Cascavel já estava solidamente colocada no mapa da madeira paranaense desde a primeira metade da década de 1940, vivendo uma saudável sensação de prosperidade crescente, mas o Brasil em geral vivia um estado de apreensão generalizada.
Supunha-se que muitas vantagens viriam da adesão imediata do Brasil aos esforços dos Aliados para vencer o nazifascismo. A ditadura, dividida, hesitava entre a neutralidade e a declaração de guerra ao Eixo, exigência dos movimentos pela redemocratização do país.
Getúlio Vargas relutava em enviar tropas à Europa. O jornalista Assis Chateaubriand (1892–1968), que viria a dar nome a uma importante cidade da região, tomou a iniciativa de organizar a Legião Latino-Americana, composta de voluntários brasileiros, argentinos, uruguaios e paraguaios dispostos a lutar junto aos Aliados.
Chateaubriand comunicou a iniciativa ao ministro da Aeronáutica, Salgado Filho (1888–1950): “Agora já temos várias dezenas de cadáveres de brasileiros vitimados por torpedos nazistas disparados contra navios mercantes nossos e neste governo ninguém quer nem ouvir falar em luta armada. O Estado Novo não quer saber de entrar para valer na guerra, e Getúlio muito menos. (…) Estamos transformados num magote de sapos acovardados”.
No último dia de agosto sai finalmente a declaração de guerra à Alemanha e Itália. Há manifestações de regozijo pela atitude corajosa finalmente tomada pelo governo brasileiro depois de muita hesitação.
Cascavel mais aconchegante
Alheio a essas movimentações, o interior do Paraná viveu um rigoroso inverno em 1942. Os viajantes que transitavam pela vila de Cascavel, a cada dia em maior número, para negociar pinhais, explorar e exportar madeira, sofriam para se alojar em boas condições.
Eles chegavam a cavalo, de caminhão ou carroça à procura dos serviços oferecidos pela vila, como cuidados com os animais de montaria, consertos de carroças e alimentação.
Para maior comodidade dos viajantes, José Bartnik e a esposa Bertha abriram um hotel com o nome da família, na Avenida Brasil, diante da futura loja Auriverde.
Grande construção com 30 quartos e uma freguesia composta majoritariamente pelos motoristas de caminhão que transportavam madeira a Foz do Iguaçu, ali foram realizadas muitas festas de casamento e vários bailes. O médico Wilson Joffre se hospedava no Hotel Bartnik e deu consultas em seu quarto até construir o Hospital Nossa Senhora da Aparecida.
Nazistas são rechaçados
Entra setembro e oficialmente o Brasil já figurava como parte ativa no conflito mundial, mas a guerra declarada à Alemanha e Itália continuava só no papel. O ano de 1942 termina com todo o território nacional se preparando para viver em estado de guerra.
No Rio de Janeiro, puxada pelos estudantes da UNE, cresceu em janeiro de 1943 a pressão popular pelo imediato ingresso do Brasil com força armada no conflito mundial.
Aproveitavam que no final desse mês o ditador Vargas se encontraria com o presidente americano Franklin Roosevelt (1882–1945) em Natal (RN), no curso de negociações para o ingresso efetivo do Brasil na guerra.
Fevereiro de 1943 começa com uma espetacular virada estratégica, jamais esperada pelos agressores nazistas: a União Soviética resistiu à invasão sofrida e venceu a batalha de Stalingrado, abatendo 200 mil soldados invasores e aprisionando outros 90 mil.
A partir de agora, Hitler começará a se encolher para posições defensivas e a simpatia do governo brasileiro pelo nazifascismo se reduzirá na proporção direta da agora já concreta perspectiva de sua derrota e dos acenos dos EUA de vantagens ao Brasil em troca da adesão aos Aliados.
O Oeste sem filhos de imigrantes
A situação desoladora do Oeste depois da expulsão dos colonos de origem italiana e alemã ficou evidente por um relato bastante objetivo feito pelo terceiro sargento Manoel Corsino Dias Paredes, então com 25 anos.
