Mentira causou o abandono do Oeste

Borba Gato matou Castelo Branco e comprou a liberdade com ouro

Quando as cidades jesuíticas do Oeste do Paraná foram varridas pelos ataques dos bandeirantes, só Vila Rica do Espírito Santo, junto ao Rio Ivaí, manteve-se, apoiada no comércio de erva-mate.

Sem os espanhóis, as autoridades portuguesas instaladas em Paranaguá teriam que iniciar a povoação do interior do futuro Paraná, mas isso requeria recursos para expedições de conquista (as entradas). 

Agostinho de Figueiredo, administrador das minas de ouro e prata do Sul, estava no cargo desde 1670 sem apresentar os resultados que o rei Pedro II ansiava. Para se prestigiar junto ao trono português, o provedor das minas de Paranaguá, Manuel de Lemos Conde, mentiu ao rei que no interior havia uma fabulosa serra de prata. 

Ávido pela fartura prateada, o monarca luso enviou ao Brasil um especialista em prospecção de minerais para avaliar a descoberta. Rodrigo de Castelo Branco vinha substituir Agostinho de Figueiredo e chegou de Portugal no fim de 1673.

Sem prata, suicídio e assassinato

Em pesquisas, Castelo Branco percorreu desde o Nordeste um vasto território, avaliando as possibilidades das regiões passíveis de boa extração mineral. Só em 1677 ele chegou a Paranaguá, de onde partiu para o interior do atual Paraná em busca da prometida serra de prata. 

“Foi-lhe, pois, confiada uma bandeira para ir ao sertão buscar a prata que afirmara ter sido descoberta e descobrir outras se possível fosse. A bem aprestada expedição transpôs a Serra do Mar, penetrou nos Campos Gerais, derivou para o sul até o Iguaçu e o Uruguai e nada descobriu” (Romário Martins, Bandeiras e bandeirantes em terras do Paraná).

Quando o logro de Lemos Conde foi descoberto, ele caiu em desgraça e teve os bens sequestrados. Humilhado e preso, suicidou-se em 1681. A disputa por cargos na colônia motivada pela prata lendária chegou ao fim um ano depois, quando Rodrigo Castelo Branco se envolveu em briga com Manuel de Borba Gato (1649–1718) e foi assassinado.

A desilusão com o futuro Paraná foi grande e o rei Pedro II se desinteressou pela região. Decidiu determinar ao governador da Capitania do Rio de Janeiro, Manoel de Lobo (1635–1683), a fundação da Colônia do Sacramento, no atual Uruguai.

O desvio da mão de obra

Na ofensiva lusitana no Uruguai de hoje está a raiz da futura Guerra do Contestado, inaugurando as questões de limites travadas inicialmente entre Brasil e Argentina.

“Os portugueses não queriam abrir mão do território por eles ocupado fora da linha de Tordesilhas, especialmente no denominado Continente de São Pedro e no interior dos atuais estados de Santa Catarina e do Paraná” (Nilson Thomé, Rio Branco e o Contestado – Questão de Limites Brasil-Argentina).  

Com o Tratado de Lisboa, firmado em 7 de maio de 1681, a Espanha entregou Sacramento a Portugal. Findo o sonho prateado, a prioridade dada pelo reino português ao Sacramento prejudicava a região Oeste. Já ignorada pela Espanha, passou a ser ignorada também por Lisboa.

Além de não investir no Paraná, o governo português exigiu que os trabalhadores da região – índios já “mansos” e em pleno vigor – fossem transferidos para o Sul ou remetidos à exploração das Minas Gerais.

Quem ficou, sofreu epidemia

A tímida reação contra a política de esvaziar a mão de obra do Paraná não chegou a desafiar o rei Pedro II. Além de perder seus jovens trabalhadores, o futuro Paraná foi assolado em 1686 por uma epidemia – a Peste da Bicha. 

Surto de febre amarela, supostamente detonado por um estoque de carne podre em barris vindos da Bahia, “a situação era tão dramática que as igrejas dessas vilas litorâneas chegavam a suspender o dobre dos sinos para não aterrorizarem ainda mais as populações” (Antônio Vieira dos Santos, Memória Histórica de Paranaguá). 

“Estavam cheias as casas de moribundos, as igrejas de cadáveres, as ruas de tumbas” (Sebastião da Rocha Pita, História da América Portuguesa).

No plano mundial, nessa época, o grande acontecimento é a Revolução Gloriosa: em 1688, contra o rei inglês Jaime II, limitou os poderes do monarca, propôs a supremacia do Parlamento, a liberdade de imprensa e individual e proteção à propriedade. É a burguesia atacando a ordem feudal.

Capitalismo e tropeirismo

A revolução, além de pôr fim ao absolutismo monárquico na Inglaterra, criou o primeiro Estado burguês do planeta, alicerçado na monarquia parlamentar. A burguesia avançaria ainda mais a partir dessa época, impondo a liberdade de mercado, ponto de partida para a vitória do capitalismo. 

Os ingleses começavam a conquista do mundo e no futuro também viriam tomar conta do Oeste. Para Portugal, o interior do Paraná voltou a interessar apenas como ponto de passagem.

Em 1698, Artur de Sá e Menezes, governador do Rio de Janeiro, escreveu ao rei informando sobre a descoberta de um caminho para as Minas Gerais dos Cataguases do Ouro Preto, citando “a utilidade dos Campos Gerais, os quais são tão férteis para os gados”.

Começava o tropeirismo. O gado traria riqueza e importância a Curitiba, mas nenhuma ação povoadora no extremo-Oeste. Então os Campos Gerais são a nova frente de colonização e enriquecimento dos paulistas, consolidando-se a partir do início do século XVIII. 

Prioridade ao eixo Viamão-Sorocaba

Com o litoral já em início de produção industrial, Curitiba é cercada de lavouras e as famílias tradicionais financiam negócios com o gado, dirigindo a ocupação dos campos que ligam a região com Sorocaba e São Paulo, onde estavam os compradores. 

A política de concessão de terras não se dava mais a título de gratidão, recompensa ou pagamento por serviços prestados a Portugal. O governador do Rio de Janeiro, Álvaro da Silveira de Albuquerque, estabeleceu que os novos donos de terras as usassem para criar currais, “tudo no intuito de desenvolver a pecuária e gradativamente a povoação destes lugares” (Diocese de Ponta Grossa, O Povoamento de Ponta Grossa).

O desagrado entre as lideranças locais com o esvaziamento populacional induzido por Lisboa aumentou em 1698, quando o governo geral exigiu o fornecimento dos índios aldeados para reforçar uma expedição encarregada de combater “índios bravios” no Rio Grande do Sul. 

Mesmo quando os combates terminavam logo, a mão de obra paranaense não retornava, deslocada para servir nas Minas Gerais, cujo ouro financiará a riqueza europeia. Para o interior, nada.  

CLIQUE AQUI e veja episódios anteriores sobre A Grande História do Oeste, narrados pelo jornalista e historiador Alceu Sperança.

A burguesia avançou com a deposição do rei inglês Jaime II

 

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