Municípios gêmeos, Comarcas gêmeas

Jovens promotores Clóvis do Espírito Santo e Josaphat Lona Cleto. Alunos do Colégio Marista dramatizam na parada escolar de 7 de setembro de 1964 o jaguncismo superado pela agricultura mecanizada

14/11/1951, 14/12/1952, 14/12/1953 e 9/6/1954 são datas comuns a Cascavel e Toledo. As duas primeiras se referem à criação e instalação dos municípios. As demais, criação e instalação das Comarcas, datas que justificariam a relação fraternal.  

Para chegar a elas, uma longa história transcorreu. Até 1910, quem precisasse dos préstimos da Justiça no Oeste do Paraná teria que encaminhar a petição aos oficiais da Colônia Militar do Iguaçu, criada em 1889.

As decisões judiciais passaram à esfera do Estado do Paraná em 8 de abril de 1910, com a criação do Distrito Judiciário. Em 1917 ocorreu a criação da Comarca de Foz do Iguaçu, só instalada de fato em 3 de março de 1919, com a Lei 1.658.

Toledo ainda não exista em 18 de janeiro de 1938, quando a Lei 6.244 criou o Distrito Judiciário de Cascavel. Em dezembro de 1952, quando foram instalados os municípios de Cascavel e Toledo, gêmeos de nascimento e instalação, tinham realidades fundiárias diferentes: o vasto Município de Cascavel abrangia a região conflitada do Vale do Rio Piquiri e o de Toledo era controlado sem disputas internas pela madeireira e colonizadora Maripá, na antiga Fazenda Britânia.   

Soluções provisórias

O prefeito de Cascavel, José Neves Formighieri, conhecia bem a realidade do Piquiri e designou o irmão Eurides Formighieri para pacificar a área. Abrangendo todo o Noroeste, a tarefa não era cabível à Prefeitura de Cascavel. Por conta disso, foi enviado ainda em 1952 o coronel João Rodrigues da Silva Lapa, que em dois meses de atuação fez inúmeras detenções. 

De imediato, em 24 de dezembro de 1952, o Estado regulamentou a atuação do Departamento de Geografia, Terras e Colonização para agilizar o registro de terras. O DGTC, por sua vez, criou a Inspetoria de Terras de Cascavel, primeiro órgão estadual a se instalar no município.

Os colonos do interior, porém, reclamavam de corpo mole dos encarregados pela inspetoria em favor dos grileiros (https://x.gd/SGWyC). 

O prefeito Neves Formighieri e a Câmara Municipal, desaguadouros naturais das queixas, articularam com o responsável pelo Cartório Civil, Sandálio dos Santos, a criação de uma Comarca em Cascavel para evitar a via crúcis dos colonos a Foz do Iguaçu, com altos custos e perda de tempo.

Mortes em série

Tempos difíceis, “forças ocultas” impediram a Comarca, mas as mortes aumentaram. A circulação de jagunços e posseiros no comércio urbano de Cascavel logo traria o clima de violência do interior para a cidade, que crescia. 

Em 28 de setembro de 1953, antes da instalação da Comarca, o comerciante João Nei Miotto matou com um tiro o vereador Adelino André Cattani, na praça Getúlio Vargas, ao lado da Rua Pio XII, onde ficava a Copal (Comercial Oeste), de Itacir e Lídia Luchesa. Matar era a solução trivial para as discussões.

“Dona Lídia Luchesa conta que cada vez que matavam alguém na frente da Comercial Oeste (Copal) ela corria a colocar um crucifixo entre as mãos do baleado para a extrema-unção. Em pouco tempo acabou com o estoque de crucifixos de sua casa e do armazém” (Xico Tebaldi, Conversa de Chimarrão). 

Este era o clima de insegurança quando ainda toda a região estava subordinada à Comarca de Foz do Iguaçu, sobrecarregada com antigos problemas da fronteira e os da colonização recente, em que títulos novos de propriedade se sobrepunham a posses decenárias, como em Criciúma (Santa Terezinha de Itaipu).

“A Colonizadora chegou querendo tirar a gente da terra. Vieram os empregados com espingardas 12, prontos para matar os ‘bandidos’, como eles diziam” (Leonardo Wichoski https://x.gd/igFMS). “Bandidos” seriam os posseiros.   

Intensa disputa 

A Comarca de Cascavel veio a ser efetivamente criada, mas não vinha só: a lei 1.542, de 14 de dezembro de 1953 também criava a gêmea toledana, resultado de uma intensa disputa entre os municípios gêmeos, pois a Assembleia Legislativa pretendia criar só uma Comarca para todo o Médio-Oeste (https://x.gd/pwPms). 

Em dia 31 de maio de 1954, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, desembargador José Munhoz de Mello, determinava, por meio de portarias, atos solenes de instalação das Comarcas de Segunda Entrância de Cascavel e Toledo. 

A de Toledo foi entregue ao experiente jurista Cid Cordeiro Simas. O promotor de Justiça designado foi Clóvis do Espírito Santo, ainda bem jovem. Simas permaneceu algum tempo em Toledo, mas aos primeiros juízes designados para Cascavel parecia que um tição aceso lhes caía nas mãos, pois nessa cidade com nome de cobra até os advogados eram ameaçados e expulsos.

