Ordem: limpar os cofres do Paraná

João IV: o ouro paranaense pagando a revolução portuguesa

Com a fuga dos jesuítas e seus índios reduzidos, ou seja, aldeados em redutos e doutrinados para a produção comunitária exportável, o futuro Paraná começou a se caracterizar como “território de passagem”, tese sustentada por muitos historiadores.

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As expedições de Aleixo Garcia, Cabeza de Vaca e tantas outras só passaram. Os jesuítas vieram, tentaram construir mas foram obrigados a passar. Os bandeirantes só passaram, sem deixar nada construído. Em seu rastro ficaram apenas as ruínas das cidades de índios criadas pelos jesuítas nas três primeiras décadas do século XVII.

Com o despovoamento de índios, o interior só continuou na mira dos bandeirantes à procura de ouro, necessário para salvar o reino português. Eles, porém, não só levaram ouro e índios para escravizar: também deixaram rastros históricos.

Em 1637, em bandeira pela região sob o comando de Fernão Dias Paes Leme, chega o jovem Mateus Martins Leme (1619–1697), que será no futuro nomeado “capitão povoador de Curitiba”. Fernão Dias, por sua vez, ainda faria muita história pelos sertões do Paraná.

Revolução longa e cara

O ano de 1640 foi pródigo em tensões em Portugal que afetariam o futuro do Paraná. Uma delas foi A Botada dos Padres Fora, que culminou na expulsão dos jesuítas. 

Foi uma vingança contra os religiosos que inspiraram um Breve (determinação pessoal) do papa Urbano VIII “ameaçando de castigos e cóleras divinas os ímpios que atentassem contra a liberdade dos indígenas, quer dos convertidos, quer dos infiéis” (Auguste de Saint-Hilaire, Viagem à Província de São Paulo). 

A revolução de Portugal contra o domínio espanhol eclode em 1º de dezembro de 1640. É a Guerra da Restauração, que vai durar 28 anos. Sob o nome de d. João IV, o Duque de Bragança (1604–1656), é aclamado rei de Portugal.

O domínio espanhol arruinou os cofres lusos e levou Portugal a perder importantes áreas coloniais, mergulhando o reino em séria crise econômico-financeira. 

Libertava-se da Espanha e se tornava escravo dos cofres vazios, já sem as perspectivas econômicas com que ingressara vitoriosamente na segunda metade do milênio. Com isso, o ouro do Paraná será necessário para pagar parte dos custos da revolução portuguesa. 

Só o ouro interessava

Desdobramento da situação revolucionária na península ibérica, em 1641 os holandeses ocuparam o Maranhão, aproveitando-se da fragilidade de Portugal, com os cofres vazios depois de décadas de submissão à Espanha.

Eleodoro Ébano Pereira foi enviado em 1649 à Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá, primeiro núcleo urbano do Paraná, para comandar uma expedição. Ela teria que subir os rios, passar a Serra do Mar e alcançar o Planalto com o objetivo de encontrar ouro e índios para capturar. 

Concentrando-se no ouro, o grupo reunido por Ébano Pereira era formado por sertanistas do litoral. Eles conheciam bem a região e os bons resultados logo apareceram, com a identificação dos sítios auríferos.

Em fins de 1651, o rei João IV ordenou a Luís Salema de Carvalho, desembargador da Relação da Bahia, ir ao Sul “para fazer examinar as minas do descobrimento do capitão Eleodoro Ébano Pereira”. As notícias foram ótimas: diversos veios de ouro foram achados.

Atraso e abandono

O reino tinha pressa em levar o máximo de ouro para custear a força militar de combate ao domínio holandês. Oficializado como administrador das minas de ouro da Capitania de Paranaguá, Eleodoro Ébano recebeu um ofício encaminhado em maio de 1652 pelo governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá. A ordem era limpar os cofres e entregar a quantia apurada ao emissário do governador, João Rodrigues Morales. 

Uma das causas do atraso no desenvolvimento do interior paranaense, a perda desse primeiro ouro oficial fará com que por longo tempo o Oeste fique fora das atenções dos governos sediados no Rio de Janeiro e São Paulo. 

Além de incursões esporádicas dos bandeirantes em busca de ouro, não encentrado no Oeste, a ação governamental se limitará ao eixo Curitiba-Litoral, depois nos Campos Gerais e só no fim do século XIX chegará a Guarapuava.

“Gostosos” com o conquistador

Em São Paulo, o mito do heroísmo bandeirante criava corpo com Afonso Taunay, filho do governante paranaense e grande escritor Alfredo Taunay. Ele foi um dos principais responsáveis pela glorificação dos bandeirantes, mesmo reconhecendo que foram extremamente cruéis. 

A ação dos bandeirantes, para Taunay, teria “as mais notáveis consequências para o futuro do Brasil”. Sem a ação de Antônio Raposo Tavares, escreveu, “a fronteira do Brasil seria hoje o Paranapanema. E Mato Grosso também não nos pertencera, espanizado pelas reduções dos Itatins”.

“A lenda [do bandeirante] se incumbiu de ampliar-lhe o feito (,,,) fazendo-o entrar no Pacífico com a espada desembainhada e dele tomar posse em nome da coroa de Portugal” (Carlos Alberto Nunes, Os Brasileidas: Epopeia Nacional). 

Na versão de Taunay, a submissão dos caciques indígenas ao bandeirante foi uma aventura pacífica: “Pôs-se em marcha o grande corpo daqueles reinos e todos seguiam gostosos esta transmigração debaixo do comando inteiramente do seu conquistador e amigo Fernão Dias”. 

Índios, agora armados 

Durante a resistência portuguesa ao domínio espanhol, os bandeirantes saíram em perseguição aos índios que fugiram pelo Rio Paraná. Mas após o desastre do Guayrá, em 1629, o rei Filipe IV os autorizou finalmente a usar armas “para que possam se defender dos irreparáveis danos que a experiência mostrou terem recebido aquelas reduções por parte dos portugueses da vila de São Paulo, ficando a maior parte delas destruídas, seus índios escravizados e como tais vendidos no Brasil ou mortos nos caminhos”.

A resistência aos ataques bandeirantes virou o jogo em 11 de março de 1641, quando três mil homens da vanguarda paulista foram derrotados na confluência dos rios Uruguai e Mbororé pelo exército de índios Guaranis, em maior número. Cerca de dois mil homens dos dois exércitos tombaram na batalha.

Em Portugal, já estavam em curso os protestos populares motivados pelos excessos tributários. Ao se agravar, essa agitação levaria à completa independência portuguesa, rompendo o controle espanhol.

O clima revolucionário crescente em Portugal, também verificado na Inglaterra, afetou os moradores do Brasil, sinalizando para uma série de revoltas inicialmente baseadas na contrariedade com os impostos e em seguida ampliadas para o sonho de independência. Mas por ora, e durante 200 anos, o Oeste ficaria ignorado.

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