“Eram constantes as reclamações por parte dos encarregados das companhias colonizadoras que tinham interesse em colonizar as terras marginais ao Rio Paraná, no sentido de um aparente descaso por parte das autoridades governamentais paranaenses quanto à abertura de vias de comunicação mais adequadas, que permitissem uma maior integração da área a ser povoada com centros que já possuíam uma importância comercial mais acentuada” (José Augusto Colodel, Obrages & Companhias Colonizadoras).
Enquanto Santa Helena era o destino de várias famílias italianas paulistas e gaúchas, a região da atual Cascavel, que só começaria a existir dez anos depois, atraía cada vez mais grupos de colonos eslavos.
Os poloneses e ucranianos traziam algum dinheiro, muitos por estímulo governamental, outros atraídos pela propaganda das colonizadoras, e consolidaram na região o sistema safrista − o cultivo do milho combinado com a criação de suínos.
Pedro Ferri, o agente
A falência do projeto colonizador da empresa Meier, Annes & Cia foi um obstáculo na corrida dos colonos gaúchos ao Oeste. Mas a companhia Alegretti, que adquiriu as terras da empresa falida, tinha Pedro Ferri como agente de propaganda e vendas.
Ferri se beneficiava de um duplo conhecimento: sabia que dificuldades os agricultores viviam em sua região de origem e tinha perfeita noção do potencial do novo destino. Afinal, já vivia no Oeste paranaense.
Para Ferri, portanto, a tarefa de vender as terras paranaenses foi facilitada pelo fato de que no Sul os colonos ocupavam áreas inferiores a dez hectares, não raro em regiões acidentadas.
Além dos morros que atrapalhavam, mais desafiadoras eram as áreas pedregosas, reduzindo severamente o espaço aproveitável. De resto, não havia gaúcho que ficasse indiferente aos relatos de Ferri sobre a fartura de terras existente no Paraná.
Terras boas distribuídas em colônias superiores a dez hectares, assim, funcionavam como um ímã para os colonos que migraram a partir de 1920 do Rio Grande do Sul ao Paraná, provenientes principalmente de Bento Gonçalves, Alfredo Chaves, Cachoeira e Marau.
Quem sofria produzindo em minifúndios com terras não raro escarpadas e pedregosas considerava um paraíso a fartura de áreas devolutas no Paraná. Vivendo em colônias retalhadas por heranças distribuídas a proles numerosas, eles viam que logo também precisariam repartir esses “pedacinhos” com seus filhos.
No Paraná, chegavam a um paraíso que tinha um lado particularmente infernal: um interior desprovido de todo e qualquer conforto, sem uma carteira de clientes aos quais vender os produtos coloniais.
Mas a aventura estava apenas começando: eles imediatamente se lançavam ao trabalho duro de tarefas combinadas entre uma agricultura de subsistência e a extração da madeira, cuja procura disparou após o fim da I Guerra Mundial.
Para juntar a subsistência com ganhar para as despesas, servindo às madeireiras, era uma lida de sol a sol repartida entre a tração animal e o braço do colono, que manuseia alternadamente a enxada, o machado e o serrote.
“O transporte da madeira para as serrarias ou pontos de embarque era realizado por carroças ou através do arrasto, tracionado por três, quatro ou cinco juntas de bois” (Noeli Woloszyn, Em Busca da Terra).
Diversifica-se a população
Pelo vasto interior paranaense, até então com vilas diminutas e muitos acampamentos transitórios, forma-se uma população rarefeita, dispersa em ranchinhos ocupados por uma ou duas famílias, bastante isoladas uma das outras, que constituem plantações diversas, principalmente de milho, feijão e trigo, além de criar suínos.
É o sertanejo paranaense retornando aos hábitos anteriores à Guerra do Contestado, com o caboclo agora se somando aos imigrantes e seus filhos.
Essa nova realidade beneficiou enormemente a pequena e isolada vila de Foz do Iguaçu, cuja população se entusiasmava com a abundância de gêneros alimentícios trazidos pelos novos habitantes, que deram vida ao comércio local:
“As terras são fertilíssimas e produzem abundantemente cana-de-açúcar, arroz, mandioca, frutas tropicais como a laranja, banana, mamão etc. Devem também produzir café e algodão, mas supomos que a cana-de-açúcar, o arroz e a mandioca são suas principais culturas” (Jayme Bailão, A Foz do Iguaçu e as Cataratas, 1921).
Erva-mate, ainda um ciclo forte
Nas obrages ervateiras do Rio Paraná, exploradas por proprietários estrangeiros, a mão-de-obra era requisitada exclusivamente para a atividade mais rentável da época: a extração da erva-mate e, crescentemente, da madeira.
Preservava-se a floresta argentina, cortava-se a do Paraná. Produzir comida não interessava aos donos das empresas, que abasteciam os seus empregados – os mensus – com seus próprios armazéns.
“Cada mensu (…) era obrigado a suprir-se de gêneros alimentícios, roupas e tudo o mais no armazém ou no barracón da obrage. (…) Nas barrancas do Rio Paraná, a agricultura era terminantemente proibida no interior das obrages” (Ruy Christóvam Wachowicz, Obrageros, Mensus & Colonos).
O Oeste do Paraná era um latifúndio colado em outro, em mata contínua. O Censo Demográfico de 1920 desmentiu as estimativas de que nessa região viviam mais de dez mil pessoas.
Na verdade, pouco passavam da metade dessa previsão: 1.500 brasileiros, 1.500 argentinos e 3.000 paraguaios – “que perfaziam densidade demográfica de 0,5 habitantes por quilômetro quadrado” (Roberto Lobato Corrêa, O Sudoeste Paranaense antes da Colonização).
Para entender o quanto era realmente pequena a população brasileira no Oeste paranaense, concentrada nos portos do Rio Paraná, basta dizer que Palmas, no Sudoeste, estava com 10.270 habitantes em 1920.
A Encruzilhada dos Gomes
O Médio-Oeste não passava de um vasto campo de coleta de erva-mate. Pela dificuldade no transporte, não valia a pena arrastar madeira da Cascavel de hoje, então inexistente, até o Rio Paraná. Além de faltar o trem, os caminhões não suportariam trafegar nas trilhas carroçáveis.
Excetuando as áreas pertencentes às obrages ou reservadas à projetada estrada de ferro, havia no Médio-Oeste uma larga faixa de terras devolutas encravada entre as companhias Domingo Barthe e Nuñes y Gibaja.
Nela ficava, desde 1895, o entroncamento de trilhas que os sertanejos chamavam de Encruzilhada dos Gomes.
Em 1921, com a transferência de terras pertencentes à Companhia Estrada de Ferro São Paulo–Rio Grande do Sul à sua sucessora Braviaco (Companhia Brasileira de Viação e Comércio), o movimento colonizador passa a ter em conta não mais apenas o centro, o Sul e os portos do Extremo-Oeste, mas, com o Norte e Noroeste, também o Médio-Oeste e o Sudoeste paranaense.
A Braviaco manifestara a intenção cumprir o acordo firmado com o governo estadual, de atrair colonos para as terras disponíveis nos vazios despovoados, cujo aproveitamento se limitava à coleta de erva-mate e contrabando de madeira.
Ela venderá terras à primeira família que em setembro de 1922 vai se apossar da Encruzilhada dos Gomes, local onde em 1930 terá início a futura cidade de Cascavel.
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