Origem do preconceito

O advogado mineiro Antônio Pereira Tomé veio para Cascavel já com casa reservada e aluguel pago, mas teve que permanecer vários meses em um hotel porque a proprietária do imóvel, ao saber que o inquilino era um advogado, recusou-se a lhe liberar a moradia.  

Alugava-se para jagunços, mas não para advogados. No passado, aproveitando-se da ingenuidade dos caboclos interioranos, homens bem falantes chegavam de Curitiba ou Porto Alegre se apresentando como advogados, falando de forma empolada e cativante. 

Os falsos “doutores” davam golpes no comércio e desapareciam. Como era um artifício muito usado, os “caipiras” abriram o olho para não cair mais na lábia dos malandros. 

Quando começaram a vir ao interior os verdadeiros profissionais do direito, a partir de 1954, enfrentaram a barreira de desconfiança dos caboclos, cansados de ser passados para trás por trapaceiros que usavam três ou quatro palavras em Latim para fingir cultura jurídica.

Assustaram o juiz

O primeiro juiz designado para Cascavel, em 5 de maio de 1954, foi Inácio Pinto de Macedo. Ao chegar à cidade na manhã do dia 9 para assumir suas funções, logo ao desembarcar do avião DC-3 da Real Aerovias no Aeroporto Coronel Alberto Mendes da Silva foi informado da ocorrência recente de cerca de 30 homicídios. 

“Uma rápida passada de olhos pela cidade o convenceu a ordenar o transporte de suas malas de volta para o avião, que partiria às 14 horas daquele mesmo dia. E tirou o time, alegando que o clima aqui era muito pesado” (Xico Tebaldi, fotógrafo e historiador).

Os temores de Macedo logo se confirmaram. Um dos primeiros jagunços submetidos a julgamento ameaçou resolutamente de morte o juiz Aurélio Feijó, substituto de Macedo à frente da Comarca, sem poupar o promotor, o próprio advogado e jurados.

O clima era realmente “pesado”. Em ponto de encontro no centro de Cascavel, um agricultor ameaçou o inimigo de morte, “serviço” que jurou completar bebendo o sangue do desafeto. A ameaça foi cumprida à risca, em público, e confirmada tranquilamente pelo autor no curso do julgamento.

Por essa época, um jagunço encontrou um homem marcado para morrer dentro da Igreja de Santo Antônio e o convidou a “morrer lá fora para o barulho não incomodar os santos” (https://x.gd/HrDrQ).

Jovens promotores

A muito custo a Comarca foi instalada. O corajoso advogado baiano Epiphânio Figueiredo veio quase por acaso, enviado às presas para celebrar um casamento, e foi convencido a ficar na função de juiz substituto, mesmo presenciando um tiroteio logo em sua primeira visita ao centro da cidade, hoje o Calçadão da Avenida Brasil.

Para a promotoria foi designado um paranaense corajoso: Josaphat Porto Lona Cleto, a exemplo de Espírito Santo, em plena juventude. Aos 23 anos, precisava punir um jagunço que aterrorizava a região de Cafelândia e ofereceu denúncia contra o “valentão”.  

Levado pela polícia ao Fórum, na tentativa de intimidar as autoridades, o jagunço ameaçou o promotor e disse “um monte de barbaridades”, segundo o juiz Figueiredo. Alertado para o fato de que suas declarações só fariam aumentar a pena, prosseguia com as bazófias: “Isto não vai dar em nada. E se der em alguma coisa, vou fazer picadinho de vocês”. 

Figueiredo conta que ele e o promotor sentiram preocupação diante das ameaças, mas não se deixaram intimidar. Os tempos eram difíceis também para os bandidos, enfrentando autoridades pioneiras que não conheciam o medo (Cascavel, a Justiça https://x.gd/8pn1J).

100 anos da revolução: Os primeiros conspiradores 

O início do movimento, em 5 de julho de 1924, proveio de uma intensa preparação. A posição de Siqueira Campos era de que a revolução deveria irromper simultaneamente em São Paulo e no Rio Grande do Sul.

Servindo na época no quartel-general do general Abílio de Noronha comandante da 2ª Região Militar, sediada em São Paulo, Newton Estillac Leal foi um dos encarregados das articulações nesse Estado.

Além de Estillac, tomavam parte nas conspirações os irmãos Juarez e Joaquim Távora, Eduardo Gomes, Arlindo de Oliveira, Osmar Soares Dutra, Tales Marcondes, Emídio Miranda e Miguel Costa. 

Dias Lopes, general reformado, foi escolhido para ser o comandante. Seu nome inspirava coragem e firmeza. Gaúcho de Dom Pedrito, abandonou o Exército em 1893 para participar da Revolução Federalista, no RS, contra o governo Floriano Peixoto. 

Com tais líderes à frente, a data da deflagração do novo movimento foi fixada em 5 de julho de 1924, para homenagear os revoltosos de 1922.

A não era revolucionária, mas feita para cativar apoio popular: voto secreto, descentralização do poder, moralização e independência do Legislativo, obrigatoriedade do ensino primário e profissional.

 Ilustração de jornal expõe o general Izidoro Dias Lopes como chefe da revolução 

 

 

Fonte: Alceu Sperança

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