Ele percorreu a cavalo os portos de Foz do Iguaçu e o interior do Município a serviço da Delegacia Regional de Polícia. Inspecionando portos nos rios Iguaçu e Paraná, evitando o enorme trecho desabitado entre Foz do Iguaçu e Cascavel, Paredes fez um significativo retrato do Oeste paranaense durante a II Guerra Mundial.
Expondo os esforços dos raros colonos que ficaram e as dificuldades da região com o conflito, mesmo distante do teatro das ações militares, o relato de Manoel Paredes trata mais da geografia que de crimes.
O maior deles, aliás, foi a expulsão dos colonos alemães e italianos, que sem culpa, apenas com base nas etnias, foram jogados no desespero, despojados e partindo sem direito à defesa, deixando um quadro de graves prejuízos à economia da região.
Paisagem de abandono
O sargento Paredes partiu em 13 de março de 1943 e diariamente anotava o que via, mencionando os nomes dos raros colonos que encontrava e a situação dos portos e vilas esvaziadas.
Relatou os serviços de balsa e travessias feitos por argentinos e paraguaios, a economia baseada nas culturas de subsistência, predominando plantações de milho, arroz, feijão, mandioca e fumo, além de criações de gado, carneiros, porcos e galinhas.
Encontrou o Porto Ipiranga abandonado, com apenas um morador, o paraguaio Rozário Benítez. No Porto Ocoy, o mesmo Benítez, ali residente desde 1903, criava porcos e tinha um campo de aviação particular.
O Porto Sete de Setembro, igualmente abandonado. No Porto Itacorá, nenhum movimento, a não ser a extração de madeira feita por Jerônimo Vargas. O Porto Sol de Maio, antiga sede da Companhia Espéria, desativado e sob a intervenção do administrador Agenor Silveira, que ficou para cuidar de lavouras e criação.
Cooperativa quebrada
Encontrando várias casas da companhia Espéria abandonadas e a Cooperativa Manoel Ribas, formada por 60 famílias de agricultores, quase à falência, havia um sinal de prosperidade desafiando tanta desolação: a casa comercial de Valentin Agostini.
A história de Agostini é um dos mais significativos exemplos do esforço dos filhos de italianos que vieram para o Oeste desafiar as adversidades da época.
Nascido em Estrela (RS), Valentim plantou milho em Buenos Aires até 1921, quando decidiu seguir para a anunciada colonização de Santa Helena, atendendo a um convite do colonizador André Zílio.
Saindo de Porto Belo (RS), contratado por Zílio, a missão inicial de Agostini era construir um barco particular para o transporte da diretoria e empregados da colonizadora Méier, Annes & Cia, iniciadora do projeto inicial de Santa Helena, que ficou conhecido como “Santa Helena Velha”.
O barco da honra
Logo ao chegar ao Oeste do Paraná, ainda em 1921, Agostini construiu um moinho e descascador de arroz movido a roda d’água porque o projeto de construção do barco inicialmente projetado foi posto de lado com a falência da empresa.
Mas Agostini não desistiu. Não só ficou, para trabalhar com o novo filão da exportação de madeira, como também manteve a ideia de construir o barco, que fez por sua própria conta.
Na época em que foi visitado pelo sargento Paredes, Agostini dava continuidade ao antigo projeto de construir o sonhado grande barco brasileiro para navegar no Rio Paraná, finalmente lançado às águas em 1944. Ele morreu no ano seguinte, mas seu compromisso de honra foi cumprido.
Depois de dar um dia de descanso aos cavalos da expedição, em 3 de abril de 1943 o sargento Paredes decidiu iniciar a viagem de Santa Helena a Cascavel por uma antiga estrada ervateira.
Reduzida a um carreiro por onde carroças carregadas não mais passavam, o resultado da penosa viagem foi atestar a inviabilidade da estrada. No entanto, ao chegar à sede distrital de Cascavel o sargento Paredes, que no futuro iria comandar a Polícia Militar do Paraná, teve uma grande surpresa, que o fez permanecer dois dias no local.
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